Jornada nas Estrelas: Iguaçu escrita por Laertes Vinicius


Capítulo 11
Os Sádicos




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Depois de quase vinte dias vagando por uma região do espaço relativamente vazia, a USS Iguaçu detectou um imenso planeta gasoso com anéis rochosos que continham o precioso cristal de dilítio, essencial para o funcionamento adequado dos motores da nave. O suprimento a bordo deveria ser suficiente para os dois anos da missão em Cão Maior, mas a recomendação era reabastecer sempre que houvesse uma oportunidade, já que não era possível prever quais dificuldades encontrariam pelo caminho. Enquanto durasse a extração do minério, parte da tripulação teria tempo para estudar o único planeta classe M daquele sistema estelar, pouco maior do que Mercúrio e aparentemente rico em vida vegetal.

— A superfície parece ser totalmente coberta por grandes florestas, até mesmo nas regiões polares. – Informou Chelaar, analisando as leituras dos sensores na estação de ciências da ponte. – Ainda não é possível identificar o número de biomas, mas é certo que excede vinte.

— Sinais de vida animal ou humanoide? – Perguntou o capitão Vernon, sentado em sua cadeira.

— Quase nada, senhor. – Respondeu Chelaar. – Há sinais fracos que poderiam representar humanoides, mas a quantidade é tão pequena que pode se tratar de um ruído nos sensores.

— Ou talvez visitantes, assim como nós. – Sugeriu Nhefé.

— O conselheiro pode estar correto, procure naves em órbita do planeta – Disse o capitão. – Se houver alguém lá, gostaria de fazer contato antes de mandar um grupo avançado.

— Sim, senhor. – Disse Chelaar.

Hashimoto para ponte.— Ouviu-se a voz do engenheiro-chefe.

— Prossiga, comandante. – Disse o capitão.

Encontramos uma rocha bastante promissora há menos de dez mil quilômetros da Iguaçu. Pelas leituras, parece conter cristais de dilítio melhores do que os nossos.— Explicou Hashimoto. – Estamos prontos para iniciar a extração.

— Entendido, comandante. – Disse o capitão. – Vernon desliga.

— Não é possível visualizar nenhuma nave em órbita, capitão. – Disse Chelaar. – Mas identifiquei vestígios de deslocamento subespacial recente e também algumas transmissões oriundas da superfície. É provável que haja alguma nave orbitando o lado oposto do planeta.

— Subtenente Naggi, frequências de saudação. – Ordenou o capitão.

— Sim, senhor. – Disse ela, iniciando o procedimento padrão de saudação. Após um minuto de silêncio, um sinal sonoro indicou que a mensagem havia sido respondida.

— Captei uma nave contornando o planeta, capitão. – Informou Da’Far.

— Estão nos saudando. – Informou Giulia.

— Na tela. – Ordenou o capitão.

A imagem de um alienígena bonachão apareceu na tela principal, trazendo no rosto um enorme sorriso. Ele era um típico humanoide masculino, cuja única diferença visível em relação aos seres humanos era um absurdamente volumoso par de sobrancelhas castanhas. Este indivíduo em si, além de simpático, era rechonchudo e tinha as bochechas coradas, além de alguns fios grisalhos em seu cabelo e barba. Ele vestia uma espécie de macacão listrado em vários tons de marrom e usava um pequeno quipá bege em seu cocuruto, dando-lhe uma aparência bastante pitoresca, embora não tão curiosa quanto a aparência de sua nave. Esta, agora inteiramente visível, era menor do que a USS Iguaçu, tendo um formado vagamente arredondado e uma configuração incomumente ornamentada e cheia de rococós, onde cada metro do casco continha o que pareciam entalhes muito elaborados. Seu interior, perceptível na imagem do alienígena bonachão, era completamente revestido de uma madeira escura, e até mesmo as estações de trabalho possuíam acabamento em madeira ornamentada.

— Sou o capitão Víbio Vernon, da nave estelar da Federação Iguaçu. – Disse o capitão, retribuindo o sorriso. – Esta é meu imediato, Kan Shion, e este é meu conselheiro, Kómóg Nhefé.

— Saudações, capitão Vernon e demais tripulantes da Iguaçu! – Respondeu o alienígena com uma voz grave e retumbante. – Sou o mestre Fraxinus, da nave Orvalho do Entardecer, ao seu dispor. – Ele parecia realmente empolgado com aquela interação. – O que os traz a Suffodio? Não lembro de ter ouvido nada sobre sua federação antes.

— Isso não é de se admirar, mestre Fraxinus. – Respondeu Vernon, cortês. – Nós viemos de muito longe, mais precisamente da galáxia vizinha, Via Láctea.

O alienígena arregalou os olhos.

— E vieram de tão longe por madeira? – Riu ele. – Não me diga que deram cabo de tudo por lá!

— Na verdade nossa missão, como primeira nave da Federação dos Planetas Unidos a visitar esta galáxia, é a exploração científica e o contato amistoso com outras civilizações, como a sua. – Explicou o capitão Vernon. – E o que nos trouxe a este sistema específico foi a presença de dilítio nos anéis deste gigante gasoso.

