Quem sou eu? escrita por moreutz


Capítulo 1
Vou morrer sozinho




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Prólogo

Eu vou morrer sozinho

As estrelas brilhavam no céu escuro e já beirava a meia-noite e, mesmo de dentro do ônibus, eu conseguia sentir a leveza que me encontrava, e como um peso saíra de mim. Terminar um relacionamento nunca era fácil, mas após um tempo acabou se tornando um costume, principalmente por eu fazer isso tanto quanto troco de roupa - palavras que Sirius dissera muitas vezes.

Não é como se meu namoro estivesse ruim, não mesmo! Meu namorado, ou melhor, ex, é um cara legal, me tratava bem e gostava de mim de verdade. E talvez seja esse o problema: me assusto com pessoas que gostam verdadeiramente de mim. 

Portanto, no âmbito de romance sou uma lástima e meus amigos concordam, e também não entendem por que eu insisto tanto em namorar se em algum momento acabo terminando com a pessoa que estou, mesmo estando tudo bem. Edgar também não entendeu isso - ele pode ter ficado bravo e pode, talvez, ter tentado acertar o vidro de ketchup que tinha em cima da mesa em mim.

Ninguém sabia que eu iria terminar tudo hoje - e nisso estou incluído. Foi decidido no meio do nosso jantar.Tínhamos acabado de sair do cinema e fomos até o bar que tem na mesma avenida do shopping e que tanto estávamos acostumados. E assim, quando ele pediu uma porção de mini pastéis vi que aquilo não era um futuro pra mim - ou até mesmo para ele - e acabei tudo. 

Uma transição nos olhos dele, que passaram de assustados, para bravos e por fim conformados, e eu soube que ouviria o que escuto em todas às vezes:

— Você nunca esteve afim de verdade, né? 

Não era verdade, mas também não era totalmente mentira. Gostava de Edgar, a forma como ele era engraçado e atencioso, sem contar que beijava bem,  e também bonito - demais— só… não era a coisa certa para o meu futuro. Como todas as pessoas antes dele também não haviam sido. 

Era difícil explicar isso para meus amigos, e mais difícil ainda para meus pais - minha mãe sempre dizia que eu iria morrer sozinho, por que sempre encontro o amor e deixo ele ir embora - mas era uma questão de me sentir confortável.

O meu maior relacionamento durou cerca de 3 meses, e acabou pelo mesmo motivo: não era o que eu via para o meu futuro, e essa revelação se deu em uma cena cotidiana. Além desse aspecto tem algo que costuma marcar que é a falta de sexo. Não por parte da pessoa com quem estou, mas por minha parte. Acontece que é difícil eu me sentir atraído dessa forma por alguém, e não é como se eu não tenha tentado, já fiz muitos esforços para conseguir, mas eu apenas não consigo, e, então, fico em um impasse pois:

1- Já tenho como primeiro passo desenvolver um laço com a pessoa antes de nos afundarmos em uma relação romântica dessa forma e;

2- Sinto muito pouca atração sexual e, quando sinto, é após algo muito intenso e processos menores envolvidos. E esses processos não tem um tempo estipulado. 

Em minha defesa, portanto, nem sempre sou eu quem termino tudo, por vezes quem está comigo é quem decide por um fim - e não julgo, sabe? Cada um com seus desejos e sentimentos - Então, acabo ficando neste ciclo onde conheço alguém - necessito de um vínculo afetivo - começamos a namorar - não sinto tanta atração sexual quanto o esperado pela outra pessoa, mesmo que eu tente  - vejo que não é aquilo que quero para mim (e às vezes a pessoa também vê isso) — eu acabo no ônibus com a cabeça na janela olhando o céu até chegar no ponto final do ônibus (que por acaso é onde o prédio que moro fica). E assim meus pensamentos costumam vaguear por aí, seja nos meus relacionamentos amorosos ou até nesses meus desejos e processos confusos até mesmo pra mim, e algumas vezes eu me pergunto: ‘’Será que realmente não estou fazendo algo errado?’’

