Bad liar. escrita por Jones


Capítulo 1
oh baby, let's make reality?




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/795068/chapter/1

Remus estava andando pela rua, tentando se distrair, sabe? Encontrar alguma inspiração naquela vidinha medíocre de apartamento quarto e sala e contas para pagar. Nosso protagonista tinha uma casquinha de sorvete na mão e seu walkman novinho da Sony na outra, uma vez que já tinha quebrado o pequeno prendedor que o fixava na calça jeans e se sentiria idiota com ele pendurado por uma cordinha no pescoço. Foi quando o viu atravessar a rua em sua direção.

Não exatamente em sua direção, para ser sincera, mas para o lado da rua onde Lupin estava. Ele estava ali com seus jeans gastos e manchados de tintas de diversas cores, o rosto com algumas olheiras e a barba por fazer. O cabelo castanho-escuro-quase-preto ficava mais claro sob o sol e os olhos adquiriam um tom menos cinzento e mais azulado.

— Cuidado com o sorvete. - o rapaz, com uma voz zombeteira, alertou Remus que enfim sentiu as gotas derretidas da casquinha em seus dedos.

— Obrigado. - ele murmurou para as costas do rapaz bonito que continuava andando em direção a padaria e confeitaria. - Droga.

Era mais um dia que ele falhava miseravelmente em disfarçar que encarava o cara sem piscar todos os dias que o via na rua – nada sutil nosso protagonista. Vivia se perguntando onde será que ele morava, qual seria o nome dele, como seria a textura daqueles cabelos escuros e se ele gostava que fossem puxados durante... Bem.

Remus Lupin, o personagem principal dessa história, sempre fora um cara nada namorador e galanteador. Era conhecido por meter os pés pelas mãos, gaguejar e pagar mico, como diziam naquela época. Em outros tempos, ele já teria pelo menos tentado perguntar tudo o que gostaria de saber, mesmo que isso lhe custasse toda a sua vergonha na cara. Entretanto, algo naquele rapaz o fazia perder a voz e as palavras, e o fazia se sentir em uma balada romântica a lá Journey.

Don’t stop believin’, Remus.

Bem, Remus estava desanimado com mais um fracasso em suas jornadas de caminhada de "distração" que ele fazia diariamente após o trabalho para ver o rapaz bonito e, obviamente, com sua falta de talento para o flerte. Entretanto, dessa vez ele não fingiu andar pelo quarteirão como sempre e simplesmente decidiu voltar para a casa e jogar uma água fria na cabeça para parar de ter pensamentos pecaminosos com estranhos escorregadios.

— Droga, onde está a porcaria da minha chave? – murmurou para si mesmo.

— Baunilha. - ouviu a voz do estranho o chamando enquanto ele abria a porta do próprio apartamento. - Eu imaginei que você deveria morar por aqui já que está sempre pela vizinhança com um sorvete de baunilha.

— Ah, eu sou o Baunilha. - Lupin murmurou sem graça. Quem era esse cara e o que ele fez com Remus? Gostava de acreditar que não era tão idiota. - Você anda me seguindo?

— Como? - o rapaz perguntou com a mão direita no bolso e uma sacola de papel pardo, provavelmente contendo pães, na mão esquerda.

— Primeiro eu te vejo todos os dias na rua. - ele encolheu os ombros. - E agora no meu prédio.

— Eu moro aqui. – o rapaz bonito tirou as chaves do bolso pelo chaveiro de tartaruga.

Eu moro aqui. - Lupin reforçou, como se fosse impossível que eles morassem na mesma cidade, no mesmo bairro, mesmo prédio, no mesmo andar. Devagar, eu sei.

— E eu aqui. - o rapaz apontou para a porta ao lado com os olhos semicerrados. - Você então é o cara dos mantras esquisitos de meditação.

— E você da música alta até tarde. - Lupin estava surpreso demais para dizer algo, mas ainda assim, para o nosso desespero, conseguiu construir uma frase com um grande potencial de destruir suas chances de formar um par com o rapaz gostoso: - Você já ouviu falar de fones de ouvido?

