A Segunda Onda escrita por Pandora Ventrue Black, Ella


Capítulo 8
Capítulo 7: Laços de sangue


Notas iniciais do capítulo

"A verdadeira família é aquela unida pelo espírito e não pelo sangue" - Luiz Gasparetto



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P.O.V Aloisia

 

E lá estavam eles, como uma horda de pessoas acéfalas em busca de discórdia e miséria. Caminhavam como se estivessem sido enfeitiçados pelo ideal ilusório do Rei Sol. Aquilo me enjoava, ver como uma massa dessas conseguia se render a um ideal que massacra e marginaliza as pessoas. Os guardas caminhavam quase em uníssono, amedrontando os comerciantes e a população do porto, que faziam o seu melhor para exibir uma postura de condescendência

Do escritório de Altair podia ver perfeitamente a região do deques com…

— Um navio vermelho… As velas prateadas! — Exclamo surpresa, talvez seria o navio dos del Brofemon.

Me apoio na janela de Altair, precisava confirmar as minhas preces. Observo a multidão no porto: tripulantes, capitães e a guarda. A milícia real estava armada, pareciam procurar confusão e matar inocentes com certeza seria o efeito colateral que eles mais amavam. Não permitiria que aqueles homens fardados me tirassem a oportunidade de conhecer um pouco mais sobre a vida dupla de meu pai. 

Me viro para Ragnar, ele assente. Seu postura rígida e seu maxilar cerrado lhe devam a atitude de um guerreiro.

Aquele homem iria até os confins do mundo por mim.

E ele estava literalmente prestes a fazer isso.

— Temos um ataque no porto, Altair!  —  Um dos membros da Irmandade comenta, mas antes que a Abellona pudesse se pronunciar sobre o assunto eu acelero para fora da sala.

Ragnar caminhava a passos largos ao meu lado, Gaia me acompanhava, porém mais atrás. Parecia nervosa, entretanto determinada. A garota tinha se provado valente, uma revolucionária, se meu pai a conhecesse, sem sombra de dúvida a teria adotado. Meu coração aperta. Niklaus Stryker era um bom homem, um dos melhores na minha opinião, e tinha um grande coração.

 — Aonde pensa que está indo?  — Altair indaga como se mandasse em mim.

— Não assistirei a esse derrame de sangue inocente! — Exclamo

— E o que pensa que vai fazer?

— Fazer alguma coisa, lutar!

— Você vai morrer se entrar nessa briga!

— Não posso ficar parada observando toda essa desgraça! — Digo avançando em sua direção, ficando frente a frente com o perigo — E você bem sabe que o rei adoraria me ver morta.

Vejo seu maxilar cerrar, havia penetrado a carcaça de mafiosa fria e calculista de Abellona e isso me faz sorrir. Era bom saber os pontos fracos das pessoas, sendo elas inimigas ou amigas.

Dou as costas para a Irmandade e acelero para a região do porto. Corremos pelos becos e ruas estreitas de Saranska até que chegamos no banho de sangue. A Guarda Real atirava na população sem dó alguma e isso me enfurecia. Sinto meu poder esfriar as minhas mãos e subir até a minha espinha, arrepio-me. Não podia perder o controle… Não aqui e, muito menos, nem agora.

Ragnar toca a minha mão, me passando algo metálico e pesado. Um revólver.

— Como?

— Mãos leves como uma pluma! — Ele fala com um sorriso mostrando minha adaga.

— E a Gaia?

— Encontrarei os feridos e os levareis para um lugar seguro! — Ela fala, determinada.

— Então leve a arma! — Falo, preocupada em mantê-la segura.

— Não preciso disso! Nasci podendo dominar o fogo! —  Ela comenta com um leve sorriso no rosto. Maliciosa, sua alma era a de uma assassina, extremamente semelhante a minha.

— Cuide-se, baixinha — Ragnar diz, repousando suas mãos nos ombros de Gaia.