Mas aprendi a não pensar dessa forma - acaba abrindo uma porta que é difícil de fechar de novo. 

Meu celular vibrou e chequei para ver quem era (não sem antes pular do banco de susto, já que estava tão imerso que esqueci que existia um mundo real logo ali).

Era Sirius, meu melhor amigo e o cara que mora comigo.

 

Telefone do Tiago 

Six: onde você tá, garoto?

Eu: No ônibus indo pra casa

Six: porque não tá com Edgar que por acaso tá aqui sentado na sala esperando pelas coisas dele?

Eu: POR DEUS ELE TÁ AI?

Six: sim? 

Eu: POR QUE?

Six: pra pegar as coisas dele, acabei de falar

Eu: Dá um jeito nisso aí, tenho mais uns 20 minutos até chegar

Six: você quer que eu faça o que? 

Eu: Sei lá, dá seus pulos, fala que tá passando mal que eu mando por correio, se mostre prestativo na amizade

Six: tá me devendo 

Eu: Não tô, agora vai.



Tudo o que eu menos queria agora era chegar em casa e dar de cara com o ex, que terminei não fazem nem 2 horas, sentado no meu sofá esperando pelas coisas dele. E que coisas eram essas? Ficamos juntos por duas semanas, não é possível que ele tenha deixado mais de 10 objetos por lá.

Ou, ele tem um plano para voltarmos, algo como, eu veria ele depois desse pouco tempo refletindo e, ao olhar em seus olhos, perceberia o terrível erro que cometi, correria até seus braços e nos afundaríamos em um belo de um beijo, mas isso não iria rolar, primeiro por que não curto clichês, segundo porque eu não estou apaixonado por ele. 

Eu não mantenho algo que eu não dê meu total empenho e atenção, seja em relações quaisquer ou coisas profissionais, e até lazeres, não tem por que me manter em algo se não estou sendo proveitoso e nem aproveitando. 

Porém, embora eu seja direto e sincero em momentos como esse, nunca havia dado um fora duas vezes em questão de horas em uma mesma pessoa, e não era uma experiência que gostaria de passar - principalmente se essa pessoa tenha a intenção de voltarmos e ainda sentir certas coisas.

Conseguia ver o ponto final pouco mais à frente e fui me levantando e indo até onde o motorista fica para me despedir dele - éramos amigos de longa data e viagens, além de que Jorge já me ouvira reclamar diversas vezes dos meus problemas e me oferecer uma bala de iogurte em troca, o que eu confesso sem de grande ajuda.

O carro de Edgar não estava em nenhum lugar por ali o que significava que Sirius havia dado um jeito e provavelmente me cobraria mais para frente, mas eu só adicionaria na lista que tínhamos desde pequenos: ‘’Coisas que devemos um para o outro’’ até ficarmos quites. 

Antes que eu pudesse abrir a porta do apartamento após subir dois lances de escada, ela se abre e dou de cara com um Remus Lupin com a sobrancelha arqueada pronto para falar:

— Do nada, Potter? — Ele virou de costas e foi entrando no ambiente. 

— Não foi do nada. — Fechei a porta atrás de mim e fui até a cozinha pegar um copo d’água.

— Foi bem analisado, pensado e tudo isso ou foi ‘’não rolou’’?

— Você fala como se eu fizesse muito esse tipo de coisa. 

—Você fala como se NÃO fizesse esse tipo de coisa. — Sirius estava sentado no sofá encarando a TV — Inclusive, ele mandou avisar que até final de semana passa para pegar tudo. 

— TUDO O QUE? — Gritei. 

— EU NÃO SEI, ELE SÓ FICAVA FALANDO ISSO. 

— CALEM A BOCA! — Remus gritou. Ele costumava colocar calma e sensatez na minha cabeça e de Sirius desde que nos conhecemos e costumava ser a pessoa que me acalmava em momentos de desespero. — O que houve, Tiago? O cara curtia você, tava te respeitando e ainda era bonito. 

