Capítulo 4

por N.C Earnshaw

APROVEITANDO QUE ERA SUA VEZ de ficar de vigia, Sasuke verificou se algum membro do time 7 encontrava-se acordado. 

Sakura ressonava ao seu lado com as mãos apoiando um lado do rosto e os lábios levemente abertos, a respiração calma e o corpo quase imóvel; exceto pelo movimento do seu abdômen, contrastava com Naruto do seu outro lado. Roncando em posição fetal, o loiro se encontrava em um sono tão profundo, que nem se uma vila inteira os atacasse, ele acordaria. O genin fez uma careta para a baba que escorria pelo canto da sua boca, pensando no quão Naruto era um desastre até mesmo dormindo, e se empertigou para verificar o sensei. 

Kakashi estava virado de lado, sem se mexer há mais de dez minutos; desde que seu turno havia acabado. Sasuke ainda tinha impressão de que ele estava acordado, mas não se importava. O Hatake não gostava de se meter em tudo que os seus estudantes faziam, principalmente em bobagens.

Por último, Sasuke pousou os olhos em Satoru, o intruso.

Ele cerrou os punhos ao lembrar que Satoru tinha tido a indecência de tentar colocar seu saco de dormir próximo ao de Sakura, com a desculpa que somente queria conversar antes de pegar no sono. Acabaria totalmente com dinâmica do time 7, visto que desde os primeiros dias, separaram a ordem dos lugares em que dormiriam após as confusões. 

Em uma das missões fora da vila, Sakura dormiu por uma noite entre os dois garotos, acarretando em um desastre. Naruto havia tentado agarrá-la em meio aos seus sonhos malucos, fazendo Sakura acordar gritando e se debatendo. Sasuke, por instinto, saltou por cima de Naruto com uma kunai e quase o degolou. Para a sorte do loiro, tinham um sensei veloz e ele foi salvo. Entretanto, desde aquele dia, o time entrou em um consenso de deixar Naruto longe de Sakura. Por consequência, Sasuke virou uma barreira para conter os seus avanços. 

Além disso, deixar um cara mais velho se deitar ao lado da única garota do time era quase obsceno. Não conheciam o chunnin. 

Para o alívio do Uchiha, Kakashi sugeriu que Satoru colocasse seu saco de dormir a um ou dois metros do dele, ou seja, bem longe de Sakura. 

O intruso se encontrava de costas para Sasuke, e foi difícil discernir se ele estava, de fato, dormindo. 

Grunhindo mentalmente, assim como torcendo para o chunnin não estar acordado, Sasuke se levantou e foi em direção às suas mochilas. 

Com movimentos rápidos e cautelosos, o genin tirou a garrafa vazia de Sakura da bolsa dela, abriu sua própria garrafa e derramou mais da metade da água que tinha nela, no recipiente da Haruno. 

Não tinham achado água como o esperado, deixando sua companheira de time decepcionada e a mercê da bondade de Satoru, uma vez que apenas em algumas horas da manhã era que conseguiriam encontrar água fresca. 

Afirmando para si mesmo que estava somente fazendo aquilo para Sakura não desmaiasse de desidratação, Sasuke se afastou com um sorrisinho satisfeito após colocar as garrafas em seus devidos lugares. 

Resolvendo terminar seu turno em outro lugar ao invés do seu saco de dormir aquecido, o Uchiha se sentou em uma pedra larga próxima aos seus companheiros de equipe e passou a apreciar o silêncio. 

Os roncos de Naruto, para alguém que não estava acostumado a ignorar o barulho, pareceria o único som ecoando entre as árvores. No entanto, seu cérebro já se encontrava treinado e empurrava o ruído nojento para o fundo de sua mente, focando-se apenas nos suspiros suaves que Sakura dava enquanto dormia. 

A respiração da Haruno sempre o acalmava e enchia seu coração de paz. Era como uma canção de ninar de tom único, e o atraia a cada vez que a menina o fazia, acalentando sua mente e o dirigindo para uma noite completa de sono. E sem sonhos. 

Acordada, ela o perturbava e mexia com ele de tantas maneiras que o deixavam maluco. Contudo, o que Sakura não sabia, era que a noite, ela era a única que o ajudava a se manter lúcido. Afastando os pesadelos, o medo e a solidão. 

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A risada divertida de Sakura foi o que o despertou. Sasuke resmungou sob sua respiração ao som de uma conversa, abriu apenas um olho e procurou sua companheira de time. 

O saco de Sakura não estava mais ao seu lado; algo que ele já imaginava, pois, o som do seu riso não vinha de tão perto. Ele estranhou o motivo de ela ter se levantado tão cedo. Geralmente, os garotos apenas se erguiam quando Kakashi os chamava. 