Ela se afasta de nós, entrando em uma das lojas do porto. Me viro para a batalha e respiro fundo. A minha primeira vítima é um homem da guarda que segurava uma jovem pelo pescoço, acerto-o em cheio na cabeça. 

A luta seria quase impossível de ganhar, a Guarda Real estava em números muito maiores. Estava em desvantagem, com certeza. Retiro da minha primeira morte uma espada e avanço na luta. O odor metálico invade as minhas narinas e os gritos de terror penetram a minha alma. Mantenho meu poder controlado, não podia diminuir ainda mais as nossas chances de vitória.

Sinto alguém se aproximar de mim e desvio rapidamente, atingindo-o na barriga com a espada. O soldado urra e cai no chão, agonizando. Analiso o campo de batalha, os navios estavam cercados, principalmente o de Salazar, que agora deveria ser de Aurora. Me encaminho naquela direção, desviando de golpes de espadas e aniquilando mais alguns guardas.

Sou impedida de continuar o meu caminho por seis soldados, que formam um círculo em minha volta. Atinjo o primeiro com uma bala em seu peito. Três avançam na minha direção, precisava ser extremamente cuidadosa, afinal eram três contra uma.

O duelo era difícil, mas consigo me livrar de um dos soldados ao enfiar a minha adaga em sua jugular e chutá-lo para longe da luta. Dois a um era bem mais fácil. Me movimento com agilidade, desviando dos golpes e apreciando os grunhidos de raiva dos homens fardados. Outro guarda padece perante a minha espada, sobrando apenas um. Entretanto sou surpreendida por uma bala que atinge a minha cintura.

A dor é excruciante, como se estivessem rasgando o meu músculo, fibra por fibra. Arfo de dor, mas não deixo o meu adversário tomar vantagem. Atinjo sua perna, forçando-o a ficar de joelhos e cravo a minha espada em seu peito. Me viro para o meu atirador e, enquanto tenta recarregar sua arma, acerto uma bala no meio de sua testa. Respiro fundo, tentando não lembrar da dor, mas o próximo adversário me agarra por trás, pelo pescoço. Sou imobilizada e socada na costela duas vezes antes de conseguir escapar. Cambaleio para frente, em busca de ar.

Rapidamente me viro para o homem de farda e atinjo-o com a adaga. A lâmina perfura seu ombro. Ele se encolhe, me dando tempo o suficiente para que eu pudesse recuperar a minha espada da minha vítima e acertar o novo adversário na barriga. Respiro fundo novamente, precisava esquecer da dor se pretendia ficar viva.

Tenho certeza que a bala está alojada na minha cintura e isso me deixava preocupada. Rasgo a roupa de um soldado qualquer e envolvo o meu corpo, pressionando com força a ferida. Olho ao redor, em busca de um rosto familiar ou uma forma de abrigo para que possa tentar retirar o projétil.

Mas antes que eu pudesse fazer qualquer coisa, sinto braços musculosos me agarrarem pelos ombros e me puxar para baixo, forçando-me a ajoelhar. Escuto o barulho de tiro passar por cima da minha cabeça.

— Você está ferida… — Ragnar fala ofegantemente e atirando no soldado que pretendia tirar a minha vida — Precisamos sair daqui!

— A bala ainda está alojada — Comento me levantando com dificuldade, sentindo os meus músculos rasgarem ainda mais.

Um soldado avança na minha direção e por conta da sua velocidade, não sou capaz de desviar de seu corpo. Nós dois caímos no chão. Perco o ar e sinto a bala adentrar mais um pouco no meu corpo. Solto um gemido de dor e soco a lateral do corpo do homem em cima de mim.

O maldito homem cai ao meu lado, mas finca sua espada no tecido da minha calça, me prendendo na madeira do porto. 

— Desgraçado! — Grito tentando apressadamente me desprender da madeira.

