O segredo das acácias escrita por Amystar


Capítulo 1
Lewis Kemble e Agatha Bridgerton


Notas iniciais do capítulo

Olá meus queridos! ♥ Se caiu aqui de paraquedas, devo lhe explicar do que se trata meu projeto: são contos escritos por mim, cada um com uma flor temática, e que são romances de cada um dos netos Bridgertons. O primeiro foi “A rosa mais linda”, o segundo “O jardim de lírios”, o terceiro "O cravo vermelho" e agora, estamos nesse, "O segredo das acácias”. Se não chegou a ler os outros, recomendo que leiam na ordem, pois os contos são uma história linear, que se completam uns com os outros. Fiquei muito surpresa, pois muitos acertaram qual seria o casal da vez '-' kkk Mas, bem, se já está tudo certo, desejo-lhes uma ótima leitura!



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Londres, 1845

Agatha Bridgerton nunca fora um exemplo de beleza. Seus pais lhe diziam o contrário, é claro: Colin e Penelope Bridgerton eram pais maravilhosos, e lhe deram a infância mais amorosa que poderia ter. Mas é verdade é que pais nem sempre são verdadeiros em relação a seus filhos, e os seus foram um pouco permissivos demais com comida quando a menina chegou na casa dos dez anos.

Sempre fora uma amante de doces. Biscoitinhos, tortas de melado e bombas de chocolate eram simplesmente sua perdição. Então, quando seu metabolismo infantil começou a diminuir, a menina começou a engordar até que ficasse visível a todos que aquela Bridgerton em específico tinha uns bons quinze quilos a mais do que o adequado. Mas até então, isso não era realmente um problema. Estava feliz, não estava? Tinha irmãos com quem implicar, amigas para fazer compras e seus pais eram incríveis. Seu peso não era assim tão importante.

O problema surgiu quando Agatha percebeu que isso era, sim, um problema. Ela sabia que não era feia de rosto, afinal, tinha herdados os lindos olhos do pai e o rosto lembrava a mãe durante a juventude. - ao menos, era o que diziam – Mas quando teve seu debút e começou a se socializar com outras debutantes, percebeu que era bem diferente delas. Todas tinham cabelos com cachos perfeitos, modos impecáveis e cinturas finas sobre-humanas. Já ela era campeã invicta em comer mais biscoitos dentre os primos.

“Você está gorda!”

Tentou ao máximo não se mostrar abalada pela declaração de Ruby Cavender, mas a verdade era que ela tinha razão. Nenhum cavalheiro se aproximaria de alguém como ela, filha de um homem sem título, sem um dote abundante ou aparência atraente. Mas, ao menos, a última coisa ela poderia mudar, e assim começou sua jornada.

No início, tentou apenas parar de comer sobremesas. Supôs que doces eram seu maior pecado, então se os cortasse, provavelmente emagreceria. Para seu pesar, seu peso em nada mudou, gerando apenas frustração. Depois, passou a comer menos nos almoços e jantares, mas resultou apenas em enfraquecimentos, tonturas e desmaios, o que assustou seus pais, que começaram a obrigá-la a se alimentar direito, mesmo contra sua vontade.

Mas Agatha queria mudar. Ela queria deixar de ser invisível e de se sentir feia. Nesse ritmo, jamais encontraria um marido e terminaria como uma solteirona pelo resto da vida, sendo um peso para a família. Então, um dia pensou que, se seus pais a obrigavam a comer, podia colocar tudo para fora quando eles não estivessem olhando, certo?

— Srta. Bridgerton?

Agatha olhou assustada para trás. Já estava realizando o ritual de comer e vomitar tudo há algum tempo, mas aquela era a primeira vez que alguém a pegava em flagrante. Lilith, que estava casada com seu primo Edmund, chamara alguns familiares até a casa Bridgerton para fazer um anúncio importante. Já sabia do que se tratava: ela estava grávida, mas para os outros ali fora uma feliz surpresa.

Todos estavam no jardim comemorando ao ar livre, até que ela percebeu que já tinha comido dois pedaços de torta. Não podia demorar muito tempo com aquilo no estômago, mas demoraria muito até chegar a uns dos banheiros da residência. Então, como segunda alternativa, saiu de fininho até os jardins do lado oposto da casa, onde raramente alguém passaria. Não havia nada de interessante ali, apenas algumas árvores e umas poucas flores.

Ela se abaixou, lançando o conteúdo para fora nos pés de uma árvore muito bonita, que dava flores chamadas de “acácia-amarela”. Tomou fôlego, pronta para a próxima rodada, quando ouviu uma voz masculina atrás de si.

Se levantou tentando ficar na frente do que foi expelido.

— Milorde… - murmurou, tentando recuperar o fôlego. Sempre ficava com fraqueza quando o fazia. - o-o que faz aqui?

Lewis Kemble, o conde de Macclesfield, era primo de Lily, então nada era mais natural que ela o chamasse. Apenas não entendia o que ele fazia ali, com ela, quando várias de suas outras primas bem mais belas aproveitavam a pequena festa no jardim principal.

— Por que a senhorita estava fazendo aquilo? - ele franziu o cenho.

— Aquilo? - ela chiou, nervosa. Tentou pensar em uma desculpa, mas nada vinha à mente. - eu… Ahn…

— Estava forçando um vômito, por que? A senhorita estava rindo até pouco, não parecia estar passando mal.

O conde tinha cabelos e olhos extremamente negros, com as madeixas escuras em um tamanho médio, que chegavam a tocar os ombros, penteados para trás. Era alto. Na verdade, bem mais alto que ela, que era considerada bastante baixinha. E, mesmo usando tantas roupas, era possível ver que tinha um físico admirável. Aquele era, de longe, um dos homens mais lindos que vira em toda sua vida.

— Não me diga que… - os olhos dele a encararam com espanto por uns instantes, até que ele pigarreou. - a senhorita não está grávida, está?

— O que? Não! - retrucou veemente. - milorde, por favor, pode fingir que não me viu e voltar para onde os outros estão?

— Já a vi fazer isso.

Agatha se calou.

— No baile do duque de Ashbourne, no sarau das Smythe-smiths, até mesmo no soirée dos Bevelstokes… - ele a mirava com o olhar acusador, cruzando os braços. - a senhorita sempre come, vai ao banheiro e volta um tanto atordoada. Por qual motivo?

Engoliu o seco, tentando dizer alguma coisa. Seu cérebro sabia que ela devia responder, mas não conseguia. Deve ter parecido uma estúpida parada daquela forma, com a boca entreaberta e o rosto levemente suado.

— Sua família não sabe, certo?

Olhou para os próprios pés, sem negar ou assentir, mesmo que seu silêncio já dissesse tudo.

— Vai… Guardar o meu segredo? - conseguiu dizer. Jesus, precisava se sentar, sentia que suas pernas cederiam.

