A Segunda Onda escrita por Pandora Ventrue Black, Ella


Capítulo 9
Capítulo 8: Confie ou desista de avançar na luta


Notas iniciais do capítulo

“Não precisamos tanto da ajuda dos amigos, quanto da certeza da ajuda deles.” - Epicuro.



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P.O.V Aurora

 

Eu só tinha uma pergunta a fazer: Por que tinha que voltar justamente pra esse lugar ?

O vento batia em meu rosto e arrepiava minha pele. O mar do Leste sempre era conhecido por suas brisas quentes e águas calmas demais, era como um oásis no meio de governos corruptos e vidas inocentes ceifadas. Em outras circunstâncias, ou melhor dizendo, há alguns anos, meu coração saltitava de alegria por estar chegando à minha segunda casa.

Jazirati era o lugar favorito de Salazar, tinha sido nessas "terras calmas" onde eu tinha aprendido tudo sobre minha origem. Por ser afastado da maioria das outras nações, não havia quase nenhuma vida humana lá. Era cheio de árvores, era calmo e bom! O Rei Sol não havia a conquistado com sua podridão e corrupção. 

Contra a minha vontade, minha mente começou a vagar para o passado, eu lembrava da última vez que Salazar nos levou para esse lugar. Eu mal sabia que dois meses depois meu pai seria capturado e morto, mas naquela noite estava apenas nós três: Mamãe, eu e meu pai.

 

 Estava no fim do inverno e flores começavam a surgir em meio a grandes pinheiros. Era noite, Oceana tinha entrado dentro da cabana Brofemon para fazer mais um de seus chás milagrosos para nós. Papai estava sentado comigo na varanda, admirando o caminho luminoso que a lua estava fazendo do mar até o horizonte.

Estava frio, então eu tinha escolhido me aconchegar ao lado dele. Nenhum dos marinheiros conheciam esse seu lado, um lado bom e afetuoso, só nós duas e para mim isso bastava.  Eu tinha completado quinze anos naquela época, ainda não conseguia entender minha ligação com o mar e foi naquela noite que ele me mostrou o caminho, contudo, eu entendi também que meu pai escondia muitos problemas em seu coração. 

Nós dois estávamos cantando uma das canções milenares de nossos antepassados, a letra era antiga, estava escrita tanto em Crostaniano quanto em Junzs— a língua materna de meu pai. No momento que íamos recitar a frase “ E o passado me leva para além das estrelas, assim era meu lar dócil e misterioso”, ele se levantou do banco onde estávamos sentados e começou a andar para fora da cabana, em direção ao mar.

— Onde o senhor pensa que está indo? Paramos na melhor parte!

 Salazar olha para trás e me encara fixamente, um grande sorriso se apodera de seus lábios, tornando-o mais jovem por alguns instantes e mais bonito. A lua iluminava sua pele morena e seus lindos olhos âmbar, nessa noite ele tinha deixado o cabelo solto. Quem visse pensaria que ele era algum nômade do norte e não um dos mais temidos (Se não o mais temido) pirata dos nove oceanos.

— Resolvi visitar nosso lar novamente, a terra sempre me dá arrepios — Diz sorrindo e gesticulando as mãos freneticamente, como se a palavra “terra” realmente deixava-o enjoado— Você vem, minha sereia?

 Sem nem pensar duas vezes, eu corri para seu lado e nos  dirigimos para a beira do mar. Quando chegamos lá, ele se agachou e tentou me explicar como que a água fazia parte de nós. Ele segurou minha mão delicadamente, me pediu para fechar os olhos e começou a mover graciosamente meus dedos. Eu estava me divertindo muito, porém sentia que ele estava diferente.

— Você está bem?— Digo me virando para ele e encarando-o preocupada.

 Seus olhos tinham um estranho brilho de tristeza, sua mente vagava longe, pensativo demais para um homem como ele. Salazar  me encarou de volta depois de alguns segundos, me fez ficar em pé novamente e segurou meu rosto com suas duas mãos.

—P-pai? O que foi? — Uma intensa preocupação surge em meu peito — Por que parece tão incomodado?

— Quero que entenda uma coisa, Aurora — Sua voz se tornou séria e profunda — A água traz vida para todos, mas também ela destrói e ilude. Não permita que seu coração fique cego pelo o que seus olhos vêem...nem tudo é o que parece.

 

Eu não entendia o que ele dizia naquela época, mas com sua morte, algo cresceu dentro de mim: Uma estranha sensação de que essa revolução tinha mais importância do que eu pensava, só não sei se é de uma forma boa ou ruim.   

