Eu te desafio! escrita por zeyzey


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Breve introdução



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Arthur estava distraído ouvindo suas amigas conversarem. Não que não se importasse com o que estavam falando, mas ele tinha dessas: às vezes, do nada, sua mente simplesmente se abstraía e ele ia para algum lugar bem longe. Uma breve escapada para o quintal de Nárnia e além; ou, em mais detalhes, caso você se interesse, em como o almoço do dia anterior havia sido ruim pra caramba, em como ele desconfiava que pintar seu cabelo negro crespo-cacheado de loiro ficaria horrível mas ele queria mesmo assim, em como a vida era entediante e nada o animava, ou em como ele queria estar transando naquele momento em vez de estar naquela sala de aula entediante.

  A lista poderia ser acrescida de muitas outras coisas, porque era assim que sua cabeça funcionava. Pensamentos a mil, em diversos assuntos e questões diferentes – e ao mesmo tempo, ainda que seu corpo magro continuasse imóvel na cadeira. Era um tipo de hiperativismo mental com o qual havia aprendido a conviver. E, sinceramente, estando no início do terceiro ano do ensino médio, havendo uma pressão imensa sobre ele e sua turma para que fossem bem no vestibular lá pelo fim do ano não tornavam as coisas muito melhores. Abstrair era muito melhor e mais leve.

Bocejou e voltou sua presença para a sala de aula, apenas a tempo de ouvir as duas amigas comentarem de uma festa de início de ano que teria na casa dos garotos do time de vôlei. Pra você, desinformado, que fique registrado que a equipe de vôlei era sempre um assunto discutido pelo pessoal daquela escola. Haviam mil motivos para serem o alvo de tanta fofoca, mas tudo podia ser resumido que todos os atletas eram de estatura mediana-alta, eram extremamente gostosos e usavam shorts daquele tecido que marcava o que há de mais interessante num homem... Ou pelo menos na maioria deles que eram cis, havia um tal de Victor que era um garoto trans, então que fique registrado essa informação e a reafirmação de que ele era tão gostoso quanto os outros.

Enfim, festa, pessoal de vôlei. Saindo de seus pensamentos Arthur percebeu que era o assunto que estava praticamente todo mundo da sala comentando. Diferente do que você pode pensar, no entanto, que essa é uma história cujo personagem principal é estranho e diferentão, que odiava festas porque ele não se encaixava e blá blá blá, e que ficaria “poxa vida, eu não pertenço logo não irei”, já adianto que esse não é o caso de Arthur. Definitivamente não mesmo.

— Os gostosões vão fazer festa? – Arthur perguntou animado, se jogando na conversa como se tivesse participado dela desde o começo.

— Oi pra você também, Arthur, bem vindo de volta! – sua amiga de olhos puxados e cabelos loiros com mechas rosadas o cumprimentou com ironia.

Ramona era uma figura única na vida de Arthur. Eram amigos desde pequenos e eram como irmãos, unidos em tudo. Frequentemente falavam mal um do outro, mas isso era entre eles; de fora, quem ousasse se mexer com qualquer um dos dois, com certeza teria um puta de um problema.

A garota de olhos puxados sempre chamava a atenção por onde passava devido ao conjunto de cabelos loiros-com-rosa, peitos grandes e uma cintura fina. Sua típica pin up girl, mas adolescente, cabeça de vento e dona de um carisma único. Seu uniforme apertado proporcionava um grande trabalho aos professores heteros, que se esforçavam ao máximo para olhá-la nos olhos e não para o decote que ostentava quando ela fazia alguma pergunta em aula.

— Tá, tá, tanto faz, vai ser na casa de quem? Do Pedrão? – disse Arthur, ignorando o deboche.

— Quem dera fosse, porque aí a Ramona conseguia tentar fazer a gente entrar. – comentou Samanta, a branquela do grupo. – Vai ser no Victor. E ele não é muito de chamar os agregados dos agregados. Você sabe a regra: eles só convidam populares, ficantes, namoradas e afins. No máximo só a Ramona vai já que o Pedrão é apaixonado por ela e quer repetir os pegas do ano passado.

— Porra, não fode. Por que você não pega os outros do grupo também, hein? Pra pedir pra eles deixarem a gente ir também. – Arthur perguntou e direcionou seu olhar para sua amiga Ramona.

— Vai tomar no cu, Arthur, sou puta agora, é? – ela perguntou retoricamente, mas já tratou de adiantar. – Não responda ou eu te mato.

