City of Stars escrita por Lily Potter


Capítulo 1
Capítulo único


Notas iniciais do capítulo

Oiiii gente, beleza??? Eu to há um tempo GIGANTESCO sem escrever jily então MIL PERDÕES SE ESTIVER PESSIMO OK? Eu amo musicais e não consegui evitar...Espero que se divirtam lendo tanto quanto me diverti escrevendo !!!
Boa leitura a todes ♥



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Era verão. Porque tudo começa no verão.

Era um dia de merda como todos os outros eram. Morar em Hollywood era uma das coisas que Lily se arrependia de ter feito, e ela tinha uma longa lista que ia desde o seu primeiro porre por causa de um garoto (se fosse uma garota não seria tão patético, mas era um garoto!) até a sua tatuagem de melancia na virilha, e o trânsito horrível que a fez se atrasar, não pela primeira e muito menos pela última, para seu trabalho na loja de vestidos de noiva, loja essa que odiava com todas suas forças e seu ódio ia desde a dona, Umbridge, até a clientela que se achava superior demais para tratá-la como um ser humano.

Por Deus! E pensar que ela havia saído de North Carolina não só em busca de realizar seu sonho de fazer música e encantar as pessoas com letras sinceras sobre amores perfeitos, mas também porque desejava estar em um lugar onde era aceita independente de quem ela escolhesse amar. Definitivamente a vida que estava levando não era a vida que havia planejado para si. Ela bebia mais álcool que água, com o tempo aprendeu a fumar a ponto de quase acabar com um maço em antes de meio dia ( que estavam quase aumentando para dois desde que começou seu trabalho na loja de noivas.) e comia tanto fast-food que constantemente se perguntava como não estava morta

Lily Evans era um caos e ainda não havia passado dos vinte e três.

    ― Tsc tsc atrasada novamente, Evans. ― A voz enjoativamente doce de sua chefe soou aos seus ouvidos e a ruiva precisou esforçar-se para não revirar os olhos, com um sorriso forçado ela cumprimentou a mulher de cabelos castanhos presos em um coque supostamente elegante que vestia um vestido, como sempre rosa, cujo a seda cor de rosa descia reta pelo corpo rechonchudo da mulher.

一 Mais um atraso e serei obrigada a te demitir, querida. 一 Completou a mulher alguns segundos depois de olhá-la de cima a baixo. Céus, como alguém conseguia ser tão irritante ao ponto de irritá-la com menos de três frases completas?

    ― Não vai ser necessário, Umbitch! ― Lily respondeu grosseiramente, olhando para a mulher. Havia algumas clientes ali e a ruiva não poderia se importar menos, já estava farta de como a mulher a tratava, e ela apenas vinha aguentando as grosserias por realmente precisar do emprego, mas já não aguentava mais, faria o que fosse preciso para pagar suas contas do próximo mês, mas não trabalharia ali mais. ― Eu me demito.

    E após gritar essas palavras ela saiu da loja e acendeu um cigarro entrando em seu carro segurando um acesso de raiva enquanto fumava de maneira desenfreada, esperando que a nicotina fizesse efeito e trouxesse um pouco de paz para sua mente turbulenta, a janela estava aberta e o carro ainda parado.

A mente de Lily estava um caos.

Não sabia como lidaria com a falta de dinheiro no final do mês. Já não tinha o suficiente mesmo trabalhando, como iria se sustentar agora? Se seus pais descobrissem iriam arrastá-la de volta para sua cidade natal e tal coisa estava fora de cogitação. Prometeu a si mesma, apenas um dia após seu aniversário de dezoito anos quando seu carro atravessou a placa enferrujada com os dizeres “Bem-vindo a  North Carolina”, que nunca mais voltaria a pisar naquele lugar odioso.

Ainda não se passavam das nove da manhã e ela já estava prestes a matar alguém, de preferência Dolores Umbridge. Batendo a porta de seu carro, o que segundos depois ela se arrependeu de ter feito pois não teria condições de consertá-lo caso estragasse, a ruiva de olhos verdes começou dirigir sem rumo por Los Angeles, olhando para os turistas que passavam por ela sem realmente vê-los. Os carros caros de celebridades e socialites passavam velozes, pessoas bronzeadas caminhavam com seus cachorros pelas ruas, o sol forte do verão castigava a pele de cada um que ousava sair por aí.  Lily dirigiu por o que pareceram horas até chegar ao Lake Hollywood Park o lugar onde podia-se ver o famoso letreiro do mundo mais de perto, seus olhos verdes estavam vermelhos e cheios de lágrimas amargas que caiam sem parar e  a angústia de não pertencer a lugar nenhum apertava seu peito e o retorcia sem dó.

Ela não pertencia a Hollywood, não era uma estrela, talvez nunca fosse ser.  Suas letras, suas crenças, tudo o que ela um dia havia acreditado eram consideradas bobas demais, apaixonadas demais, criticavam coisas demais  para vender. Era o mesmo que todos diziam-na desde quando era apenas uma criança de oito anos “você é muito boba, Lily” e quando ela envelheceu, não muito, mas o suficiente para começar a entender algumas coisas falavam passou a ouvir “Você critica demais, Lily”  que as pessoas eram assim mesmo e ela deveria deixar de lado, que deveria lutar um pouco menos pelo o que acreditava ou iria acabar se dando mal.

    Ela nunca desistiu de lutar pelo o que acreditava. Não até aquele momento.

    Sem pensar muito ela saiu do carro e sentou-se na grama do parque ignorando todos os turistas que estavam passando por ela, ansiosos por uma foto do letreiro mais famoso da cidade onde a mágica acontecia. Se apenas soubessem como estavam enganados, ela pensou amarga, acendendo o terceiro cigarro do dia e tragando-o com lentidão, sua pele branca e desacostumada com o sol forte da Califórnia, apesar de viver ali há cinco anos e de vir de uma cidade costeira a pele branca de Lily não havia acostumado-se, as árvores mal se balançavam e ela jurava que poderia ver o ar em sua volta tremelicar sob o poder do astro rei.

Sempre que seus olhos repousavam sob o letreiro Lily lembrava-se da sua primeira experiência, da sensação de pura felicidade, em estar naquela cidade tão maravilhosa e cheia de sonhos. Tinha apenas dezoito, havia saído de casa após uma briga feia com seus pais, largando eles, sua irmã mais nova, Petúnia, e toda sua vida antiga para trás, tudo isso por causa de um sonho. A sensação de estar ali, de realmente estar onde poderia ver tudo acontecendo a deixou encantada, não tinha muito dinheiro e teria que se virar com qualquer emprego que aparecesse, mas aquilo não a assustava, sabia que em breve conseguiria realizar seus sonhos e tudo valeria a pena.

Ela era tão ingênua, tão cheia de vida, de sonhos.

Nenhum de seus sacrifícios valeram a pena, nada que ela havia feito tinha sido suficiente, ela não era talentosa nem rica o suficiente para estar ali, mas era livre demais para voltar a esconder-se sob os olhares alheios, para não ter orgulho de ser pansexual. Sentia vontade de ligar para seu antigo agente, Severus Snape, ele era um merda e só queria transar com ela, mas era famoso no meio musical então talvez ela devesse tentar novamente, quem sabe vencer o nojo de beijá-lo em troca de sua carreira. Um suspiro sôfrego saiu dos lábios avermelhados dela, sabia que não conseguiria vender-se a esse ponto, principalmente para um cara que tinha idade para ser seu pai e tinha um cabelo que era puro óleo.

Pela primeira vez em meses, enquanto observa os turistas e a tristeza a consumia, uma frase começou a surgir em sua mente, o começo de uma letra que nunca ficou pronta,  a primeira música que escrevera, ou ao menos tentou, sobre a cidade, ainda no dia em que viu o letreiro, quando estava exatamente naquele mesmo lugar. O sol não já estava mais no céu quando viu as sombras das grandes letras brilhando, ela ainda não fumava e seus cabelos ruivos brilhavam sob a luz do luar junto das estrelas cintilantes, era inverno mas não fazia frio, e ela sentia-se infinita. Apenas com dezoito anos e acreditava que o mundo cabia na palma de suas mãos.

City of stars

Are you shining just for me?

City of stars

There's so much that I can't see

Mas o que era isso além de algumas frases soltas? A única coisa que ela conseguiu escrever diante de seu deslumbramento infantil, a primeira vez que se via tão deslumbrada com a beleza de algo que não conseguia por em palavras. Ainda na época Lily sabia que não era muito, mas diferente de agora, tinha certeza que aquela seria uma música especial quando estivesse pronta, que seria única e conversaria com os sentimentos das pessoas que a ouviam. Já faziam cinco anos que ela não mexia na letra, nunca conseguiu terminá-la, nada nunca parecia bom o suficiente para que a letra virasse uma música, para que ganhasse uma melodia, algo que a guiasse e a transformasse em algo novo, para que a transformasse em música.

Agora, assim como ela, aquela música já parecia estar além dos meios de salvação.

 Lily encarou o horizonte se perguntando se deveria acender mais um cigarro ou sair para procurar um emprego. O final do mês não estava tão perto, mas  precisava garantir que não dormiria na rua, porque se dependesse do Sr. Riddle ela já estaria na rua há anos (o senhorio do apartamento a detestava desde que descobriu que ela beijava meninos e meninas), e que conseguiria comer sem ter que recorrer a algo extremo.

Com isso em mente, decidiu por fim que a atitude mais responsável seria tentar um emprego, talvez o bar em que ela trabalhou no começo, mas que por ordens de Snape, seu ex agente, ela precisou demitir-se. Quando isso aconteceu, Lily havia imaginado que seu agente estava pensando no seu melhor, no melhor para sua carreira, afinal ele havia estudado para aquilo e não ela, mas agora a ruiva desconfiava que ele sentia-se intimidado pelo barman com quem ela frequentemente flertava.