— Dilítio? – Repetiu o mestre Fraxinus. – É um recurso muito comum nesta região, mas se tem algum valor para vocês, podem levar o quanto quiserem.

— Agradecemos pela generosidade. – Disse Shion, fazendo um gesto suave com a cabeça. – Suponho que este sistema esteja dentro dos territórios de seu povo. É algum tipo de colônia?

— De certa forma pode-se dizer que é uma colônia, embora ninguém tenha residência física aqui. – Respondeu o mestre olhando para cima, reflexivo. – Mas costumamos vir a Suffodio por outra razão. – E, voltando a sorrir, deu batidinhas no braço de sua cadeira, o qual também era feito de madeira e ricamente entalhado.

— Seria possível enviarmos alguns grupos de pesquisa ao planeta? – Perguntou o capitão Vernon. – Gostaríamos de estudá-lo enquanto extraímos dilítio dos anéis deste gigante gasoso.

— Sem dúvidas, meus amigos! – Respondeu o mestre Fraxinus, satisfeito. – Eles serão meus convidados de honra! Basta me dizer quantos virão e eu lhes mostrarei o que há de melhor em Suffodio!

— Ótimo! Em breve transmitiremos as informações dos grupos de estudos. – Disse o capitão Vernon. – E, se desejarem, os senhores estão convidados a virem a bordo da Iguaçu. Tenho certeza que acharão nosso banco de dados dendrológico bastante interessante.

O mestre acenou alegremente, encerrando a transmissão fazendo um sinal de positivo. Os tripulantes da ponte se entreolharam, surpresos em encontrar alguém tão empolgado e receptivo.

— É um primeiro contato promissor. – Falou o capitão. – O que me diz, conselheiro?

— Admito que adoraria ter alguma ressalva para fazer a respeito daquele homem, mas infelizmente não sinto que ele represente qualquer ameaça para nós. – Disse Nhefé, espantando a todos com essa declaração. – Seu contentamento em nos encontrar pareceu genuíno e sua hospitalidade foi sincera.

— Bom, se meu conselheiro disse, está dito. – Disse o capitão Vernon, sorrindo. – Imediato, forme dois grupos avançados e utilize as naves auxiliares Amito e Mozeta. Comunique nossos novos amigos assim que estiverem prontos para deixar o hangar.

— Sim, senhor. – Disse Shion, levantando-se. – Subtenente Naggi, venha comigo.

As duas deixaram a ponte juntas, animadas com o primeiro contato amistoso, e seguiram diretamente para o hangar. No caminho, Shion selecionou os seis outros tripulantes que fariam parte da missão avançada, levando em conta suas aptidões e especialidades acadêmicas. Não demorou muito para que todos os convocados se fizessem presentes no hangar, onde receberam as instruções necessárias da primeiro oficial.

O grupo liderado por Shion e composto pela linguista betazoide Lworx e pelos tripulantes Olayinka e Puerta, partiria com a nave auxiliar Mozeta em direção à nave alienígena, onde fariam um intercâmbio cultural mais aprofundado com aquela espécie. A bordo da nave auxiliar Amito, cujo destino era a superfície do planeta, Giulia lideraria o grupo formado pelo botânico Awl, pela bióloga Yeong-Hui e pelo segurança Abaroa.

Shion para Amito.— Ouviu-se a voz da primeiro oficial, assim que se aproximaram do planeta o suficiente para vê-lo em detalhes pelas escotilhas da nave auxiliar. – Vamos entrar no hangar da nave dendroniana dentro de dois minutos.

— Entendido, comandante. – Respondeu Giulia Naggi. – Nós desceremos ao planeta imediatamente, já recebemos as coordenadas do local da... Serraria.

Bom trabalho, subtenente.— Disse a andoriana. – Shion desliga.

A vista da órbita do planeta Suffodio era estonteante, e os tripulantes a admiraram demoradamente antes de iniciarem a entrada na atmosfera. Abaixo da singela camada de nuvens brancas, destacava-se uma imensa superfície verde escura, evidenciando as densas florestas que cobriam quatro quintos da superfície total do planeta. Além do verde, alguns pontos azuis brilhantes apontavam a existência de lagos de vários tamanhos e formatos, complementando a beleza singular de Suffodio.

— É raro que planetas classe M deste tipo não tenham uma superfície majoritariamente oceânica. – Comentou a bióloga Yeong-Hui, olhando pela escotilha de bombordo. – E este aqui sequer possui um oceano.

— É impressionante. – Disse Awl. – Nunca ouvi falar de um planeta florestal dessa magnitude.

— Delmora Regulus VII é considerado como sendo a maior floresta da Federação, e mesmo assim se limita a uma floresta continental situada no meio de um oceano gigantesco. – Comentou Abaroa, no leme. O alferes seguia carreira como segurança, mas também possuía interesse acadêmico na área de exobotânica, e ocasionalmente auxiliava Awl em suas pesquisas.

— Estou curioso para saber qual é a relação entre os dendronianos e este planeta. – Disse Awl. – Quando nos informaram que seríamos recepcionados em uma serraria, confesso que senti um certo desconforto.