— E você já ouviu falar de alguma outra coisa além de mantras indianos que ninguém quer ouvir? - o vizinho disse em um tom mais arrogante que o pretendido. - Talvez eu te passe umas mixtapes sob a porta, para ver se você adquire algum gosto musical.

— Ah, não muito obrigado. - Remus cruzou os braços defensivamente. - Seu gosto musical é tão pretensioso e falso quanto os gemidos das suas companhias sexuais.

— E qual a sua base de comparação? - o vizinho colocou a chave em sua porta, pronto para girá-la. - Os zero sexos que você faz?

Remus olhou para o vizinho com os olhos semicerrados. Essa interação tinha tomado um caminho esquisito e tortuoso basicamente por sua causa, porém nunca daria o braço a torcer e admitiria derrota. Mesmo o vizinho sendo a pessoa mais atraente que ele já vira em toda sua vida, não conseguia contabilizar a quantidade de vezes que pensou em se mudar de vez por causa dos milhares de barulhos diferentes que atravessavam as paredes finas em todas as horas do dia.

Meditar quase não estava sendo o suficiente.

— Boa tarde e tenha um ótimo dia. - Remus entrou em seu apartamento de uma vez e bateu a porta atrás de si, deixando o vizinho confuso e irritado do lado de fora.

Mal pode evitar fechar os olhos ao ouvir a porta ao lado se batendo com força.

O engraçado-ou-irritante para Remus Lupin, era que mesmo com toda a raivinha que vinha cultivando pelo vizinho, aquele que ele nem sabia o nome e só soube do rosto nesta tarde, era que ainda assim ele figurava seus sonhos mais ardentes durante a noite.

— Se eu não te conhecesse, diria que você está a fim dele. - sua amiga disse após ouvi-lo descrever toda a situação de dias anteriores.

— Jamais. - Lupin mentiu.

Nunca admitiria que o vizinho gostoso estava tomando uma grande fração de sua mente. O que começara com um flerte no meio da rua, agora dominava 2/3 de sua atividade cerebral.

— Você é um péssimo mentiroso. - Lily riu, enquanto os servia de mais uma taça de vinho. - Por que você não se apresenta novamente?

— Porque esse cara é um saco. - Remus girou os olhos e bateu na parede quando a música alta começou a tocar, como vinha fazendo nos últimos dias.

— Isso é tão quarta série. - Lily quem girou os olhos dessa vez.

Obviamente a música do vizinho ficou mais alta. Já ouviu a máxima "quando um não quer, dois não brigam"? O contrário também era real.

— Você tá vendo com o que eu tenho que lidar? - ele respirou fundo de olhos fechados. - Eu deveria ligar para a polícia.

— Porque o seu vizinho está ouvindo música alta às oito da noite? - Lily riu. - A polícia vai achar que é realmente um caso de vida ou morte, com certeza.

Lupin bufou olhando para o teto.

Por que esse cara o deixava tão louco? Ele se perguntou, como se todos nós não soubéssemos a reposta: uma combinação de rosto perfeito, visual rebelde e sorrisos tortos sensuais. Quem não ficaria louco?

Quando Lily foi embora, Remus se concentrou em modos de retaliação: o que poderia fazer para dar ao seu vizinho um pouco do que ele merecia? E ele tinha certeza de que o vizinho estava fazendo aquilo de propósito, para tirá-lo do sério. Para fazê-lo ir até lá berrar com ele.

Quase esmurrando o travesseiro numa tentativa de amaciá-lo, Remus soube exatamente o que fazer e isso até o fez cair no sono um pouco mais rápido.

Às seis e quinze quando seu alarme despertou, vestiu suas roupas mais confortáveis, deixou os seus livros, calculadora e outros materiais de trabalho separados e ligou seu aparelho de som. Com uma fita de meditação guiada engatada, apertou o play e aumentou o volume ao máximo, na parede divisória dos apartamentos.

Contou sete respirações fundas até ouvir o som de alguém esmurrando sua porta.

— Isso. Não. É. Muito. Zen. De. Sua. Parte. - a cada pausa uma alfinetada de seu dedo indicador no peito de Remus Lupin.