Uma hora depois de sua epifania ela estava no lugar onde costumava ser o bar Three Broomstick, encarando confusa para o novo nome e as paredes vermelho sangue agora cobriam o que um dia haviam sido paredes pretas, um leão rugindo pintado de dourado estava no lugar da três vassouras prateadas que costumavam ficar ao lado da placa  de madeira antiga, a nova placa era preta, talvez plástico, e em uma caligrafia rebuscada que dava um ar meio etéreo e mágico estava o nome do bar: Gryffindor Room.

De primeira ela estranhou afinal por mais que ele reclamasse, Aberforth parecia ser totalmente apaixonado pelo pequeno bar que possuía, mas então ocorreu que muito deveria ter mudado desde sua última visita ao bar, há quase seis meses porque por mais que amasse conversar com o senhor rabugento o bar era um pouco longe demais de seu antigo trabalho para ela se dar esse luxo, e apenas por não ter nada a perder, Lily fez seu caminho para dentro do pub que agora parecia muito mais bonito e jovem com toda a decoração minimalista, tinham até mesmo colocado um palco, um decente e não aquela coisa quase caindo aos pedaços de antes, em um dos cantos do bar, o que fez o coração dela dar um pulo de felicidade momentânea, palcos significava apenas uma coisa em um bar: apresentação ao vivo.

Talvez eles precisassem de uma cantora.

― Sinto muito, doce, mas ainda não estamos abertos. ― Uma voz rouca ecoou pelo ambiente assustando-a, ela virou-se em direção da voz apenas para encontrar os mais incríveis pares de olhos que ela já viu em toda sua vida, eles eram algo entre o azul e cinza e pareciam perfurar sua pele como gelo. Na verdade, eles pareciam serem feitos de gelo, e ao mesmo tempo assemelhavam-se a um dia tempestuoso.

    ― Se não estão abertos, porque a porta não está trancada? ― Lily perguntou com os olhos semicerrados em direção do homem cujo o corpo estava apoiado no balcão do bar, apenas agora ela havia reparado nos cabelos longos que caiam em ondas perfeitas em seus ombros e ela  se permitiu sentir inveja, apenas por alguns instantes, da beleza daquele cabelo antes de voltar a falar. ― Bem, não importa. Eu estou procurando um emprego.

    ― Sendo assim você deveria ao menos dizer seu nome, não acha, ruiva? ― O moreno perguntou com uma meia risada que parecia um latido, e ela limitou-se apenas a revirar os olhos para a resposta infantil que recebeu, mesmo sabendo que ele tinha alguma razão nessa questão.

    ― Você também não me disse o seu. ― Ela respondeu com outro revirar de olhos e homem apenas riu novamente e mexeu em seus cabelos, deixando-os ainda mais lindos. Céus! Parecia que o que ele tinha de lindo tinha de insuportável.

    ― Não sou eu quem está procurando emprego. ― O moreno lindo-e-insuportável-demais respondeu com aquele sorriso brilhante e cheio de dentes parecendo se divertir bastante em irritá-la. Quando ela estava preparada para o responder com uma resposta ácida, cujo provavelmente lhe custaria a vaga de emprego que ela nem sequer havia conquistado, a porta da frente se abriu.

    ― Sirius, seu idiota, você enlouqueceu?! Quantas vezes eu já não te falei que é perigoso deixar a porta do pub abert...― Um rapaz reclamou já dentro do pub olhando severamente para o que provavelmente era seu amigo, e assim que os olhos de Lily pousaram nele, ela o reconheceu. Era Remus.O bartender londrino com quem Lily trocou alguns beijos, e algumas coisas a mais, quando ela cantava no bar. Remus havia sido único amigo. ― Lily?

    ― Você conhece ela, Rem? ― O moreno, Sirius, perguntou com um sorriso despretensioso, mas sua voz tremeu em algo que parecia muito com ciúmes ao seu ver, e ela sentia um pequeno prazer ao vê-lo desconfortável, como se isso fosse uma punição cômica dos deuses. Com isso sua irritação já começava a sumir agora que a atenção dele não estava voltada para si. O mais alto aproximou-se do de olhos azuis e o beijou levemente, como numa tentativa de fazê-lo desmanchar a careta irritada, mal o beijo terminou e o mais baixo afastou-se colocando ambas as mãos na cintura. ― Não tente me distrair, Lupin! Quem é ela?

    ― A ela, está bem aqui. ― Lily falou sarcasticamente recebendo um olhar repressor de Lupin, seu cabelo castanho claro estava maior, antes eram tão curtos que ela mal conseguia pegá-los e agora eles batiam nos olhos do garoto, do que quando eles trabalhavam juntos e seus olhos âmbar estavam mais iluminados. O que o amor não faz, uh? ―  Eu sou, Lily Evans. Cantei por aqui há quatro anos e queria saber se vocês tem alguma vaga.

    ― Não precisamos de uma cantora. ― Sirius respondeu rispidamente, seus olhos que antes apenas assemelhavam-se com gelo pareciam tentar congelá-la, e Lily quase se arrependeu por ter o provocado. ― Já pode ir.

    ― Eu posso fazer outras coisas além de cantar. ― A ruiva falou com um olhar determinado lançado em direção aos dois homens que estavam apoiados no balcão. Logo que as palavras saíram da boca de Lily os dois se encararam e ficaram no que parecia ser a batalha de olhares mais longa do mundo, por fim, a ruiva cansou-se de todo o show que o de olhos azuis estava dando e se pronunciou novamente:

 ― Eu não vou dormir com seu namorado, não se preocupe.― Falou com um dar de ombros e após uma pausa propositalmente dramática, ela continuou com um meio sorriso sacana em seus lábios. ― A não ser que ele peça.

    ― Fico feliz em saber que você não vai dormir com o meu marido, Evans. ― O de olhos azuis respondeu com um revirar de olhos, parecendo um pouco mais seguro com a afirmação dela, e optou por não dizer que ela já havia dormido com o marido dele, não queria perder seu emprego. Emprego esse que ainda não havia conquistado. ― Está contratada, então, chegue às cinco.

― Da manhã? ― Perguntou confusa, afinal era um pub e pelo o que entendia pubs costumavam abrir as onze ou depois do horário do almoço, sua confusão pareceu divertir os dois homens que riram abertamente antes de perceberem que ela não os acompanhava.

    ― Você não está falando sério, ‘tá? ―  Remus perguntou parecendo assustado e quando ela assentiu, o mais alto negou com um sorriso de lado, como se alguém estivesse sussurrando uma ótima piada em seu ouvido e ele estivesse se segurando para não gargalhar. ― Eu avisei que todo aquele álcool acabaria com sua cabeça, mas não sabia que faria tão cedo.

    ― Cale a boca, Lupin. ―  Ela resmungou, irritada, sentindo suas bochechas, orelhas e pescoço queimarem em vergonha. Lily odiava sentir-se envergonhada, a sensação de queimação em todo o corpo, e o modo como seus olhos sempre buscavam o chão. Era a pior sensação do mundo e sempre a remete as lembranças que tinha de casa. ― Estarei aqui amanhã, às cinco da tarde.

    ― Hoje. ― Corrigiu Sirius trocando um olhar divertido com seu marido, e a ruiva apenas gemeu sôfrega, percebendo que seus planos de se afogar em uma boa garrafa de conhaque e quem sabe encontrar alguém para aliviar a tensão do dia teriam que ser adiados por um bom e longo tempo. ― E é Black, agora, Evans.

    ― Mas já? ― Perguntou bobamente, não sabendo se ficava feliz por ter conseguido um emprego, o que significava que ela conseguiria ter um teto pelo próximo mês, ou se ficava triste por ter de adiar seus planos. ― Você mal me conhece, eu nem sei seu sobrenome e eu acredito que deveríamos assinar um contrato antes de você me mandar vir.

    ― Resolveremos isso hoje no final do seu treinamento, ruivinha. ― Ele respondeu ainda sorrindo e começou a se afastar para além do balcão, além de onde os olhos de Lily poderiam vê-lo, e apenas quando ele chegou em algo que parecia ser uma porta foi que ele virou seu rosto em direção da ruiva e falou em um tom divertido: ― Meu sobrenome é o mesmo do meu marido, Black, mas sempre pode me chamar de Lupin.

    E com isso ele saiu, deixando uma ruiva confusa e um Remus divertido para trás.

(...)

    Ela já estava trabalhando no Gryffindor Room há três semanas quando o conheceu.

    Cabelos encaracolados, óculos quadrados, olhos castanhos com uma leve cor esverdeada mais próxima a íris, pele dourada, roupas impecáveis e um sorriso deslumbrante de deixar qualquer ser humano com as pernas bambas. Ele usava jeans bonitos e de aparência nova, uma camiseta com as palavras “Save the Earth”, uma jaqueta jeans em seus ombros e tênis pretos limpíssimos. Um bom moço que não parecia em nada com a clientela do pub, que geralmente era composta por motoqueiros mal encarados e alguns turistas desavisados, e ainda assim ele estava fazendo seu caminho em direção ao bar.

― Olá. ― Ele disse com um sotaque terrivelmente inglês o qual chamou a atenção da ruiva, talvez ele fosse um turista desavisado e isso explicava as roupas dele. Caso resolvido Sherlock, ela pensou com um sorrisinho mental.

― Oi.― Lily respondeu vagamente não prestando muita atenção no cara que estava sentado no bar, era uma terça feira a noite e as coisas estavam calmas, talvez ela conseguisse sair mais cedo e ir para outro pub e beber alguma coisa, afinal lhe parecia levemente antiético ficar bêbada em seu ambiente de trabalho.

    O silêncio entre eles permaneceu por alguns minutos e Lily apenas continuou a balançar a cabeça conforme a música, algum pop meloso e chiclete, cujo o nome ela não conseguia lembrar. Ele a encarava, ela podia sentir seu olhar seguindo cada movimento dela, o que era algo levemente preocupante. Ela deveria chamar os seguranças? Ou Sirius? O homem parecia inofensivo, mas nem todos os psicopatas se parecem com psicopatas, então talvez ela devesse realmente se preocupar.

