Natureza Humana escrita por Last Mafagafo


Capítulo 10
Capítulo 10




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Quando John saiu pelo bosque sem rumo, Donna sentiu seu coração encolher dentro do peito. Pobre John... Donna imaginava o quão confuso e assustado ele deveria estar se sentindo, mas ela não sabia o que fazer. Donna havia aprendido a gostar do doce e atrapalhado John Smith, mas o universo precisava do Doutor! Se ao menos ela pudesse separar os dois... Tudo seria tão mais fácil se ela ainda estivesse com o relógio! Seria só abrir e pronto. John não precisaria passar por tudo aquilo.

— Eu não sei o que está acontecendo aqui, mas acho que você deveria conversar com ele. John é um homem bom - disse a enfermeira Redfern, olhando para Donna.

— Eu sei - disse Donna, triste.

— Então você deveria dizer isso para ele.

— Ei! Eu pensei que você quisesse me ver bem longe do John - disse Donna, surpresa.

— Deus sabe como eu desejei estar no seu lugar, Srta. Noble. Mas agora John é o mais importante, não acha? - Redfern perguntou, antes de seguí-lo.

A ruiva observou a enfermeira, surpresa. Desde que havia chegado a 1913 era a primeira vez que ela concordava com Joan Redfern. Aquela realmente era uma noite de surpresas! Donna se levantou depressa, tentando não ficar muito para trás.

— Venham por aqui, eu sei onde podemos nos esconder - disse Joan, seguindo por uma trilha. 

Eles chegaram a um chalé que a enfermeira explicou ser da família da menininha cujo corpo foi roubado pela Família Sangue. Como a loira havia previsto, a família inteira havia sido vítima do ataque, e o chalé estava desocupado. Era horrível pensar que uma família havia sido destruída apenas por estar no lugar errado, e na hora errada. Donna se sentiu culpada por não ter conseguido evitar aquilo.

— Eu preciso ir até lá, antes que alguém morra - disse John.

— Você não pode - disse a enfermeira, tentando contê-lo - Srta. Noble, deve haver algo que possamos fazer.

— Não dá. Eu não posso fazer nada sem o relógio - disse Donna, exausta.

— E o que tem nesse relógio? Você só fala nele o tempo todo - perguntou John.

— Você. Ou melhor, o Doutor - disse Donna, se atrapalhando - Olha John, eu não tenho ideia de como isso funciona, mas eu sei que tudo o que ele é, tudo o que ele já pensou, todo aquele conhecimento... Está tudo no relógio.

— E o que acontece se eu o abrir?

— Você volta a ser ele.

— É como morrer - lamentou John, virando-se para a janela. As duas mulheres olharam uma para a outra, preocupadas.

Alguém bateu na porta. Todos ficaram assustados. A enfermeira se levantou para abrir. Ela não tinha ideia de como ela poderia ser útil, nem entendia completamente o que estava acontecendo, mas sabia que espantalhos não podiam bater. Era o garoto Latimer, e ele estava com o relógio. Não apenas isso, ele estava disposto a devolvê-lo ao Doutor. Timothy entregou o relógio para Donna, com um sorriso constrangido. Donna teria brigado com o menino, mas havia algo no seu olhar que a fez desistir da bronca. Ela apenas sorriu, em agradecimento. Donna então se aproximou do Doutor, como quem se aproxima de um animal ferido.

— Segure - ela pediu. Seu olhar era cheio de ternura, como se falasse com uma criança.

— Não… - disse John, se afastando assustado.

— Por favor…

— Ele me disse para encontrá-lo. Ele quer ser segurado - disse Latimer, tentando ajudar Donna.

— Se você estava com o relógio, porque não o devolveu? - perguntou a enfermeira.

— Por que ele estava esperando… Depois eu estava com medo... do Doutor.

Donna olhou para o garoto com carinho, reconhecendo sua situação. Foi exatamente o que ela sentiu quando conheceu o Doutor, quando viu seus olhos cheios de mágoa e ódio ao assistir a Imperatriz Racnoss e seus filhos se afogarem nas águas do Tâmisa. 

— Por que? - perguntou John.

— Porque... eu o vi. Ele parece... o fogo, e o gelo, e fúria. Ele parece a noite e a tempestade, e o coração do Sol - disse Latimer, se aproximando.

