Um ano de histórias escrita por Annabel Evers


Capítulo 2
Mais feliz


Notas iniciais do capítulo

Hey, hey.
Hora de conhecer um pouco a tal Dominique do capítulo passado (toda história tem dois lados).



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F E V E R E I R O 

 

Dominique Marie Weasley

15 de fevereiro - Carnaval 

 

    Dominique nunca esteve sozinha. Ela tinha dois irmãos, uma família muito grande que via com frequência e, nos tempos de escola, tinha muitas amigas. A loira estava acostumada a sempre ter alguém por perto, então foi uma surpresa para si mesma quando fugiu. 

    Ela não pensou muito. Em um minuto, estava na porta do trabalho (estágio), no outro já estava com malas prontas para viajar. Não que ela lembrasse, mas provavelmente houveram muitas lágrimas envolvidas. 

    É o que acontece quando você é traída. 

*

    Ninguém, além do ex, sabia os motivos por trás de seu sumiço. Temendo o desespero dos pais, Dominique entrou em contato com eles, avisando que pegou suas próprias economias e viajou para a França (ela ficaria com a tia Gabrielle, então não tinha porque ficarem nervosos). Ela lidaria com eles, bem como todos os problemas que ela largou, quando reunisse coragem para voltar. 

    Ela poderia elencar o passar daquele mês em pequenas decisões que tomou (porque era mais fácil do que resolver a bagunça em sua vida). Na primeira semana, Domi decidiu comprar novas roupas quando achou um vestido que a lembrava dele. Na segunda semana, ela irritou-se com o cabelo longo e resolveu cortar (porque é o que as garotas fazem quando rompem um ciclo). Na terceira semana, recebeu uma carta dele. 

    Naquele dia, comprou uma passagem para a Itália. 

*

    Talvez não tenha sido uma boa ideia viajar para um destino turístico tão romântico quando você está superando alguém. Depois de viver três dias como uma turista em Roma (optando por visitar seguros pontos históricos), Domi saiu do hotel que estava hospedada e migrou para um hostel. 

    E foi quando sua viagem não se mostrou um erro. Na semana seguinte, Domi foi apresentada à verdadeira Roma: frequentou o melhor de uma vida noturna na cidade. Ali, Domi não era de uma família famosa ou vivia com o rótulo de mocinha feliz e popular. Ela se sentia à vontade para despejar toda sua amargura com aquele grupo com quem dividia o quarto. Ah, o vinho…

    — Então — começou Kate, uma jovem também inglesa. — Vocês estavam namorando em segredo porque são, hm, primos e você temia a reação das pessoas. 

    — Não só da família, de todo mundo, já que o cara era um galinha. — acrescentou Daniel, talvez o mais bêbado ali além de Domi. 

    — A pergunta que não quer calar — tornou a dizer Kate. — Você tinha medo do relacionamento público por causa da reputação dele. Sempre teve medo de ser traída?

    — Quando eu me apaixonei, sim. — admitiu Domi, que tinha abandonado a taça e agora bebia diretamente da garrafa. 

    — Caralho — os dois exclamaram em conjunto. 

    — A pior parte foi que eu pensei, “somos tão parecidos, intensos e loucos; se eu me jogar, ele não vai temer”. Eu preferia ter recebido um balde de água fria do que um par de chifres. 

    — Ah, não, flor — argumentou Daniel. — Ele te deu a porcaria de um anel. Você não criou expectativas à toa. O cara mostrou que estava na mesma página. 

    — Ah, sim, perdidamente apaixonado e depois me traiu?

    — Nunca disse que ele não era um canalha. 

    Ela acabou rindo, mesmo sentindo o peso daquela afirmação. Tudo começou como uma brincadeira inofensiva: eles sempre trocavam flertes, brincando com as reações do outro. Em algum momento, Dominique passou a provocá-lo não por um esporte, mas porque queria a atenção dele, queria matar sua curiosidade dele. Que culpa tinha ela quando, ao passarem a trocar saliva, ela não conseguisse mais largá-lo? 

    Se apaixonar é tão estranho. Todos os “sintomas” poderiam ser facilmente associados a um medo. Porcaria de frio na barriga, mãos suando e ansiedade aflorada — não tinha como isso ser saudável. Mas estar apaixonado é também ser cego, fingimos que não vemos esses verdadeiros sinais e mergulhamos de cabeça na emoção. 