    ― Qual seu nome? ― o homem-lindo-que-pode-ser-um-psicopata perguntou com uma expressão curiosa a qual ela achou adorável, o que era uma palavra um tanto quanto incomum em seu vocabulário, e o encarou, apenas para encontrar os olhos mais expressivos que ela já viu. ― Eu sou James.

    ― Lily. ― A ruiva respondeu com a voz fria, ele era adorável, mas isso não significava que ela iria sair espalhando flores por aí. Sua frieza, porém, não pareceu incomodá-lo, na verdade isso pareceu apenas o incentivar a falar.

    ― Você é daqui de Hollywood, Lily? Posso te chamar de Lily, né?― ele perguntou com um olhar levemente sonhador, o tipo de olhar que ela mesma não tinha em seus olhos há anos, o pobre menino britânico estava sendo iludido pela mídia ainda. Ela não o respondeu vocalmente, apenas balançou a cabeça em negação, e ainda assim ele não desistiu de continuar a conversa ou se desanimou. ― Eu sou de Surrey, fica na Inglaterra.

    Lily optou em não respondê-lo e continuou a limpar o balcão, que já não estava sujo desde o começo da conversa, mas ela preferia ocupar-se a pensar nisso, James no entanto não pareceu se preocupar com a falta de resposta e desandou a falar sobre sua vida, e céus, ela daria qualquer coisa, bem quase qualquer coisa, para fazê-lo calar a maldita boca.

― Você é sempre tão calada? ― o moreno perguntou de repente, interrompendo seu próprio monólogo, que durou mais de vinte minutos, sobre como as multinacionais não se importavam com o meio ambiente ou qualquer coisa que ativistas falam sobre. A única certeza que Lily tinha era que nunca tentou entender sobre isso antes, e não seria agora que começaria.

― Nem sempre. ― A ruiva respondeu encarando por alguns segundos antes de ir atender um cliente, o primeiro que apareceu após o moreno que tentava desesperadamente conversar com ela por Deus sabe que motivo. Outro silêncio longo e constrangedor, ao menos constrangedor na visão dela uma vez que ele ainda sorria.

― Jamie! ― A voz de Sirius soou animada e apesar da música que estourava nas caixas de som ele não estava gritando, o que era surpreendente já que o de cabelos longos vivia gritando, apesar de raramente ser necessário. E com um sorriso que parecia, literalmente, rasgar seu rosto bonito, Sirius apareceu saindo, aparentemente, de lugar nenhum. ― Você nos encontrou!

Lily observou os dois homens se abraçarem com um olhar chocado, o qual ela se obrigou a não demonstrar no momento em que seu chefe virou-se para encará-la, com um meio sorriso e uma expressão marota, um conjunto que após uma semana de convivência, a ruiva apenas conseguia associar a Sirius Lupin-Black.

    ― E pelo visto conheceu nossa barman mais radiante. ― Comentou sarcasticamente apontando para Lily com um gesto de cabeça que apenas se limitou a encará-lo com frieza e dar um aceno de cabeça em direção ao James. Talvez ele não fosse um psicopata, mas, se ele era amigo de Sirius, com certeza não era cem por cento normal. ― Sorria um pouco mais, Evans, ou essa sua cara feia vai espantar ainda mais meus clientes.

    ― Se você não quer que eles se assustem não deveria ficar zanzando pelo bar, Black. ― Ela o retrucou um pouco impaciente, olhando em direção dos dois homens que ali estavam, apenas para revirar os olhos. Sirius e tal James, sorriam demais, e se havia uma coisa que Lily não compreendia eram pessoas excessivamente felizes.

    ― Vai se foder, Evans! ― Sirius respondeu com uma falsa carranca, fazendo-a rir verdadeiramente. Por mais irritante que Sirius fosse e por mais que  eles vivessem nesse pé de guerra, sempre implicando e se xingando, Lily havia encontrado algo muito parecido com o que era ter um amigo no moreno e, do jeito dela, reconhecia e demonstrava isso.

    Sem esperar a resposta dela, Sirius começou a arrastar James para outro lugar, e o de óculos apenas sorriu cordialmente em sua direção antes de acompanhar o amigo para algum lugar do pub onde os olhos dela não conseguiam enxergá-los. Era a primeira vez em anos que um homem, aparentemente hétero, não tentava algo a mais com ela quando ela estava em um bar, sendo ela a barman ou não. A sensação de ser tratada apenas como Lily, a barman mal-humorada ou apenas como uma mulher, e não como alguém para transar ou fazer qualquer coisa do gênero, era um tanto reconfortante e fazia com que ela se sentisse mais humana.

    Um sorriso surgiu em sua expressão séria, talvez ele não fosse tão ruim quanto ela julgou. Permitiu-se pensar nele por mais alguns instantes e desejou que o moreno passasse por ali sempre que pudesse, afinal, um homem bonito e, com muita sorte solteiro, não era uma coisa tão ruim de se ver com uma frequência quase que diária. 

Lily nunca admitiria, mas pelo restante da noite seus olhos buscavam os cabelos bagunçados de Potter toda vez que ouvia uma risada.

(...)

    Quase um mês inteiro se passou até que Lily se encontrasse com James novamente. Ela estava trabalhando duro no bar e gostava de seus chefes, apesar de negar isso quando questionada, apesar disso sua vida não havia mudado muito, ainda bebia e fumava mais que deveria, ainda frequentava festas de teor duvidosos e talvez por estar sempre fazendo alguma coisa que Lily nunca mais viu o moreno de cabelos bagunçados. No entanto, isso não significava que ela não estava ouvindo sobre ele, Sirius constantemente falava de seu melhor amigo, e ela já havia descoberto uma lista extensa de coisas sobre ele.

Sabia que ele era produtor musical, o que a surpreendeu porque ela conhecia a maioria dos produtores musicais e nunca havia visto o nome dele, e foi preciso que Sirius a explicasse que ele era formado em produção musical, mas que não estava exercendo o cargo, no entanto não a contou o porquê. James era de uma pequena cidade inglesa chamada East Yorkshire, o que explicava o sotaque forte, onde Sirius, Remus e um outro amigo também moraram por um longo tempo, sendo o moreno de óculos o único a ainda morar lá, e ele não era uma pessoa que curtia muito festas, ao menos segundo as palavras de Remus.

Era um sábado a noite, quase uma da manhã, o turno de Lily havia acabado a pouco tempo e ela estava quase morrendo por um cigarro, mas todo seu maço havia acabado durante seu intervalo, há quase três horas. Era uma noite fria, o que era incomum do lugar mesmo já sendo outono, mas conhecendo sua sorte, ou melhor a falta dela, deveria ter imaginado que no único dia em que ela esquecera o casaco e que o aquecedor, não só do apartamento, mas também o do seu carro haviam quebrado faria frio. Soltando um suspiro cansado, a ruiva entrou no carro abraçando seu corpo, amaldiçoava-se por ter escolhido aquele dia para usar um cropped de alças finas, mas ao menos estava de calça e não de shorts, o que poderia ser considerado uma pequena vitória. 

Dirigiu por longos minutos terríveis até a loja de conveniência mais próxima, controlando-se para não gritar a cada vez que algum carro parava na frente do seu, o que era irracional já que eles devem parar no sinal vermelho, mas as leis de trânsito não eram a preocupação de Lily quando seu corpo implorava por um pouco de nicotina. Assim que a placa neon apareceu, ela se apressou em estacionar o carro na primeira vaga que encontrou, ignorando tudo que estava ao seu redor, incluindo o frio que assolava sua pele. A mudança de temperatura quando entrou na loja, foi mais que brusca e Lily viu-se desejando ficar ali um pouco mais, a missão por um maço sendo posta de lado ao perceber que também estava com fome.

Antes de prosseguir pelo corredor onde ficavam os biscoitos, aquela loja era quase sua própria dispensa de tanto que ela ia ali, Lily conferiu sua carteira, apenas para perceber que só teria dinheiro para comprar uma das coisas, e sabendo que seu corpo necessitava muito mais da nicotina do que da comida, ela lançou um último olhar desejoso em direção ao mundo de Lay’s e Doritos para então seguir em direção ao caixa onde poderia comprar seu maço de Marlboro. 

    ― Um maço de Marlboro, por favor. ― Ela pediu lançando um último olhar na seção de biscoitos, e entregou sua nota de cinco dólares, junto da nota de um dólar, e recebeu seu maço com uma satisfação imensa, mesmo que ela soubesse que ele duraria apenas até o dia seguinte, isso é, se ela tivesse sorte.

Lily saiu da loja em passos apressados e encostou-se na parede de tijolos envelhecidos do local já que ali conseguia ser mais aquecido que seu carro e começou a tragar seu cigarro, apreciando o sabor da nicotina e em como tudo nela já parecia mais leve agora. Um sorriso irônico brotou nos lábios avermelhados dela, sua felicidade, a mesma que antes ela jurava não vender a qualquer pessoa, agora se resumia em um pequeno pedaço de papel com química dentro, resumia-se em algo que um dia ela repudiou e que poderia vir ser o motivo de sua morte.

    ― Não sabia que você fumava, Lily. ― Disse uma voz, levemente conhecida, ao seu lado, assustando o diabo para fora da ruiva, que se virou rapidamente em direção da pessoa. Era James, que em toda sua simplicidade, e beleza ela precisava admitir, estava parecendo bem aquecido ao seu lado e um tanto decepcionado. Ao menos ele não iria esperar grandes coisas vindas dela a partir de agora.

    ― E eu não sabia que você gostava de assustar pessoas a noite. ― retrucou ela com a voz ríspida, o que a fez se amaldiçoar no segundo seguinte pois não era sua intenção ser mal educada, e então como forma de redenção ela o estendeu o maço que estava em suas mãos. ― Aceita um?