— É claro. - ele concordou de imediado, com um sorriso de canto. - mas ele terá um preço.

— É óbvio. - concordou ela, soturna. Provavelmente ele iria querer se aproveitar dela de alguma forma, ainda que ela não soubesse como de fato isso poderia acontecer. Assuntos escandalosos eram mantidos longe de seus ouvidos. - o que seria, milorde?

A ironia final o fez alargar o sorriso, até que antes de virar as costas e se retirar, ele falou:

— Eu a procurarei, me aguarde.

E por todo mês seguinte, ela o evitou de todas as formas.

~

Desde então, Agatha não viu mais o conde de Macclesfield. Ouvira Lily comentar, certa vez, que o primo voltara para Kent, mas que não tinha certeza absoluta disso. Isso foi bom para a Bridgerton, que continuou mantendo seu segredo intacto, sem medo de ser exposta ou chantageada. Sempre que terminava uma refeição e ninguém estava por perto, ela corria para algum banheiro e despejava todo o alimento que consumia para fora. Obviamente isso a deixava fraca e cansada, mas de alguma forma, aprendeu a disfarçar bem. A perda de peso foi gradual, mas amigas e familiares já comentavam como ela estava magra, e sentiu-se incrível com isso.

— Agatha?

Mas ainda não era suficiente. Ela ainda tinha que ficar mais magra. Não sentia que seu peso atual estava bom, se emagrecesse mais alguns…

— Agatha!

Agatha se assustou, olhando para as primas. Estava tão perdida em pensamentos que nem percebeu que estavam falando com ela.

— Você estava muito distraída. - disse sua prima Penelope. - no que estava pensando?

— Pen, não se intrometa nos pensamentos dos outros. - Violet advertiu a prima mais nova.

Violet era um ano mais velha, e já estava casada com o primo de ambas, sir Oliver Crane, há dois anos. Ela estava grávida de seis meses, e sua barriga já era bastante visível. Em breve ela voltaria para casa, em Gloucestershire, para se preparar para a chegada do bebê. Por isso, Charlotte deu a ideia das primas se reunirem na casa Bridgerton para um de seus divertidos chás da tarde.

— Me desculpem, perguntaram alguma coisa? - Agatha perguntou, voltando a se concentrar no assunto em questão.

— Perguntei qual sexo acha que o bebê de Violet terá. - disse Charlotte, uma de suas primas mais próximas. Ela havia se casado no ano anterior com o conde de Billington, e atualmente morava em Kent.

— Por que querem saber minha opinião sobre isso?

— Você acertou que Samuel seria um menino. - observou Amanda, olhando para o filho de três anos, que brincava no chão ali perto com soldadinhos de brinquedo.

— E acertou que May seria uma menina. - disse Mary, irmã mais nova de Charlotte. - será que Agatha é capaz de prever o futuro?

— Não seja ridícula. - Charlotte revirou os olhos, com a impaciência comum de uma irmã mais velha. - por que não vai brincar com suas bonecas?

— Pare de me tratar como criança!

Mesmo tendo quinze e vinte e três anos, as duas Bridgertons ainda brigavam como quando eram menores.

— Meninas, por favor. - Lily, casada há um ano com seu primo Edmund, acalmou o ânimo das duas. Não era visível, claro, mas ela estava grávida de dois meses, e sua cabeça doía apenas em ver brigas. As duas se calaram para não incomodar a cunhada, mas continuaram a lançar olhares provocativos uma para outra.

— Bem. - Agatha pigarreou. - acho que o bebê de Violet será uma menina. - olhou para ela, depois virando-se para Amanda. - e o seu também.

Todas as cabeças se viraram para Amanda sobressaltadas.

— Como adivinhou que eu estava grávida? - ela perguntou surpresa, colocando a mão instintivamente na barriga. - apenas eu e Charles sabíamos.

— Sorte, eu acho. - riu a outra, em seguida dirigindo-se a Lily. - já o seu… Hm… - ela analisou a situação da nova prima. - acho que será um menino.

— Seria bastante conveniente, afinal, precisamos de um herdeiro para o viscondado. - ela sorriu. - já considero certo que será um menino, a partir de agora.

— Será que estou grávida também? - gemeu Charlotte, pegando mais um biscoito. - meu apetite está a todo vapor, perdi a conta de quantos destes eu já comi.

Todas as demais primas pegaram mais biscoitos e teceram elogios à cozinheira, mas Agatha se contentou em bebericar seu chá. Sentia uma vontade imensa de comer um daqueles, mas tinha que se controlar.

— Não vai querer um? - Amanda, que estava sentada ao seu lado, indagou-lhe. - sempre gostou tanto de doces.

— Não, obrigada. Apenas chá está bom.

— Você está muito magra, precisa comer mais. - alertou Lily, sempre preocupada. - já faz bastante tempo desde que a vi comendo um doce.

— Ela não come mais doces há meses, foi Jane quem me disse. - interveio Mary, com seu tom insinuante, ainda que não soubesse exatamente o que ela estava insinuando. - e também ela está comendo pouco nos almoços e jantares também.

— Acho importante cuidar da saúde. - disse Amanda, a mais velha e mais maternal do grupo de primas. - mas também não há problema em se dar ao luxo de coisas que gostamos, Agatha. Se quiser comer, coma.

Após as palavras da mais velha, todas as moças olharam para Agatha, com os olhos cheios de ansiedade sobre o que ela iria fazer. A Bridgerton suspirou, percebendo que não tinha como sair daquela situação. Se ela resistisse em comer, as outras continuariam a querer forçá-la a isso, a não estava com a mínima vontade de travar aquela batalha. Então, a contragosto, pegou um biscoito e o levou a boca, sentindo o gosto levemente açucarado na boca.

Todas pareceram contentes, e rapidamente outro assunto surgiu à mesa, desviando a atenção de todas. Aquele sabor era tão bom. Passou a língua de leve pelos dentes, em busca de mais resquícios do biscoito. Talvez se ela pegasse apenas um, não fosse assim tão ruim para…

— Boa tarde, senhoritas.

Todas olharam para porta, se deparando com um cavalheiro ruivo de sorriso tímido. Era o conde de Billington, irmão mais velho de Lily e marido de Charlotte. Sua prima se levantou rapidamente, toda sorridente e foi até o marido, lhe dando um beijo rápido no rosto. Em outras situações isso seria inapropriado, mas estavam em família e ninguém realmente se incomodava com aquilo.

— A que devemos vossa ilustre visita, Sua senhoria? - brincou Charlotte, até que reparou outro cavalheiro vindo atrás dele. - Ah, Lewis!

Agatha arregalou os olhos. Ah, não.

Penelope, que era a outra única solteira ali, rapidamente concertou sua pose para que ficasse extremamente ereta, tendo em vista a outra “ilustre visita”. Mary, que tinha apenas quinze anos, fez o mesmo, mas era óbvio que o conde não se interessaria por uma adolescente.