    No caso de Domi, a profundidade dos seus não cabiam no pequeno espaço que ele tinha para ela e, na queda, ela transbordou, dividida em partes, para bem longe. Ela tinha medo de não recuperar mais. 

 

    A primavera se aproximava e, para alunos do NIEMs, significava uma lenta e tortuosa perda de sua autoconfiança, compostura e sanidade. Felizmente, para Dominique e James, melhores alunos do seu ano, aquilo não era problema. Longe de serem os mais inteligentes da turma ou os mais dedicados — eram incrivelmente bons mesmo sem grandes esforços. E mesmo se não fosse: fazia um belo dia de primavera para ficarem presos na biblioteca. 

    Entre beijos, os dois faziam uma confusa revisão em um canto afastado do jardim. 

    — A maravilhosa conjuração — começou James, murmurando contra o pescoço dela. — quais as exceções?

    — As leis de Gamp — respondeu quando ele interrompeu o beijo. — Hm, a vida… e o dinheiro, ouro, comida e objetos animados. 

    — Particularidades? 

Domi ficou por cima dele, mordiscando a mandíbula dele antes de responder. 

— Bem, tirando a vida, as outras coisas podem ser convocadas se você souber onde estejam. Minha vez. 

Parecia que ela se referia às perguntas, mas na verdade o envolveu em um beijo lento e molhado, como era sempre entre eles. A garota achou que tinha morrido ali a revisão deles, mas James tinha outras ideias. 

— E por que não usar um Accio ao invés de tentar conjurar? 

— Ai, James — disse Domi, bufando. Ela jogou o cabelo para trás, irritada, mas ele nunca a achou tão linda. — O Accio realmente funciona. Ok. Mas tem restrições de quão longe. 

— Verdade. — James tinha um grande sorriso quando murmurou: — Accio anel. 

A bolsa do garoto estava aberta e de lá vinha levitando uma caixinha preta. Dominique ficou pasma quando o garoto abriu-a e mostrou o anel. Ouro branco, uma pedra lápis-lazúli no centro. A loira não teve reação. Ele não podia estar sugerindo um namoro, certo? Certo?

— Olha, eu fui um babaca nas festas de fim de ano. Eu sou explosivo e isso não é desculpa. Eu quero mudar, loirinha. Não quero ser esse cara ciumento que briga com teus amigos e fode com a própria família. Eu quero ser melhor, por mim e por você. A gente pode ficar do jeito que você quiser e essa posição tá ótima — meio emocionada, a garota ainda riu. — Mas pode ser mais. Esse anel significa que eu gosto de você e quero tentar. Exclusividade, mas sem rótulos. No nosso tempo. Que tal?

Dominique o beijou tão forte que os dois caíram para trás. Era a melhor resposta que ele poderia esperar. 

Mas Hogwarts chegou ao fim e a vida adulta não dava tanto intervalo para encontros furtivos. O anel que Domi levava num cordão parecia pesar, um lembrete que talvez estivesse na hora de usá-lo em sua mão. Ela queria, ele não sabia. Ela insistia e ele dizia pensar. Ela estava quase desistindo, mas ele resolveu tentar. 

Uma dica: quando um dos lados não está pronto para um compromisso, o resultado é um coração partido. 

Ah, como a vida era engraçada. 

*

Daniel convenceu Dominique a ir com ele encontrar uns amigos no carnaval em Veneza. Se fosse no início da viagem, ela provavelmente recusaria. Mas, ao decidir aproveitar aquela oportunidade de autoconhecimento, Domi se viu anestesiada — todos os seus problemas ainda estavam no mesmo lugar, mas ela não os deixava virem à tona e estragarem o que estava vivendo. 

Uma droga que Dan tivesse uma ideia engraçada de encontro entre amigos. Ele aparentemente tinha um date, e seus outros amigos se dividiam em dois casais. Dominique iria chutar sua bunda se o único cara sozinho fosse sua ideia de encontro às cegas. 

— Esse é o Lorenzo, o cara que eu comentei. Aqueles dois que não se largam — ele levantou um pouco a voz para alfinetar os amigos. — são Bianca e Enrico. Geovanni e Alessandro — Dan apontou para o casal extremamente simpático. — e o mascote deles, Matteo. 

— Já fui apresentado de formas mais lisonjeiras, Dan — Matteo aproximou-se de Domi e beijou seu rosto. — Prazer, ragazza.