    ― Eu não fumo, mas obrigado. ― James respondeu com sinceridade, sorrindo em direção da ruiva que soprava a fumaça em direção do céu sem estrelas. Lily sentia o olhar dele sobre si enquanto tentava focar nas espirais que a fumaça saíam de sua boca, encolheu-se levemente ao sentir o vento gelado, mas não tentou não dar qualquer indício de notar o que ele fazia. ― Eu sou novo na cidade ainda, e estava me perguntando se você não poderia me mostrar alguns restaurantes bacanas um dia desses, Remus disse que você mora aqui há alguns anos…

    Ele estava a chamando para sair de forma indireta? Não poderia ser! Por qual motivo alguém como ele se interessaria por alguém como ela? Não fazia o menor sentido. Entretanto bastou que ela olhasse em direção do rosto dele, que estava totalmente vermelho e apresentava feições envergonhadas, para que suas suspeitas provassem-se verdadeiras, apesar da confirmação, Lily ainda não tinha certeza se deveria confiar no rapaz. Ele encarou o silêncio dela como uma negação, e suas feições caíram levemente, mesmo que ele tentasse não demonstrar.

    ― Tem um não muito longe daqui, se quiser eu posso te levar até lá. ― Lily respondeu quietamente. Seus olhos involuntariamente olharam para seu relógio de pulso que marcava que já eram uma e vinte da manhã. O que James estava fazendo procurando um restaurante a essa hora? Ou melhor, o que ele, de todas as pessoas,estava fazendo em uma loja de conveniência nesse horário?

    Independente da resposta, isso não era da sua conta e ela deveria manter isso em mente. James não era nada dela para que ela ficasse preocupando-se com ele, com o horário tardio de suas refeições e de um provável sono desregulado. Até porque quem era ela para falar alguma coisa?

― Eu tô de carro então não vai demorar muito tempo. ― A ruiva continuou  casualmente como se não houvesse o encarado por cinco minutos em completo silêncio. Internamente estava torcendo para que ele fosse declinar a proposta dela, mas ignorando a sensatez, que talvez apenas ela possuísse naquele lugar, ele pareceu animado com a ideia. Xingou-se mentalmente de todos os nomes horríveis que ela conhecia pela ideia idiota, mas tentou sorrir para o moreno afinal a ideia de ir naquele exato momento havia sido dela.

    ― Obrigado, Lily! Eu provavelmente acabaria comendo salada com frango enquanto via Netflix, mas o Sirius disse que eu precisava sair um pouco, e às vezes ele está certo. Mas acho que preciso guardar isso em casa antes ― Comentou ele em voz animada seguindo os passos dela pelo estacionamento parecendo muito confortável em tagarelar sobre tudo o que via, e por Deus, a animação dele a afligia. E se ele esperasse que ela respondesse entusiasticamente? Certamente Sirius havia lhe informado quão rabugenta ela era, ele não estaria esperando isso, então por quê insistia em conversar com ela? Na verdade, como ele a encontrou?

    ― Como você sabia onde eu estava? ― A pergunta saiu da boca dela sem nenhuma permissão, interrompendo o moreno no meio da frase e fazendo com que seu rosto fosse preenchido pelo mais forte tom de vermelho. Céus, se ele tivesse qualquer interesse, ela havia acabado de aniquilá-lo. Pensou em pedir desculpas pela grosseria, ou até mesmo se explicar, mas sinceramente, ela não conseguia se forçar a ser tão gentil, principalmente quando ela estava se sentido tão exausta. Para ser sincera ela nunca se sentia inclinada a ser particularmente gentil, talvez fosse por isso que tinha tão poucos amigos.

    Há! Como se ela precisasse deles.

    ― Eu estava na loja, comprando azeite e um pouco de tofu. ― o de óculos explicou mostrando a sacola de compras, que apenas naquele momento que foi citado foi que ela o notou, parecia ter mais coisas que ele dizia, e talvez o rosto de Lily fosse mais expressivo que ela esperava, pois logo ele continuou a falar naquele mesmo tom animado.

―  Não tinha tofu. ― Continuou ele com uma careta chateada, fazendo uma pequena pausa para olhar para o céu sem estrelas antes de se voltar para Lily. ― Eu também comprei queijo brie e algumas coisas pra fazer um jantar, foi quando eu te vi perto da seção de biscoitos, pensei em dar um olá, mas você sumiu de vista.

    Apesar de parecer impossível, o rosto dela ficou ainda mais vermelho, e ele apenas sorriu daquela forma serena que apenas ele tinha. E o coração dela acelerou, pela primeira vez em um longo tempo, mas ela ignorou isso e apenas permitiu que James entrasse no carro e sem falar nada, Lily partiu com o moreno em direção ao restaurante.

    Durante todo o percurso que deveria ser de no máximo vinte minutos, mas que somados ao trânsito instável e infernal da cidade e o estranhamento da ruiva em ter um cara totalmente lindo, e pelo o que ela sabia bem sucedido, em seu carro indo para algo que parecia muito com um encontro, mas que poderia ser muito bem um dos momentos que Lily tinha onde ela fantasiava um pouco demais a vida e enxergava entrelinhas onde não existia. Como uma vez em seu primeiro ano de ensino médio onde ela jurou que Logan Mason, apenas o garoto mais lindo do primeiro ano, estava dando em cima dela quando na verdade, ele só queria saber as horas.

Sim, ela era patética nesse nível.

E James era de fato muito simpático, e passou os minutos no carro contado a ela, uma total estranha, sobre sua vida em East Yorkshire, sobre seu cachorro um buldogue chamado Michael, homenagem ao rei do pop, sobre sua galinha que se chamava Alanis, ele a contou até mesmo sobre um peixe dourado que ele teve quando criança que se chamava Freddie, em homenagem ao Freddie Mercury, obviamente. Apenas quando ela estacionou perto do restaurante foi que ele deu uma pausa, permitindo assim que Evans processasse a informação de toda a vida do garoto em sua mente em paz, percebendo no final que não havia aberto a boca uma vez sequer.

    ― Eu estou sendo muito chato? ― O de óculos perguntou quando eles estavam a poucos passos do restaurante, Joe’s, parecendo tímido e até mesmo constrangido pela primeira vez, e talvez tenha sido isso que fez com que a ruiva se sentisse levemente compadecida por ele, mas ainda assim, ela não falou, e ele viu isso como um motivo para continuar a falar. ― Eu acabo falando muito quando ‘tô nervoso, sabe? É um problema que eu sempre tive, e você me deixa nervoso, eu nem sei porquê, tudo bem que te acho muito linda, mas isso nunca foi o suficiente para me deixar assim, e sei lá, não me acha maluco, não, ‘tá? Desculpa, eu fico realmente nervoso perto de você.

    ― James, relaxa, ‘tá tudo bem. ― Lily respondeu com uma voz gentil, surpreendendo até a si mesma, porque realmente estava tudo bem, e ela talvez gostasse um pouco do jeito do homem. Eles trocaram um sorriso e entraram no restaurante.

(...)

    Depois do dia no restaurante, ver James passou a ser uma rotina, assim como era rotina jogar dardos com Sirius toda quarta-feira e ganhar dele cada vez e fumar observando o letreiro grande com o nome da cidade onde ela sempre sonhou em morar. O moreno aparecia toda terça e quinta-feira para buscá-la, afinal esses dois dias eram os únicos em que ela saía às oito da noite, e frequentemente aparecia nos sábados de madrugada, dizendo sempre que estava a procura de um dos amigos, mas sempre passava a metade da noite no bar conversando com ela enquanto a observava atender os clientes.

Eles tinham algo muito semelhante a encontros, apesar das negações constantes que ela fazia sempre que Remus e Sirius faziam um comentário sobre um possível novo casal, mas James e ela não eram um casal ou um possível novo casal, afinal não tinha como ser. Sim, ele havia dito que ficava nervoso perto dela e a achava bonita, mas eles estavam conversando há quase dois meses, ou melhor ele falava, e ela ocasionalmente comentava algumas coisas, o que surpreendentemente não o havia afastado, e é claro ela se sentia atraída por ele, porque ele era de fato lindo.

    Era segunda-feira, e ela estava de folga, como sempre. Ter o primeiro dia da semana de folga não era de todo ruim, afinal ela odiava as segundas-feiras, como quase todo ser humano decente. Até porque segunda era o dia em que ela precisava tirar forças para fazer permanecer viva por mais uma semana, e normalmente o sentimento que se apoderava dela, além da raiva absoluta, era um desânimo total que a fazia ficar na cama até o horário de seu turno no Gryffindor Room que começava apenas no dia seguinte.

Como estava de folga ela não precisava fazer o esforço de levantar-se da sua cama barata para se arrumar, e sabendo que só precisaria levantar-se no dia seguinte Lily ficou o dia todo vagando entre seu quarto, o segundo menor cômodo da casa porque o banheiro era obviamente menor, e a sala. A única mudança entre os dois cômodos era a cor das paredes, enquanto seu quarto tinha as paredes cinza claras cobertas de posters de bandas e filmes que ela amava, a sala era de um papel parede florido que ela não teve dinheiro para tirar ou cobrir o desastre que era aquela parede. No momento, o relógio marcava cinco da tarde, lá fora caía uma chuva leve, seu apartamento estava gelado, apesar das janelas fechadas. Lily  estava sentada em seu sofá vermelho de segunda mão, usando uma calça velha de moletom cinza e uma camiseta velha do Foo Fighters que ela havia afanado de alguém, seu cabelo não via uma escova desde o dia anterior e por esse motivo estava reunido em um rabo de cavalo mal feito, em suas mão direita estava uma tigela de cereal e na esquerda uma garrafa de vinho quando a bateram em sua porta.

Porque, é claro, sua campainha não funcionava. Havia quebrado desde o primeiro semestre em que estava morando ali e ela nunca havia se incomodado em trocar uma vez que não recebia visitas. Bem, nunca havia recebido até aquele momento. Com um suspiro meio irritado, afinal poucas pessoas sabiam onde ela morava e ela não estava no humor para conversar com nenhuma delas no momento, a ruiva encaminhou-se em passos pesados até a porta, cujo a pessoa estava esmurrando.