— Descobriremos em breve. – Disse Giulia, observando pela escotilha. – Mas, com tantas florestas, imagino que o ar daqui seja realmente fresco e limpo.

A nave auxiliar pousou em um local do hemisfério norte, onde a floresta era formada essencialmente por variedades de coníferas e bordos, alguns deles com mais de cem metros de altura e troncos com diâmetros descomunais. A serraria mantida pelos dendronianos, e fabricada inteiramente em madeira de lei, consistia de uma série de edificações dispostas em um semicírculo perfeitamente organizado. Havia muita atividade no local e, a despeito da presença alguns equipamentos altamente tecnológicos, os lenhadores e madeireiros pareciam trabalhar com ferramentas rudimentares como machados e serras.

— Boa tarde! Sejam bem-vindos à Serraria do Norte! – Disse alegremente um dendroniano, assim que o grupo avançado saiu da Amito. Seu rosto estava muito corado e suas volumosas sobrancelhas, assim como seu cavanhaque pontiagudo, vibravam em uma brilhante tonalidade acaju. Ele utilizava um quipá verde bastante desgastado e vestia um macacão marrom escuro com algumas listras horizontais beges. – Meu nome é Ulmus, sou o capataz responsável pela fiscalização da extração de madeira em todo o meio Norte e parte do Noroeste também. O mestre Fraxinus pediu que eu os recebesse e os levasse para conhecer nossas instalações e as florestas locais.

— Obrigado! – Disse Giulia, cumprimentando-o. – Eu me chamo Giulia Naggi, oficial de comunicações da nave estelar da Federação Iguaçu. Estes são meus colegas Awl e Yeong-Hui, especialistas em botânica e biologia, e o alferes Abaroa, da segurança. Estamos honrados em visitar seu planeta e conhecer um pouco mais de sua cultura.

— Esplêndido! – Exclamou Ulmus sorrindo e acenando para que o seguissem. – Se querem uma visita tranquila, vocês vieram na época certa, pois a temporada oficial de extração ainda não começou. Somos a primeira expedição, responsável por organizar tudo e averiguar as condições das florestas.

— Temporada de extração? – Perguntou Awl.

O dendroniano riu alegremente.

— É claro que vocês não sabem! – Disse ele, corando ainda mais. – Pelo que o mestre me disse, vocês vieram de muito longe!

— Está correto, viemos da Via Láctea. – Assentiu Giulia. – É a galáxia que faz interseção com esta galáxia anã.

— Não entendo muito de cartografia estelar. – Admitiu Ulmus. – Mas posso lhes contar boas histórias sobre meu povo e sobre nossa paixão por madeira.

— Adoraríamos ouvi-las. – Falou Giulia, educadamente.

— Por muito tempo, nosso planeta natal foi riquíssimo em vida vegetal, especialmente árvores de grande porte e madeira excepcionalmente valiosa. – Explicou Ulmus, abrindo as portas de uma das instalações da serraria e convidando-os a entrar. – Nossa civilização floresceu em uma relação íntima com indústria madeireira, e nossa cultura está intimamente ligada a ela. Houve um tempo lamentável em que o crescimento populacional e a falta de consciência levaram ao desmatamento desenfreado e à exaustão de nossos próprios recursos florestais, o que custou a vida de milhões de pessoas, vítimas de fome e guerras sangrentas. – Enquanto falava, ele mostrava a atividade dentro da instalação de beneficiamento de madeira, onde gigantescos troncos eram convertidos em tábuas. – Felizmente, quando parecia não haver mais esperança, a primeira sonda que mandamos além do nosso sistema solar descobriu este planeta florestal e a esperança uniu nosso povo novamente.

O cheiro de madeira era muito agradável, mas o barulho das serras exigia que Ulmus falasse cada vez mais alto, deixando-o ainda mais corado. Todos os tripulantes prestavam atenção no que ele dizia, mas Awl e Yeong-Hui também aproveitavam para examinar as adjacências com os tricorders.

— Desde que a paz voltou a reinar em meu planeta, foram elaboradas leis muito rígidas sobre o corte e extração de madeira. – Continuou o capataz Ulmus. – Mas três gerações depois, nossa primeira nave tripulada chegaria a este planeta florestal e iniciaria uma nova era em nossa civilização. Agora, duas vezes ao ano, centenas de milhares de pessoas vêm aqui para ter um contato verdadeiro com a floresta, seja trabalhando nas serrarias ou derrubando árvores com o machado ou as serras manuais.

— Vocês realmente são apaixonados por madeira, não? – Perguntou Giulia.

— Está em nosso sangue! – Bradou o capataz. – Faz parte da essência de um dendroniano amar a madeira e o que pode ser feito com ela. – Ele abriu a porta dos fundos da instalação, para que o grupo pudesse sair. – Nós mantemos um controle do número de visitantes e de árvores derrubadas, bem como seguimos um complexo sistema de revezamento regional, o que nos permite sempre ter uma experiência autêntica e madeira de qualidade sem deixar de lado a preservação e renovação das florestas.