— Estava alto? - ele sorriu com um ar de deboche nem um pouco disfarçado. - Nem percebi.

— Você é muito irritante, sabia? - a voz do vizinho era pura cólera. - A maneira que você fica batendo na minha parede como um senhor de setenta e oito anos é apenas...

— O que? - ele falou com os olhos semicerrados.

Aquele vizinho era realmente um espécime exemplar de homem. Estava vestindo apenas uma samba-canção larga e reveladora, que exibia suas pernas bem torneadas e seu abdômen e físico definidos, porém não definidos demais. Ele não parecia um homem daqueles que frequentavam academias. Talvez ele nadasse ou algo assim.

Remus estava desconcertado, primeiro porque nunca em seus sonhos mais loucos tinha chegado perto da perfeição das medidas daquele rapaz; segundo porque agora pensava em si, meio magro e alto demais tendo menos chances ainda com seu vizinho e arqui-inimigo.

E ainda porque estava se esforçando muito para não suspirar pela proximidade sensual ou para respirar fundo e sentir o cheiro refrescante do shampoo daqueles cabelos negros que caiam em camadas onduladas e desalinhadas até alguns dedos abaixo de sua linha do maxilar.

Mas, como eu já devo ter dito uma vez: não havia nada de sutil ali. Talvez sutileza não estivesse mesmo no vocabulário do nosso rapaz, já que agora ele estava encarando os lábios do vizinho bonito.

— Frustrante. - o vizinho completou a frase.

Não estou aqui para narrar outro ponto de vista, mas o vizinho estava claramente confuso com os sinais que estava recebendo de Remus – também conhecido como Baunilha: Primeiro o cara passava os dias batendo na parede, lançando indiretas em voz alta, tinha colocado mantras e meditações guiadas no cu da manhã apenas para irritá-lo e agora estava ali olhando-o como se quisesse tirar a única peça de roupa que vestia.

Eu também estaria confusa.

Você é frustrante. - Lupin disse com a voz baixa demais. Era quase um sussurro.

O que era frustrante era a vontade que tinha de enfiar a língua na boca dele de um jeito nada romântico e um tanto avassalador - de uma maneira que nunca tinha feito.

— Baunilha. - o vizinho disse, ainda próximo demais. - Você quer me beijar.

— Não. - Lupin mentiu.

— Você pode ser de lua, completamente louco... - ele tinha um sorriso torto e presunçoso nos lábios.

— Mas? – estava se segurando para não deixar o suspiro preso em sua garganta escapar.

— É um péssimo mentiroso. - o vizinho se virou e voltou para o seu apartamento.

E assim nosso protagonista nada sutil e péssimo mentiroso ficou a ver navios. Chupando dedo. Assistindo as costas do vizinho bonitão entrarem no apartamento.

Se não tivesse que ir para o escritório, talvez tomasse a coragem de bater na porta e berrar que não estava mentindo, mas todos - eu, você que está lendo, ele mesmo e o vizinho - sabiam que ele estava.

A quem ele queria enganar? Obviamente ele não teria a coragem. Entretanto, passou o dia inteiro dedicando três quartos de sua mente no vizinho e no que diria ao encontrá-lo na rua mais tarde e apenas um quarto aos números das taxas tributárias de alguma empresa que deveria estar calculando. É suficiente dizer que ele não conseguiu cumprir nenhum prazo naquele dia.

Só pensava em comprar algum sorvete de sabor diferente naquele dia, provar que não era sem graça e previsível como baunilha.

Porém, encarou tão indeciso o serviço de buffet daquela sorveteria que era o ponto exato entre seu trabalho e seu apartamento que, adivinhem, pegou mais uma vez seu sorvete de baunilha. Pensou que se quisesse chamar a atenção do vizinho, deveria ter vestido algo diferente daquele tom de cinza que usava como uniforme de trabalho. Hoje não tinha nem a companhia do seu parceiro para todas as horas, o walkman, que deixara em casa após sair com pressa.