    ― Evans, eu estou congelando aqui, abre logo essa merda! ―  A voz inconfundível de Sirius Black soou através das paredes finas e com um suspiro irritado Lily abriu a porta, resistindo ao impulso de deixá-lo plantado ali. E como ele havia descoberto seu endereço, afinal? Ah, sim, ela precisou preencher essa informação na ficha dos funcionários.

    ― O que você quer, Sirius? Se for por culpa de mais uma de suas brigas com o Remus, eu não quero saber! Faça sexo de reconciliação e me deixe em paz. ― Ela gritou irritada abrindo a porta, as mãos na altura do peito e o rosto fechado, uma posição clara de quem estava na defensiva, mas suas defesas desarmaram quando seus olhos encontraram com os de James e de Remus que estavam ao lado do moreno de cabelos longos. Seu rosto ficou vermelho imediatamente, e levemente envergonhada ela permitiu que os três homens que apresentavam casacos levemente molhados e cabelos encharcados entrassem em seu apartamento. ― Então, o que vocês querem?

    ― Olá para você também, ruiva, eu estou muito bem, obrigado! ― Respondeu Sirius revirando os olhos e sentando-se no sofá dela sem permissão. Bem, ele nunca pedia permissão para nada, Lily não sabia porque ainda se surpreendia com isso. ― Isso é vinho e cereal? Por Deus, ruiva, você é louca.

    ― Seu apartamento não mudou muito desde a última vez que eu vim aqui. ― Remus comentou despretensiosamente olhando para o sofá menor, que ela trocou alguns meses depois da última vez que ele apareceu em sua casa, há quase três anos. O de cabelos castanhos claros parecia estar pensando a mesma coisa, pois um sorriso malicioso apareceu em seus lábios por alguns segundos. ― Você trocou o sofá, eu gostava daquele azul.

    “Se você realmente gostasse dele não teria estragado de maneiras irreparáveis.” Pensou com um sorriso sarcástico querendo fazer morada em seus lábios. Ela queria poder dizer isso, mas conhecendo Sirius, como conhecia, Lily duvidava que o comentário nada inocente não causaria a terceira guerra mundial e eram águas passadas

    ― Você já esteve aqui antes, Moony? ― James perguntou curioso com o rosto ilegível e ainda de pé ao lado dela que ainda estava próxima da porta, muito chocada com o que estava acontecendo para voltar a se sentar. Sirius estava com uma carranca alternando o olhar entre a ruiva e o marido, como se ele pudesse lê-los apenas com um olhar. Era um pouco assustador, ela precisava admitir.

    ― Sim, há uns anos. ― O moreno de olhos castanhos respondeu com um tom casual demais. Há! Agora ele se sentia envergonhado. Lily segurou, ou melhor tentou segurar, um revirar de olhos, mas era mais forte que ela, sinceramente homens eram outra coisa. Qual era o problema de dizer que eles haviam se beijado e bem, transado, alguns anos atrás? ― Você ainda está mantendo contato com a Marls?

    ― Às vezes a gente sai para alguma festa, mas você sabe como as coisas são para mim. A última foi no mês passado, no Halloween. ― Lily respondeu com um dar de ombros e finalmente saindo do seu estado de choque e apontando o menor sofá para os dois homens que ainda estavam de pé antes de aconchegar-se no sofá maior onde Sirius estava.

― Tire seus pés imundos da minha mesa de centro Black, ou eu te faço limpar ela com a língua. ― Disse a ruiva secamente. E então uma breve pausa apenas para observá-los. ― E vocês ainda não responderam minha pergunta.

    ― Eu fiquei preocupado com você hoje de manhã, Lily. ―  James foi quem respondeu após alguns segundos de silêncio constrangedor, ele estava olhando diretamente para ela e a ruiva jurava que ele estava lendo sua alma com aquele olhar. Sua resposta foi apenas um balançar de ombros como quem diz que eles não deveriam se preocupar com ela e um revirar de olhos demorado. ― É sério! Você sumiu do nada, e sei lá, fiquei com medo de ter te acontecido alguma coisa.

    ― Eu não preciso de babá, James, e eu ‘tô bem! ―  Ela respondeu com a voz irritada, pegando a garrafa de vinho de cima da mesa que ficava ao lado do braço do sofá e sorvendo um grande e longo gole. Quem eles achavam que eram para ficar dando palpite na vida dela assim? Eles mal a conheciam, pelo amor de Cristo! E ela era alguém muito normal e estava totalmente bem, algumas vezes ela exagerava na bebida. Mas afinal, quem nunca não é mesmo? Mas ela não estava passando por alguma crise ou qualquer coisa do tipo, e se estivesse saberia dizer, afinal, era a mente e o bem estar dela, certo?

    ― Ruiva, são cinco da tarde de uma segunda e você está bebendo vinho barato enquanto come um cereal que tem mais açúcar que tudo. Se isso é estar bem para você, já mostra que está com sérios problemas. ― Sirius falou tudo de uma vez com o rosto sério, naquele momento ele não parecia o cara que implicava com ela no trabalho ou que a mandava mensagens pedindo ajuda para se entender com Remus, ele ainda não sabia que ela e o Lupin haviam transado, e sim um cara sério e preocupado com alguém.

    Mas Lily não merecia a preocupaçã deles, sabia que não merecia. Ela era apenas uma mulher de vinte e três anos com sonhos frustrados, vícios, relacionamentos sem estrutura, um apartamento caindo aos pedaços, e havia sido escolha dela, seus pais faziam questão de lembrá-la sempre que tinham a oportunidade. Se ela tivesse aceitado a proposta de Severus, se ela não tivesse rejeitado romanticamente nada disso teria acontecido e ela estaria em New York, bem sucedida e sem precisar de alguém sentindo pena dela. Um sentimento de rancor e algo mais instalou-se no estômago de Lily e ela podia jurar que estava prestes a vomitar, ou pior, chorar.

Se isso fosse acontecer, precisava tirá-los de seu apartamento o mais rápido possível, odiava que sentissem pena dela, odiava que a enxergassem como alguém fraca, odiava sentir-se fraca e mais ainda odiava que aqueles três homens que ela conhecia há tão pouco tempo já tivessem a capacidade de descobrir quando ela estava se arrastando para uma onda de tristeza. Apertou os olhos fechando-os o máximo que conseguia, uma tentativa, até o momento bem sucedida, de não chorar.

    ― Vocês não precisam ter pena de mim só porque a gente conversa, às vezes. ― Foi o que Lily respondeu, sua voz soando ácida demais até para os próprios ouvidos, sabia que isso lhe custaria três grande amigos, e talvez algo que poderia ter sido um caso romântico, mas sabia que não poderia se dar o luxo de ser amada. Ela não merecia o amor ou o carinho de ninguém e o quanto antes ela os afastasse, menos se machucaria.

    Lily permaneceu de olhos fechados esperando que os passos deles seguissem em direção da porta e ela por fim pudesse deixar algumas lágrimas caírem e culpar a bebida, mesmo que no fundo ela soubesse que uma garrafa de vinho barato não era o suficiente para deixá-la ébria. Esperou por longos minutos, mas os passos ecoaram contra o piso de madeira, e o piso de seu apartamento sempre rangia, não tinha uma maneira de passar por eles silenciosamente. Então o silêncio só poderia significar uma coisa: eles ainda estavam ali. O que a deixava confusa, mais confusa do que quando fumou pela primeira vez e seus pensamentos ficaram leves, mais confusa do que quando beijou uma menina e gostou, mesmo que seus pais dissessem que era errado. Por que eles não a abandonaram como todas as pessoas de sua vida?

    Por que ainda se importavam quando nem mesmo ela se importava mais? Uma parte da mente dela, a parte que ela tentava matar com cigarros e álcool desde seus dezenove anos, sussurrou baixinho quase inaudível “Você merece ser feliz também, não há nada de errado com isso”, mas tão rápido quanto a voz chegou, ela se foi, uma voz muito mais forte e alta rebateu: “Você não é ninguém, eles só estão com pena da sua vida miserável.

    A voz mais alta regozijou em pura alegria quando passos ecoaram pelo pequeno apartamento, e a ruiva sentiu-se triste, apesar de já esperar por aquilo, toda vez que acontecia doía como se fosse a primeira vez. Abriu os olhos quando não escutou o barulho da porta se abrindo apenas para encontrar todos os três homens ao seu redor. James ajoelhou-se ficando em sua frente, Sirius permanecia ao seu lado no sofá e Remus agora estava do outro lado, todos os três com semblantes sérios.

    ― Lily você pode não perceber isso, mas somos amigos, e você gostando ou não, nós vamos nos preocupar com você e te ajudar em tudo que pudermos. ― Remus falou suavemente apoiando a mão no ombro da ruiva e o apertando suavemente com carinho. Os outros dois concordaram com um meio sorriso e a Evans permaneceu quieta, ainda sem saber o que pensar. Por que eles eram tão gentis? No entanto, nenhum deles pareceu se importar com o silêncio, não tão incomum dela e apenas acomodaram-se no sofá, todos espremendo-a de forma que ela se sentia abraçada.

    Era um sentimento que ela não lembrava há tempos, e isso fez com que sua garganta se fechasse ainda mais, o choro cada vez mais crescente em seu corpo, procurou por um cigarro em sua roupa e quando achou o maço que carregava, pegou um cigarro, ignorando seus visitantes que também estavam calados. Suas mãos tremiam, ela estava aflita e precisava aliviar aquele sentimento de alguma forma, mesmo que isso a tirasse alguns anos de vida. Ninguém sentiria sua falta, ela pensou com um sorriso depreciativo.

    ― Você não ousaria acender esse cigarro, Evans. ― Sirius falou com a voz irritada tirando o maço e o cigarro de suas mãos e os colocando no próprio bolso. Lily sentia-se irritada, mas não conseguia falar sentia que se tentasse falar acabaria chorando, e ela não iria chorar na frente deles. ― Não vou ficar assistindo você se matar na minha frente.

