Doubt Comes In escrita por hugweasley


Capítulo 1
Capítulo único




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Desde pequeno, James Potter foi ensinado que existiam criaturas assombrosas, prontas para mata-lo na primeira oportunidade. Lembrava-se das histórias que sua mãe lhe contava sobre hidras, cães de três cabeças, quimeras, e todos outros monstros que destruíram os maiores heróis que já pisaram na Terra. Algumas noites, o garoto ia dormir assustado com o que poderia acontecer consigo no futuro, afinal, não tinha um porte físico que o preparava para ser um herói; pelo contrário, James era magro demais, desengonçado pela sua altura, e seu único talento era tocar lira.

Naquele momento, entretanto, James soube que nenhuma criatura de seus pesadelos infantis era tão assustadora quanto sua própria mente. Enquanto caminhava pela caverna fria e úmida, sem nenhum barulho ao seu redor que não fosse um pingar constante, ele travava uma batalha com seus pensamentos, mais feroz do que qualquer outra já travada em toda a história. Estava tentando a todo custo ignorar as garras se aprofundando em seus pensamentos, arranhando e deixando-os cada vez mais altos.

Determinado a manter o frio do lado de fora de seu corpo, tentava pensar nos momentos felizes que vivera. Lembrava-se do dia que conheceu o grande amor de sua vida; Perséfone tinha acabado de chegar, trazendo consigo um dos dias mais ensolarados que já existiram. No momento em que Lily pisou no campo florido, os olhos de James foram atraídos para ela. Honestamente, como seria diferente? Tinha certeza que, mesmo se as moiras não tivessem controle da sua vida, ele ainda seria atraído pela luz que refletia nos cabelos ruivos da garota, pelo sorriso que tinha a capacidade de iluminar seu dia mais escuro, pelos olhos verdes que pareciam ler seus segredos mais profundos.

Aquele tinha sido o dia mais feliz dos seus dezenove anos, sentimento que acompanhou os outros dois anos seguintes, mas agora estava tendo dificuldades de se lembrar do calor que sentira. Suas memórias o traíam, distorcendo as imagens para os dias que Perséfone estava no Mundo Inferior. Em outro momento, talvez James se recordasse de que todos os dias, por mais gelados que fossem, tinham sido felizes porque Lily estava ao seu lado.

Mesmo durante a fome, com ventanias balançando as estruturas de sua casa, eles tinham sido felizes. Faziam planos, cantavam, dançavam, apreciavam a companhia um do outro, imaginando quando Perséfone voltaria com o calor e a comida farta. Eram bons tempos, James pensou, mas não conseguia vê-los agora.

Tudo o que passava pela sua mente era como a caverna estava similar ao inverno que Lily tanto odiava. O Mundo Inferior era mais quente do que a caverna que o levava para fora dele, para o frio que congelava seus ossos, pisava em seu estômago e os deixava doentes. Qual motivo Lily teria para acompanha-lo? Mesmo que ela o acompanhasse, não sabia se Hades estava falando a verdade quando lhe propôs aquele teste.  

Não, James balançou a cabeça, não pensaria naquilo. Ele não poderia perder a batalha interna que travava, porque isso significaria perder Lily para sempre, e isso não era uma hipótese que ele gostaria de ver.

Decidiu pensar no dia mais feliz de sua vida, que pairava em seus pensamentos todos os dias, desde o momento que acordava até o que ia dormir. Em um dia tão ensolarado quanto o que conheceu Lily, ele também se casou com ela, quase dois anos depois. Sorriu com a lembrança. Mesmo sendo outono e com a ausência de Perséfone, aquele dia tinha sido abençoado pelos deuses para o casal.

Naquele dia, Lily estava mais bonita do que a própria Afrodite. Agradeceu as moiras por terem unido seus destinos, pois ele não conseguia pensar em alegria maior do que ter a ruiva ao seu lado – e para sempre. Todas as juras de amor agora seriam eternas, ele era dela, ela era dele. Estava ansioso para irem para sua casa, dormirem e acordarem juntos, terem filhos, envelhecerem juntos; queria começar uma vida ao seu lado, a melhor vida que poderia ter.

O sorriso desapareceu de seu rosto quando se lembrou do que aconteceu a seguir. Tão rápido quanto a felicidade veio, ela foi arrancada de si bruscamente. Detestava o sentimento de que as moiras estavam brincando com ele, que nunca tinha sido uma pessoa ruim, mas era a realidade.

No primeiro dia de casados, James levou sua esposa para um piquenique no mesmo campo que a conheceu, como uma maneira de deixa-la nostálgica, uma homenagem aos dois anos mais felizes de suas vidas.

Contudo, as moiras planejavam outra coisa para o casal. Enquanto James recolhia margaridas para Lily – as suas favoritas – e as transformava em buquê, ouviu um grito agudo e, quando se virou, uma cobra verde deslizava para longe da ruiva. O buquê de flores caiu ao mesmo tempo que Lily, morrendo tão rapidamente quanto. James a segurou em seus braços enquanto observava o brilho se esvair dos olhos verdes, tentando, em vão, conforta-la dizendo que tudo ficaria bem. Não há agonia maior do que mentir para a pessoa que ama e para si mesmo, apenas para tentar aliviar uma dor que o marcará para sempre. A verdade era que, enquanto o fio da vida da garota era cortado, sentia que o seu também estava sendo.