Quando olho para o infeliz vejo em seus olhos o brilho opaco da morte. Ragnar estava em cima dele, com uma espada fina cravada no peito do soldado. Me levanto, novamente, com dificuldade. Rangar me apoia com o seu corpo e caminhamos juntos para perto de um navio. O homem levanta a minha regata, juntamente com o curativo improvisado e examina a ferida.

— Ainda posso lutar...

— Não, de forma alguma!

— Não foi uma pergunta! — Exclamo me virando para luta

Por algum milagre o número de soldados havia diminuído drasticamente. 

Nós conseguiríamos ganhar.

Pela primeira vez!

— Vai acabar se matando,

— Pelo menos levarei alguns homens da Guarda comigo — Murmuro sem olhá-lo nos olhos.

— Ah, sim, claro! Como se eu fosse deixar!

— Cale-se, Ragnar! Você não é meu pai!

— Sim, está certa, não sou — Ragnar respira fundo e segura o meu queixo, forçando-me a olha-lo — Mas me importo com você, Aloy. 

Me calo e me afasto de seu toque. Não podia ser sentimental, não agora. Vejo um soldado ser arrastado para o mar por uma mão feita de água. A mulher que parecia estar no comando do oceano estava cercada por soldados. Acelero em sua direção, pois parecia precisar de ajuda, mas sou impedida por Ragnar, que segura o meu pulso com firmeza.

— Aloy! Você está ferida! Você ouviu alguma coisa do que eu disso?

— Não sou surda — Sibilo.

— Pois parece!

— Ragnar, uma mulher provavelmente sairá gravemente machucada se eu não a ajudar! — Digo, fuzilando Ragnar com o olhar e mudando completamente de assunto — Me solte!

— Você não pode salvar todo mundo, Aloy! — Ele exclama largando o meu braço.

— Me observe! — Digo lançando-o um olhar desafiador.

Dessa vez acelero sem ser barrada. Em um corpo no meio do caminha estava uma baioneta presa a um coldre. Pego a arma e me encaminho para onde a mulher estava. Seus cabelos castanhos refletiam a luz do amanhecer. Os seus olhos pareciam brilhar com a adrenalina da batalha, com certeza ela era uma pirata, sua maestria com espadas deixava isso óbvio. 

Mas algo diferente chama a minha atenção.

Em sua orelha estava um singelo brinco com um pingente de lua.

Idêntico ao meu colar.

Seria ela a filha de Salazar?

Adentro em sua luta ao atirar em um dos soldados. A mulher sorri e lança uma adaga em minha direção.

— Ótima mira! — Ela exclama enquanto desvia de um soco.

— Pensei que talvez precisasse de uma mãozinha!

Ela sorri e nocauteia o seu adversário, logo em seguida se aproxima de mim. Sua mão aperta a minha com sutileza, mas rapidamente percebo um guarda bradando sua espada em nossa direção. Faço uso do ombro da mulher como estabilizador da baioneta e atinjo o infeliz seguidor do Rei Sol.

— Obrigada! — Ela diz, mas sua feição alegre subitamente se altera, estava preocupada.

Ela me puxa para si, me fazendo rodopiar levemente. Quando me localizo na luta, percebo que estava de costas para a pirata. Nessa formação poderíamos vencer os guardas ao nosso redor.

— Meu nome é Aurora, a propósito — Ela comenta enquanto perfura a barriga de um homem com sua espada — Aurora del Brofemon!

Engulo em seco. Havia encontrado as filhas dos líderes da Revolução da Lua. As duas estavam em Saranska, apenas em lugares distantes da cidade. Se não fosse por essa revolta na região portuária, nós duas provavelmente não teríamos nos encontrado.

— Me chamo Aloisia Stryker, mas pode me chamar de Aloy!

Volto minha atenção para a luta.