Os três riram. O grupo sendo formado por Arthur, Ramona e Samanta. Era a típica composição escolar de duas amigas e o amigo gay. Sendo Arthur o garoto magro e de pele caramelo, cabelos crespos-cacheados e uma beleza estranha à primeira vista, mas bizarramente bonita com o costume; Ramona sendo a oriental loira e que desafiava o estereótipo de que descendentes de japoneses eram geniais; e Samanta, a branquela de cabelos curtos, estilo homenzinho, e que se dizia bruxa – ou neta daquelas que vocês não queimaram [algo assim].  

— Alguém sabe se o garoto novo vai? O garoto Almirante. – Arthur perguntou.

— Provável. Desde que ele entrou na escola o pessoal do vôlei colou nele. – Samanta respondeu.

— E sem falar que praticamente obrigaram o garoto a entrar pro grupo de vôlei como se ele não tivesse nem opção. Coitado – comentou Ramona.

— Tá perguntando porque já colocou o alvo nele, Arthur? Quem diria, uau, nada previsível. – debochou Ramona mais uma vez do amigo.

— Ué, que que tem? Alto, bonitão, mal encarado e do time de vôlei? Check, check, check e check. – Arthur fez sinais de estar assinando uma lista imaginária em sua frente.

— No dia que algum cara não der check na sua lista você me avisa, porque, até onde sei, basta ser homem que já tudo preenchido. – Samanta provocou.

— Há-há-há.

Você talvez esteja pintando uma imagem do tal Almirante como se fosse algo maravilhoso, né? Como dito por Arthur, alguém alto, bem bonito, com uma aparência rústica? Mas o pior que era isso mesmo. Bruno, que era seu primeiro nome, era o garoto transferido e que vinha de uma família de militares – daí o sobrenome clichê – e que havia se tornado a nova sensação da sala. Clássico garoto gostosão que tem um bom porte e todas as garotas heteros e os garotos gays querem dar a famosa sentada.

— Boatos que o Bruno é seu clássico homem hetero machão. Daqueles caras que não recusam um desafio porque tem medo de parecer menos homem. Bem besta. Boatos, também, que ele virou uma garrafa de vodka porque foi desafiado. Ou pelo menos foi isso que o Pedrão me contou – fofocou Ramona.

— Eita, foi por isso que ele faltou àqueles dois dias de aula iniciais? Ressaca porque topou um desafio idiota? – Arthur perguntou, incrédulo. – Eu adorei!

Falando no diabo, naquele exato momento Bruno Almirante passou pela porta. Alto, presença forte – e atraente – com sua mochila carregada só de um dos lados. Topete majestoso, um perfume caro exalando, calças do uniforme na medida certa marcando as coxas. Uma visão do paraíso, mas uma visão do paraíso acompanhada das outras visões do paraíso vulgo os outros da equipe de vôlei. Pareciam até uma gangue de mafiosos bonitos e charmosos. Bruno Almirante, Pedro Souza, José Augusto Meyer, Victor Assunção e outros de menor importância. Entraram rindo de alguma piada, provavelmente alguma coisa sem graça que só homens heteros acham engraçado. Aliás, talvez nem todos, já que Bruno estava com a cara séria. Não que estivesse irritado com a companhia, mas claramente não era de rir de uma piada só porque a maioria estava rindo.

— Ué, cadê o Ramon? Será que os boatos são verdadeiros? – Samanta perguntou encarando o grupo do fundo da sala com seus amigos.

— Que boatos? Aquele que ele pegou a mãe do José? Será?! – Arthur questionou, atentíssimo à fofoca.

— Ai, gente, por favor, né, quem pega mãe dos outros assim. – Ramona indagou, desmerecendo qualquer legitimidade daquela informação.

— Ué, aparentemente o Ramon. Disseram que foi na festa na casa do José, mas ninguém conseguiu confirmar isso. Sei que deu treta – Arthur deu de ombros, voltando a apoiar seu cotovelo na carteira e observando Bruno pelo canto de olho. – Que bosta, odeio quando a gente fica de fora das coisas assim. Por que a gente não pode simplesmente ser convidados pra festa? Maioria vai.

— Talvez seríamos se você não tivesse tido a treta com o cara expulso do ano passado, né – Ramona retrucou de prontidão, como se estivesse esperando há algum tempo para soltar aquilo.

— Ah, qual é, não é minha culpa se descobriram que a gente era amigo quando criança e víamos o pinto um do outro quando íamos tomar banho. – Arthur prontamente respondeu, desdenhando.