Quanto mais ele tentava e tentava não pensar no vizinho gostoso, conseguia obter exatamente o efeito contrário. E mais um dia, sem falha, o vizinho atravessou a rua em sua direção, mas dessa vez com um sorriso maldoso no rosto. Não o cumprimentou nem nada, apenas sorriu de canto e acenou para o sorvete com os olhos, fazendo Remus girar os olhos e simplesmente ir embora.

Outra vez em casa levemente irritado e frustrado, com o bolo de envelopes que pegou na caixinha de correio do prédio, Remus fechou a porta com o pé enquanto passava os olhos pelas cartas.

— Sirius Black? - murmurou para si mesmo lendo o nome no envelope. - O carteiro deve ter se confundido.

Apartamento 51.

O dele era o 49. Então...

— Então o nome dele é Sirius. - ele demorou uns segundos para chegar a essa associação, mas eu já disse que às vezes ele era meio devagar. – Que espécie de nome é Sirius?

Diz o cara que se chama Remus.

Culpando seu ascendente em signo de fogo, ele resolveu que ia tomar um banho e colocar alguma coisa que o deixasse atraente, mesmo julgando a tarefa impossível. Resolveu vestir um jeans e uma camiseta branca e se sentiu o verdadeiro James Dean com as ondas dos cabelos castanhos dourados penteados para trás.

Antes que as chamas da sua coragem apagassem, ele bateu na porta do cara que agora sabia se chamar Sirius Black e sorriu satisfeito quando o viu o olhar de cima a baixo. Se tivesse se dado ao trabalho de colocar sapatos, talvez pudesse fingir que estava apenas casualmente de passagem. Se sentiu burro por não ter pensado nisso antes que o vizinho abrisse a porta.

Agora parecia que tinha se arrumado apenas para estar ali. O que era uma verdade absoluta.

— Você não tem camisetas? - as palavras lhe escapuliram da boca antes que pudesse pensar nelas.

Eu não acho de bom tom culpar o rapaz Lupin aqui, já que esse tipo de coisa como abdomens nus e torso bronzeado e tatuado, realmente tem o poder de nos desconcentrar e ele já é conhecido por meter os pés pelas mãos.

— Você saiu da sua casa para me perguntar sobre minhas roupas? - o olhar de divertimento era quase palpável. - Você deve estar muito a fim de mim mesmo.

— Eu não... - desistiu de mentir. - Vim lhe trazer essa carta, Sirius.

— Você anda mexendo na minha correspondência, Baunilha? - disse surpreso ao vê-lo lhe chamar pelo nome. Estava se divertindo tanto sendo o vizinho misterioso...

— Remus. - o rapaz resolveu corrigi-lo, defensivamente. - E não mexi em nada, estava no meio das minhas.

— Como o pior vizinho do mundo, devo lhe pedir desculpas por isso, não é? - Remus fingiu não notar os tons de desdém de sua voz. - Me desculpe pelo incômodo, Baunilha.

Remus o encarou com os olhos apertados. Queria ter imaginação suficiente para em cima da hora inventar um apelido criativo e irritante para ele.

Que homem frustrante!

— Só fiz o que bons vizinhos fazem. - ele estava o encarando indiscretamente mais uma vez.

— Na sua fantasia você é o bom vizinho e eu o mau vizinho? - Sirius perguntou de maneira petulante.

Lupin não confessaria, porque ele ainda tinha bom senso, que as fantasias dele aconteciam de maneira bem diferente, mas queria muito tirar aquele sorrisinho arrogante de seu rosto. E por isso, mais uma vez culpando seu ascendente em áries, empurrou o seu vizinho na parede do corredor e o beijou nos lábios de maneira firme e irritada. E, perdão aqui pela citação bíblica: ele viu que era bom. Muito bom. Não era de seu feitio beijar as pessoas sem permissão e até se sentiu culpado por isso, então resolveu separar o beijo, mesmo que estivesse (se não estivesse enganado, é claro) sendo correspondido com louvor. Virou-se de costas rapidamente e voltou para seu apartamento, fechando a porta atrás de si.