Não demorou muito para que Aurora controlasse a água do oceano e levasse mais homens para o fundo do mar. Fui capaz de ceifar a vida de mais algumas dezenas até a luta finalmente findar. 

Estava cansada, sentia meu sangue jorrar da ferida, manchando a minha roupa. Quando percebo que não precisava mais lutar, me sinto falhar, mas meu corpo não toca o chão. Antes que eu pudesse cair com tudo na madeira do porto, sinto as mãos de Aurora me segurarem.

— Oye, calma! 

— Desculpe-me — Digo tentando me recompor e falhando miseravelmente, isso era patético.

— Ela está ferida! — Escuto a voz de Ragnar e vejo-o lutando para passar pela multidão.

— Stryker? — Altair fala se aproximando de nós 

Altair Abellona estava com alguns poucos ferimentos, mas parecia preocupada, não com ela mesma, obviamente, já que a pessoa que estava no chão sangrando era eu. Ragnar também não havia saído ileso. Ninguém ao nosso redor estava. Vejo faces idosas e jovens, todas cansadas, mas ao mesmo tempo triunfantes.

Isso significava uma chama acesa da revolução nos corações da população de Saranska. Sinto meu coração aquecer juntamente com a minha visão desfocar. Sabia que iria esmorecer,  mas não conseguia afastar a sensação de dever comprido, de finalmente ter deixado o Rei Sol com um gosto amargo na boca. 

Isso é o retorno da Revolução da Lua.

Isso é a mudança.

O Rei Sol e sua Guarda Real iriam pagar. 

Sinto o mundo ao meu redor escurecer. Sou abraçada pela escuridão, mas me deixo levar com alegria e satisfação.

 

⋆ ⋆ ⋆ ☪ ⋆ ⋆ ⋆

 

Abro os olhos com dificuldade. A dor de cabeça me impedia de raciocinar, parecia que havia bebido dois litros de whiskey. Uma ressaca desgraçada, isso definia muito bem o que estava sentindo.

Desconheço o lugar que me encontrava. Estava deitava em uma espécie de sofá, macio e sedoso com o seu tecido de veludo vermelho. Olho ao redor, tentando procurar alguma coisa familiar. O cômodo todo era feito de madeira escura, com estantes, velas e uma mesa no centro. Ao meu lado estava uma larga janela na qual eu podia ver o oceano e o céu se misturando no horizonte.

Automaticamente sinto o meu estômago embrulhar.

Droga!

Merda!

Me levanto rapidamente, colocando minha mão na boca. Sabia que vomitaria, é isso que o mar me causava. Acelero para fora do cômodo, adentrando no convés. Sinto os olhares julgadores dos marujos acompanhando a minha corrida até a borda do navio.

Jogo no oceano tudo o que não comi.

— Aloy! Você acordou! — A voz alegre de Rangar se aproxima de mim.

— Não! — Falo e elevo meu braço para que ele mantenha uma certa distância da minha pessoa e vomito novamente.

— Ah… — O meu colega de trabalho fala enquanto passa sua mão pelo cabelo e pescoço.

— Eu vou matar quem me colocou nesse navio e… — Tento falar mas sou interrompida pelo meu café da manhã não tomado que se joga nas águas frias do mar abaixo de mim

— Oye, Aloy! Fui eu que te trouxe à bordo! — A voz suave de Aurora ecoa pelo o navio — Deveria me agradecer! Se permanecesse em Saranska estaria presa a essa altura!

— Eu prefiro… A cadeia…

Respiro fundo tentando controlar a ânsia. Ragnar massageia os meus ombros, tentando aliviar a tensão do meu corpo.

— Um dos marujos tirou a bala de você, foi… Horrível — Ele fala, mas sua voz falha, como se estivesse emocionado — Você ficava acordando e gritando de dor… Tiveram que te embebedar para continuar o procedimento

— Isso explica a dor de cabeça infernal… — Comento apoiando os meus cotovelos na beirada de madeira do navio e respirando fundo — Para onde estamos indo?