Un ragazzo italiano senza nome femminile, che miracolo — todos riram do comentário dela. 

— Noites e noites com a senhorita e não sabia que você falava italiano!

— Falo pouco, Dan, por isso deixava com você a responsabilidade de se comunicar. 

Domi não sabia o que esperar quando cruzassem a ponte que era a entrada para a cidade. Sabia que o carnaval em Veneza era, sobretudo, um evento de cores e fantasias históricas. Mas não imaginou que a primeira coisa que veria era um verdadeiro engarrafamento. Um pouco estressante, mas divertido. O grupo era muito engraçado; não eram aqueles casais que ignoram as pessoas ao redor, mas que gostavam de incluí-la. Domi agradecia silenciosamente, porque se sentia desconfortável com o olhar constante de Matteo. Ela não queria ficar com ninguém e pronto. 

(E ele lembrava muito o jeito peralta de James). 

Eles compraram máscaras e outros acessórios quando chegaram na cidade. A arquitetura de Veneza era um mergulho no tempo e a cada canto que olhava tinham pessoas usando roupas de época. Toda aquela produção era de cair o queixo. Domi nem sentiu o tanto que eles estavam andando — a atmosfera era contagiante. 

Quando eles foram assistir ao desfile na praça São Marcos, Matteo voltou a irritá-la. Ela virou a cabeça em sua direção quando senti-o segurando seu quadril. 

— Calma, regazza, mas sua varinha estava aparecendo. — a loira arregalou os olhos. — Inglesa… Hogwarts?

— A melhor, claro. 

— Deixa eu adivinhar… foi uma corvina?

— Não, grifinória. A Casa da coragem. 

— Ah — comentou ele, um sorriso malicioso crescendo. — Eu ouvi falar que as corvinas eram as mais belas de todas…

Domi gargalhou tanto que tremeu os ombros. Com o barulho ao redor, a conversa deles mal era ouvida. 

— Essas cantadas realmente funcionam?

— Nunca — percebendo o olhar confuso da loira, o italiano continuou. — Mas serve para quebrar o gelo. Olha, nós somos os únicos você sabe do grupo. Estou tentando chamar sua atenção desde lá da ponte para te levar em um canto (sem segundas intenções!), um espaço para… enfim. 

Bruxo, sim. — Ah, vamos lá. 

Matteo e Dominique avisaram ao resto do grupo que iriam andar por aí e se encontrariam em um bar conhecido por eles. O rapaz saiu arrastando a loira, que ria da sua pressa. Eles desceram por algumas ruas paralelas; Matteo andava tão rápido e entrava por cada atalho que, se ele a largasse ali, ela não saberia como voltar. Por fim, eles pararam de frente para um arco que dava para um pequeno espaço ao céu aberto. Matteo ergueu a própria varinha e murmurou um revelio. Aquele pequeno espaço transformou-se em uma praça cheia. Antes que eles pudessem entrar, Matteo apontou a varinha para um tijolo meio irregular e disse:

— Fiore, Matteo. 

Ao se identificar, o véu que ela nem reparou estar no arco caiu e seu queixo também. Veneza estava em uma atmosfera histórica, mas ali… era mítico. A música bucólica, as pessoas dançando um ritmo desconhecido, figuras de deuses? ou algo assim emolduravam as laterais. E ela tinha certeza que haviam fantasmas misturados às pessoas fantasiadas. Dominique sorria, contagiada por aquele ambiente que transpirava magia. Matteo pigarreou para chamar sua atenção e fez uma falsa voz séria ao dizer:

Benvenuto, Dominique, ao Stregheria. 

Ele murmurou algumas explicações sobre essa festa de carnaval bruxo que fazia homenagem à Antiga Religião e seus cultos. A jovem estava distraída e atenta, perguntando a todo momento sobre pequenos detalhes na decoração ou sobre as histórias por trás das fantasias. Dançaram, riram, interagiam com outras pessoas. As máscaras que eles usavam deram lugar a véus diáfanos, fitas e objetos mágicos. Para provocá-lo, Domi ficou nas pontas dos pés e depositou uma coroa de flores na cabeça de Matteo. 

Bell'uomo, come un fiore — brincou a loira. Matteo apenas riu, pois estava acostumado aos trocadilhos com seu nome. 

— Belo homem, hein?