— Boa tarde a todas, senhoritas. O mordomo não nos anunciou porque já nos considera da família, imagino. - o conde apareceu detrás do primo, se curvando para elas. - espero que estejam tendo uma tarde agradável.

Todas responderam de uma forma diferente, bobas com a atenção do conde de Macclesfield. E não era para menos, refletiu. Não era todo dia que um homem tão bonito aparecia no meio do chá. Tentou afastar o nervosismo que sentia. Ele não tocaria naquele assunto ali, não é?

— Gostaria de se juntar a nós, milorde? - perguntou Lilith que, como esposa do futuro dono da casa, se sentiu na posição de anfitriã.

— Seria um prazer.

Charlotte chamou uma criada e solicitou mais chá, visto que o delas já estava morno e restava bem pouco.

Nate se sentou no lugar vago ao lado da esposa, e o conde, para sua surpresa, se sentou na cadeira à sua esquerda, relativamente perto dela. Ele se remexeu um pouco, parecendo ligeiramente incomodado, mas todos estavam conversando e nem prestavam atenção. Charlotte falava algo sobre a viagem que fizeram para a França, até que Agatha reparou, envergonhada, que encarava o conde.

Sabia que uma hora ele voltaria para cobrar o “favor” que fizera ao guardar seu segredo. Na verdade, pensava até que ele havia demorado demais.

— Como vai, srta. Bridgerton? - perguntou ele, sorrindo, provavelmente gostando olhar atento dela sobre ele, como um sinal de que sua beleza encantava as pessoas.

— Muito bem, obrigada, milorde. - sorriu educadamente, tentando disfarçar o rubor e nervosismo.

— Como está a família?

— Vai bem.

— Meu irmão me contou que seu irmão é o melhor da turma em literatura. - comentou ele.

— Perdão, meu irmão?

— Sim, seu irmão Thomas. Ele tem a mesma idade do meu, já o deve ter conhecido, seu nome é Damian.

Seu irmão Thomas tinha dezenove anos e ainda estava na universidade. Gostava muito dele, e sentia muito sua falta no dia a dia. Sorriu ao lembrar dele.

— Sim, ele veio nos visitar uma vez. Thomas é mesmo um rapaz muito inteligente, sabia? Aprendeu a ler sozinho, bem cedo, acho que na idade de Samuel. - apontou com o queixo para a criança presente, que agora fingia montar um cavalo de madeira.

— Isso é incrível. Damian sempre foi muito bom com ciências, talvez por influência de nosso pai.

— Vocês foram próximos na infância?

Lewis pensou naquilo por uns instantes.

— Não muito. Sou seis anos mais velho que a minha irmã mais próxima de mim em idade, Gillian, nove anos mais velho que Damian e longos dez anos mais velho que Jacob, o mais novo. Quando eles já tinham idade suficiente para andar e formar frases completas, eu já tinha interesses bem diferentes deles.

— Ah, sinto muito.

— Não sinta. - ele sorriu para ela. - por sorte sempre tive Nate, que foi mais do que um primo para mim. Foi uma boa infância.

Sorriu de volta, de repente sentindo-se à vontade na presença do conde. Poderiam conversar mais e mais durante aquela tarde, mas suas primas já começavam a espiar os dois de canto de olho, claramente interessadas na interação dos dois. Acanhada, voltou a se concentrar no chá, não dando mais abertura para o primo de Lily iniciar uma conversa.

~

Decorrido o tempo, o chá veio ao fim e Charlotte anunciou que iria embora com o marido. Todos aproveitaram para irem para suas casas, e, para surpresa de Agatha, antes que pudesse dizer qualquer coisa, o conde virou-se para ela e lhe perguntou se gostaria de fazer uma caminhada até o Hyde Park.

Tinha certeza de que ele cobraria pelo silêncio que manteve até agora. Seria um ato de covardia extrema negar o convite dele, então Agatha aceitou, e agora se via caminhando com ele no parque com uma criada seguindo-os a alguns metros de distância.

— Achei que não aceitaria me acompanhar. - ele finalmente disse algo, concentrando-se no caminho sem olhar para ela.

— Sei o que quer tratar. - retrucou. - poderia ser mais objetivo?

— A maioria das damas ficaria encantada em se estender numa conversa comigo.

— Não sou como a maioria das damas.

Ele ficou em silêncio, voltando ao seu modo misterioso. Após cumprimentarem alguns conhecidos passando em seus cavalos, ele indagou:

— Pode esperar aqui um minuto?

— Aqui?

Olhou em volta, percebendo que pararam em frente a um banco.

— Sei que é mal-educado, mas preciso buscar algo para lhe mostrar. Juro que não demorarei.

Hesitou, mas, no fim, assentiu. Estava com um pé atrás sobre o conde, mas sentia que lhe devia aquela. Sentou-se pacientemente no banco, e sua acompanhante também, em um outro mais afastada.

No fim, ele realmente não demorou. Pareciam-se ter passado no máximo cinco minutos, quando Lewis retornou com um livro preto em mãos. Sem qualquer cerimônia, ele atirou-se ao lado dela, mirando-a com um olhar concentrado.

— Eu lhe suplico, por favor, que não conte sobre isto para ninguém. A verdade é que sou... Um entusiasta de romances góticos, e há alguns anos me aventuro escrevendo meu próprio livro. Comecei quando estava terminando os estudos e agora finalmente o completei.

Olhou interessada para o livro – que agora descobrira ser um caderno – nas mãos dele.

— Um romance? O senhor, milorde?

— Me chame de Lewis, por favor. E sim, um romance. - ele suspirou.— sei que é estranho, pois é um gênero tipicamente feminino, mas não consigo deixar de gostar, minha biblioteca particular é cheio deles.

— Nunca soube de um homem que gostasse. Meus irmãos leram “Romeu e julieta” uma vez e quase vomitaram.

— É uma peça trágica. - comentou, mas logo voltou-se ao assunto original. - a questão aqui é que… Depois de reler tudo, percebi que preciso de ajuda.

— Ajuda?

— Sim. A parte do romance, em si, está aceitável, mas não sei detalhar ambientes. Sempre que o casal entra em um lugar, digo apenas “entraram em uma sala azul” ou “o salão de baile era grande”. Tentei melhorar mas não consigo.

— Me desculpe, milorde, mas não posso lhe ajudar nisso. Eu nunca escrevi nem mesmo um diário, como eu poderia…?

— A senhorita pode! - ele a interrompeu fervorosamente, agitado como uma criança. - o Sr. Bridgerton, seu pai, é um dos escritores mais geniais que já vi!

— Meu pai não escreve romances.

— Mas descreve lugares como ninguém. - retrucou. - quando leio um dos diários dele, sinto como se estivesse no lugar, com a areia entre os dedos e o calor do sol esquentando minha cabeça. É uma sensação mágica, um dom da escrita que eu não tenho.

