Além daquilo que enxergamos escrita por MiaLuaMF


Capítulo 4
Capítulo Três


Notas iniciais do capítulo

Atena realmente pode se provar rancorosa, não?



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Eu acho que deveria sentir vergonha de mim mesma. Ou melhor, eu tenho certeza de que deveria me envergonhar por minhas ações. Mas se eu faço isso? Nem um pouco; muito pelo contrário, estou radiante de felicidade pela ideia de vingança. Ah, vovó, que a senhora nunca saiba dessa fase obscura da minha vida.

Levei o fim de semana inteiro – quero dizer, as noites que deveria usar para dormir inteiras – para maquinar sobre a melhor maneira de fazer o novato sentir um pouquinho do gosto amargo que eu ando experimentando por sua causa. Eis aqui o que montei:

Virar o feitiço contra o feiticeiro – ou seja, para cada momento em que me atrapalhar durante as aulas, farei o mesmo;

Usarei de sua aparente “aliança” com o professor Michael para acabar com sua imagem de aluno aplicado – é uma espécie de tradição o homem mandar fazermos um resumo sobre toda a matéria vista na série anterior valendo 1/3 da nota semestral, e eu sei, ele é completamente maluco por pedir isso, porém me ajudará. Digamos que eu possa trocar o tal resumo feito pelo Kim para um outro nada, como dizer, apresentável.

Vamos, não me olhe assim. Eu tenho certeza de que ele dará um jeito de se recuperar. Eu odeio admitir, entretanto o garoto realmente é inteligente, pressupondo do pouco que vi. E se equivalerá à mancha que deixou em meu histórico escolar.

E é isso. Esse é todo o meu plano. Não sou uma pessoa criativa, como podem ver. Infantil? Sim. Rancorosa? Óbvio. Deveria tentar melhorar? Sem dúvidas. Vou fazer isso? Talvez... acho que vou pôr na minha lista de resoluções de Ano Novo. Mas criatividade? Provavelmente estava em falta quando nasci.

Enfim, hoje é segunda-feira, um novo e lindo dia. O céu está azul, os pássaros estão cantando, é perfeito para colocar em prática esse meu lado vingativo recém descoberto.

Já me encontro sentada em meu lugar quando Kim Taehyung chega e ocupa seu assento, sem cumprimentar ou olhar para o rosto de ninguém. Desde que chegou não o vi realmente falando com sequer uma pessoa, apesar de várias terem tentado se aproximar. Sempre se manteve distante, embora fosse simpático e educado; permito uma pontinha de curiosidade escapar para me perguntar se haveria algum motivo por trás da reclusão.

A aula da Sra. Monroe começa e junto dela, a inquietação do coreano sentado atrás de mim. Eu juro, ele faz isso propositalmente, porque não é possível. No entanto, ao invés de me irritar, respiro fundo e agradeço a Atena West de catorze anos por tomar a decisão de deixar o cabelo crescer o máximo que pudesse para doar; sim, eu jogo ele para trás, em um único e gracioso – ou era essa a minha intenção – movimento.

O barulho de algo sendo atingido e um diminuto som de engasgo me faz querer rir, mas tento me manter séria e atenta às explicações dadas simultaneamente. Pode ir se acostumando, Kim, você receberá muitos fios com aroma de coco na cara. Um cabelo castanho claro maravilhosamente hidratado e ondulado, obrigada.

Mentira, eu preciso urgentemente cortá-lo, ou não servirá para ser doado nem a uma boneca falsificada.

É muito mais cansativo e trabalhoso incomodar alguém do que eu pensei. Fiz de tudo, derrubei meus materiais incontáveis vezes, não parei em uma posição, a todo minuto arrastava minha cadeira da forma mais ruidosa que conseguisse, batucava o mais alto que desse com minhas unhas, ocupava seu espaço pessoal com meus fios longos e, de vez em quando, um cotovelo repentino. Exceto por quando Taehyung me pediu para “tomar mais cuidado” com meu cabelo, não notei um único sentimento de aversão. Ou ele não se importa de verdade, ou já reparou o que estou tentando fazer. Não sei qual das duas opções é pior.

Mas tudo bem, afinal, Roma não se construiu em um dia. Ainda temos muitos dias pela frente, além da segunda parte de meu plano. A mais sem-noção e arriscada, a qual não posso deixar uma pisca sequer de quem trocou os resumos, ou serei enterrada viva mais rápido que o Barry ao criar outra linha do tempo.

—#–

Mais rapidamente do que eu esperava, o tempo passa e estamos na sexta, sem muitos progressos, e sim, na aula de Geografia. Sim, o Snape fajuto nos manda fazer o maldito resumo. E escutem só essa: para segunda. É, para daqui três dias. Eu digo que ele não é normal. Ninguém que goste e lecione essa matéria pode ser normal. A minha sorte é que eu fiz tudo nas férias, porque já estava preparada para uma data de entrega pequena. Aliás, minúscula.

Coitados dos desavisados. Agora, quem deixa para a última hora de propósito, porque quer, tem mais é que se desesperar mesmo.