— Em nossa galáxia, algumas culturas têm um comportamento semelhante em relação à caça. – Disse Giulia, observando a densa floresta que ficava além das construções. – Mas confesso que nunca ouvi falar de nenhum povo que tivesse uma relação tão profunda com a madeira e com sua extração.

— Lembro-me da primeira vez que vim a Suffodio com minha mãe. – Contou Ulmus, pausadamente e com um brilho no olhar. – Eu tinha oito anos e acabara de receber minha primeira serra senoidal. Foram seis dias, apenas nós dois e um pinheiro-pedregoso de vinte metros. No fim, tínhamos grandes tábuas de qualidade, cuidadosamente plainadas, e vários metros cúbicos de lenha.

— Não me admira que a nave de Fraxinus fosse tão ricamente adornada e revestida com madeira. – Comentou Yeong-Hui. – Devem existir artesões muito talentosos entre seu povo.

— Tenha certeza disso! Inclusive os membros da minha família sempre foram reconhecidos por entalharem majestosas decorações internas de naves luxuosas e importantes. – Explicou o capataz Ulmus, cheio de orgulho. – Minha irmã mais nova foi responsável por redecorar a nave do presidente da lua de Dendronia II, há alguns anos.

— Impressionante. – Disse Giulia, simpática. – Gostaria de conhecê-la. Ela também está aqui em Suffodio?

A expressão de alegria desapareceu do rosto de Ulmus e seus olhos se encheram de lágrimas.

— Ela está morta. – Respondeu Ulmus, com o pesar endurecendo suas coradas feições. – Foi capturada por sádicos há quase seis meses.

— Sinto muito. – Disse Giulia, com voz amena, diante da visível tristeza sentida por Ulmus.

— Eu também. – Disse o capataz, engolindo o choro. – Ela não merecia ter esse fim, era uma pessoa tão boa e habilidosa. Não gosto nem de pensar no que eles podem ter feito a ela antes... Antes do fim.

— E quem são “eles”, senhor capataz? – Perguntou Awl, recebendo um olhar de censura de Giulia, pela indelicadeza.

— Os sádicos! – Respondeu Ulmus. – É claro que vocês não os conhecem, vindos de tão longe. Sorte a sua que tenham passado por lugares distantes de onde eles costumam ser avistados. – Ele respirou fundo e franziu o cenho, procurando manter a voz firme. – Não sabemos muito sobre eles, ninguém sabe. Tudo o que fazem é vagar pelo espaço capturando pessoas para torturá-las e fazer todo tipo de atrocidades com elas. A crueldade corre em suas veias e seu coração bate no ritmo de um tormento perverso e enlouquecedor. Eles se regozijam com o sofrimento físico e psicológico, ansiando em ver o horror nos olhos de suas vítimas. Não conhecemos o nome que dão à sua própria espécie, mas os chamamos de sádicos, pois qualquer um que tenha o infortúnio de cruzar seu caminho recebe um destino mais aterrador do que a morte, e os poucos que conseguem escapar costumam perder a sanidade.

— Isso é horrível! – Admirou-se Yeong-Hui. – Eles estão em guerra contra seu povo?

— Não. Mas se tivessem, ao menos teríamos como combatê-los. – Disse Ulmus, balançando a cabeça. – Eles não têm estrutura política, governo ou organização militar, e seu propósito é apenas saciar seu prazer doentio. – O capataz colocou um pé sobre um cepo e estreitou o olhar, sentindo uma visível repulsa. – Cada nave-masmorra tem sua própria autoridade e não segue nenhuma regra além da violência e da selvageria. É impossível declarar guerra a eles, pois não se sabe onde vivem ou quantos deles existem.

— Entendo. – Disse Giulia. – É aterrador pensar que uma espécie assim exista.

— Infelizmente, existe. – Continuou o capataz. – Dizem que no passado eles habitavam um planeta distante, onde cometiam suas monstruosidades uns com os outros, mas que aos poucos abandonaram esse mundo para saciar sua perversidade ao causar dor e sofrimento a outros seres sencientes. – Ele fez uma pequena pausa. – Meu pai costumava dizer que eles são como tempestades e outras forças da natureza. Para mim, eles não passam animais, predadores cruéis que atingiram o máximo grau da maldade.

— Essa conversa está me deixando angustiada. – Disse Yeong-Hui, apreensiva. – Vim aqui para estudar a vida deste planeta e não para ouvir histórias de terror.

— Também desejo encerrar esta conversa. – Disse o capataz Ulmus. – Eu apenas expliquei tudo isso para que vocês pudessem aprender mais sobre a ameaça que eles representam, mas falar sobre os sádicos é considerado um mau agouro entre meu povo. Crescemos ouvindo histórias de que eles são capazes de escutar quando se fala sobre eles, e que isso os atrai.

— Se for assim, pretendo não falar neles durante todo o restante de nossa viagem. – Disse Giulia, encerrando o assunto.

O sol brilhava forte naquela região do planeta, assinalando o meio do verão, e um dia durava o equivalente a 31 horas terrestres, o que deu muito tempo para que o grupo conhecesse a floresta e as outras instalações da serraria. Não restaram dúvidas sobre a existência uma relação muito profunda entre os dendronianos e a atividade madeireira, evidenciada em cada explicação dada pelo capataz Ulmus e na dedicação de todos que ali trabalhavam. Diante da aproximação da temporada, a função da equipe do capataz era delimitar as áreas de extração e as rotas de retirada de madeira, além de verificar e testar todo o maquinário disponível.