    E porque diabos você se importa? Sentiu vontade de gritar isso, usando todo o ar de seus pulmões para fazer um escândalo e quem sabe assim finalmente conseguir fazê-los sair de seu apartamento, e talvez manter uma relação estritamente profissional. Sua voz não saiu na primeira tentativa que fez, apenas um grunhido irritado saiu de sua garganta, e quando tentou falar novamente, não foram as palavras gritadas em sua mente que saíram de sua boca. Sabia, mesmo que apenas no mais íntimo de seu ser, que não deveria falar aquilo seria expor-se demais, e ela decididamente não estava no humor para sentimentalismos.

    ― Então feche os olhos. ― Respondeu sarcasticamente e os três bufaram irritados, apesar de soarem levemente divertidos também.

    ― Você não precisa bancar a durona sempre, Lil 's. ― James falou suavemente.

    A frase era simples e pouco efeito teria na maioria das pessoas, mas aquilo fez com que seu estômago pesasse ainda mais. Seus olhos buscaram os deles e tudo dentro dela gelou ao ver que ele tinha lágrimas nos olhos, e não parecia constrangido, na verdade ele as exibia quase que com orgulho. Talvez era o jeito do moreno mostrá-la como ele era superior.

    ― Eu não estou bancando nada, Potter. ― Lily respondeu com a voz cheia de arrogância ou ao menos tentou, sua voz não pareceu pertencê-la quando falou, soava quebrada e fraca. Sentia-se pequena, mas não queria demonstrar, queria ser forte e mostrá-los que não precisava de ninguém.

    ― Você é tão teimosa, ruiva. ― Remus resmungou com um grunhido irritado e levantou-se do sofá, saindo do lado de Lily apenas para jogar-se no colo de Sirius fazendo-se confortável, James também saiu de sua posição, mas agora para ocupar o lugar onde Remus estava antes, os braços dele a puxaram para um abraço e todo o corpo de Lily aqueceu-se, apesar dos protestos de sua mente, seu corpo relaxou contra o do moreno.

    ― Podemos parar de falar sobre mim por um tempo? ― Pediu ela com a voz levemente irritada, mas não conseguiu manter toda sua acidez com os braços de James ao redor de si. Por algum motivo seu corpo reagia de modo diferente quando ele a tocava, tudo parecia mais suave e melhor, e ela sentia que estava enlouquecendo um pouco mais toda vez que ele sorria, com o sorriso de propaganda de creme de dental, porque centenas de elefantes pisoteavam seu estômago a cada vez que isso acontecia.

    O sentimento apesar de familiar, em nada poderia ser comparado com as meras borboletas que sentia quando estava na companhia de Emmeline Vance, sua ex-namorada, a primeira pessoa por qual havia se apaixonado, sua primeira desilusão amorosa e um dos principais motivos de ter saído de casa há quase seis anos. Lily tinha planejado casar com a loira, e em North Carolina casamentos de pessoas do mesmo sexo ainda era proibido, ou como gostavam de dizer a cidade ainda estava presa na era medieval, no entanto, Lily nunca pode fazer o pedido a Emme, apenas uma semana antes do dia em que a ruiva pediria Vance em casamento, a loira terminou tudo o que tinham e sumiu.

    Segundo o post do instagram, onde Evans a seguia com seu perfil falso feito apenas para stalkear pessoas do seu passado, Emmeline estava agora casada com uma mulher chamada Catarina, estava morando em algum lugar perto de Paris, e tinha duas crianças. O que era no mínimo irônico, afinal sempre que Lily sugeria ter um bebê a loira recusava dizendo que não gostava tanto assim de crianças. Agora achava que Emmeline não gostava tanto assim, não era direcionado às crianças, e sim, à Lily.

    Talvez, Lily ainda não tivesse superado totalmente. Talvez ela nunca fosse superar totalmente.

    ― Tudo bem, Evans, mas não fique  feliz com isso não porque essa conversa ainda não acabou. ― Sirius a respondeu gesticulando exageradamente, como sempre fazia, e com uma voz ainda séria, mas que não era tão grave quanto antes. Ela assentiu e revirou os olhos, a ideia de receber sermão não lhe era nada agradável, por anos os pais dela fizeram isso, e agora Sirius, de todas pessoas, parecia disposto a fazer também. ― Agora, eu estou morrendo de fome, tem alguma coisa para comer aqui, além desse negócio aqui?

    ― Não é um “negócio”, Black. ― Lily respondeu irritada tomando a caixa de cereal das mãos do moreno que apenas riu pelo nariz e passou a caixa para Remus, fazendo com que a ruiva irritasse mais ainda. ― É o melhor cereal! É Honey Smacks!!!!

    ― Okay, srta. eu amo o Honey Smacks, tem alguma coisa decente para comer? ― Perguntou James com um sorriso de lado, cutucando as costelas de Lily levemente. Ele adorava fazer isso quando queria irritá-la, e isso a deixava em uma mistura de sentimentos confusos: os mais altos deles eram ‘mata esse cara agora!!!’, e o que falava ainda mais alto que esse era ‘por favor, James, beije minha boca’. Talvez ela tivesse o encarando um pouco intensamente demais, pois sequer precisou o responder para que ele soltasse uma gargalhada intensa, balançando a cabeça em negação no processo.

    ― Você é impossível, Lily! ― James exclamou ainda com o sorriso em seu olhar.

    A risada dele aquecia e fazia com o que os outros dois rirem também transformando o apartamento normalmente em vida de Lily em algo muito semelhante a um lar. Não uma casa, não, casa era apenas um lugar onde ela se escondia das chuvas e do calor, e seu apartamento era isso, mas agora..Agora assemelhava-se a um lar. Um lugar onde poderia sentir-se acolhida, onde teria amigos, abraços, risadas genuínas e, talvez, até mesmo amor.

    Lily sabia que não merecia um lar. Sabia que de todas as pessoas na Terra, ou talvez, na Galáxia, ela não era a que mais merecia um lugar como um lar, mas mesmo assim...Mesmo assim ela permitiu que James fizesse uma refeição cheia de coisas naturais, que Sirius e Remus mexessem em seus dvd’s e cd’s, que música alegre que há muito ela não escutava repercutir por todo seu apartamento, permitindo que tudo ficasse mais quente, mais vibrante, colorido e bonito. E talvez, pior que isso, ela permitiu que essas ações tornarem-se frequentes, permitiu-se ser feliz. 

(...)

Há três meses, ou talvez um pouco mais, Lily havia permitido que James, Sirius e Remus entrassem em sua vida, entrarem de verdade e não como os seus amigos de festas que apenas mandavam convites de festas e falavam sobre seus últimos ficantes. Não, os três eram algo muito mais constante e seguro, eles sabiam onde ela morava, visitavam-na semanalmente, e sempre falavam sobre coisas importantes como a família deles, sobre orfanatos que o casal visitava, os Black estavam começando a considerar ter uma criança após dois anos de casamento ou até mesmo sobre seus passados na Inglaterra. Lily nunca falou sobre seu passado. Ou sobre sua família.

    Como o pub estava sempre fechado nas segundas feiras, esse era o dia oficial da reunião deles, e com o passar das semanas a ruiva passou a esperar ansiosamente por isso. Animada o suficiente para sempre deixar sua casa o mais arrumada que ela conseguia durante a manhã, e para sempre separar roupas de camas para caso algum deles, normalmente James, quisesse ficar ali.

Eram quatro da tarde, e o inverno já havia ido embora, o que significava que o tempo levemente fresco também estava indo com ele e por isso ela precisaria aproveitar o máximo que podia para usar suas roupas pretas e jaquetas de couro antes que começasse ficar muito desconfortável para o uso delas. James era sempre o primeiro a chegar, e ela amava isso. Eles eram apenas amigos, é claro, mas o falatório dele a animava de um jeito que não existiam palavras o suficiente para expressar o que sentia, e claro a visão do corpo bonito dele todo confortável em sua sala era algo que ela amava.

Estava em sua cozinha preparando os ingredientes para os brownies que o James havia prometido ensiná-la, a companhia dele a mostrou que cozinhar tinha um efeito quase tão terapêutico quanto escrever músicas, suas mãos estavam focadas na ação de organizar cada ingrediente, mas sua cabeça estava distante, memórias de uma quarta feira, semanas antes, quando James apareceu de surpresa em seu apartamento passavam vividas por suas pálpebras como se estivesse acontecendo naquele exato momento.

As lembranças eram tão vivas que ela jurava ainda sentir os braços dele envolta de sua cintura, guiando os passos dela enquanto uma música calma soava ao fundo, a cozinha estava quente, mas dessa vez não tinha a ver com o forno ligado, e sim com o sentimento crescente de felicidade que crescia em seu peito. A mão quente do moreno acariciando seu rosto e colocando seus cabelos de lado, suas respirações se encontraram e estava muito próximo de um beijo acontecer, mas o hálito quente dele sob sua boca foi tudo que Lily recebeu, juntamente de um pedido de desculpas apressado quando ele desviou o olhar.

    “Me desculpe, Lily, mas é muito cedo para fazermos isso.” Uma longa pausa. “E eu não quero te machucar.”

Essas foram as palavras de James, soaram doces e cálidas contra seu ouvido, mas o coração dela doeu com aquelas palavras. Por que era cedo demais? Ela não era suficiente? Desejou gritar e perguntar, desejou chorar e expulsá-lo de seu apartamento, mas tudo que a ruiva fizera foi abraçá-lo com força e aquiescer, sua voz não encontrando espaço para os pensamentos conflitantes.

    A porta foi aberta bruscamente retirando-a de seus devaneios. Apenas Sirius, James e Remus, possuíam a chave de seu apartamento além dela. E por isso seu olhar imediatamente voou para a entrada da cozinha, seu coração já estava acelerado na expectativa de ver James, já estava preparando-se para não agir como uma louca quando escutasse voz bonita e grave dele e para não se derreter quando ele sorrisse doce em sua direção.