Com as costas na porta se permitiu respirar com as mãos no peito, tentando controlar o ar que entrava e saía de seus pulmões.

— Minha nossa. - suspirou, pensando na merda que tinha feito.

Não sabia se o vizinho gostava de homens, não sabia se ele era comprometido, não sabia se podia beija-lo... Enfim, se fosse somar o que sabia, não preencheria um parágrafo.

Ouviu uma batida na porta atrás de si e suprimiu uma interjeição de surpresa e susto.

Quando abriu a porta estava pronto para pedir desculpas, mas o rapaz Sirius também parecia dominado pela impulsividade e replicou os movimentos de um Lupin chocado.

Replicar é uma palavra injusta para as habilidades superiores de Sirius Black. Ele estava pressionando o rapaz contra a parede, tinha uma mão no seu cabelo arrumadinho e a outra segurava sua cintura.

Antes que a realidade de sua fantasia deixasse de ser real, Remus enfiou os dedos entre os fios ondulados e desgrenhados de seu cabelo. Ele tinha cheiro de shampoo de hortelã, tinta a óleo e pãezinhos com manteiga.

— Eu disse que você queria me beijar. - Sirius balbuciou com os lábios bem próximos aos de Remus.

— Aparentemente, você também queria. - ele não pode evitar tentar sorrir de maneira presunçosa. Apenas tentar mesmo. Seu sorriso estava mais para um "estou morrendo de felicidade, me beije de novo".

Porém, nosso segundo mocinho na história era um bom provocador, daqueles que vão lá, atiçam e viram as costas para ir embora. O protagonista que queria mais, ficou mais uma vez confuso ao assistir aquele belo traseiro se encaminhar de volta ao seu apartamento.

— Quanto tempo vamos ficar nessa dança? - Lupin perguntou para si.

Ele queria focar na parte boa, aquela que eles deixam de ser implicantes um com o outro e começam a se dar uns amassos e algo a mais, sabe? A pergunta básica era: como se faz isso?

Precisou tomar outro banho quente e longo, o qual não preciso descrever pois não sou indiscreta. Vou resumir em: Remus tinha fantasias muito criativas e estava realmente atiçado naquele momento.

— Baunilha? - ouviu alguém gritar da porta. Alguém? Todos nós sabemos exatamente quem era.

Se enrolou rapidamente com a toalha na cintura e foi até a porta. Podia ter pedido um segundo para vestir algumas roupas, mas cá para nós, o rapaz estava amedrontado que o vizinho simplesmente fosse embora se não tivesse respostas.

Sirius também estava de banho tomado, sem as roupas manchadas de tinta e um cheirinho especial de sabonete.

Se olharam surpresos, na verdade se examinaram da cabeça aos pés. E eu posso te dizer com toda a certeza que haviam faíscas e fagulhas voando naquele momento.

— Entre. - nada sutil em seu olhar devorador, Lupin fez um gesto casual segurando a toalha com uma mão e com a outra indicando para que ele entrasse.

— Achei que você já tinha tomado banho. – provocou com aquele sorriso arrogante e sensual, insinuando fatos que sabemos serem reais.

— Saia. – Remus girou os olhos envergonhado, porém ainda sorria.

— Estou brincando. – Sirius mordeu o lábio inferior. – Espera...

Sirius tinha um engradado de cerveja em uma das mãos e uma pizza na outra. Remus se perguntou se era por isso que ele foi embora tão repentinamente, o que era realmente um alívio já que seu primeiro pensamento era o de que com certeza beijava mal.

— Eu pensei que... - o vizinho estava nervoso. Que fofo. - Que talvez a gente pudesse ao invés de gritar um com o outro, conversar. Aqui está minha oferta de paz.

— Parece uma boa ideia. - ele sorriu timidamente e olhou para si mesmo ainda de toalha. - Eu só vou vestir alguma coisa.

— Apesar de estar difícil de me concentrar, você não me parece nada mal. - Sirius era um rapaz direto e safadinho. Gosto dele. - Está bem bonito para falar a verdade.