Ainda sonolento, virou-se para continuar a dormir e aproveitar os minutos que tinha antes do sensei acordá-lo. Cobriu o rosto com o braço, para proteger seus olhos da claridade e afastou um pouco suas pernas das de Naruto; que tinha parte do seu corpo no espaço de grama que separava os sacos de dormir de ambos. 

Uma gargalhada rouca o despertou do seu breve cochilo, fazendo seus sentidos se apurarem.

Assim que seu cérebro meio adormecido se deu conta de quem eram as vozes que estavam perturbando seu sono, o Uchiha teve que se controlar para não se erguer num pulo e… Bem, ele não sabia o que faria. Mas tinha em mente um ou dois xingamentos. 

— O Daisuke vomitou sem parar! — A risadinha divertida de Sakura fez Sasuke coçar os olhos com força. — Então, como meu companheiro de time estava abatido, tive que tomar conta da situação. Derrubei os dois idiotas com alguns socos e eles saíram correndo sem sequer olhar para trás. 

— Sugoi! Você é mesmo incrível, Satoru-kun! — Sasuke levantou metade do seu corpo ao ouvir a frase, chamando a atenção da dupla sentada sob a árvore. Próximos demais, notou o genin. Os braços até se roçavam tamanha a proximidade. 

— Oh, bom dia, Uchiha! — cumprimentou Satoru com um sorriso. 

Sasuke apenas grunhiu, e o sorriso do chunnin aumentou ao notar seu mau-humor. 

O caçula dos Uchiha procurou o sensei pela clareira minúscula e, ao não ver nem sombra de Kakashi, franziu o cenho. Aquele dia estava começando a ficar muito esquisito...

— Ele precisou usar o “banheiro” — avisou Satoru, fazendo o sinal de aspas com os dedos. 

Sasuke torceu o rosto ao perceber o jeito esquisito que Sakura estava se portando. A garota, desde que ele tinha acordado, não havia se dignado a nem sequer fitar seu rosto. Encontrava-se com os olhos brilhando enquanto encarava o rosto levemente bronzeado do chunnin e agarrava o braço dele como se fosse sua salvação. 

— Está bem, Uchiha? Está com uma cara meio estranha — indagou Satoru, sinceramente preocupado. 

Sasuke arqueou uma sobrancelha. Geralmente, não falava muito. Era do tipo que não gostava de gastar palavras sem necessidade e acreditava que alguém só deveria abrir a boca, se tivesse algo importante a dizer; muito diferente dos seus companheiros de time, que falavam pelos cotovelos. Entretanto, a presença daquele outro garoto na missão, deixava-o quase mudo. 

— Ah! Ele está bem — afirmou Sakura, com desinteresse, tentando ganhar de volta a atenção de Satoru. — É o Sasuke. Ele sempre está de mau-humor. 

O genin sentiu uma pontada em seu coração com a revirada de olhos que ela deu em seguida.

A Haruno estava se referindo a ele como se não se importasse, como se os sentimentos de Sasuke não merecessem mais sua atenção. E isso doeu. 

Satoru deu de ombros e voltou-se para a garota. 

No momento, Sasuke se debatia internamente, sem compreender o que estava acontecendo. Sakura estava agindo tão anti-Sakura, que se ele não tivesse fingido ir se aliviar em meios as árvores e usado “kai” diversas vezes, acreditaria que estava preso em um genjutsu. 

— Está na hora de seguirmos viagem, meus adoráveis genins! — anunciou Kakashi assim que retornou. Diferente da frase animada, sua voz soou como se ele estivesse entediado. 

— Naruto ainda não acordou, Kakashi-sensei — avisou Sakura. 

Sasuke quase rosnou ao ouvi-la. 

— Pode acordá-lo, Sasuke?

O Uchiha se moveu antes que ele completasse seu pedido. 

Foi em direção ao garoto loiro sentindo raiva em cada célula do seu ser, pegou a garrafa de água que Naruto deixava próxima ao saco de dormir e derramou todo o conteúdo no rosto dele. 

O Uzumaki berrou logo que sentiu o líquido o afogando. Ele se levantou num pulo, limpando o rosto com as mãos, em desespero. O loiro puxava o ar com força, engasgando-se com a água que havia entrado em sua boca. 

— Teme! — gritou Naruto com os punhos cerrados. Demorou um ou dois minutos para se tocar quem tinha derramado água nele. O sorrisinho de escárnio no canto de boca do Uchiha, entregou-o. 

Kakashi interveio antes que os garotos começassem a brigar aos socos, ordenando que Naruto se arrumasse, pois sairiam em alguns minutos. 

O loiro, à contragosto, dobrou saco de dormir e enfiou na mochila de qualquer jeito, fuzilando Sasuke com o olhar todo o tempo.