Teria sido um primeiro contato primoroso e muito produtivo, mas, ao entardecer, um alarmante comunicado estarreceu todos na Serraria do Norte. No momento em que os tripulantes da USS Iguaçu e os dendronianos se reuniram para compartilhar uma refeição e uma bebida tradicional de seu povo, ouviu-se a voz exaltada de um dendroniano pelo equipamento de comunicação de Ulmus:

Capataz!— Gritou a voz, que pertencia a um dos oficiais da ponte na nave de Fraxinus. – Uma nave-masmorra acabou de irromper em nossa frente e, antes que pudéssemos fazer algo, tivemos nossos principais sistemas desabilitados. Eles não abordaram nossa nave, então acredito que devam estar em busca de vítimas na superfície, preparem-se para...— E a comunicação parou imediatamente, para o horror de todos.

Sentados numa grande clareira perto do refeitório, em pequenos bancos feitos de toras, os dendronianos ficaram petrificados de medo e, por alguns instantes, a única coisa que os diferenciava de estátuas era a cor se esvaindo de seus rostos. A bióloga Yeong-Hui, que acabara de pegar uma grande caneca cheia de líquido amendoado, parecia tão abalada quanto eles, arregalando os olhos e assumindo uma expressão de pânico. Giulia, entretanto, rapidamente pegou seu fêiser e olhou para Abaroa e Awl, que fizeram o mesmo. Ao ver a reação dos tripulantes da USS Iguaçu, o capataz Ulmus acordou de seu estado de paralisia:

— Todos de pé! – Bradou ele, empunhando um grande machado que jazia ao lado de um dos troncos. – Vamos buscar abrigo no refeitório, de lá poderemos acionar alguns sistemas de defesa e pegar nossas armas!

— Nós daremos cobertura! – Disse Abaroa em voz alta, assumindo uma postura defensiva, empunhando seu fêiser e se mantendo alerta.

Não houve tempo para que o grupo percorresse os pouco mais de cento e cinquenta metros até o refeitório pois, vindo de um lugar desconhecido, um disco avermelhado pairou sobre eles e no momento seguinte tudo ficou escuro como o breu. O coração de Giulia acelerou enquanto ela ouvia os gritos dos dendronianos e os sons de golpes secos, mas o que mais a inquietou foram os disparos de fêiser. Ela sabia que, naquela completa escuridão, era mais provável que o disparo atingisse um dos colegas ao invés dos atacantes.

— Yeong-Hui! – Gritou ela, tanto para dar à bióloga o conforto de uma voz conhecida, quanto para desencorajá-la de usar o fêiser naquela situação, pois pensou que ela era possivelmente a pessoa que estava atirando. – Você está bem?

No instante seguinte, antes que pudesse haver uma resposta, Giulia perdeu a consciência.

Shion estava na engenharia, ouvindo uma longa explicação sobre os curiosos motores da nave do mestre Fraxinus, capazes de atingir dobra 7.6, quando um alarme estridente soou. Imediatamente, os tripulantes dendronianos arregalaram os olhos e voltaram-se para seu comandante, que parecia igualmente assustado. No instante seguinte, a nave estremeceu repetidas vezes, e houve falhas de energia visíveis em todos os painéis da engenharia, sinalizando que estavam sob ataque.

— O que houve? – Perguntou Shion, impávida.

— Sádicos! – Disse mestre Fraxinus, engolindo em seco. – Estão nos atacando!

Shion desaprovou a indolência do mestre em dar ordens para proteção de sua tripulação, e imediatamente deu ordens para que os outros tripulantes da USS Iguaçu, que estavam espalhados pela nave dendroniana, retornasse à nave auxiliar.

— Quem são esses tais sádicos? – Insistiu Shion, seguindo Fraxinus enquanto ele dava ordens pelo comunicador móvel que carregava em seu cinto.

— A espécie mais abominável que eu conheço. – Respondeu o mestre, tentando acionar um dos elevadores revestidos de madeira entalhada que levava a ponte de comando. – Não acredito que eles estavam aqui! Nunca houve registros de uma nave-masmorra neste sistema.

— Sendo assim, precisamos repeli-los! – Disse Shion, exasperada. – Permita que eu use o sistema de comunicação de sua nave para convocar a Iguaçu. Ela chegará aqui em questão de minutos e será de grande ajuda no combate.

— Claro, fique à vontade. – Disse o mestre, finalmente acionando o elevador. – Mas quem corre perigo são as pessoas na superfície e não nós.

— Como assim? – Perguntou Shion, impedindo o fechamento da porta do elevador.

— Preciso chegar a ponte! – Esbravejou mestre Fraxinus.

— Meu pessoal está na superfície. Se eles correm perigo, quero saber o porquê! – Disse Shion, olhando firmemente nos olhos do mestre.

— Está bem, eu explico, mas venha comigo. – Disse Fraxinus, abrandando a voz.