Já estava quase anoitecendo, raios dourados iluminavam meu rosto e parte do Diamante de Sangue, meu imponente navio. Rapidamente subo na lateral do navio, engatinho até a estátua de anjo esculpida no fronte da embarcação e sentei nas costas do anjo abraçando a cintura da criatura. 

Dorian nunca entendia porque eu fazia isso (Como se ele tivesse realmente me perguntado sobre algum momento) todas as vezes que eu matava algum soldado, eu sabia que era estranho porém eu não me importava. Era algo do meu pai, todas as vezes que ele decidia ir para Jazirati, vezes que sempre correspondia a dias que ele lutou, ele se sentava no anjo. "Eu preciso ver o horizonte, preciso olhar para frente nunca para trás…"

— Se não o passado me afoga — Sussurro tristemente.

Sinto mais uma lágrima cair do meu rosto. Não! Se recomponha Aurora, você tem visitas  na sua casa, no seu navio. Visitas que francamente eu não esperava, ainda não acreditava que uma hora eu estava lutando contra vários soldados e em segundos, um grupo de desconhecidos surgem para me ajudar. A líder deles, eu não sei o que pensar dela.

Caminho novamente para o navio, dava para ouvir os passos e gritaria dentro da sala principal. “Como a minha mãe está tão calma com aquela mulher lá dentro?”, pergunto-me encarando a porta da cabine e andando até o centro do navio, onde havia armas jogadas por todo lugar. Matrax… não adianta eu brigar com essas crianças que ainda vão transformar meu navio em um chiqueiro.  Começo a recolher as armas do chão, não que eu não tivesse amado reforços, claro que não! Estávamos quase encurralados e se não fosse Aloy, Marlly e Grel teriam morrido. Ambos foram acertados e estão impossibilitados de fazer qualquer coisa por semanas.  Talvez com eles há uma verdadeira chance de acabarmos com todos esses massacres sem sentido que esse governo está fazendo e o mais importante, eu irei vingar minha família. Minha mente estava mergulhada em inúmeros pensamentos, não estava no presente e sim no passado novamente. Bom, até uma voz estridente ao meu lado me interromper.

— E então, chegamos?

 Encarei a mulher ao meu lado. A expressão em sua face beirava uma tentativa fracassada de fingir alegria por estar falando comigo. Seus intensos olhos azuis me analisavam, possivelmente tentando decifrar o que eu sentia ao vê-la. 

 Agonia.

Era isso que eu sentia ao vê-la, não era nada em relação a quem ela era, independente de que tipo de trabalho essa mulher tinha, eu não podia negar o talento dela na luta. Fiquei muito feliz por ela ter me ajudado quando estava cercada pelos almofadinhas, mas agora, tudo nela me irritava. Talvez pela forma presunçosa que ela me olhava ou pelo fato de que eu não sabia o que esperar dela. Ou talvez (E eu tinha certeza que esse era o motivo mais forte) seu rosto me lembrava alguém, e isso acelerava meu coração imediatamente.

— Sim, estamos chegando — Digo respirando fundo. 

— Isso me deixa bem aliviada — Aloy fala em um tom quase que melancólico. 

— Vê aquele borrão negro no horizonte?— Digo apontando para o norte — Lá é Jazirati, em menos de dez minutos nós atracamos.

Ela se aproxima de mim lentamente e observa atentamente o lugar que apontei, vejo que suas mãos estão pousadas na barriga ainda. Bom, nem todos são bons em se acostumar a novos ambientes.

— Você não se dá muito bem com o mar, não é mesmo?— Me seguro para não rir.

 Ela me olha fixamente, seus olhos tomam um tom de desprezo, mas isso dura apenas alguns segundos.

— Sempre preferi a terra firme, navios me enjoam— Disse olhando em volta — Duvido muito que algum dia eu conseguiria gostar de morar em um lugar como esse.

Reviro os olhos, que menina mais fresca.

— Bom então trate de gostar, porque você vai ficar muito tempo em alto mar a partir de agora, minha cara aliada — Digo me virando novamente para o mar.

Ficamos em silêncio por algum tempo, quando a ouço rugir baixinho ao meu lado, eu conseguia irritá-la!

— Eu vou buscar os outros então — Sua voz era seca e fria, como a de uma assassina — Obrigada pela maravilhosa conversa, pirata.