Agatha quase perguntou se ele queria que ela conseguisse-lhe um autógrafo.

— Porém isso é totalmente secreto, não posso deixar que ninguém descubra. - continuou. - Por isso, preciso que a senhorita mostre isso ao seu pai em meu lugar, alegando ser seu, e me diga tudo o que ele disser.

— Meu? - piscou. - ah, não, meu pai nunca acreditaria. Ele sabe que nunca fui muito interessada em romances, desconfiaria na hora. - pensou por alguns segundos. - eu poderia dizer que foi escrita por uma amiga, o que acha? Não seria tão estranho. Uma amiga tímida que não quer se revelar.

— Então isso é um sim?

Olhou para baixo, sentindo as mãos enluvadas dele segurarem as dela fervorosamente, enquanto seu rosto estava bem perto do dela, – perto até demais. - causando-lhe sensações novas na barriga do estômago. Seu rosto esquentou, e sabia que não era culpa do calor do verão. Era o rosto daquele homem, seus traços masculinos próximos dela eram mais atraentes do que de longe. Nem mesmo quando dançavam juntos conseguia reparar em tantos detalhes. Ele era um lorde jovem e bonito, cobiçado por muitas jovens, e estava ali… Com Agatha Bridgerton.

Deixando o mundo da fantasia e se concentrando na realidade, afastou as mãos dele, murmurando que alguém poderia ver e entender errado. Ajeitou-se no banco timidamente, torcendo para que o rosto agora tivesse uma coloração normal.

— E-Eu vou ajudá-lo, sim. Não sei se meu pai saberá aconselhar bem, mas prometo que tentarei.

Agatha ficou de pé, e ele rapidamente repetiu o ato, de frente para ela.

— Esse será o nosso segredo. - ele lhe estendeu a mão. - a senhorita me ajudará com o meu, e eu guardarei seu.

Ela olhou nos olhos dele, mesmo acanhada, e aquiesceu, apertando firmemente a mão dele, selando o acordo.

~

Lewis passou os dias restantes com um sorriso estampado na face. Apenas a pequena possibilidade de ser ajudado por um mestre da escrita como Colin Bridgerton o deixava estasiado, e mal podia se aquietar tamanha era sua ansiedade para finalmente rever Agatha. Os dois combinaram de se encontrar na casa de Nate e Charlotte, onde poderia coincidentemente aparecer para uma visita ao mesmo tempo. Então, na hora de ir embora, Lewis se certificaria que a moça chegasse bem em casa, e a levaria até sua residência.

Era perfeito e, quando o dia chegou, foi bastante frustrante jogar conversa fora com o primo e sua esposa. Não que desgostasse dos dois – na verdade, era o exato oposto – mas queria saber as novidades da Bridgerton, e se ela conseguira a devida atenção do pai sobre seu livro.

— Bem, acho que já vou me retirar. - Agatha sorriu, levantando-se pronta para ir embora. Ele levantou-se quase que imediatamente.

— Permita-me acompanhá-la, srta. Bridgerton!

Talvez tivesse falado com uma fervorosidade exagerada, pois Charlotte e Nate arregalaram os olhos para ele.

— Ficaria encantada, milorde. - Agatha sorriu polidamente, livrando-o de ter que dar alguma explicação.

Eles mal haviam pisado no terceiro degrau no lado de fora quando perguntou:

— E então, o que ele disse?!

Ela suspirou, como se previsse que ele perguntaria aquilo.

— Papai apontou algumas coisas bem interessantes, não transcrevi exatamente o que ele disse, mas separei em tópicos porque foi o mais fácil. - remexeu o bolso, mostrando uma folha dobrada a ele. - posso lhe passar rapidamente, levaria um tempo para explicar minuciosamente o que ele…

— Não, eu quero saber tudo. O que acha de irmos ao Gunter’s?

— Ao Gunter’s? Eu… Hm…

Ela olhou para os próprios pés, em dúvida, mas acabou assentindo, avisando a mudança de planos para a criada que os acompanhava. E, pouco tempo depois, eles já estavam sentados de frente um para o outro, saboreando seus respectivos sorvetes.

— Entre as várias falhas que você cometeu, a principal delas foi essa aqui. - virou a folha de papel para que ele pudesse ver, apontando para o primeiro tópico. - “descrição sensorial”. É mais ou menos como a falta de detalhes de um ambiente, de sentimento no local que se está descrevendo.

— Eu disse a você que este era meu maior pecado.

— Sim, mas eu não disse isso a ele, foi papai quem percebeu sozinho.

Não esperaria menos dele.

— Enfim, ele disse que o ideal é que, quando um personagem está em um lugar, você não deve narrar como um observador, e sim como o próprio. É algo como…

— Se colocar no lugar do personagem?

— Sim! Exatamente, foi isso o que ele disse. Como na cena em que a mocinha fica de pé, no parapeito da sacada. A intenção dela era acabar com a própria vida, e você disse isso, mas não explicou nada sobre o que ela sentia com aquilo. Poderia ter falado sobre… - ela checou o papel. - o clima, as estrelas, o arrepio que ela sentia por usar apenas uma fina camisola, detalhes nesse estilo.

Ela continuou a contar os tópicos que o pai apontou, tudo com o máximo de detalhes que conseguia. Enquanto ela explicava, veio a mente de Lewis que Agatha era bastante bela. Estava um pouco magra demais, era verdade, mas o cabelo castanho e principalmente seus olhos esverdeados chamaram bastante sua atenção. Como nunca reparara nisso antes? Dançara com ela tantas vezes desde seu debút, há dois anos atrás, e jamais reparou, por exemplo, como ela mexia as sobrancelhas enquanto falava.

— ...E então, naquele momento em que a vilã foi derrubada no chão por um macaco irritado, eu ri demais! Foi muito engraçado, papai achou o mesmo. - ela falava pondo as mão enluvada na boca para segurar o riso.

— Essa cena saiu naturalmente, mas pensando bem, é bem engraçada. - riu também.

— Eu entenderia se isso tivesse acontecido em um lugar com outras pessoas, mas num lugar vazio, sozinha? Riria muito se fosse comigo.

— Acha que eu deveria adicionar mais cenas assim?

— Ah, sim, com certeza, milorde! A leitura fica tão leve e divertida.

— Achei que tivesse dito que não precisa me chamar de milorde. Me chame de Lewis.

Agatha se remexeu, ficando corada de repente. Sentiu vontade de tocar-lhe o rosto, e sentir a maciez de sua pele. Se pudesse, a pegaria ali mesmo e atiraria sobre uma cama, admirando seu pequeno e frágil como estremecer quando ele retirasse lentamente todas as camas de roupa que usava.

Piscou. O que diabos ele estava pensando?

— Não posso, milorde, isso é inapropriado. - respondeu ela. - outras pessoas podem ouvir e julgar coisas erradas.