— De acordo. – Disse Shion, e entrou no elevador.

— Os sádicos são uma espécie repugnante que vaga pela galáxia em busca de vítimas para suas práticas de tortura física e psicológica. – Explicou o mestre, enquanto se deslocavam lentamente pelo elevador, ainda carente de energia. – E raro encontra-los, mas geralmente o resultado é terrível. Eles não são organizados politicamente e nem possuem um planeta natal conhecido, e parecem se guiar apenas pelos seus desejos hediondos, emboscando naves e pequenas colônias desprotegidas.

— Então eles desabilitaram esta nave para que não pudéssemos auxiliar as pessoas na superfície? – Perguntou Shion.

— Exatamente. – Respondeu Fraxinus, deixando o elevador e seguindo pelo corredor que levava a ponte. – Uma nave-masmorra comum não tem poder de fogo para enfrentar ou abordar esta nave, mas se nos desabilitarem por alguns minutos, terão tempo para sequestrar nosso pessoal da superfície e fugir.

— Como é possível que não os tenham detectado a tempo? – Perguntou Shion, caminhando ao lado do mestre.

— A única explicação é que eles tenham chegado aqui antes de nós. – Respondeu mestre Fraxinus, pensativo.

— Então eles devem possuir uma tecnologia de camuflagem impressionante, além de uma paciência considerável. – Disse Shion, entrando na ponte e vendo a tripulação agindo desordenadamente.

— Desconhecemos seus métodos. – Explicou Fraxinus, assumindo seu posto ao centro. – Embora ocasionalmente nós os enfrentemos, nunca fomos capazes de tomar uma nave-masmorra para estuda-la. Tudo o que sabemos vêm dos relatos dos poucos sobreviventes resgatados que não enlouqueceram.

— Encaminhamos um alerta a todos na superfície. – Informou um dos tripulantes, de aparência abatida. – Mas nossas comunicações foram cortadas e não sabemos o que houve depois disso.

— Contataram a Iguaçu? – Perguntou Shion.

— Eu... não. – Respondeu o tripulante, revelando que a ideia nem passara por sua cabeça.

— Entendo. – Disse Shion, impaciente com a inaptidão do mestre e de sua tripulação. – Shion para Olayinka. Informe, alferes.

Não consegui contatar a Iguaçu, comandante, há muita interferência devido às flutuações dos escudos.— Ouviu-se a voz da alferes Olayinka, do hangar, utilizando os sistemas da nave auxiliar.

— Mestre Fraxinus, se o senhor abaixar os escudos apenas por um instante, poderei mandar uma mensagem emergencial para o capitão Vernon. – Pediu Shion, virando-se para o mestre.

O mestre Fraxinus hesitou por um momento, mas fez um gesto com a cabeça para que um de seus subordinados abaixasse os escudos.

— Agora, alferes! – Ordenou Shion.

Após um instante de silêncio total, ouviu-se a voz de Olayinka:

A Iguaçu está a caminho, comandante.— Informou ela. – Eles detectaram a nave desconhecida e tentaram entrar em contato conosco, mas como não respondemos, o capitão Vernon decidiu vir até nós. Chegarão em instantes.

— Excelente! – Disse a andoriana, sorrindo. – Shion desliga.

— Sensores operantes. – Informou um dos tripulantes. – Não há sinais da nave-masmorra e nem do grupo de preparação da Serraria do Norte.

— É onde seu pessoal estava. – Comentou Fraxinus, pesaroso.

— Espero que não me entenda mal, mestre Fraxinus. – Disse Shion, levantando-se. – Mas pretendo retornar à minha nave assim que ela chegar.

— É claro, comandante. – Disse Fraxinus, compreensivo. – Eu os seguiria se pudesse, mas levaremos horas até termos propulsão de dobra novamente.

— Não se preocupe. – Disse a andoriana, dando as costas e deixando a ponte. – Trarei seu pessoal de volta também.

O mestre Fraxinus apenas abriu a boca, como se fosse dizer algo desencorajador, mas não foi capaz.

Quando a visão de Giulia finalmente desembaçou, ela se viu em uma espécie de cela, na qual o chão era demasiadamente inclinado para um lado, tornando quase impossível ficar de pé. Ao seu lado, também acorrentada pelos tornozelos, estava a bióloga Yeong-Hui, escondendo o rosto com as mãos e soluçando desesperadamente. Grotescamente pregado em uma das paredes estava o cadáver ressequido de um alienígena, cuja pele havia sido brutalmente arrancada e cujas mãos e pés estavam amarrados com arame farpado.

— Yeong-Hui. – Chamou Giulia. – Estou aqui.

Embora estivesse horrorizada com a cena, Giulia manteve a voz suave, no intuito de tranquilizar a colega.

— Não quero... morrer... assim. – Soluçava a bióloga.

— Você não vai! – Disse Giulia, com voz firme. – A Iguaçu já deve estar a caminho. Eles vão nos tirar daqui antes que percebamos.

— Onde estão Awl e Abaroa? – Perguntou Yeong-Hui, olhando para Giulia com os olhos vermelhos e inchados.