Um sorriso inocente se forma em meus lábios, eu sabia que não deveria me portar assim, porém não podia negar quão bom foi vê-lo... Ou melhor, vê-la irritada.

— Eu não te criei com essa falta de educação.

Olho para trás, Oceana me encarava séria enquanto observava a assassina sumir perante nossos olhos.

— Eles são nossos aliados agora, Aurora! Devemos tratá-los como parte da tripulação.

Olho-a fixamente, eu não conseguia ficar séria ou mentir perto de minha mãe, por isso um leve sorriso tomou conta dos meus lábios.

— Eu sei mãe, é só que algo neles me incomoda — Diminuo o tom de voz — Talvez eu esteja sendo hipócrita em julgar pessoas como eles dado ao meu histórico de confusões, contudo eu não consigo evitar! Eu estou tentando, mesmo.

 Ficamos alguns segundos em silêncio, sinto mãos tocarem minha orelha delicadamente, meu corpo enrijece.

— Eu te conheço, não tente mentir para mim. Não é esse o motivo de por que você resolveu encrencar gratuitamente com ela.

Encaro-a perplexa. Seus olhos estavam pacíficos, ela não estava me manipulando ou atuando algo, ela sabia.

 Mas eu me recuso a aceitar.

— Perdão mãe, mas dessa vez  a senhora está enganada — Me viro de costas no momento que meu rosto começa a arder brutalmente.

 Nesse momento, todo o restante dos tripulantes, fixos e recentes, saem da cabine. Aloy e Altair saem juntamente  com outros dois homens, que eu podia estar errada, mas mantinham uma distância mínima de cada uma, como se precisassem protegê-las de algo.

— Oye, não lembro a última vez que casais subiram em meu navio — Digo sarcástica.

— O que você quis dizer com isso?— Pergunta a ladra confusa, olhando ora para mim ora para o homem atrás dela.

— Nada — Digo inocente.

Oceana aproxima sua boca do meu ouvido e sorri maliciosamente.

— Eu lembro sim da última vez que um casal esteve aqui.

O sorriso em meus lábios some imediatamente.

Jazirati ainda continua seus portos intactos, mesmo com o passar dos anos, o que tornava tudo mais nostálgico. O navio se agitou quando atracamos, pedi para apenas Dorian e Matrax descessem comigo, o restante dos marinheiros ficaram a bordo, de resto, todos os novos aliados e minha mãe me seguiram para dentro do lugar. 

Já estava anoite quando alcançamos a cabana, porém as luzes de dentro estavam acesas. Eu dizia “cabana”, mas meu pai nunca teve humildade como uma de suas qualidades, ela era grande, feita de madeira e em suas paredes haviam inúmeros desenhos e símbolos da pirataria, eu me sentia em casa. Quando entramos, uma luz intensa invadiu minha visão e senti o ambiente esquentar, olhei para a sala de estar e vi que a lareira estava acesa.

— Pensei ter ouvido você falar que não vinha aqui fazia anos — Pergunta Altair curiosa — Então por que aqui parece tão….arrumado?

Fechei os olhos e tentei respirar fundo. Só podia ser brincadeira.

— Mãe, por favor me diga que você não teve a ousadia de permitir que ele cuidasse do nosso lugar — Encaro-a séria.

 — Ele quem?— Pergunta o homem ao lado de Aloy: Ragnar creio eu.

 Minha mãe estava prestes a falar algo quando a calmaria da cabana é interrompida, e meu coração começa a saltitar freneticamente.

— Achou mesmo que eu ia perder a festa, peixinho dourado? — Pergunta uma voz grave logo atrás de mim.

Minha pele se arrepiou só de ouvir sua voz.

 Há um motivo do por que eu evitava vir para esse lugar, aqui realmente era uma ilha cheia de memórias e nostalgia e eu amava quando meu pai me trazia. Mas tinha sido aqui também que meu pai conheceu aquele que viraria um de seus aprendizes. Alto, moreno, com longos cabelos castanhos e ondulados, forte e com um profundo olhar verde-caramelo, que assombrava meus sonhos. O homem mais insuportável e irritantemente belo de todos os mares.

— Que legal, depois de anos o sorriso ambulante voltou a aparecer — Digo sorrindo sarcasticamente — Natanael, sempre se intrometendo onde não é chamado.

 O familiar sorriso presunçoso surge em sua face.

— Também senti saudades de você, Aurora.

Aloy ri sarcasticamente ao meu lado.

— Se conhecem?— Perguntou Ragnar.

— Muito — Responde Oceana prontamente.