Ele suspirou, tentando controlar o próprio corpo.

— Tudo bem, como quiser, srta. Bridgerton.

— P-Preciso ir, não posso demorar muito. - Agatha ficou de pé. - meu pai ainda não terminar de analisar o livro, vamos ter que combinarmos de nos vermos novamente.

Por fim, quando Lewis finalmente a acompanhou até em casa, ficou combinado que os dois se encontrariam na festa no jardim de Lady Riverdale, onde poderiam conversar sem causar suspeitas. Estranhamente, Agatha parecia mais quieta e distante do que antes, quando falava empolgada e com bastante intimidade com ele. Será que tinha feito algo que a desagradou?

Essa possibilidade lhe doeu mais que o normal, por algum motivo.

~

Agatha estava mais nervosa que o normal. Desde que saíra de casa, não parava de perguntar se seu penteado estava bonito e de checar se sua saia estava bem alisada. Estava calor, mas todo seu suor não era causado pela temperatura, disso ela tinha certeza. Sua mãe estranhava sua atitude, uma vez que ela costumava sempre estar bem quieta e tímida.

— Agatha, pare de mexer no vestido, ele está perfeito. - advertiu sua mãe, quando chegaram à festa. - por que não para de olhar para os lados assim? Está procurando por alguém?

— O que? Não! - respondeu de imediato, em seguida tentando parecer mais calma. - não é isso, eu só estava… Analisando os rostos conhecidos. Olhe, aquela não é sua amiga Lady Turner? Por que não vai cumprimentá-la?

— É mesmo, não a tinha visto. Venha comigo.

— Prefiro sentar um pouco e beber algo, estou morta de sede.

Ela deu um sorriso amarelo, e Penelope avaliou a filha por um momento. Mas pareceu convencida de que ela falava a verdade, pois apenas pediu que não saísse de seu campo de visão. Inventara aquilo de estar com sede, mas reparou em segundos que estava, de fato. Transformando sua mentira em verdade, foi até o aparador e se serviu de um copo de limonada, que serviu tanto para molhar a garganta quanto para acalmar seus ânimos.

Desde a última vez que vira o conde o rosto dele não saía de sua mente, de como ele era divertido, gentil, criativo, forte e… Bem, na verdade, ele não fizera nenhum feito que exigisse força física, mas tinha certeza de que ele era forte. E bondoso. Com certeza era do tipo que dava pagamentos a mais para os empregados no fim do ano, e se lembrava do nome de todos os arrendatários.

— Limonada é uma ótima ideia, hoje está um dia absurdamente quente, não concorda?

O coração dela bateu descompassado quando virou-se de costas e deu de cara com Lewis, sorrindo para ela. Ele finalmente havia chegado! Não ouvira o som de seus passos, ele andava bem sorrateiramente, pelo jeito.

— Lorde Macclesfield, não o vi chegar.

— Acabei de chegar. - ele também se serviu de um copo. - e então, tem novidades para a minha pessoa?

— Sim, vários!

Sentindo as bochechas doerem de tanto sorrir, a moça disse a ele animadamente tudo o que o pai lhe passara. Colin Bridgerton estava especialmente empolgado na tarefa de crítico do livro, o que fora uma surpresa para Agatha, que não esperava aquilo do pai. Ele a questionara apenas uma vez sobre o autor, e quando ela disse que era segredo, pareceu que ele desconfiava que ela própria fosse a autora e estivesse com vergonha de admitir. Deixou que o pai pensasse assim pois, se dessa forma ele se tornava mais empenhado, que fosse.

— Quer dizer então que se errei nesse capítulo? Porque se for assim…

— Olá, Macclesfield. Srta. Bridgerton.

Lady Riverdale se aproximava deles junto da filha mais nova, que deveria mais uns dois anos mais velha que Agatha. Ela gostava de ambas, tanto a matrona quanto a filha era pessoas encantadoras, com um sorriso e um brilho natural que poucos da aristocracia dispunham.

— Milady, perdão, que rude de minha parte. - Lewis se virou para a mais velha, beijando elegantemente sua mão, em seguida, beijando a da filha. - estava em uma conversa tão excitante com srta. Bridgerton que me esqueci de cumprimentá-la. Espero que me perdoe, este coração se romperia se a senhora se chateasse comigo.

— Oh, menino, pare com isso. - ela riu, e virou-se para Agatha. - ele sempre faz isso, me tratando como uma jovenzinha, olhe só! Desse jeito deixará lorde Riverdale enciumado.

— Eu não sonharia em irritá-lo ou teria que enfrentar a destreza de seus punhos.

A marquesa, que se chamava Elizabeth, riu novamente. Ela era sobrinha da falecida Lady Danbury, e Agatha se lembrava de vê-la durante algumas visitas à velha senhora, a quem seu nome fora dado a homenagem. Inclusive, se não estivesse enganada, a própria também tinha uma filha chamada Agatha, em homenagem à falecida.

Percebeu que Lewis era uma pessoa muito sociável. Ele conversava e desenvolvia assuntos facilmente com Lady Riverdale, que claramente gostava da companhia do jovem conde, como uma madrinha afetuosa com seu afilhado. Após alguns minutos de conversa, ela se lembrou da filha ao seu lado.

— É um prazer revê-lo, milorde. - a moça fez uma elegante mensura, sorrindo educadamente. — é bom vê-la também, Agatha.

— Igualmente. - sorriu de volta.

Bailey Sidwell era uma moça muito bonita. Tinha cabelos loiros, olhos castanhos e um dote absurdamente alto. Não entendia como ela ainda podia estar solteira aos 22 anos.

— Sobre o que falavam antes de chegarmos? Pensei ter ouvido algo sobre um capítulo…

— Falávamos sobre um livro. - Agatha respondeu rapidamente.

— É mesmo? Qual livro?

— Um romance bobo que estou lendo. “Miss Butterworth e o barão louco”.

— Verdade? Eu adoro os livros de Sarah Gourley. Esse é um dos meus preferidos, junto de Miss Sainsbury e o major misterioso.

— Bailey é uma fanática por livros de romance, nossa biblioteca é cheia deles. - explicou Elizabeth. - ela está se aventurando escrevendo o próprio romance, logo irá publicá-lo.

— Mamãe! - advertiu ela, cruzando os braços. - por favor, não liguem para ela. É apenas um hobby, não sei se tenho plano de publicar um dia.

— Um romance? - indagou o conde, interessado. - sobre o que é a história?

Vendo Lewis e Bailey se envolverem em uma conversa empolgante sobre o livro dela, a Brigderton experimentou sensações nunca tivera antes. Primeiro, hesitação, em seguida raiva e depois sobrou apenas tristeza. Era claro que uma moça como Bailey Sidwell, filha de um marquês, de cabelos loiros ondulados e hobbies em comum atrairia a atenção do conde. Não seria surpresa se, em pouco tempo, ele anunciasse um noivado com a moça. A marquesa com certeza faria gosto da união, já que tinha Macclesfield em tão alta conta.