    Mas quando passos pesados demais para serem do moreno de óculos ecoaram pelo piso de madeira, o coração dela pulou uma batida, e um frio começou a descer por sua espinha e um pressentimento ruim instalou-se em seu estômago. E então Remus apareceu no vão da cozinha, os olhos castanhos pareciam perdidos e estavam cheios de lágrimas contidas. Lily olhou para o relógio, eram quatro e meia, James havia marcado de aparecer quatro e quinze. James nunca se atrasava. Remus nunca aparecia antes das cinco. Sirius sempre estava com seu marido, mas agora não estava ali.

    Alguma coisa estava errada. Alguma coisa estava muito errada.

    ― Cadê o James? ― A voz dela disse em um tom amedrontado que há tempos seus ouvidos não escutam, não desde quando pouco antes de seus dezoito anos correu aos prantos para a casa de sua namorada onde precisou contar o que lhe aconteceu, sobre como seu pai havia descoberto sobre elas. Lembrava-se de estar com medo de seu pai, tremendo pelo tapa que recebeu de sua mãe e temendo ter de escolher entre sua irmã mais nova e ser livre.

Foi a última vez que Lily sentiu tanto medo.

― Ele sofreu um acidente, Lil 's. ― Foi a resposta curta do moreno.

Um acidente. James havia sofrido um acidente. James estava em algum lugar sangrando e machucado, seu James. A pessoa que ela estava começando a cogitar começar um relacionamento. Um dos poucos caras que nunca foi nada além de gentil com ela, sem esperar qualquer coisa em troca, o homem que fazia com que ela comesse bem, que a fazia sorrir, que fazia um sol inteiro nascer dentro do corpo dela apenas com um olhar.

Naquele momento, Lily descobriu que estava apaixonada por James. E ainda assim, foi o pior dia de sua vida. 

(...)

    James estava em coma há três semanas. E Lily estava tentando ser forte, nunca foi o tipo de pessoas que fica se lamentando pelos cantos apenas porque algo deu errado, mas pela primeira vez que essa era a única coisa que queria fazer, não conseguia entender como havia se apegado tão rápido sem perceber o que estava acontecendo, não sabia dizer, apenas sabia que esse era o principal motivo pelo qual odiava se apegar.

    A dor da separação era muito grande para que ela suportasse.

    Se ela não tivesse ninguém, se não amasse alguém, não doeria. Não sentiria nada, é claro, muito menos estaria feliz, não de verdade. Sabia disso, tinha total consciência de que era uma escolha covarde, e por mais que doesse seu ego admitir, imatura. Às vezes a ignorância era uma dádiva, da qual ela usufruía no momento.

Incrivelmente, a dor de ver James, a pessoa mais tagarela e cheia de vida que ela conhecia, em uma cama de hospital parecendo branco demais, calado, ou melhor desacordado, e parecendo quase morto, fez com que sua inspiração voltasse. Era irônico em como algo que ela desejava há quase dois anos viesse por meio de uma das maiores dores que ela já sofrera, a dor das palavras de seu pai contra seu namoro com Emmeline em nada era comparado com a dor de não saber o que poderia acontecer a James. Sequer sabia se ele permaneceria vivo por muito tempo.

    O acidente havia sido terrível pelo o que os policiais contaram a Sirius e Remus, ao menos. Um motorista embriagado, doía pensar que um dia ela fizera algo como dirigir bêbada, ultrapassou um sinal vermelho em uma rodovia. O carro de James havia sido acertado em cheio, a lataria estava totalmente amassada e os vidros quebrados, o outro motorista, o culpado, cujo nome ela não fizera questão de saber, havia morrido na hora.

    Lily sequer sentiu-se vingada, preferiria que ele estivesse vivo e que ela pudesse socar o seu rosto até que ela sentisse alguma coisa, qualquer coisa, além da dor dilacerante que praticamente a rasgava. Não conseguia acreditar em como o destino era, de fato, cruel consigo, justamente quando ela se viu apaixonada, apaixonada de verdade, com todos os sentimentos intensos e cheios de coisas boas apaixonada, a pessoa pela qual ela se apaixonava entrava em coma.

    A vida era injusta, mas Lily já estava acostumada com a injustiça.

    Olhou novamente para o rosto pálido de James sem realmente vê-lo, ele estava nessa mesma posição há tempo o suficiente para que a imagem ficasse gravada em sua retina. Havia sido culpa dela. O acidente era sua culpa, se não tivesse se aproximado dele, se não tivesse o chamado para ir até sua casa naquele dia, se ela não houvesse ficado amiga de Sirius e Remus. Nada disto teria acontecido se ela não tivesse se aproximado deles naquele dia. James ainda estaria bem, tagarelando por aí, com o rosto cheio de vida. E ela, bem...Ela não estaria sofrendo agora. Como iria sentir-se triste quando não conhecia a felicidade? Mas eles haviam lhe mostrado a felicidade, lhe apresentado a sensação maravilhosa que era estar feliz e rodeada de pessoas que amava.  Se não conhecesse tal sentimento, não estaria sentindo falta dele agora.

Não estaria tão perdida.

― Srta. Evans? ― Um enfermeiro, ele parecia ser dez anos mais velho que ela, chamou da porta, seu olhar era piedoso. Lily estava farta de olhares assim, e ainda assim eles pareciam segui-la onde quer que ela fosse. Remexeu-se na cadeira desconfortável, seria ela realmente desconfortável, ou a situação fazia com que as pessoas sentissem-se desse modo?, e fitou impassível o enfermeiro de cabelos muito escuros, quase tão escuros quanto os de James.

― O horário de visitas acabou há cinco minutos. Já passam das oito. ― Continuou ele com a falta de resposta dela. A ruiva apenas permaneceu o encarando, seus ouvidos não pareciam compreender bem o que ele dizia, e o mais velho apenas suspirou, ou ao menos ela achava que havia sido um suspiro.

A fama dela já era presente no hospital, afinal estava ali desde o dia que o James havia chegado, e certamente os enfermeiros e médicos precisavam cuidar dos outros pacientes, e por isso nem sempre eles se importavam se ela ficava um tempo a mais. Mas hoje não foi um dia de sorte e por isso o que veio a seguir não foi o clique da porta se fechando e sim de uma voz falando calmamente:

― A senhorita precisa ir, srta. Evans.

Sentindo-se um pouco anestesiada, Lily levantou-se da cadeira e quase que roboticamente juntou suas coisas, e quando tudo estava em suas mãos, beijou os cabelos do homem ligado aos tubos de respiração, e em seguida beijou a curiosa cicatriz que marcava sua testa. E só então saiu do quarto morbidamente branco.

O choro estava preso em sua garganta há dias, mas nenhuma lágrima foi derramada, nem mesmo quando, ainda no segundo dia, a figura de Sirius chorando agarrou-se nela. Ele estava inconsolável, havia perdido seu irmão mais novo, uma das poucas pessoas de sua família de sangue de quem realmente gostava, há apenas um mês. Não conseguia imaginar perder James também. E sinceramente? Ela também não.

Não conseguia lembrar-se como chegou em casa, sabia que havia pulado no primeiro táxi que apareceu, que às pressas lhe deu seu endereço, mas todo o resto era um borrão, assim como todos os dias anteriores haviam sido. Ao chegar em seu apartamento, notou como ele parecia cada vez menos como um lar, cada dia longe de James fazia com que ela voltasse a ser quem era antes de conhecê-lo: um corpo cheio de sentimentos que não sabia expressar.

Claro, ainda havia Sirius e Remus, mas ela não conseguia olhá-los sem sentir-se, ainda mais, culpada por tudo que estava acontecendo. Se ao menos Lily não tivesse chamado James até alí, nada teria acontecido e todos estariam na casa do Potter, comendo pratos cheios de vegetais e nutrientes enquanto bebiam suco, de qualquer que fosse a fruta que James houvesse escolhido da vez, batizado com vodca para si e Remus, e apenas com um pouco de champagne para os outros dois. Ela não queria perdê-los, mas parecia que seu destino já havia sido traçado.

Nunca deveria tê-los deixado entrar em seu coração, mas como poderia adivinhar?

Soltou um suspiro que nem sabia que segurava e entrou em seu quarto, suas mãos ágeis indo em busca de algo que ela havia achado no dia anterior enquanto fazia uma limpa em sua escrivaninha, estava em busca de um maço de cigarros perdido e acabou achando seu caderno de composições. Uma letra em particular chamava sua atenção: City of stars.

 O primeiro, e único, verso da música parecia ridiculamente irônico levando em conta o que estava acontecendo em sua vida no momento. As estrelas não brilhavam para si, nem metafóricas ou, menos ainda, literalmente, as noites eram como quase sempre sem estrelas, mas, de fato, havia muito que ela não via. E como poderia ter visto? Como poderia ter, sequer imaginado, que acharia alguma coisa ali, principalmente após tantos anos procurando, buscando, e até mesmo implorando, por qualquer coisa. Havia achado o amor, ali, sabia agora que, sentia isso desde quando colocou os olhos em James, que aquela sensação estranha de coração acelerado era, de fato, amor.

Who knows?

I felt it from the first embrace

I shared with you

Na verdade, ela ousava dizer, quem poderia imaginar que eles iriam se apaixonar meses depois? James era um cara lindo, gentil e bom,e Lily, bem, ela não ia dizer que era feia, afinal ela era muito bonita, mas todas as outras importantes, aquelas que realmente importavam para pessoas como James Potter. Coisas como um bom caráter e dignidade. Ela não tinha nenhum dos dois, e ele, bem ele, tinha tudo, inclusive, o amor de Lily Evans.

Mesmo que isso não fosse muito. Ele tinha seu coração.

Não foi preciso nada grandioso para que ela se apaixonasse, apesar de ter demorado três meses, e um acidente que colocou o moreno em coma e logo após  levou a situação atual, e deplorável, dela. Apesar de saber que estava apaixonada por ele, que talvez, até mesmo chegasse a o amar, não se recordava como havia acontecido, e isso era bom. Se soubesse o que estava acontecendo, se ao menos duvidasse que poderia estar se apaixonando, certamente teria movido mundos para se impedir de cair nas garras afiadas do amor. Desconfiava que tudo havia começado com um abraço, algo pequeno, e bem simples, mas que mudou sua vida toda, para algo bom.

