Os Desqualificados escrita por S Q


Capítulo 10
"Qual é o Time?"




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Ana e Ricardo tinham outra apresentação agendada, dessa vez em uma pequena rádio local. Por ser nova, tinha uma audiência ainda bem baixa e não conseguia atrair artistas grandes, que cada vez mais focavam nas plataformas de stream. Oportunidade para artistas menos conhecidos como eles. Assim que chegaram lá, perguntaram se podiam mostrar a gravação da música de Marizete, "O que há de Melhor".  O locutor dono da rádio achou estranho porque nenhum dos dois que estavam lá  era quem cantava. Mas assim que ouviu as batidas que abriam o refrão, não conseguiu ficar parado e começou a batucar com o pé. Quando terminou de ouvir, ele falou:

— A melodia é boa, mas a gravação tá com uma qualidade péssima. A pegada rock ficou legal, só que combinaria mais um vocal masculino, não essa vozinha de mulher…- bufou- É, desculpa, não dá pra tocar isso na rádio. De jeito nenhum. 

Os dois ficaram com cara de tacho. 

—Não fiquem assim! Vocês podem ainda colocar ela no Instagram para os amigos verem, garanto que vão conseguir curtidas e elogios. Mas não é uma canção, digamos, exatamente “qualificada”...

Ao ouvir isso, Ana se exaltou:

—Está nos chamando de “desqualificados”?! Fala a verdade, é só porque você preferia que alguém mais famoso aceitasse tocar aqui, não é?

O dono da rádio ficou bastante irritado com o tom que a musicista usou e fez questão de esfregar na cara dela que enquanto a música não tivesse um Emmy, fosse aprovada em um conservatório ou qualquer coisa do tipo, ele tinha total direito de achá-la desqualificada o quanto quisesse. E irritado, saiu logo dispensando qualquer apresentação dos dois naquela noite, expulsando-os da rádio.

Ana ficou revoltadíssima com a intolerância do sujeito. Seu namorado pôs as mãos em seu ombro, tentando acalmá-la.

—Calma, esse foi só o primeiro lugar onde a gente tentou apresentar essa música. Ainda vai dar certo. E na pior da hipóteses, a gente pode...garantir uns elogios das minhas tias postando ela no Facebook.- riu sem graça.

A mulher tirou as mãos dele dos seus ombros.

—Isso seria como concordar com o que esse idiota falou.

Antes que Ricardo tivesse chance de resposta, o telefone de Ana tocou. Era Milena perguntando como as coisas estavam indo. 

—Não deu em nada.- Ana respondeu logo.

—Caramba, vocês cruzaram a cidade e ele não deixou nem vocês fazerem um cover, nada mesmo?

Patrick ouviu do térreo parte da conversa, e assim que Milena silenciou, subiu as escadas e bateu na porta, perguntando se podia entrar. A amiga deixou e logo foi contando sobre os problemas que Ricardo e Ana tiveram. Patrick ficou bastante pensativo. Milena chegou a estalar os dedos na frente do seu rosto, achando que o amigo estava sonhando acordado, mas em um estranho rompante, ele declarou que  precisavam fazer uma reunião de banda, antes de mais nada.

—Quer dizer, não foram só os dois que participaram da gravação. Eu e você estávamos lá, embora eu seja só um bocó no baixo e você não queira aparecer. Também somos parte da banda, bem ou mal. Eles estão muito acostumados a trabalharem em dupla, eu sei, mas infelizmente, até agora, não conseguiram nada assim. Precisamos formar um time, espírito de equipe, até para se dar força. Qual é  o time?!

— Wildcats! - Milena respondeu rindo e concordando com a cabeça sobre o que ele tinha dito. Ela não conseguiu deixar de pensar que também deveria ouvir a opinião de Marizete, afinal, era a verdadeira autora da música “O que há de Melhor”. Se cobrou mentalmente de passar na casa de reabilitação no dia seguinte. Enquanto o casal não chegava, pegou o papel com a letra, que passou a carregar sempre em seu bolso, sem perceber, como uma espécie de amuleto. Passou os olhos pelo verso “quem você é não se pode esconder”. E os seguintes: 

Em alguns instantes tudo pode mudar

Mesmo se você não acreditar

Em o que há de melhor

 

Não importa o mal que há

Alguém sempre vai vencer

E isso é o que há de melhor

Ela acompanhava cantarolando baixo, mas precisou parar de ler porque ouviu as vozes de Ana e Ricardo, entrando na vila. Patrick lhe seguiu rápido, indo até eles.

—E aí, como vocês estão? Primeiramente, quero que saibam que isso não é o fim do mundo, ainda existe chão. Sucesso não vem de uma hora para outra mesmo. Mas a gente ainda vai ficar famoso, com o nome conhecido até nos buracos mais sórdidos do mundo! - falou Patrick tentando animá-los. Milena ficou surpresa em como as palavras do rapaz refletiam a música deles. Aliás, será que ele tinha ouvido ela cantarolando? 

Ana não respondeu nada e foi entrando carrancuda na sua própria casa. Ninguém se incomodou de segui-la, devido a intimidade que tinham. Se sentando no sofá da prima, Milena pigarreou:

—Bem, então temos que achar uma outra maneira de trabalhar essa música, certo?- Fez questão de colocar uma ênfase na palavra “temos” para mostrar que estavam juntos nessa.

Ana olhou para ela com uma expressão confusa, de quem realmente não sabia o que fazer. Patrick então logo se empertigou:

—Fique tranquila, minha cara vizinha, porque nós tivemos alguns planos.

Então contou tudo que ele e Milena tinham conversado. Ao terminar, Ana deu um pequeno sorriso encorajador mas baixou a cabeça de novo.

—É legal ver vocês se engajando com a ideia da banda. Eu sei que deveríamos ter ido juntos na rádio, mas é que no fundo eu não perdoaria de dar muita esperança de algo, e acabar não dando certo... de novo. - falou encarando abertamente a prima, com seus olhos cor de mel mirando culpadamente os mais escuros de Milena.


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