Ela revirou os olhos, puxando-o para longe daqueles círculos de pessoas dançando e foi procurar uma bebida. A loira exclamou como aquela bebida parecia cerveja amanteigada e Matteo revirou os olhos, murmurando algo como “esses ingleses não sabem nem o que é vermute”. Mas o moreno acabou sorrindo ao observar a loira apoiando-se no corrimão e fechando os olhos quando jogou a cabeça para trás. Era lindo o movimento que seus cabelos ondulados faziam. Matteo piscou, tentando apagar esses pensamentos. Dominique definitivamente não parecia afim de algo, qualquer coisa, com ele ou ninguém. 

Essa linha de pensamento o deixou tão curioso que acabou por perguntar:

— Qual a sua história?

A loira negou com a cabeça, ainda de olhos fechados e movendo-se com a música. — Você primeiro. 

— Terceiro filho de cinco. Aluno excelente em Beauxbatons, mas chutei um pouco o balde após as provas do sexto ano. Minha mãe é francesa, fez questão que eu estudasse lá. Depois que ela faleceu… eu só terminei a escola e voltei para a Itália, para ficar perto do meu pai. 

— Sinto muito. 

— Obrigado. Enfim, estou com quase 19 anos e pensando ainda no que vou fazer da minha vida. Algo parecido?

— Algo assim — admitiu. — Tenho 18 anos e chutei meu balde agora. Eu estava juntando dinheiro do meu estágio, na loja dos meus tios, para investir na minha própria marca de roupas. Mas peguei o dinheiro para viajar. 

— Tão repentinamente?

— Que história estaria completa sem um ele? — Matteo fez uma careta, entendendo o que ela queria dizer. — O meu ele era um relacionamento difícil. Eu era muito, ele era pouco. Péssima combinação. A gente estava brigando tanto que eu nem sabia se estávamos juntos. Eu vi ele com outra na loja dos nossos tios, onde estávamos estagiando e… só não deu mais. Eu precisava sair de perto do que me lembrava ele. Desculpa por mais cedo — acrescentou Domi, sorrindo sem jeito. — Você parece muito com ele, sabe. 

Matteo fez uma cara de ofendido. — Poxa. Enfim, Dominique: bem vinda à crise existencial do que fazer com nossas vidas. 

 A loira riu, erguendo a sua bebida para brindar com ele. Eles ainda ficaram um tempo por ali, mas o relógio corria e mais cedo do que queriam, eles precisavam voltar. Matteo os guiou novamente, pois Domi estava completamente perdida, principalmente de noite. Matteo não fez nenhum tipo de investida e ela agradeceu. Hoje tinha sido um dia para ela, para se entender — era bom que terminasse assim. 

Não era a loucura de ter largado tudo e viajado. Não eram suas noites boêmias ou os amigos que fez no decorrer do caminho. Era simplesmente ela, surgindo dos escombros de suas desilusões. Era uma nascente fagulha de felicidade, tão pura e genuína — e ela faria de tudo para manter. 

*

James deu às costas. Todo o trabalho de descobrir onde ela estava, mapeando seus passos. Ele fora estupidamente tolo e egocêntrico ao achar que ela precisava dele. Nah, ela estava mais feliz. 

Que inferno. E ele nem tinha o direito de atrapalhar a cena que viu: Dominique sendo abraçada por um cara que a fazia rir, enquanto entravam em um bar. Um riso completo, como aqueles nos jardins de Hogwarts, antes de James foder com seu coração. 

Ele teve medo dos seus sentimentos, do futuro, de se sentir preso. E então, aquele erro. Ele realmente pensou em dizer “nós estávamos dando um tempo”? Que ridículo. Não adiantava falar como se sentiu errado ao beijar aquela garota, como ele percebeu naquele instante a burrice que fazia — nada disso importava mais. Ninguém a machucou como ele fez. 

Pateticamente, ele terminou a noite com uma garrafa de cerveja e algumas lágrimas aqui e ali. 

Deveria ter dito que a amava, mas agora era tarde demais. 


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Notas finais do capítulo

Alguém já foi uma Dominique aqui? Ou um James? Se sim, sabem que não é fácil. Tentei passar a bagunça que é um relacionamento quando se está confuso e acaba machucando o outro.
Ah, embora eu realmente saiba umas frases em italiano, eu dei uma olhada básica no google tradutor, façam o mesmo hehe
Atée depois!



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