As horas seguintes foram uma tortura para o Uchiha. Ele se encontrava cansado de toda a falação, mais irritado que o normal e com uma vontade imensa de socar alguma coisa. Ou um certo alguém, para ser mais específico. 

— Ah, Satoru-kun! Você é tão legal! — O elogio de Sakura fez o genin querer vomitar. 

Sasuke verificou se Naruto ou Kakashi estavam prestando atenção na dupla que caminhava na dianteira. Nenhum dos dois parecia dar a mínima. O Uzumaki ainda tinha a expressão emburrada da clareira e o Hatake estava concentrado demais em seu livrinho pornográfico para dar atenção a sua estudante flertando com o garoto mais velho. 

— Não foi nada — respondeu o chunnin com humildade, enrolando uma mecha rosa de cabelo da garota com o dedo. 

O Uchiha não percebeu que tinha ativado seu sharingan, até Naruto o cutucar com força. 

— Cara — ofegou o loiro, coçando a nuca. Ele tinha desistido de provocá-lo quando percebeu os olhos vermelhos do outro. — O que te deixou assim? 

Sasuke desativou o sharingan e grunhiu. 

Os garotos ficaram em silêncio por alguns segundos, mas o Uzumaki não segurou a língua. 

— Está bravinho porque a Sakura-chan está dando atenção a outro? — A expressão de Naruto passou a ficar maliciosa ao ver o canto da boca do seu amigo/rival se torcer. 

— Tsc. Não era você que gostava dela? — retrucou o Uchiha, engrossando um pouco sua voz para não demonstrar seus sentimentos. Estava furioso e não conseguia desviar os olhos dos cabelos rosa de Sakura. 

Naruto soltou uma risada sem graça. 

— O Satoru é legal. 

O moreno arqueou uma sobrancelha, e acostumado com a falta de palavras do seu companheiro de time, Naruto entendeu como um “e como diabos isso justifica você ignorar outra cara dando em cima da garota que você gosta?”. 

— Não é muito diferente do normal. É o Satoru ou você, não faz muito diferença. — Sasuke se surpreendeu com o quão maduro Naruto soou. — A Sakura-chan nunca me dá atenção por livre e espontânea vontade. 

Eles observaram Satoru tirar uma folha dos cabelos de Sakura e fazer um cafuné na cabeça dela.

— A mesma coisa, hum? — provocou Sasuke vendo Naruto ficar vermelho. — O que acha que fez a Sakura mudar tão rápido? 

— Preocupado, teme? — O Uzumaki levantou ambas as sobrancelhas. 

— Por favor — bufou o Uchiha. — Não me importo com o que a Sakura faz. 

Naruto o fitou, desacreditado. 

— Estou achando agradável não ter ela me importunando durante toda a missão. — O loiro não acreditou muito na sua tentativa de se reafirmar, mas deu de ombros. 

Ambos encararam o céu acima deles com caretas pensativas. 

— Ela pode ter cansado dessa sua cara feia — sugeriu Naruto.

Sasuke revirou os olhos. 

— Ou… — O rosto do Uzumaki se iluminou, atraindo o olhar do outro genin. — ela pode estar sob o efeito de uma poção do amor. 

Sasuke soltou uma risada surpresa, coberta de escárnio. 

— Imbecil. 

Naruto não se ofendeu, visto que não estava dando atenção ao seu companheiro de time. Ele estava forçando sua mente atrás de explicações. 

— A Sakura-chan começou a ficar estranha depois que ela tomou aquele chá esquisito e...

— Naruto — cortou Sasuke. — Poções do amor não existem. 

— Claro que existem! — gritou o Uzumaki. 

Satoru quis se virar para olhar o que aconteceu, mas Sakura buscou sua atenção novamente.

— Dá pra falar mais baixo! — sussurrou Sasuke, socando o ombro do seu rival. 

— Aquele chá estranho deve ter feito a Sakura-chan se apaixonar. 

Sasuke negou com a cabeça. 

— Por qual motivo ele não me deixaria beber também? 

“Talvez porque você seja nojento”, pensou o Uchiha. 

— Não lembra o que ele falou? “Só deixo garotas bonitas beber do meu chá”. — Naruto engrossou a voz para imitar o chunnin. 

Sasuke pegou Sakura apertando os músculos de Satoru e mordeu sua própria bochecha com força. A teoria de Naruto estava começando a fazer sentido. 

Kakashi, ao contrário do que os seus estudantes pensavam, prestava sim, atenção neles. Principalmente quando Naruto e Sasuke pareciam entrar em consenso sobre algum assunto e trocavam confidências aos sussurros.

O Hatake sentiu as palmas de suas mãos começaram a suar, imaginando o tipo de problemas que aquela dupla arranjaria. “Kami que me ajude”, orou o sensei.