— Tudo bem, querida? - a própria perguntou em voz baixa e preocupada, notando a expressão perturbada de Agatha.

— Está sim, milady. Acho que minha mãe está me chamando, com licença.

A jovem fez uma mensura, e saiu apressadamente do pequeno grupo. Elizabeth olhou para Lewis, ainda concentrado conversando com a filha, e depois para Agatha, que tinha certeza de que não fora chamada pela mãe. A marquesa sorriu, entendendo o que se passava, então chamou atenção da filha.

— Veja, Bailey, a srta. Cavender está ali sozinha, por que não vai conversar com ela? - sugeriu sutilmente, depois virando-se para o conde em tom de desculpa. - ela perdeu os pais ano passado, coitadinha, acabou de tirar as roupas de luto.

Lewis sorriu murmurando palavras de compreensão, e quando as duas se retiraram reparou que estava sozinho. Onde Agatha se metera? Queria aproveitar o tempo da festa para conversar com ela, queria saber mais sobre as críticas de seu livro, cada detalhe era importante. E, talvez até mais importante do que isso, queria saber sobre ela.

As características de Agatha Bridgerton eram muito interessantes. Ela era muito expressiva, de longe entenderia a abrangência de qualquer assunto que ela falasse, apenas por sua expressão. Ela também era muito divertida, sabia apreciar uma piada e devolvê-la com uma cômica ironia como ninguém. Apesar de se mostrar tímida e retraída para o resto da sociedade, os primos e irmãos a consideravam uma das pessoas mais engraçadas da família, que todo ano, no natal, dava um show de piadas para entreter seus consanguíneos.

Se achava um idiota por nunca antes ter trocado mais que meias palavras com ela. Sua mãe estava certa em dizer que a moça era encantadora, mas para ele, ela era mais do isso. Agatha era… Algo bem maior do que isso, com certeza, mas ainda que se esforçasse para defini-la, nenhum adjetivo parecia se igualar ao seu pensamento.

Durante o resto da festa não desgrudou o olho dela, que curiosamente em momento nenhum se virou na direção dele, para que seus olhares se cruzassem. Conversou com alguns amigos ali presentes, como Bernard Sidwell, - o herdeiro do marquês de Riverdale – Kenneth Ravescroft, cunhado de sua irmã, e William Ridgely, o herdeiro do duque de Ashbourne. A festa estava cheia de pessoas influentes e parentes de pessoas influentes, então não se surpreendeu quando viu Agatha conversando com estas pessoas, a maioria delas homens que eram maridos em potencial.

Sentiu uma frustração ao ver aquilo, passou o resto do dia carrancudo e causou estranhamento nos amigos, que diziam que era raro vê-lo aborrecido. Mas o que ele poderia fazer? A Bridgerton era uma debutante como qualquer outra, era totalmente normal que socializasse com outros cavalheiros. Ela estava… Rindo? O incômodo começou a aumentar. O que o idiota do Norman Berbrooke tinha de tão engraçado para dizer?

— Está muito tenso, Macclesfield. Tem que relaxar, por que não vai conosco até o bordel esta noite? - algum dos outros rapazes perguntou, mas nem se deu ao trabalho de se virar para ver quem era.

— Eu passo.

Não sentia vontade alguma de se deitar nenhuma mulher. Pouco tempo depois, foi embora, saindo dali com um mal humor terrível que não tinha há anos.

~

Assim que voltou para casa, Agatha pediu ao pai que terminasse o livro e fizesse logo uma crítica completa, para que assim ela pudesse se ver logo livre de Lorde Macclesfield. Era difícil admitir, mas estava quase certa de que estava apaixonada por ele, e queria arrancar aquele sentimento de si antes que se transformar em algo maior, que tornaria sua queda maior ainda. Lewis era um homem muito bonito e charmoso, e muito inteligente também. Ele nunca se interessaria por alguém como ela, que não tinha uma beleza arrebatadora nem talentos aparentes.

— Como você está linda. - seu pai pegou sua mão e a girou, fazendo-a dar uma voltinha. - parece sua mãe com esse vestido.

Estava vestida para o baile de Lady Wexford, que, para ela, era e sempre seria apenas sua prima Belinda. Todos os anos era de costume que fizesse um baile de verão, muito esperado pela nobreza e que geralmente contava com a presença de jovens estudantes que estavam em casa para as férias de verão. Seu irmão mesmo, Thomas, chegara há uns dias, mas nem isso conseguia animar seus ânimos.

Tudo o que se passava em sua mente eram a visão de Lewis com meninas como Bailey Sidwell.

Lewis… Quando começou a pensar nele assim?

— Agatha? - o pai chamou, notando-a distante. - está tudo bem?

Suspirou, esforçando-se para parecer melhor.

— Está sim, é apenas uma enxaqueca.

— Não precisa ir se não quiser, tenho certeza de que Belinda vai entender.

— De forma alguma, não é necessário, logo vai passar. - forçou um sorriso. - onde Thomas e mamãe estão? Desse jeito vamos chegar muito tarde.

— Seu irmão está terminando de se arrumar e sua mãe foi apressá-lo, sabe como ele é. - o homem grisalho revirou os olhos. - já estou ficando com fome. Vou à cozinha buscar algo, nem que seja um pãozinho.

— Vou com você. - ela caminhou junto ao pai.

Colin olhou-a de soslaio, surpreso. Agatha comendo deliberadamente? Isso era novidade, há meses que a filha parara de se alimentar direito. Não disse nada, até porque não queria tocar nesse assunto, mas, sem ela soubesse, talvez já tivesse em mente a provável causa daquela mudança repentina.

~

— Quem você tanto procura? É uma moça? Como ela é? É bonita?

Lewis quase se esquecera como irmãs podiam ser irritantes.

Olhou para o cunhado, plantando ao lado dela.

— Ravenscroft, eu suplico, amordace-a antes que eu mesmo o faça.

Dylan Ravenscroft, o marido de sua irmã, apenas deu ombros e riu de canto, em sinal de rendição. Depois que o tio morrera há três anos sem um herdeiro, seu pai, Blake Ravenscroft, se tornara o novo visconde de Darnsby, transformando Dylan no segundo da linha de sucessão, logo depois de Kenneth, o filho mais velho. Era irônico como depois de cinco filhas mulheres, David Ravenscroft não conseguiu ter nenhum filho homem, enquanto seu irmão mais novo tivera sucesso em ter três filhos homens, - sendo o terceiro batizado de Maurice - e apenas a mais nova uma menina, Marabelle. A conhecera no casamento, uma ótima menina.

— Sugiro que apenas compartilhe seus pensamentos com ela, caso contrário descobrirá por si só.