 Todos olhamos para ela, eu sentia que isso tudo a divertia de algum modo.

— Natanael foi um dos aprendizes do meu marido — Explica calmamente minha mãe, evitando me olhar — Ele passou grande parte da vida dele conosco, por isso creio que sua presença nos ajudará imensamente — Diz reforçando essa última palavra — É muito bom ver um sorriso familiar, Natanael!

— Digo o mesmo...capitã — Fala Natanael quase como se estivesse envergonhado.

 Um silêncio se instalou por toda a sala, eu sentia a familiar e antiga raiva se apoderar de mim novamente, Natanael me olhava com o mesmo olhar de culpado de todas as vezes que me decepcionava.

 Bom, ele que suporte as consequências dos próprios atos.

 Altair suspira nervosa atrás de mim.

— Olha... Nós não temos muito tempo, então Oceana você poderia….

— Não, deixe-a falar o que precisa — Interrompe Ragnar, direcionando seus olhos para eu e Natanael.

— Ragnar, nós não temos tempo para esses conflitos amorosos — Sussurra Aloy para o homem ao seu lado.

— Ele tem razão, se existe algo que eu sei da Aurora é que ela nunca confia em alguém se houver algum acerto de contas pendentes — Natanael fala calmamente — Fale.

Aloy levanta os braços impaciente, em um sinal de rendição.

Ele sabia, me conhecia bem o suficiente para saber o que eu pensava.

Babaca.

— Por que você apareceu? — Minha voz se torna fria e seca.

Seu corpo se enriquece levemente, estava se preparando para o que eu realmente queria falar e isso me irritava mais.

— Aurora, acho que já estava claro…

— Não — Digo interrompendo-o — Por que você está aqui depois de dez anos?

Seu rosto enrubesce violentamente e a raiva guardada por anos finalmente surge em meu peito, fervilhando como lava.

— Ele te deu um lar, te deu comida e uma família. Nós sempre te tratamos com amor e carinho, te mostramos o quão bom era viver entre as sereias — Comecei a me aproximar dele lentamente — Você era um abandonado do governo e vivia com a humilhação de ser rejeitado pelo seu estúpido pai nobre apenas por ter como mãe uma mulher pirata, você era um bastardo apenas quando o encontramos e nós te demos dignidade, Salazar te deu a dignidade que você não tinha! 

— Aurora, por favor… — A voz de Oceana começou a enfraquecer, por que ela sabia que eu falava tudo o que ela  negou.

 Eu tinha que me acalmar, sentia meu sangue ferver e estava me descontrolando, mas eu nunca tinha me sentindo tão aliviada.

Eu nunca tinha percebido o quanto ele tinha me ferido.

— Não! Eu não vou deixar passar isso só por que a senhora o ama como um filho! Eu não aceito ingratos!— Exclamou

Meus olhos se enchiam de pura raiva a cada palavra que eu falava

— Nós te demos tudo que precisava, Natanael. E você só tinha que estar lá, naquela tarde, para ajudá-lo e defendê-lo! — Eu parei a centímetros do seu rosto — Mas você não estava, sabe por que? Porque você é um covarde, um covarde traidor. A partir daquele dia você não só traiu Salazar, mas como também  me traiu.

 Me viro de frente para todas as pessoas que estavam na sala, todos me encaravam perplexos. Menos Aloy, ela se mantinha sem expressão, como se minha discussão a incomodasse. Aquela mulher era fria.

Nada parecia quebrá-la

— Eu quero deixar uma coisa clara, nós somos aliados e vamos lutar lado a lado pela revolução. Isso aqui não é brincadeira, e eu não tenho tempo para marujos covardes, estamos entendidos? — Digo, extremamente irritada

Aloy me encara fixamente.

— A Seita não precisa desse tipo de sermão, pirata! — Aloy fala praticamente me fuzilando com o olhar, dessa forma ela parecia uma máquina assassina — Somos honrados, diferentemente de vocês!

— Não me ofenda, Aurora — Disse Altair andando para perto de mim — Pode ficar tranquila porque eu não preciso de nenhuma aula sobre confiança.

 Encarei-as por alguns segundos, elas não estavam mentindo.

— Já que gastamos muito tempo nessas.... Discussões comoventemente ridículas — Aloy se manifesta com um ar de superioridade e sarcasmo — Oceana, comece a se explicar!

Minha mãe respirou fundo e se sentou em uma das cadeira da sala, abrindo diante de nós um grande mapa.

— Prestem atenção… 


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