— Eu sei disso tudo, mas então, quando ele foi pedir uma porção de mini 

pastéis eu vi que aquilo não era um futuro pra mim.

— Por causa de mini pastéis? Imagina se for sei lá, uma costela, você vai assassinar a pessoa? — Sirius falou e logo após soltou uma risada que demonstrava que havia achado engraçado sua observação. 

Remus e eu nos encaramos e reviramos os olhos, coisa que estávamos acostumados a fazer após longos anos com Sirius Black, e Remus ainda tinha um bônus por ser seu namorado.

— Continuando… Ficamos preocupados, é só isso, eu não sei dos seus sentimentos, só do que conta, mas cuidado para não ficar nessa procura insana e acabar deixando passar algo que pode ser bom, mesmo que não se encaixe direito na sua visão. - Lupin falou calmo e sincero.

— Eu sei, Rem, e vai dar tudo certo, mas eu não podia me colocar em uma posição onde talvez daqui há alguns anos eu acorde e me arrependa. Não é isso o que eu quero e procuro. — Me levantei da cadeira em que estava sentado, precisava de um banho e depois de alguma coisa para me distrair (além de descobrir o que o tudo de Edgar queria dizer. Será que o tudo era uma analogia para mim e na verdade ele me queria? Ou, provavelmente, meu ego se acostumou ao do Sirius e agora formulo coisas absurdas) — Vou tomar um banho. POR FAVOR, não entrem lá pois estarei PELADO!

— Não tenha vergonha do seu corpo, Tiago! — Black me olhou com um sorriso. 

—Vai se foder.

Sirius era meu melhor amigo desde o 6º ano, quando nos conhecemos e ainda somos mesmo com 25 anos, moramos juntos e nos entendemos bem. É o tipo de pessoa que você sente necessidade de se ter por perto, - mesmo que em alguns momentos queira matá-lo - está sempre disposto a ajudar e alegrar quem quer que seja, além de tudo isso, é extremamente bonito. Tem olhos castanhos bem escuros, cabelo preto e ondulado com uma mecha vermelha que havia feito no mês passado, maxilar marcado e costumava usar camisetas de bandas aleatórias (tinha uma onde estava com a estampa do Iron Maiden na frente e atrás estava uma foto da Turma do Pagode). 

Conhecemos Remus na mesma época, e pouco depois eu já sabia que um seria o futuro do outro, mesmo ambos negando. O garoto era mais calmo que nós dois e Pedro - outro amigo nosso - e tinha a tendência de nos colocar na linha ou conseguir nos livrar de uma detenção. Seus olhos transmitiam essa tranquilidade mesmo tendo passado por diversas coisas em sua vida, na perda de pessoas queridas e de violências sofridas, e, fosse como fosse, Remus não deixava de exibir um sorriso e um bom conselho quando precisávamos.

Pedro, por outro lado, se dividia em nos acompanhar nas aventuras ou ficar estudando na biblioteca com Lupin. Era mais tímido do que os três, isso com certeza, mas também com um dom pro humor que Sirius não conseguia ter. Ele, no caso Pedro, era mais baixo que nós três com a pele negra e sorriso suave, como minha mãe costumava dizer, o que fazia com que todos o percebessem como uma pessoa calma - o que era totalmente o contrário. 

Pensar em meus amigos me acalmava e passava uma sensação boa. Sabia que procurava por essa pessoa do seu futuro, mas também sabia que tinha várias logo ali comigo pessoas que me ajudam e apoiam. Até mesmo Marlene que costuma implicar com qualquer coisa que faço, se mostra gentil quando precisa. 

Saindo do banho e deitando na cama sem roupa nem nada - e garantindo que tranquei a porta antes de qualquer coisa - lembro que um novo dia estava perto e que esse novo dia era sábado, dia de irmos até o nosso bar preferido, ouvirmos qualquer um que toque e julgar essa pessoa mesmo que estejamos um pouco bêbados e em nenhuma condição de julgar alguém - coisa que Alice sempre nos lembra. 