— Dylan está certo, sabe que eu descobrirei. - Gillian sorriu, convencida. - quem é? É Agatha Bridgerton? Ouvi dizer que estavam conversando no parque há alguns dias.

— Como você sabe disso? Não chegou há pouco tempo da lua de mel?

— Sabe como é, estou sempre a par de tudo e de todos, sou muito bem informada.

— Para mim isso é apenas ser mexeriqueira.

Ela bufou, cruzando os braços de forma nada elegante para um salão de baile. Já estava ficando cheio e não tivera nem sinal de Agatha. Onde ela estaria? Tinha certeza que fora convidada, era prima em primeiro grau da anfitriã.

— E então? É a menina Bridgerton? - insistiu sua irmã, para seu pesar. - deve ser, ela é muito agradável, está apenas um pouco magra demais. Acham que ela ficou doente?

— Gillian, está vendo Portia Featherington logo ali? Sim? Então por que não vai cumprimentá-la e fazer estas perguntas a ela? A mulher é tão fofoqueira que deve saber de minha vida mas do que eu, se dará bem com você. Com licença.

Saiu a tempo apenas de ver a expressão irritadiça da irmã, mas nem se importou. Continuou marchando sem rumo, até que decidiu pegar algo para comer no aparador. Já estava há algum tempo sem se alimentar, e seu estômago começava a reclamar. Quando terminava de comer um canapé, percebeu alguém ao seu lado.

— Olá, meu rapaz.

Colin Bridgerton, em pessoa.

— Sr. Bridgerton. - fez uma breve mensura, um pouco nervoso.

Ele devia ter mais ou menos a idade de seu pai, calculou Lewis, talvez um pouco mais novo. O homem tinha olhos verdes, o cabelo misturado entre tons castanhos e grisalhos, os últimos em maior número, era alto e tinha um sorriso enigmático no rosto.

— Ouvi dizer que esteve com minha filha no parque.

De novo essa história? As pessoas não tinham nada melhor para fazer?

— Sim, fala de Srta. Agatha, certo? É uma menina encantadora.

— Sim, ela é… - concordou, lentamente.

Instantes de um silêncio constrangedor se instalaram.

— Srta. Stephanie Jackson é uma protagonista adorável, Leah Kennedy se tornará uma autora formidável, ainda que falte prática.

Ele sabia. Lewis tinha certeza. Teria adivinhado apenas pela forma como Sr. Bridgerton o olhava, como se estivesse a par de todos os seus segredos, mas se lembrara naquele momento que fora idiota ao ponto de assinar no final de seu livro de anotações, com o pseudônimo de “Leah Kennedy”. E o homem, é claro, como um bom detetive, logo associou as iniciais do nome e sobrenome.

Considerou fingir-se desentendido, mas não adiantaria.

— Como soube?

— Não foi difícil, os boatos sobre você e minha filha, Agatha suspirando pelos cantos… Mas tudo bem. - fez uma pausa na fala para comer a própria bomba de chocolate. - não contarei a ninguém, Macclesfield. Agora, por que não aproveita que a valsa irá começar e convida minha lindíssima filha para dançar?

~

— Se prepare irmãzinha, seu príncipe encantado está olhando em sua direção, será questão de minutos até que venha cumprimentá-la.

O corpo inteiro de Agatha se arrepiou, sentindo o olhar do conde sobre si. Evitando encará-lo, ela se virou para o irmão mais novo, que fazia companhia para ela.

— De quem está falando, Thomas?

— De Macclesfield, é óbvio. Damian me contou que os viram juntos no Hyde Park. - com um sorriso zombeteiro bem característico, o Brigderton se inclinou um pouco na direção dela, murmurando ao seu ouvido: - arrebatou um conde, hein. Muito bem, irmãzinha.

— Não sabia que as novidades de Londres chegavam até as dependências de Cambridge.

— A maioria não chega, mas não foi lá que soube disso. Damian me disse ontem na taberna, recebeu a informação em primeira mão da irmã. Ah, é Miles ali? Vou falar com ele.

A irmã de Lewis não estava em lua de mel? Pensou em perguntar sobre aquilo, porém não teve a chance, pois assim quando viu, já estava sozinha. Revirou os olhos. O irmão era um admirador do primo Miles desde que era novinho.

Pegou uma taça de champanhe que um criado passava carregando em uma bandeja, e mal teve tempo de beber quando alguém passou esbarrando em seu braço, fazendo derramar um pouco do conteúdo em sua mão. Ficou surpresa ao perceber que era Ruby Cavender, por algum motivo.

— Você. - ela sorriu azedamente, encarando o próprio vestido um pouco molhado na barra da saia. - não me surpreendo.

— Me desculpe, não tive a intenção.

— Bem, acho que eu mereço, não?

Agatha não respondeu nada. Os olhos de Ruby estavam diferentes, pareciam sem vida. Provavelmente ainda sofria com a morte dos pais, no verão passado.

— Você emagreceu por que eu disse que você era gorda?

Engoliu o seco. Antes ela tinha medo de garotas como Ruby Cavender, mas agora…

Agora não.

— Sim. Eu precisava disso.

— Não, não precisava. Você era bonita. - a outra deu ombros, entediada - mas não fique se achando por isso.

Então ela saiu, deixando Agatha quase boquiaberta.

Ela… Era bonita?

— Srta. Bridgerton. - ouviu uma voz masculina atrás de si. - me daria a honra de tirá-la para dançar.

~

Era difícil entender com exatidão os sentimentos que floresciam dentro deles, até porque, em nenhum dos dois jamais se apaixonara antes. Lewis já chegara a cogitar cortejar uma dama ou outra, mas nunca foi até o final, ficando extremamente entediado após ter alguns minutos de conversa. O clima e a decoração de um salão nunca foram temas apreciados pelo conde.

Mas com Agatha era diferente. Podiam conversar sobre qualquer coisa, que ele acharia simplesmente fascinante. Era um completo imbecil por nunca antes ter dado atenção a ela. Será que as sensações estranhas que sentia dentro de si também aconteceriam se a tivesse cortejado antes? Sem essa história toda de romances góticos ou de segredos descobertos debaixo de uma acácia-amarela? Ele nunca saberia, mas talvez tudo tivesse acontecido exatamente da forma como deveria. Agora tudo era diferentes. Vê-la ali, valsando com ele, fazia seus olhos brilharem, e se sentiu honrado de dançar com a moça mais bela de todo o baile.

Ela se sentia bonita. Não porque Ruby Cavender a dissera isso, mas porque Lewis demonstrava isso. Sentia o olhar de todos sobre eles, mas ao mesmo tempo, era como se toda a humanidade de repente não existisse mais, e estivessem apenas os dois em todo o mundo, como um feixe de luz sobre eles, a única coisa iluminando uma escuridão sem fim.

— Deveria parar de agredir sua saúde. - ele disse, ainda com os olhos vidrados nela.

— Eu precisava ficar magra. - respondeu. - foi apenas assim que funcionou.