— Eu não sei, mas se estiverem presos assim como nós, tenho certeza que saberão o que fazer. – Disse Giulia, segurando a mão da bióloga. – Acalme-se e nós vamos sair dessa juntas. Eu prometo!

— E como você pode saber? – Perguntou Yeong-Hui com a voz esganiçada.

— Essa não é a primeira vez que sou prisioneira de uma espécie impiedosa. – Disse Giulia, olhando nos olhos da colega. – Quando eu tinha apenas seis anos, a estação onde eu vivia com meus pais foi atacada pelos breens. Eles foram mortos, assim como todos os outros adultos, e eu fui levada para servir como escrava.

— Eu não sabia. – Disse Yeong-Hui.

— Vivi quase dez anos a bordo de naves breens, servindo seus oficiais e sendo humilhada de maneiras que eu nem posso descrever. – Continuou Giulia. – Eu apanhava diariamente, mesmo que não tivesse feito nada de errado. Eles pareciam se deleitar em ver o sangue escorrendo de minhas costas a cada chicotada.

— Isso é terrível. – Disse Yeong-Hui, chorando. – Como foi que você escapou?

— O capitão Vernon. – Disse Giulia, com um leve sorriso. – No dia do meu aniversário de dezesseis anos, a nave em que eu servia foi interceptada após atacar um entreposto comercial ferengi na fronteira do espaço da Federação. Após detectarem biosinais humanos a bordo, o capitão Vernon, que naquela época era o oficial tático da USS Covilhã, sob o comando do capitão Galghash, liderou pessoalmente uma missão de resgate que quase lhe custou a própria vida. – Giulia fez uma pausa, contendo a emoção. – A imagem dele, com o braço esquerdo quebrado e a cabeça ensanguentada, sorrindo e me dizendo “vai ficar tudo bem, eu vou tirar você daqui”, foi a coisa mais extraordinária que eu havia visto desde minha captura pelos breens.

Yeong-Hui soluçava menos a cada palavra de Giulia, encorajando-a a continuar contando sua história.

— Foi isso que me inspirou a entrar para a Frota Estelar. – Explicou Giulia. – Eu queria ser como ele, queria fazer parte da organização que havia me salvado de uma vida de escravidão e desgraça, para um dia poder ajudar outros como eu. – Ela sorriu novamente. – Em meu íntimo, sempre soube que um dia eu serviria ao lado do homem que me resgatara, e grande foi minha alegria quando isso aconteceu de fato. Desde então, minha confiança nele cresceu ainda mais, e tenho certeza que neste momento ele está fazendo de tudo para nos tirar daqui em segurança.

Giulia soltou a mão da bióloga, que parecia mais calma e até esboçava um sorriso tímido. Porém, num piscar de olhos, as fracas luzes que iluminavam a cela se apagaram e, quando foram religadas, Yeong-Hui havia desaparecido.

O clima na ponte da USS Iguaçu era de grande tensão, fazendo com que os tripulantes naturalmente adotassem uma postura de maior seriedade e concentração.

— Três minutos para interceptação. – Informou Kwa.

— Alguma resposta? – Perguntou o capitão Vernon.

— Não, senhor. – Informou a tripulante que substituíra Giulia no posto de comunicações.

— Senhor, se a descrição dada pelos dendronianos for fidedigna, é bastante improvável que esses “sádicos” estejam abertos ao diálogo. – Disse o conselheiro Nhefé.

— Concordo. – Disse Vernon. – Tenente Rose, carregar bancos fêiseres. Vamos desabilitar seus propulsores e escudos assim que entrarmos em alcance de disparo.

— Sim, senhor. – Disse Rose.

— Imediato, reúna uma equipe de abordagem e aguarde na sala de transportes 1. – Disse o capitão.

— Sim, senhor. – Disse Shion, levantando-se. Ela fez um gesto para Da’Far, que a seguiu.

— Esta é a nave mais sinistra que eu já vi. – Comentou Kwa, olhando para a imagem projetada na tela principal.

A nave-masmorra era bizarra. Tinha metade do tamanho da USS Iguaçu e era toda feita de um material profundamente negro, sem nenhuma luz visível a não ser as emitidas pelas afiadas naceles de dobra. Sua constituição, no entanto, era muito menos uniforme, como se fosse feita por meio do remendo de vários pedaços de outras naves, o que a impedia de ter um formato definido. Inúmeras correntes negras pendiam da obtusa parte inferior da proa, cada qual contendo uma espécie de capsula oval em sua extremidade.

— Entramos em sincronia com o campo de dobra da nave alienígena. – Informou Rose. – Disparando fêiseres.

Como a USS Iguaçu estava alinhada atrás da nave-masmorra dos sádicos, os fêiseres acertaram em cheio, obrigando-os a sair de dobra para que pudessem adotar manobras evasivas.

— Os escudos deles estão falhando. – Informou Rose. – Não vão aguentar muito mais.

A ponte da USS Iguaçu estremeceu ao receber disparos vindos da nave-masmorra, algumas faíscas saltaram dos painéis da lateral esquerda.

— Escudos a 90%. – Informou a alferes Harman.