— Ilhas Jazirati

— E onde fica esse infernozinho? 

— Distante… Faz quase dois dias que estamos navegando!

— Céus! Eu passei todo esse tempo apagada?

— Basicamente, sim — Ele me comente e vira o meu corpo para si, me olhando nos olhos, como se pudesse ver a minha alma — Nunca mais faça isso, Aloy! Eu achei que…

— Não achei que se livrará de mim tão cedo, Ragnar — Digo o interrompendo — Não padeço tão facilmente assim.

Toco sua face macia. Ele parecia exausto, como se não tivesse dormido. Entretanto, seus olhos escuros como a noite brilhavam misteriosamente. Queria beijá-lo. Queria rodopiar naquele convés em seus braços para comemorar o início da queda daquele maldito sistema, mas parecia ser errado. Antes de apagar, eu me sentia tão vitoriosa. Mas agora meu coração estava inquieto, sentia que algo daria errado.

— Você está certa — Ele suspira — Precisa mais do que uma simples bala para te derrubar.

Ele dá um sorriso amarelo e isso faz o meu coração apertar. Havia o arrastado para essa situação. Um pressentimento ruim assola avassaladoramente o meu corpo. Rapidamente olho para a minha marca. A regata preta deixava bem claro que algo estava errado comigo, mas a mancha da Escuridão ainda estava do mesmo tamanho, não havia aumentado nem diminuído.

— Oye! Pombinhos! Nos meus aposentos, agora! — Aurora exclama apontando para o interior do cômodo que eu acabara de sair.

Bufo e reviro os olhos. Me recomponho, endireitando a postura e prendendo minhas longas madeixas negras em um coque. A ânsia de vômito parecia ter diminuído um pouco, o que me deixava relativamente mais calma.

Pigarreio e me direciono para os aposentos de Aurora. Altair estava parada, perto das estantes. Com um livro em suas mãos. Parecia estressada, mas desde que a conheci, esse parece ser o seu normal. Não a julgo, ela faz parte de uma máfia, se preocupar com tudo era meio que seu trabalho.

Sentada á mesa estava uma senhora, bebericando de seu vinho elegantemente. Suas madeixas negras e compridas estavam perfeitamente presas em uma trança lateral. Seu olhos eram parecidos com os meus: azuis claros como o céu de uma manhã de verão.

— É bom vê-las reunidas — A mulher fala e direciona o seu olhar penetrante para mim — Me chamo Oceana, Aloy, e conheci muito bem o seu pai

Engulo em seco.

Aquela mulher conhecia o meu pai.

Finalmente respostas!

— Senhora, o meu pai… — Tento falar mas ela me interrompe ao levantar sua taça.

— Responderei todas as perguntas…  — Oceana fala provando e apreciando o seu vinho — Quando estivermos em terra!

— Jazirati está próxima! Ao fim da tarde estaremos lá! — Aurora fala analisando um grande mapa em uma mesa

— Eu não tenho todo esse tempo — Retruca Altair fechando presunçosamente o seu livro. 

— E eu não tenho essa quantidade de comida no estômago para alimentar os animais marinho — Comento, sentindo a ânsia retornar.

— Tudo em seu tempo, jovens!

Bufo e cruzo os braços.

— Não sairei daqui até consegui minhas respostas!

— Pode ficar plantada aí, então. Tenho um navio para comandar! — Aurora fala e escancara as portas do cômodo, como se mandasse no lugar todo. 

“Teoricamente, ela manda em todo o navio…”, penso e balanço a cabeça, ao perceber a burrice cometida

— Até mais ver! — A Capitã fala, rispidamente.

— Temos muitos tonéis de vinhos, queridos! — Oceana comenta terminando a sua taça.

Respiro fundo e me retiro do cômodo a passos barulhentos. Odiava o fato de Oceana ser tão misteriosa. Odiava Altair por ser tão presunçosa. Odiava Aurora por ser tão imponente.