Remus sorriu ainda mais, mesmo que seu rosto estivesse com um tom semelhante ao de um pimentão. Desconsertado, foi até o quarto de onde gritou que já voltava. Vestiu seus jeans novamente e uma camiseta preta para dizer que tinha outras roupas bonitas - não que ligasse muito para isso ou as tivesse de fato. Penteou o cabelo novamente, tentando canalizar uma pessoa confiante novamente.

Era como se estivesse a caminho de um primeiro encontro em muito tempo. Respirou fundo. Estava nervoso de verdade.

— Ele é só alguém com o potencial de amigo ou algo a mais - disse para o seu reflexo no espelho antes de sair do quarto e olhar para Sirius acertando a mesa.

Como se isso não fosse grande coisa.

— Estava pensando que você tinha desistido. - Sirius gracejou com os olhos cheios de expectativa. - Sabe? De conversar comigo.

— Só estava me vestido. - tentou manter um tom de voz displicente e deu de ombros, fazendo Sirius sorrir.

Péssimo mentiroso.

— Sobre o que você quer falar? - Remus perguntou, indo buscar as cervejas que Sirius tinha deixado na geladeira.

— Não sei. - ele deu de ombros. - Sobre o que as pessoas falam num encontro?

— Isso é um encontro? - Remus mordeu o lábio inferior, tentando reprimir um sorriso.

— Pode ser, se você quiser que seja. - ele lhe lançou uma piscadela.

— Você quer que seja? - ora, ora, Remus sedutor.

— Bastante. - o vizinho confessou, erguendo a longneck em um brinde.

Remus encostou a garrafa na dele dando graças aos céus por Sirius ser uma pessoa bem mais direta que ele.

— O que eu preciso saber sobre você? Além de que você é um amante de baunilha e mantras de meditação. - ele perguntou, pegando um pedaço de pizza com as mãos.

— Nada muito interessante. - Remus deu de ombros, dessa vez falando a verdade. - Tenho um emprego chato, vinte e seis anos e acho que baunilha é ótimo.

— Baunilha tem sido meu sabor favorito. - ele murmurou com um sorriso nos lábios. - Nos últimos meses.

— Você sempre faz isso? - Remus perguntou cruzando os braços.

— O que? - perguntou inocentemente.

— Veja, agora eu não sei se você estava falando do sabor baunilha ou de mim. - perguntou meio envergonhado. - Daí provavelmente eu vou passar a noite me perguntando e analisando se eu estou interpretando coisas demais numa simples frase.

— Você é... - ele disse meio que rindo. - Deixa pra lá.

— Não, me fale, eu aguento. - Remus disse nervoso. - Eu sou o que? Desastrado? Desajeitado? Afobado? Perdido? Lerdo? Implicante?

— Hiperativo? - Sirius o interrompeu, rindo. - Eu ia dizer algo como encantador.

— Encantador. - ele meditou a palavra, tentando analisar o que isso significava.

Sirius sorriu para a maneira como Remus sempre parecia estar analisando alguma coisa e, como sou uma narradora onipresente, direi o que ele estava pensando: ele queria dizer que Remus era fofo, que achava ele bonito e que estava a fim dele há algum tempo.

— Quando eu falei de baunilha estava falando de você, Baunilha. - pensou que se dissesse isso, ele pararia de ficar tanto dentro da própria cabeça.

— O que?

— Ok. - ele respirou fundo e girou os olhos. - Eu posso ir à padaria em qualquer horário, mas daí eu perderia o rapaz gostoso tomando sorvete de baunilha de maneira quase pornográfica todos os dias.

— Você estava de fato me perseguindo. - Remus concluiu um pouco rápido demais para o seu padrão normalmente lento.

— Perseguindo é uma palavra forte. - o vizinho mordeu o lábio inferior. - Você vai fingir que não estava me esperando diariamente com seu sorvete de baunilha?

— Eu admito. - ele corou mordendo um pedaço de pizza. Eles ficaram se encarando com sorrisos por alguns minutos em um silêncio confortável até Remus desconcertado perguntar: - E o que eu deveria saber sobre você, além de que você está muito a fim de mim?