— Mantenha fogo constante, padrão de ataque kappa. – Ordenou o capitão.

O confronto durou alguns minutos, durante os quais, a despeito de seu tamanho e poder de fogo inferior, a nave-masmorra se mostrou um adversário tenaz e ousado, infligindo danos inesperados à USS Iguaçu. Por fim, com um torpedo fotônico certeiro, os escudos da nave adversária caíram, permitindo uma sondagem completa e a obtenção da localização aproximada dos prisioneiros, em locais sob proteção de campos de força secundários que impediam a utilização direta do transporte. Imediatamente a informação foi transmitida à equipe de abordagem, sob o comando de Shion.

— Vernon para sala de transportes 1. – Disse o capitão, em voz alta. – Agora!

Durante apenas alguns instantes (que na percepção do capitão Vernon e da tripulação passaram lentamente) todos ficaram apreensivos, aguardando informações do grupo avançado.

Shion para Iguaçu.— Ouviu-se a voz da primeiro oficial. – Destruímos os geradores de campos de força e estamos mantendo posição no corredor principal de acesso às celas.

— Entendido, imediato. – Disse o capitão Vernon. – Chelaar, trave no grupo avançado e nos prisioneiros e traga todos imediatamente.

            – Sim, senhor. – Respondeu Chelaar.

— Alferes Kwa, mantenha a distância relativa estável. – Ordenou o capitão. – Tenente Rose, concentre o fogo nos sistemas de armas.

— Capitão, a nave-masmorra está emitindo pulsos de natureza desconhecida que estão interferindo com nossos transportes. – Informou Chelaar, franzindo o cenho – Eu consegui travar em todos os biosinais mas, nessas condições, é possível que metade deles acabe rematerializado no vácuo do espaço.

— Encontre a origem dos pulsos e transfira a informação para a estação de armas. – Disse o capitão. – Vernon para grupo avançado, qual é a situação?

Nenhuma baixa, mas Cedroor e De León foram atingidos por uma espécie de corrente dentada e estão seriamente feridos.— Informou Shion, em meio ao som de disparos e explosões.

— Recue se achar necessário, imediato. Estamos com dificuldades para travar em vocês. – Disse Vernon.

Sim, senhor.— Disse a andoriana. – Shion desliga.

— Capitão, identifiquei a origem dos pulsos de energia. – Informou Chelaar. – Fica no coração da engenharia, logo abaixo do que parece ser a ponte.

— Não há como desabilitar os emissores utilizando os fêiseres. – Informou Rose. – E um torpedo fotônico naquele ponto destruiria a nave em questão de segundos.

— Se dispararmos um torpedo, seria possível transportá-los entre o instante em que os pulsos bloqueadores cessassem e a explosão completa da nave? – Perguntou o capitão

— Como a engenharia e as celas ficam em extremos opostos da nave-masmorra, teríamos uma janela de ação de 0,3 segundos. – Respondeu Chelaar. – É matematicamente possível, mas eu não conseguiria trazer todos ao mesmo tempo usando os atalhos da minha estação. Precisaríamos que as salas de transportes 1 e 2 executassem a mesma operação simultaneamente. Somente assim há uma chance de suspender todos os padrões no armazenador e transportá-los em segurança.

— Execute. – Disse o capitão Vernon, sem hesitar. – Contate imediatamente o chefe Chamberlain e a tenente Alfredsson e coordene a operação de transporte.

— Sim, senhor. – Disse Chelaar, encaminhando as ordens aos responsáveis pelas duas salas de transportes. – Eles estão a postos e sincronizados com minha estação.

— Tenente Rose, prepare-se para atirar ao meu comando. – Disse o capitão Vernon, olhando a imagem da nave-masmorra projetada na tela principal. – Fogo!

Numa fração de segundo o torpedo fotônico atingiu o alvo, iniciando uma reação em cadeia que, além de interromper a emissão do pulso que confundia os transportes, levaria a nave-masmorra à sua inevitável destruição. De modo perfeitamente sincronizado, Chelaar e os oficiais de transportes travaram nos sinais dos prisioneiros e do grupo avançado, transportando-os para a USS Iguaçu antes que fossem engolidos pela explosão.

— Informe. – Pediu o capitão Vernon, sem tirar os olhos da tela.

A nave-masmorra havia sido completamente destruída, e seus destroços se afastavam em todas as direções, impelidos pela força da explosão.

— Vinte e seis pessoas transportadas, quatorze delas diretamente para a enfermaria. – Informou Chelaar, aliviada. – Conseguimos!

— Excelente. – Disse o capitão Vernon, respirando aliviado. – Mas quero ver a lista completa de nomes antes de comemorar.

            Dos vinte madeireiros dendronianos raptados, dezessete foram resgatados com vida, quatro deles gravemente feridos. Quanto aos tripulantes da USS Iguaçu, foram resgatadas Giulia, Yeong-Hui e Awl, este último seriamente ferido, além todos os membros do grupo avançado liderado por Shion, dois deles à beira da morte. O único nome ausente na lista de transportados foi o do alferes Abdul Abaroa, morto pelos sádicos antes mesmo do início do confronto com a USS Iguaçu.


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