O último suspiro de Lily levou consigo toda a felicidade de James. Ele tinha passado a última semana se lamentando, incapaz de aceitar a tragédia, apenas tocava lira, músicas tão tristes que comovia aqueles ao seu redor. Na tarde anterior, uma ninfa se comoveu com a história dos dois, e lhe confidenciou um caminho para o Mundo Inferior, para que ele pudesse resgatar a amada. Ela disse que Hades e Perséfone certamente iriam se comover também com a história do casal, não possuindo escolha senão deixar Lily voltar ao mundo dos vivos.

As garras se afundavam cada vez mais em seus pensamentos, arrancando qualquer esperança que pudesse existir. James sempre foi otimista, mas, agora, não conseguia ver uma razão para ser.

Nada em sua vida jamais tinha sido fácil, então, por que falar com Hades teria sido? Bastou conversar com o deus do Mundo Inferior, cantar sua canção sobre a tragédia que assolou sua vida, uma lágrima de Perséfone e, pronto, Lily estava liberada para segui-lo de volta ao mundo dos vivos.

Era o que incomodava James: sua esposa poderia segui-lo, não andar ao seu lado. A condição imposta por Hades martelava em sua cabeça, o fazendo hesitar antes de dar qualquer passo naquela caverna. Como poderia acreditar que Hades falava a verdade? Ele estava proibido de olhar para trás e checar se Lily estava mesmo o seguindo, pois, caso o fizesse, ela ficaria no Mundo Inferior para sempre.

Queria silenciar suas dúvidas e anseios, mas como faria isso se o único barulho naquela caverna era o ecoar de seus passos? Teria Hades realmente a deixado ir? Se sim, por que Lily o seguiria? Ele não sabia dizer se amor dos dois era, de fato, mais forte e poderoso do que o inverno e a fome.

Tentou se recordar de qualquer momento que pudesse lhe dar esperança, mas nada veio à mente. James era um garoto fraco, sem nada a oferecer que não fosse sua música, não fazia sentido que justo ele tivesse convencido um deus a fazer aquilo que era proibido.

Poderia ser um truque, mas ele não olharia para trás. Se estivesse sendo enganado, provavelmente alguma divindade interviria a seu favor.

Interviria mesmo? Parecia inocente de sua parte pensar que os deuses tirariam um tempo para ajudar James Potter. Por que os deuses se importariam agora, se nada fizeram quando ele passou fome durante a infância?

Um passo após o outro, era no que ele precisava focar. Podia ver a luz do mundo dos vivos no horizonte, um brilho que nem parecia ser real. Repetia mentalmente sua conversa com o espírito de Lily, não se esquecendo da promessa que fizera:

“Só precisamos caminhar, depois nós vamos ficar juntos. Você não vai ficar longe de mim nunca mais.”

“Contanto que estejamos juntos.”

Caminhar não parecia uma tarefa tão fácil agora. James se questionava se o túnel realmente teria um fim, ou se estava apenas andando em círculos, sendo uma marionete para que Hades pudesse se entreter naquela tarde. A luz do horizonte nunca chegava, certamente aquilo era uma armadilha e ele ficaria preso no Mundo Inferior para sempre. Pior, Lily ficaria presa e, quando Hades se cansasse da brincadeira, mandaria James de volta para a sua solidão no inverno.

Queria acreditar na palavra de Hades. Queria acreditar nas palavras de Lily. Queria acreditar nos seus princípios. Queria acreditar que ela estava seguindo seus passos. Queria acreditar na luz que enxergava no horizonte. Queria acreditar no amor deles.

Mas ele não conseguiu.

Era um truque, não tinha dúvidas disso.

Girou seus calcanhares, cansado de ser um peão para divertimento dos deuses, determinado a provar para si mesmo que estava certo, querendo silenciar as dúvidas em sua mente.

— James. – disse, puxando o ar num lamento.

Ela estava lá, lhe dando um sorriso triste. Um último sorriso, como se quisesse dizer “está tudo bem”, mesmo que fosse mentira. O amor de sua vida esteve em seu encalço o tempo todo, como ele, no fundo, soube que estaria.

Podia ver com clareza seu rosto delicado, suas sardas, seus olhos verdes, seu cabelo ruivo; todo seu corpo se iluminava por causa da luz atrás dele. Foi só nesse momento, olhando as cores voltarem ao corpo de Lily, que percebeu o quão próximo deveria estar da saída.

— Lily... – ele esticou o braço, num impulso de tentar traze-la para si, como se pudesse evitar o tratado firmado com Hades.

Sem ter a quem culpar se não a si mesmo, ele observou a alma de sua esposa ser puxada por uma mão invisível para o centro do Mundo Inferior novamente, onde, dessa vez, ficaria pela eternidade.

Sozinho, James Potter voltou a caminhar no absoluto silêncio da caverna em direção ao mundo dos vivos.


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Notas finais do capítulo

Obrigada pra quem leu até aqui! Espero que tenham gostado da história :)



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