Sabe o que eu descobri nesses últimos dias? Que o clube de música terá uma reunião para decidir os horários dos encontros durante o almoço, também na segunda-feira. Olha que coincidência! Parece que o destino está cooperando comigo. Se isso não é um sinal do Universo dizendo que devo seguir em frente, não sei o que mais poderia ser.

O almoço é simplesmente a hora perfeita para trocar os trabalhos. Ninguém nos corredores, menos ainda nas salas de aula, onde encontrarei sua mochila e discretamente farei o que tenho que fazer. Porque sim, se tornou uma questão de honra, a qual eu tenho que retrucar.

Certo, tudo bem, não seja tão estraga-prazer. Eu admito, levo as coisas muito a sério. Sou competitiva demais e não estou conseguindo me controlar. Contudo, por favor, somente dessa vez, ignore. Eu tenho certeza de que, mais cedo ou mais tarde, o Carma retornará.

Só espero que seja mais tarde, bem mais tarde, e preferencialmente que seja, sei lá, quando eu estiver tomando um sorvete e ele caia inteiro no chão, inesperadamente. Seria triste, eu admito, no entanto, cá entre nós, suportável.

—#–

— ‘Tá fazendo o quê?

Preciso me apoiar no chão para não cair devido ao susto que levo. Como o planejado, estamos na pausa para o almoço, todos ocupados demais para notar uma garota retornando a sua sala de aula, por mais que ela – eu – exalasse uma aura nada inocente. Entretanto, o que decididamente não planejei foi a entrada repentina e silenciosa do meu “alvo”, que me encontra agachada procurando dentro de sua mochila por algo que – agora é mais do que óbvio – não se encontra aqui. Fazia bem uns cinco minutos que eu tentava achar seu trabalho, mas não havia uma única menção a ele ali. A minha sorte é de não ter deixado as folhas pelas quais trocaria o trabalho à mostra e sim ainda guardadas com minhas coisas.

Porém congelo no lugar ao escutar sua voz, cuja qual expressa claramente sua surpresa ao me encontrar remexendo o que não me pertence.

— Eu, é, estava... – me levanto e ponho-me em sua frente, desesperadamente tentando criar uma desculpa que me livrasse, embora não dê para esconder meu nervosismo ao ter sido pega. – Estava procurando minha caneta! Pensei ter visto ela cair dentro da sua mochila. Desculpe, não quis... xeretar. Mas devo tê-la perdido, infelizmente. Era minha caneta da sorte, sempre assino meus trabalhos com ela e precisava para o resumo de Geografia.

Forço-me a calar a boca, não aguentando proferir mais nenhuma “abobrinha”. Sério? Procurando uma caneta? Da sorte? Quem acreditaria nisso? Sinto vontade de me dar um tapa diante de tamanha estupidez.

— Ah. Quer ajuda? – Kim Taehyung me pergunta. Estranhamente, parece falar sério, como se de fato tivesse engolido a desculpa idiota. Novamente, fico surpresa e sem reação. Ninguém pode ser tão ingênuo.

— O quê? – é tudo que sou capaz de responder.

— Você quer ajuda para procurar? Deve estar em algum canto da sala – ele diz, olhando ao redor. Em seguida, se abaixa e começa a olhar embaixo das carteiras.

— N-Não! – me encolho, pois saiu mais alto do que o planejado. O garoto volta a se levantar, com um olhar questionador. – Não é necessário, não precisa se preocupar. Era só uma superstição boba minha, posso viver sem ela.

Tudo o que eu menos preciso é de nós dois revirando uma sala a qual não tem nenhuma caneta jogada por aí, claro.

— Certeza? Porque eu não iria estranhar você achar que deve usá-la para o resumo do prof.º Michael. Ele é sempre tão duro assim? Ainda bem que eu já tinha sido avisado e preparei o meu com antecedência. Acabei de entregá-lo, aliás. Queria tirar algumas dúvidas antes de ir para a reunião do clube de música.  – ele simplesmente solta, como se eu tivesse lhe perguntado alguma coisa e tampouco me dá tempo de respondê-lo.

Ao menos agora eu sei porque não consegui encontrar seu trabalho. Droga, tanto preparo para nada.

— De verdade, está tudo bem. Talvez até tenham-na roubado. Sabe, ela é muito bonita, de uma tinta azul escuro brilhante – porque eu continuo falando da suposta caneta? – Enfim, eu tenho que ir almoçar.

Não espero por sua resposta e vou embora, finalmente respirando fundo. Como Taehyung foi enganado tão fácil? Eu sou uma péssima mentirosa, minhas mãos até mesmo estão tremendo. E, afinal, quem será que lhe disse sobre o resumo? Por mais duro que seja, costumam deixar os alunos novos – normalmente aqueles que estão começando o ensino médio – descobrirem sozinhos.

— Ei, espera! – viro para trás. É o estrangeiro me chamando, segurando um pequeno objeto em suas mãos. – Fica com isso. Não é tão bonita e nem poderá substituir, mas...

Olho para o que ele me estende. É uma caneta azul.


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Notas finais do capítulo

O que aprendemos com este cap? Que Atena West seria uma péssima agente secreta



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