— Não é sua culpa, mas agora os heteros do vôlei querem distância por medo de você ser um manjarrola. – Samanta finalizou a conversa.

Os três amigos suspiraram profundamente. Talvez simplesmente teriam que aceitar o fato de que não seriam convidado pra coisa nenhuma, afinal uma festa cheia daqueles caras teria de sobra muita bebida, cigarro, música (o que era bom), mas tinha também excesso de masculinidade frágil (o que era chatão). O trio costumava brincar sobre isso, porque era algo totalmente clichê. Um grupo de caras bonitos e sarados, com tendências homofóbicas e machistas que objetificavam as mulheres e se pagavam de indestrutíveis. Eles sabiam que era algo extremamente brochante, mas tudo parecia irrelevante porque as festas eram boas. Quem tinha a sorte de ir sempre falava bem.

Esse era um assunto delicado no trio, inclusive, porque Ramona tinha Pedrão que ficava em sua cola, mas ela não cedia de forma alguma às investidas do rapaz. Samanta e Arthur se perguntavam o que tinha de errado ali, afinal era o passaporte para pelo menos ela frequentar as festas. Ramona, no entanto, deixava bem claro que preferia morrer a usá-lo para entrar nas festas ou que preferia ser queimada viva a namorá-lo. E ela deixava isso bem claro e não se prolongava, nem permitindo que o assunto se estendesse.

Talvez você se pergunte: “ué, mas e a Samanta? Por que não é paqueirada?”. Boatos corriam que os caras não gostavam de meninas de cabelo curto como o da branquela do trio, mas a verdade, mesmo, é que eles tinham medo de tentarem uma pegada com ela, dar errado e ela lhes lançar um feitiço para que seus paus não subissem mais. Afinal outras meninas tinham cabelo curto e já foram alvos dos atletas, e Samanta era uma garota extremamente bonita.

Assim como Arthur, o charme da bruxa era único. Talvez seus peitos não fossem grandes como os de Ramona, nem tivesse a mesma espontaneidade de Arthur, mas Samanta era linda em seu corpo mais reto e estilo meio menino de se vestir. Gritava atitude. “Não, caralho, eu não sou sapatão só porque uso essas roupas!” ela dizia quando Arthur a provocava, chamando-a de caminhoneira quando ela chegava com uma camisa social masculina sobre a camiseta do uniforme. Curiosamente lhe caía muito bem, Arthur pensava, mas gostava de provocar porque esse era seu jeitinho de ser.  

 - Não acredito que vamos começar o ano excluídos de novo das coisas. Vai ser um desafio fingir tranquilidade e indiferença quando as fofocas da festa correrem pela sala... – Samanta comentou, bufando. O comentário da amiga acendeu uma lâmpada imaginária sobre a cabeça de Arthur.

Uma ideia, das boas, e um risco a se correr.

Ramona e Samanta já iam comentar alguma outra coisa quando se surpreenderam com Arthur se levantando de repente e indo em direção aos garotos do vôlei. As meninas se entreolharam, sem saber o que pensar mas curiosas demais para ver o que diabos Arthur aprontaria.

O garoto andou tranquilamente até a área da sala dominada pelo grupo de vôlei e parou em frente ao jovem Almirante. Bruno pareceu confuso com em ver o garoto do fundo da sala ali, em sua frente, imóvel e com um sorriso malicioso na cara.

Bruno baixou a cabeça, voltando à sua leitura e ignorando o garoto a sua frente, mas Arthur deu um passo a frente e sorrindo. Puta audácia do garoto, vai dizer.

— Algum problema? – Bruno perguntou, confuso.

— Qual é a do viado, ficou doido? – José perguntou, já se levantando e partindo para cima de Arthur quando Bruno ergueu seu braço e impediu o colega de grupo de prosseguir.

— Eu consigo me virar. Algum problema? – Bruno repetiu a pergunta, dessa vez mais sério. O grupo se entreolhou, afinal era incomum José obedecer as ordens de algum dos garotos assim.

— Você é o cara que não recusa um desafio, né?

Dessa vez foram os garotos de vôlei que se entreolharam, de repente animados com o rumo que aquilo estava tomando. Bruno não respondeu, mas não saiu do lugar. Arthur tomou aquilo como uma confirmação.

— Pois eu desafio você a ser meu namorado.

Aquele pedido de desafio saiu mais alto do que deveria e todos da sala pararam o que estavam fazendo para direcionar seus olhares para Arthur e Bruno.


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Notas finais do capítulo

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