— Além desse fato? - ele bebeu mais um gole e coçou o cabelo escuro. - Sou artista, tenho a sua idade e... Quero muito te beijar de novo, é tudo o que estou pensando desde hoje cedo.

— Eu gosto de como você é direto. - Remus mordeu o lábio inferior e ergueu as sobrancelhas.

— Então você gosta de alguma coisa em mim? - Sirius perguntou com expectativa. - Estou me sentindo um adolescente.

— Você também faz com que eu me sinta um adolescente que mete os pés pelas mãos. - ele deu de ombros. - Falando todas as coisas erradas desde o primeiro dia.

— Parece que vamos ter que nos acostumar com isso. - o vizinho sorriu, fazendo a distância entre os dois diminuir. - Agora eu gostaria de te beijar algumas vezes.

— E eu gostaria de ser beijado muitas vezes. - nosso protagonista se sentia plenamente feliz pela primeira vez em muito tempo, com os lábios colados aos de Sirius.

Era como se aquilo fosse certo, sabe? Como se tudo se encaixasse perfeitamente quanto mais eles se conheciam e descobriam coisas um sobre o outro.

Por exemplo, ele descobrira com o tempo que Sirius era um artista brilhante e se reconheceu em várias pinturas. Surpreendeu-se a ver que algumas eram datadas de antes daquele primeiro beijo.

— Eu pinto o que eu gosto e o que me atrai. - Sirius dissera na ocasião.

Remus gostava de como a atenção dele flutuava, era como se olhar no espelho. Um minuto estavam conversando animadamente e no outro estavam olhando para a boca um do outro e se agarrando onde estivessem.

Ele sentia que se Sirius fosse a arte, ele seria o pincel.

Dividiam os fones de ouvido, várias fitas e mixtapes, muitas refeições e a cama praticamente todos os dias - mesmo que Sirius dormisse muito menos que ele e saísse no meio da noite para pintar alguma coisa lindíssima e brilhante. Se sentia constantemente inspirado.

— No meu quarto tem um super espaço, eu até movi alguns móveis de lugar... - Remus falou, uns seis meses depois do início daquele relacionamento, quando Sirius mencionou que precisava arranjar um estúdio já que as pinturas estavam ocupando os lugares de comer e dormir. - Se você quiser eu posso te alugar esse cômodo e eu viria de brinde, algo que já vem junto com o quarto, sabe?

— Você está me chamando para morar com você? - ele apertou os lábios.

— Se você não achar precipitado ou que precisa de tanto espaço, quer dizer você já dorme aqui quase todos os dias e eu meio que desocupei metade dos armários para você trazer suas roupas e o que mais você quisesse e talvez um dia a gente possa arranjar uma casa maior com um estúdio de verdade, onde você possa ter espaço e não se cansar de mim e...

— Você já pensou em tudo mesmo. – Sirius, que estava de braços cruzados, os descruzou, levantou-se pensativo e em silêncio e foi até seu apartamento.

Esse foi o momento que Remus suou frio e murmurou para si mesmo:

— Eu estraguei tudo.

Era um passo gigantesco esse de morar juntos, é o tipo de comprometimento que se você não está pronto para fazer e a outra pessoa está, evidencia que as pessoas estão em locais diferentes na relação, levando a insegurança e no fim ao rompimento.

Remus não estava pronto para viver sem Sirius, de verdade. Mesmo que estivessem juntos pela metade de um ano, ele descobrira já na segunda semana que o amava. Guardou para si mesmo a informação como um segredo que revelaria quando a hora chegasse. E agora  talvez não chegaria nunca.

Ficou olhando em silêncio e com os olhos cheios d'água a porta aberta que Sirius deixara, esperando com o coração apertado que ele voltasse. Mas por que voltaria? Mesmo que Sirius fosse a pessoa intensa e enérgica da relação, nada era mais intenso que o mundo de fantasias e planos românticos de Remus.

E ninguém poderia culpá-lo, eu certamente não posso. Ele só queria toda a parte de uma fantasia bem comum na realidade: casamento, família e romance.