— Isso é ridículo. Há várias maneiras de manter a boa aparência sem precisar vomitar.

— Como sabe disso? O senhor é médico?

— Não, mas meu amigo Victor Sidwell é. Ele me disse uma vez.

— Ah. Irmão da Srta. Bailey.

Olhou de uma forma estranha.

— Está com ciúmes?

— Não. - respondeu de imediato.

Em meio à dança, eles se afastaram por um instante, em seguida voltaram ficar perto um do outro.

— Mas Vossa senhoria parecia encantado com ela na festa de Lady Riverdale. - continuou ela, incapaz de se conter. - têm muito em comum, devo admitir. O interesse pela escrita de romances góticos, por exemplo.

Lewis riu, mais só um pouco.

— Já disse que fica esplêndida com ciúmes?

Agatha se calou, sentindo as bochechas arderem.

— Quero saber… - continuou ele. - por que faz isso, Agatha? Por que se manter tão magra?

Mas naquele mesmo momento a valsa acabou, e ele teve que levá-la para perto de algum parente. Antes que ele o fizesse, no entanto, ela se soltou da mão dele, andando em disparada por um corredor. O que ela estava pensando? Estava irritada com ele? Não queria deixar as coisas assim, então a seguiu, mesmo sabendo que aquilo era inapropriado. E se alguém se incomodasse com aquilo, que fosse para o inferno.

— Agatha? Agatha!

— Talvez… - ela parou de repente, surpreendendo-o um pouco. Ainda estava de costas, com os ombros tensos. - …seja porque meninas magras conseguem maridos.

— O que?

— Estou respondendo sua pergunta.

Por alguns segundos, Lewis não soube o que dizer. Logo ele, uma pessoa tão comunicativa.

— Não entenda errado, Lewis, mas temo que nossa parceria termine aqui. Papai logo vai terminar de ler seu livro, e não teremos mais que nos encontrar dessa forma. Será algo bom, pois assim os boatos sobre seu falso interesse sobre mim não o incomodarão mais. E não precisa se preocupar, eu nunca falarei nada a ninguém, seu segredo está a salvo.

Ela se virou de frente para ele, forçando um sorriso. Mas estava claro nos olhos dela que ela segurava as lágrimas. Estava chateada. Ele a havia chateado.

Olhou para um lado e para o outro, e viu que ninguém estava por perto. Puxou-a pela mão, e abriu a primeira porta que viu, entrando e prensando Agatha na parede, de olhos arregalados.

— Lewis?

Era doce ouvir seu nome na voz dela, mas teve que impedi-la de falar, beijando-a como se sua vida dependesse disso. Ela estava assustada no início, mas sentiu que o desejo dela crescia tanto quanto o seu no momento em que seus lábios começaram a correspondê-lo num ato instintivo inacreditavelmente perto.

— Não ligo paro o seu peso… Você é perfeita, Agatha. - beijou-a rapidamente mais duas vezes. - perfeita para mim, e é tudo o que importa, porque eu me casarei com você, e quero vê-la sendo feliz.

— Você… - a voz dela falhou. Estava tão feliz e estupefata que era impossível mensurar. - você se casará comigo? Por que? Por causa dos boatos?

— Não. - negou com a cabeça, ajoelhando-se diante dela, segurando uma de suas mãos. - não me importo com aquilo, não afetou em nada minha decisão. Me casarei com você porque é a mulher mais extraordinária que conheço, que me deixa louco e que me faz pensar em você todas as horas do dia. Porque eu a amo, e quero que seja minha leitora mais assídua e fiel.

Ela ainda estava muda, encarando-o.

— Isso, ahn… - ele pigarreou, de repente um tanto constrangido. - isso se for do seu desejo.

— Mesmo que seus monólogos sejam ridiculamente melosos e que suas descrições de um quarto sejam medíocres?

Aquilo doeu, só um pouco, mas ele riu, ficando de pé.

— Sim, ainda assim, terá que ler meus livros.

Ela sorriu.

— Me casarei com você, mas porque o amo, não porque gosto de romances góticos. - o sorriso dela aumentou. - é uma condição que me faz hesitar, sinceramente, mas nem tudo é perfeito, não?

Então eles riram, tão alto e tão plenamente que nem se importaram se alguém os ouviria ali ou não. Se beijaram e se amaram como se não houvesse amanhã e, para completar o dia com chave de ouro, se debruçaram sobre o aparador deliciando-se do bufê.

Um mês depois, estavam casados, e o livro “O amanhecer dos crisântemos” de Leah Kennedy foi publicado, sendo um verdadeiro sucesso de vendas. - “Inexplicavelmente” - acrescentou Agatha. Lewis comentou como ela era cruel dizendo aquilo, mas sabia que era apenas uma brincadeira da esposa.

Até porque, a vira ler seu livro debaixo da acácia de seu próprio jardim, ainda que ela já o tivesse lido um milhão de vezes.

Ela sorria, e para ele, aquilo era tudo o que importava.


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Notas finais do capítulo

Ownnntt esse conto foi tão fofo ♥ A ideia inicial era fazer com que o “Lewis” atual fosse na verdade “Damian”, que troquei e coloquei como o nome se seu irmão mais novo, porque vi em uma série o nome Lewis e… Bem, achei mais bonito ‘3’ Desculpem se houve algum erro de digitação, revisei duas vezes mas sabem como é, sempre passa alguma coisa despercebida. Fico no aguardo pelos comentários de vocês, flores do meu jardim ♥ E fiquem aí com as participações e situação, que neste conto, foram muitas!
Participações:
Elizabeth Sidwell - protagonista de "Como se casar com um marquês"
Bailey Sidwell ?“ 5ª filha de Elizabeth e James.
Dylan Ravenscroft ?“ 2º filho de Blake e Caroline, do filho “Como agarrar uma herdeira”.
Gillian Ravescroft (ex Kemble) ?“ 2ª filha de Robert e Victoria de “Mais lindo que a lua”.
Ruby Cavender ?“ filha de Cavender, vilão do livro “Um perfeito cavalheiro”
Citações:
Kenneth Ravenscroft - filho mais velho de Blake e Caroline.
Maurice Ravenscroft - 3º filho de Blake e Caroline.
Marabelle Ravenscroft - 4ª filha de Blake e Caroline.
Damian Kemble ?“ 3º filho de Robert e Victoria.
Norman Berbrooke ?“ filho mais velho de Nigel Berbrooke.
William Ridgely - filho mais velho de Alexander e Emma, do livro "Esplêndido", ainda não publicado no Brasil. (Personagem oficial da JQ)
Bernard Sidwell - filho mais velho de Blake e Caroline.
Victor Sidwell ?“ 3º filho de James e Elizabeth
Lady Turner - ex Miranda Cheever, atualmente Miranda Bevelstoke, do livro "História de um grande amor" (Personagem oficial JQ)



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