Não sei bem como adormeci, apenas como acordei com a porta sendo quase arrombada pelo animal que eu chamava de amigo, gritando as 10 horas da manhã avisando que iríamos almoçar no bar. 

— PARA DE BATER!

— POR QUE VOCÊ TRANCOU? — Sirius continuava gritando, não era surpresa que dona Minerva do apartamento de baixo reclamasse tanto deles.

— PRA VOCÊ NÃO ENTRAR! 

— VOCÊ TÁ PELADO?

— SIM!

— COMO ASSIM? QUE COISA BIZARRA.

— É POR ISSO QUE EU TRANQUEI, SEU SEM NOÇÃO!

— COLOCA UMA ROUPA, SEU MANÍACO! 

— SIRIUS, SAI DA MINHA PORTA! — E com o último grito ouvi ele bufar atrás da porta e sair andando. 

Encarei o teto por mais tempo do que o planejado, e escolhi uma roupa por mais tempo do que esperava. Como se eu estivesse em piloto automático, mas na verdade apenas tentava descobrir o que Edgar realmente queria. 

Ao sair do meu quarto vejo os dois já me esperando:

— Ia mandar uma mensagem. — Remus sorri. 

— Tem que ensinar pra esse daí o que significa mensagem. — Apontei para 

Sirius que pegava a chave do carro. 

— Você vai no porta-malas. — Ele saiu na nossa frente — Vamos passar pegar o Pedro antes. 

— E a moça que vai dividir apartamento comigo vai me encontrar lá também, parece que ela é nova aqui, então já apresento ela pra todo mundo. — Remus explicou enquanto descíamos os degraus - Vocês vão gostar dela, super interativa, divertida e — Ele tossiu — bonita. 

— O tipo de Tiago, só falta saber se ela topa um relacionamento onde demore um tempo para criar um vínculo e depois comecem a namorar onde com 2 semanas eles possam terminar. Se for isso, ela cabe na qualificação. - Sirius ia em direção ao estacionamento. 

— Eu já te mandei ir se foder hoje? — Perguntei com cara de confuso. 

— Não. — Ele sorriu.

— Vai se foder, meu amigo!

— Obrigado, Ti! 

E entramos no carro.

O caminho até Pedro e depois até o bar foi tranquilo e conhecido, o que me passou uma sensação de felicidade e como se algo bom fosse realmente acontecer. Quase como se o futuro fosse aparecer para mim - mas como eu buscava por essa sensação muitas vezes nos dias, tentei deixar para lá. 

Sentamos na mesa de sempre, até que tive de ir ao banheiro. Precisava respirar e pensar que Edgar não daria uma de doido e apareceria ali de forma amigável porque ele nem gostava desse lugar. Mas sabia que eu e meus amigos gostavam. 

Depois de dar algumas jogadas de água no meu rosto, apontar para o espelho e dizer: ‘’Você é foda!’’, sai e fui novamente até meus amigos que se preparavam para ouvir a primeira pessoa a tocar.

Quando a música começou, um toque calmo mas com notas que eu conhecia por ser da música ‘'Exagerado" do Cazuza, senti todo o meu corpo estremeceu meus olhos pararam na mulher logo a frente no pequeno palco que tocava um violão e cantava com os olhos fechados, como se colocasse toda a sua energia naquilo - algo que admirava demais. 

Ela era ruiva e eu estava desesperado para poder olhar seus olhos, usava uma regata preta com um shorts e um cinto marrom, e no pé um all star meio rasgado e desbotado, portanto, não era preto. 

Eu estava tão preso naquela cena que não percebi que ainda estava em pé no meio do corredor, e precisou que um garçom me chamasse para que eu desse mais alguns passos e me sentasse na mesa certa.

— Sabem quem é? — Perguntei para todos.

— É a Lilian - Remus olhou para mim — a minha nova colega de apartamento.


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