Parou de encarar a porta e deitou-se no chão alguns minutos depois, encarando o lustre no teto, sem se importar com o que diria quem passasse no corredor naquele momento.

— Baunilha? - Sirius o chamou após vê-lo triste olhando para cima por um tempo. - O que houve?

— O que houve é que você não teve coragem nem de me dispensar e dizer que ficar comigo era uma péssima ideia. - ele ainda estava olhando para o teto, numa tentativa de travar as lágrimas em seus olhos ardentes.

— Por que eu diria isso? - Sirius perguntou confuso, percebendo que Remus evitava olhar para ele. - O que está acontecendo? Eu só estive fora por trinta minutos.

Lupin se sentou confuso, em sua mente já tinha se passado horas naquele pensamento de ter sido abandonado após fazer um pedido importante como aquele.

Encarou Sirius de verdade, primeiro seus olhos cinzentos e confusos e depois os dentes brancos que mordiam o lábio inferior. Desceu o olhar para o corpo atlético que já conhecia bem, até as mãos que segurava uma mala mal fechada e um quadro que ainda não tinha visto.

— Está indo viajar? - ele perguntou de cenho franzido.

Sirius teve tanta vontade quanto eu de bater a mão na testa com força e gritar: DUH.

— Estou aceitando imediatamente a oferta de alugar qualquer lugar onde você possa vir de brinde. - Sirius respondeu sorrindo e meneando a cabeça. - Se eu já não te conhecesse e te amasse, me sentiria ofendido pelo seu pensamento de que eu seria capaz de te deixar em algum momento.

— O que você disse?

— Que se você não fosse a pessoa mais devagar que eu conheço, eu me sentiria ofendido por essa sua ideia de pensar que eu iria embora. - Sirius apertou os olhos confusos.

— Não essa parte. - Remus se levantou e caminhou até a porta a passos lentos. - A parte de você me amar.

— Ah, isso. - o não-mais-vizinho, porém ainda gostoso, murmurou com o rosto corado. - Eu estava esperando que você dissesse primeiro, mas nada grita mais "eu te amo" do que "eu meio que desocupei metade dos armários para você trazer suas roupas e o que mais você quiser" ou "um dia podemos arranjar um lugar maior com um estúdio para você".

— Você me ouviu balbuciando tudo isso? - Remus disse, tirando a mala estufada de coisas da mão dele.

— Foram as palavras mais doces que eu já ouvi na minha vida. - Sirius sorriu, lembrando Remus de que aquele era o sorriso mais lindo que já vira. - Agora você deveria me beijar.

— Obrigado pela dica. - Remus sorriu, com uma mão em seu pescoço, abaixando a cabeça para beijá-lo.

— Aqui está o meu "eu te amo". - Sirius entregou a ele uma pintura.

— Quando você pintou isso? - Remus disse examinando o quadro bonito de cores vibrantes.

Sirius se vestia de cores escuras sempre e reservava todas as outras para suas obras de arte. E aquela era de longe a maior explosão de cores que Remus já vira. Era um rapaz de cabelos castanhos dourados penteados com uma mão no pescoço e a outra no queixo de outro rapaz ligeiramente mais baixo de cabelos negros bagunçados. Os lábios deles estavam colados e vermelhos, e deles irradiava uma luz em tons amarelos e laranjas, como faíscas e fagulhas.

— Na noite do nosso primeiro "encontro". - ele disse envergonhado.

Mais do que tudo, essa resposta fez o coração de Remus saltar, pular algumas batidas e enfim, se sentir cheio e completo. Foi sorrindo que disse por fim:

— É a coisa mais linda que eu já vi, depois de você.

Para Sirius, isso foi o equivalente a mais "eu-te-amos" que o possível. Para Remus, aquele seria o momento em que olharia em retrocesso todas as vezes em que estivesse triste ou que os dois passassem por algum problema que parecesse impossível de ser resolvido.

Para mim, foi um desses momentos perfeitos que você tem vontade de guardar em um globozinho de neve e sacudir com amor todas as vezes que você precisar de um pouquinho de magia na sua vida.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Tô romantica, me deixa ♥



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Bad liar." morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.