Sentiu seus dedos coçarem novamente, aquela sensação de que precisava escrever algo, qualquer coisa a consumiu cada vez mais, mais, mais e mais. Era uma comichão insistente, algo impossível de ignorar, que apenas a ideia de ignorar essa vontade, esse desejo, trazia-lhe uma dor palpável, quase física. A ideia agora já borbulhava em sua cabeça, e inesperadamente, com uma prática que achava que tinha perdido, Lily começou a compor. As palavras fluíam no papel com a mesma velocidade que seus pensamentos iam se solidificando, as lembranças sendo revividas e a paixão.

 Ah, a paixão, apenas aumentava,dóia, mas nunca parava. E quando o sol começou a subir pelo horizonte, ela tinha uma letra pronta, uma melodia meio completa, olheiras embaixo de olhos verdes muito apagados, e muito cansados, o rosto ainda marcado por lágrimas, e um coração cheio de dor. Dor de algo que poderia ter sido. De algo que poderia acontecer, ao menos, não mais.

Talvez nunca mais.

(...)

Mais duas semanas se passaram e nada havia mudado. Bem, quase nada, na verdade. Lily em um ímpeto de coragem mostrou a letra, a melodia, bem a música toda a Remus e Sirius, e contou tudo a eles. Tudo mesmo, todas as coisas sobre sua horrível existência, até mesmo sobre sua tatuagem ridícula de melância, e por mais estranho que pareça, eles a ouviram falar.

Não sabia bem o porquê de ter contado tudo aquilo, talvez o fato de James estar desacordado, e a pequena, porém existente, possibilidade dele nunca acordar a fazia querer tentar. Aquela música havia sido para ele, e ela queria que soubessem o quanto gostava dele. Deus, quem ela queria enganar com isso? O quanto ela o venerava, e até mesmo, o amava. Ela era completamente boba por ele, e não se sentia envergonhada disso, ao menos, não tanto. Não mais.

Nunca mais.

A produção foi, em grande parte, surpreendentemente fácil. Remus e Sirius assumiram o papel de agente dela, e a ajudaram com tudo, e bem, um pouco mais que tudo, talvez. Em uma semana, ela gravaria a música oficialmente, e isso a fazia sentir como se estivesse cumprindo algum propósito, mas, apesar da sensação maravilhosa que sentia em trabalhar com o que gostava, aquilo ainda não era o suficiente. Queria compartilhar sua felicidade com alguém.

Com James Potter.

E isso a levava até ao quarto estupidamente branco, em um hospital estupidamente grande que cheirava a algum desinfetante caro, cheio de enfermeiros com expressões estupidamente condescendentes, mas nem mesmo tudo isso foi capaz de fazê-la desistir de vê-lo. Nunca faria. Não, não importava o quanto ela odiava hospitais, o quanto ela detestava aquele branco doentio, por ele, ela moraria ali, até que ele se recuperasse, ou, ao menos, acordasse.

Suspirou ao entrar no quarto, a cama ainda estava quase que intocada, James respirava com a ajuda dos aparelhos e parecia até mesmo tranquilo, as flores, camélias vermelhas, que Lily trouxera no dia anterior. A poltrona cinza, levemente desconfortável, apesar de ela ainda ter a teoria que o desconforto vinha da situação e não do objeto, e até mesmo a manta que Remus havia trazido há quase uma semana estava no mesmo lugar, e isso era desconcertante. James era uma pessoa cheia de vida e mudava tudo do lugar, o tempo inteiro, e vê-lo tão complacente, tão calmo, e tão triste. Era terrível.

Sentia a necessidade de falar, queria falar, ansiava por isso, na verdade, ia além, ela precisava disso. Seus sentimentos, aqueles que diziam respeito a James, deveriam ser falados a ele, não? E já havia falado com seus amigos, Sirius e Remus compreenderam, e apoiaram-na, e até mesmo torciam para que quando o moreno acordasse, quando e não se, tudo entre eles se resolvessem. Então por que ela simplesmente não conseguia falar? Pegou na mão do moreno, aquilo precisava ser o suficiente para lhe dar apoio. Tinha de ser.

    ― James… ― Foi tudo que conseguiu dizer, ou melhor, sussurrar, antes das lágrimas começarem a rolar por seu rosto, ela queria tanto dizer o que sentia, o quanto o amava e o queria bem. Ela sentia-se tão mal por vê-lo ali, era injusto demais. O bolo em sua garganta aumentou, e as lágrimas correram ainda mais selvagemente por seu rosto, ela sabia que sairia dali com os olhos vermelhos e o rosto inchado, talvez pela primeira vez em dias, sabia que não deveria chorar, que deveria ser forte por James.

Por James.

    Imaginou ter sentido alguma coisa pressionando contra sua mão, exatamente a mão que estava segurando a de James, mas deveria ser apenas um espasmo. Já havia acontecido antes, o corpo dele as vezes pregava peças nela e nos amigos, e quando eles olhavam para o rosto dele, na esperança de ver aquele seu sorriso bonito e branco, e seus olhos castanhos esverdeados pousando gentilmente sobre eles, mas isso nunca havia acontecido, e, por isso não voltou seu olhar para seu rosto, isso apenas faria com que tudo fosse mais difícil, muito mais difícil. Como ela poderia dizer tudo aquilo que queria olhando no rosto complacente e pálido de alguém que normalmente é tão vivo? Ela desmoronaria, ainda mais, no caso.

    ― Eu sinto muito, James, de verdade. ― Sussurrou suavemente observando suas mãos juntas. Encaixavam-se perfeitamente, era confortável, poderia dizer até mesmo que conseguia ver eles andando por aí assim, talvez em um futuro não muito distante, haveria risadas e conversar, tinha certeza. Nunca seria silencioso e doloroso, nunca seria assim. Como ela nunca notou que suas mãos se encaixavam assim? Também não sabia bem porquê pedia desculpas. Poderia ser por tantas coisas, havia tantas coisas para se desculpar com James, por não ter percebido antes, por ter sido grosseira, e talvez….Na verdade, principalmente, por ter permitido que ele se apaixonasse por ela. ― Sinto muitíssimo mesmo. Ah, eu sinto muito mesmo, James, se eu apenas pudesse…

    ― Lily? ― A voz rouca de alguém que não usava há muito tempo se fez presente, e Lily virou seu pescoço rapidamente em direção da voz. Da voz de James, apenas para surpreender-se com os olhos dele a encarando, confusos, desfocados, mas abertos. Não conseguiu se conter e se jogou em cima do corpo do moreno, abraçando-o com toda força.

    ― Ah, James! ― Ela exclamou com tanta emoção que não reconheceu a própria voz, ele ainda segurava sua mão junto da dela. Seus olhos tentavam focar no rosto dela, era uma tentativa boba, afinal ele era praticamente cego quando estava sem óculos, mas apenas o fato de seus olhos estarem abertos era o suficiente. Lily sabia que sim.

    Sabia que não deveria beijá-lo, mas vê-lo ali era tão bom, e o quarto não parecia mais exageradamente branco, parecia apenas limpo, claro, bonito e cheio de luz, assim como o moreno de cabelos cacheados e bagunçados, com seus gentis olhos cor de avelã e sorriso fácil. Lily beijou James Potter pela primeira vez em uma cama de hospital, logo após ele acordar de um coma de quase dois meses.

    Foi o beijo mais mágico de toda sua vida, não havia língua, ou mãos em todos os lugares, apenas uma mão hesitante em seu rosto, lábios cálidos e ressecados contra os seus. Era doce, e único. Sentia que os dois estavam renascendo, sentia que tudo poderia mudar a partir daquele ponto, mudar para algo bom.

― Se eu soubesse que precisava parar no Hospital para te beijar teria feito isso há muito tempo. ― James comentou com uma risada quando ele estava recebendo alta, muitas semanas depois. A relação deles estava melhorando a cada dia que se passava, assim como a saúde do moreno de óculos, ainda não era exatamente um namoro, mas era algo. Algo único, bom e totalmente deles.

Lily riu e ajeitou o óculos que escorregava pela ponte de seu nariz. Ela ainda estava usando a roupa, uma coisa muito mais sofisticada que estava acostumada a usar, que usara para fechar o contrato com a gravadora de James. Sua inspiração havia voltado e seu primeiro seria ``City of stars''. Não poderia ter escolhido outro, nunca.

    ― Imagino o que preciso fazer para te pedir em namoro. ― Continuou com a voz bem humorada e os olhos fixos na ruiva. Empurrando a cadeira de rodas com uma das mãos, mas nada era o suficiente para tirar a animação dele. Menos ainda sua tagarelice. ― Voltar para o hospital, provavelmente.

    ― Você pode só pedir também. ― Respondeu com um sorriso sarcástico, colocando as malas dele no carro. Aquilo pareceu ser o suficiente para calá-lo.

    ― Você me daria a honra de ser minha namorada, Lily Evans? ― Perguntou com a voz polida, mas ela conseguia ouvir o nervosismo, o medo, a expectativa. Não o respondeu de cara, adorava torturá-lo com silêncios longos, em vez disso ajudou-o a entrar no carro, e apenas quando estava saindo do estacionamento do hospital foi que olhou para ele, que ainda fitava Lily com expectativa.

    ― E então? ― Perguntou James, não conseguindo ficar quieto por mais um minuto.

    ― É claro que aceito namorar você, idiota. ― Respondeu com carinho, beijando suavemente, permitindo-se sorrir verdadeiramente, o tipo de sorriso que chegava aos olhos, que fazia o moreno sorrir também.

― Que bom, porque eu amo você.

― E eu, eu amo você.

Era primavera.

E tudo de bom parecia acontecer na primavera.

Porque James era sua primavera.

    Fim.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenha gostado! Feliz jilytober galeris !!!!



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