Odiava tudo e todos naquele momento. 

Queria respostas, precisava delas, como um peixe precisa de água, como a Lua precisa do Sol.

Mas teria que esperar.

Não poderia fazer outra coisa senão esperar.

Certamente não poderia nadar de volta para Serry. Não assopraria as velas para que acelerasse a velocidade do navio, isso seria humanamente impossível. Eu não poderia fazer nada além de esperar e rezar para que o enjoo passasse.

Repouso meus cotovelos na beirada do navio eu vomito novamente.

A espera seria longa. Muito mais longa do que eu esperava e, até mesmo, imaginava. A voz de Oceana ecoa na minha mente. Eu me recusava a passar as próximas horas sóbria. Isso já era pedir demais.

Me encaminho para o interior do navio a procura dos tonéis de bebida alcoólica e facilmente o encontro. Naquele cubículo estavam diversas garrafas de vinho e rum, assim como barris com mais bebida alcoólica.

Ragnar também estava lá.  Quieto, pensativo, segurando uma garrafa de rum. Ele parecia triste, ansioso. 

Me aproximo dele e toco sua face.

— As vezes me pego pensando se sou louco… — Ele fala e toma uma grande dose de álcool. 

— Não entendi…

— Rum é realmente horrível!

— Ragnar? 

Ele me deixava tensa, ansiosa pelo seu toque. Seu calor me acalmava, sua voz grossa e levemente rouca me fazia arrepiar.

— Droga, eu te sigo até os confins do mundo, Aloy! Não percebe?

— E-Eu… Sinto muito!

— Assim que vi você partindo, correndo em direção a estação de trem eu não pensei duas vezes… — Ele fala e segura meu rosto entre suas mãos — Não consigo me imaginar sem você, Aloy.

— Ragnar… Eu… Eu temia que fosse me seguir, por isso saí sem avisar — Digo, incerta se estava falando a coisa certa — Não queria que se metesse em confusão…

— Me deixar para trás também não ajuda! Somos uma dupla, não lembra?

Ele estava certo! Desde que cheguei na seita nós treinamos juntos. Abigail costumava dizer que éramos metades quando separados e um ser inteiro quando juntos. Pego a garrafa de rum de suas mãos e engulo uma larga quantidade de álcool.

— O governo já tirou o meu pai de mim, eu… Não queria ver você empalado em uma praça!

— Somos assassinos, Aloy, nosso trabalho é não ser pego —  Ele fala, irritado —  Ou se esqueceu?

— E Salazar? Ele era um pirata, todos o temia. Sua fama não lhe adiantou de muita coisa, não é mesmo?

— Ele não era um Sanguinium.

Correto, de novo.

— Estava tentando proteger você, seu pai e todos que me deram abrigo em tempos tão difíceis... Você não entende, não é?

Ele bufa, revirando os olhos.

— Eu não devia estar viva — Falo observando a garrafa em minhas mãos — Todas as pessoas que tentaram me proteger morrem. Meu pai, Stella... Genevive. 

Respiro fundo e dou outro gole.

— Não posso me dar o luxo de perder vocês, minha única família.

— Irá nos perder se nos afastar, Aloy — Ragnar fala tocando a minha mão — Entenda que quando se é um Sanguinium, você ganha uma nova família. Não somos enlaçados por nosso sangue, mas, acredite em mim, querida, nós daremos a nossa vida por você.

— E é por isso que eu não queria que me seguisse.

— Como você mesma disse: Você não é meu pai!

Sorrio, me segurando para não socá-lo.

— Agora… Cala a boca e me beija!

E com isso ele me puxa para si, me calando com seus lábios macios e quentes. Me sinto relaxar, como se nada no mundo pudesse me atacar. Estava sedenta por aquilo.

Sedenta por Ragnar.


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