— Pare!

— Ele é antigo e eterno. Ele queima no centro do tempo e pode ver o giro do universo.

— Pare! Pare... - pediu John, como se estivesse sendo torturado.

— E... ele é maravilhoso.

Donna sorriu, pousando as mãos nos ombros do menino. Ela jamais poderia ter dito melhor. Eles foram interrompidos por uma explosão do lado de fora. Luzes e bolas de fogo caindo do céu.

— Eles estão destruindo a vila - disse a enfermeira.

— O relógio… Como se estivesse dormindo, esperando para acordar - disse John, pegando o relógio das mãos da ruiva.

— Por que ele falou comigo? - perguntou Latimer, confuso.

— É um campo telepático de baixa intensidade, você nasceu com isso. É um engrama sintático extra, causando…

Donna sorriu, levantando uma sobrancelha. Quem disse que John não era o Doutor? O Sr. Smith olhou para Donna assustado.

— Ele fala assim? 

— Yep… O tempo todo. É até um pouco irritante - disse Donna, sorrindo - Só precisa abrir e ele voltará.

— Eu não posso fazer isso, eu não posso. E se eu der o relógio? É o que eles querem, não é?

— É isso que você quer fazer? Continuar vivendo como John Smith quando todas essas pessoas morrem? - perguntou Donna e, pelo olhar de John, ela já sabia a resposta - Você não pode estar falando sério!

— Por que não? - ele gritou.

— Porque isso não está certo, e você sabe disso! - gritou Donna.

A enfermeira Redfern percebeu que os dois precisavam conversar a sós. Ela sabia que aquilo deveria ser resolvido entre John e Donna. Os dois pareciam um velho casal discutindo, e Redfern lamentou sinceramente que algum dia ela tivesse pensado que teria uma chance com o Sr. Smith. Joan olhou para o jovem Latimer, e apoiou suas mãos nos ombros do garoto.

 - É melhor vocês conversarem com calma. Nós esperaremos lá fora - ela anunciou, saindo com o jovem Tim.

Donna assentiu e se sentou na frente do Doutor, o olhar paciente e carinhoso.

— Então tudo foi uma mentira? Minha vida inteira?

— Algumas partes - Donna respondeu, sinceramente.

— E você? Você estava só atuando?

— Ei! Como eu poderia? Você não se lembra do meu show no campo de tiro? Acha que eu teria aberto minha enorme boca se eu estivesse atuando? Em 1913? 

Ele sorriu. Ela realmente era uma mulher diferente das demais.

— Lembra quando você sonhou comigo vestida de noiva? - John assentiu - Essa foi a primeira vez que eu encontrei o Doutor. Num minuto eu estava entrando na igreja e no outro estava no meio da TARDIS. Você já viu como é. Eu odiei o Doutor. Dei dois tapas nele naquele dia. Tudo o que eu queria era voltar para o meu casamento. 

— Você é casada? - ele perguntou, surpreso, se sentindo o maior dos pecadores.

— Não! Graças a Deus! Meu noivo me trocou por uma aranha enorme. Longa história - ela sorriu - Mas no fim daquele dia, o Doutor me ofereceu para acompanhá-lo nas suas viagens. Sabe o que eu fiz? Eu recusei. Recusei porque tive medo, assim como você está sentindo agora.

— Ele é um homem terrível - disse John - Você quer que eu me torne ele?

— Ele não é um homem terrível. Eu percebi isso no momento em que ele desapareceu e me arrependi de não ter ido com ele. Ele sai pelo universo, vivendo aventuras e salvando pessoas. Olhe para o céu, você não tem vontade de ver? De estar lá em cima e conhecer mais do que qualquer um já conheceu?

— De que adianta ver o universo se ele é um homem sozinho? Eu não quero ser sozinho.

— Ei! Ele não é sozinho. Eu nunca contei para o Doutor, mas eu planejo viajar com ele para sempre. Ou pelo menos até minhas pernas não aguentarem mais toda aquela correria. Já te contei que minha tia Zelda tem reumatismo? Espero não puxar esse lado da família. Mas se eu ficar como meu avô você pode ter certeza que eu vou te seguir até uns 80, pelo menos.

— Donna, eu vi as outras mulheres. Todas as outras que passaram pela vida dele. Elas se vão, elas sempre se vão. Quase nunca por vontade própria. Se ele voltar e você for com ele, você pode acabar se machucando. Mas comigo, John Smith, eu prometo que eu não vou deixar nada te fazer mal - ele segurou as mãos dela, implorando para que Donna o escolhesse, para que ela o deixasse ser apenas John Smith.

— Eu segui o Doutor porque eu escolhi. Na verdade, eu procurei por ele até encontrá-lo. O risco faz parte. Com o Doutor eu conheço o universo! Nós salvamos pessoas, nós fazemos o que é certo… Pela primeira vez na minha vida eu acho que estou fazendo algo que vale a pena, mesmo sendo apenas uma ajudante.  

Ele olhou para Donna, triste.

— Você o ama?

— O que? - ela perguntou, confusa.

— É por isso que você fugiu do meu beijo? Por que você o ama? - perguntou, John, irritado.

— Isso é ciúmes, Homem do Espaço? - Donna riu. Só mesmo o Doutor poderia ter ciúmes dele mesmo - Eu não poderia te beijar, não seria certo com ele. Eu e o Doutor somos só amigos. Além disso, eu tenho a cor de cabelo errado, ele prefere as loiras. Me surpreende que você não tenha se interessado pela enfermeira Redfern - Donna apontou para a porta. 

— Mais um motivo para você ficar comigo. Eu amo você, Donna Noble e posso te fazer feliz. Eu prometo que te farei a mulher mais feliz do mundo se você escolher ficar comigo.

— Eu sei que você faria - ela disse, acariciando seu rosto.

— Mas você prefere o Doutor…

— Você é o Doutor, John. Quando você atirou aquela bola e salvou a vida daquela mulher e seu bebê, eu tive certeza que você era ele. Vocês são um só. Bondoso, inteligente, um pouco convencido e simplesmente incrível. Além do cabelo, é claro… Só espero que ele não se lembre disso...

John suspirou, segurado o relógio. Seu semblante partiu o coração da ruiva. Ele estava assustado e triste. Era como se estivesse para morrer e, de certo modo, ele realmente estava.

— Espera, John. Antes de você ir… - Donna beijou John carinhosamente nos lábios, um beijo casto - Você foi brilhante.

— Eu só espero que ele não se lembre disso - disse John, com um sorriso triste.

John segurou o relógio e o abriu. Uma luz dourada tomou conta dele, percorrendo seu corpo. Seus olhos se iluminaram com o mesmo brilho, e quando a luz desapareceu o homem que estava ao lado de Donna já não tinha mais um único coração. 

— Ah! Eu estou de volta! - ele disse, com um enorme sorriso - Donna! Aí está você! Espera… O que é isso? Esse gosto... Arg! Peras! Você me deu peras? Como você pôde? Eu disse que não podia comer peras. Regra número cinco! Vai demorar séculos para tirar esse gosto da minha boca.

— Seja bem vindo, Doutor - ela disse, revirando os olhos - Se você já terminou de reclamar, nós precisamos salvar o mundo. A Família Sangue nos encontrou e eles estão atacando a cidade.

— Oh, não! Não! Não! Vamos Donna, não temos tempo a perder. Allons-y! 

O Doutor saiu da cabana, encontrando a enfermeira e o menino do lado de fora.

— Ah! Vocês estão aí! Entrem na casa, é mais seguro. Eu volto logo. Donna… Pensando bem, entre com eles. Você deve estar exausta em ter que lidar comigo. Eu volto num minuto.

— Você não vai se livrar de mim, Spaceman! - ela disse.

— Ah! Eu sei que não! Mas dessa vez eu tenho um plano e preciso de você aqui. Não se preocupa, não vai demorar.

— Que plano? - ela perguntou, gritando, enquanto o Doutor corria de costas.

— Eu vou entregar o que eles querem! - ele piscou.

Essa foi a única resposta que Donna conseguiu. Ela revirou os olhos, rezando para que ele soubesse o que estava fazendo, seja lá qual fosse seu plano. Com um suspiro, Donna assistiu o Doutor sumir no bosque, correndo como um maluco em direção à nave da Família Sangue.


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Notas finais do capítulo

E o Doutor voltou... Último capítulo em breve!