Lie to me escrita por Tati Rodrigues


Capítulo 2
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Olá, espero que gostem!



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Voar foi a coisa mais assustadora da minha vida... Não, acho que passar 15 minutos achando que eu iria ter que morar nas ruas de Fortaleza passando fome foi a coisa mais assustadora da minha vida, mas o avião chegou bem perto disso. Sou completamente adepta da ideia de que, se o ser humano fosse feito para voar ele nasceria com asas.

Mesmo assim aqui estou eu, rumo a um novo capítulo da minha história. Deixar meus amigos pra trás foi mais difícil do que imaginei. Nunca esperei ter que partir pra tão longe. Minha ideia de vida se resumia em apenas um estado brasileiro, jamais imaginei sair da minha zona de conforto, mas agora eu tenho a oportunidade de viver um sonho, desperdiça-la não é uma opção.

Fui de primeira classe, o que me faz pensar que essa universidade seja ainda mais rica do que imaginei, ao mesmo tempo em que meditava que tipo de pessoa eu encontraria lá. Quer dizer, é uma universidade extremamente seleta, na lista de formandos que estava disponível no site tinha nomes desde magnatas do petróleo até filhos de políticos renomados. Não havia uma única pessoa formada ali que não conseguiu fazer um nome pra si mesmo.

Era isso que eu queria e ao mesmo tempo estava morrendo de medo de conseguir. Se os formados eram desse nível, como será os alunos? E os bolsistas? Como eram tratados? Eu estava nervosa, estava ansiosa, tremendo de verdade. A minha vida depois que entrei no orfanato foi um verdadeiro inferno e grande parte se deve a escola. Os professores nos tratavam diferentes, os colegas se achavam superiores, era complicado.

Agora imagine como será isso em uma universidade onde cada aluno tinha mais dinheiro que todas as pessoas que eu conheço juntas. Isso não iria prestar, mas ao mesmo tempo tinha que ser. Era isso ou nada. E o "nada" não era uma opção. Além disso, eu era boa em me adaptar, eu e minha mãe vivíamos nos mudando, sempre uma cidade diferente, uma escola diferente. A diferença é que agora eu não a tinha mais como meu porto seguro.

Depois de mais de três horas de viagem cheguei ao meu destino. Havia uma pessoa com o meu nome escrito em uma placa e foi a ele que me dirigi assim que peguei minhas malas.

—Vicktoria Santiago? - o homem que parecia ter uns trinta anos me perguntou.

—Sim, sou eu. - respondi timidamente. Ele parecia o segurança de um daqueles filmes que eu assistia com a minha mãe. Todo engravatado e de óculos escuros. Estava chamando bastante atenção, coisa da qual eu não gostava. Parecia que ele estava ali pra esperar a filha do presidente, e não a mim.

—Ah que ótimo, o vôo não atrasou como foi previsto. Eu sou Samuel, seu motorista enquanto estiver na cidade. É um prazer finalmente conhecê-la. Deixe-me ajudá-la com as malas.

Espera, motorista enquanto eu estiver na cidade?

—Me desculpe, mas enquanto eu estiver na cidade? Eu vou morar aqui por pelo menos mais quatro anos, o senhor não veio aqui só pra me buscar? 

Ele olhou pra mim visivelmente confuso.

—O contrato que assinei dizia claramente que serei seu motorista pelos próximos cinco anos senhorita, não se preocupe.

—Mas, quem o contratou pra isso?

—A reitoria da ULXIV. Será que poderíamos continuar essa conversa no carro? Temos um horário a cumprir.

—Como assim? As aulas só começam na semana que vem, não tenho compromisso nenhum até lá. - comecei a andar atrás dele desesperadamente. Eu não podia ter confundido as datas, eu conferi várias vezes, não era possível ter ocorrido um engano.

—Claro, mas a senhorita tem que comprar o material, e principalmente o uniforme. É expressamente proibido frequentar as aulas sem uniforme. Então a senhorita precisa encomenda-los o quanto antes. - ele dizia enquanto abria a porta de um carro preto de vidros escuros estacionado não muito longe da porta pela qual saímos.

E pela primeira vez algo me ocorreu. Eu não tinha dinheiro pra comprar nada disso. Não sabia que precisava de uniformes, as fotos que eu vi todos os formandos estavam de smoking preto, e aquilo não poderia ser o uniforme... Ou será que seria. Meu Deus, não tô conseguindo respirar...

Samuel deve ter visto algo no meu rosto por que imediatamente tornou a explicar.

—Tenho certeza que vai dar tempo a senhorita comprar. O Reitor pediu pra que eu lhe levasse lá assim que chegasse, então não se preocupe. Ele vai explicar melhor como as coisas funcionam.

—Mas...

—Senhorita, eu sou apenas o motorista, não tenho muitas informações além de onde levá-la.

Ele parecia visivelmente cansado. O que fez com que eu sentisse um pouco de culpa por bombardeá-lo com perguntas que ele não saberia responder. Entrei no carro e seguimos em direção ao prédio da reitoria.

Por todo o caminho pairou um silêncio desconfortável, e quando chegamos ao destino me senti em um experimentos social bastante inusitado. Era um prédio enorme, o piso do Hall de entrada era feito em Mármore branco e os móveis eram de uma madeira escura com detalhes em branco. E como se não bastasse o lugar intimidador todas as pessoas estavam vestidas como se estivessem em um tribunal ou algo do tipo. Todos vestidos na maior formalidade. O que causava um contraste absurdo com o meu jeans preto e uma camisa da minha banda favorita.

Segui em direção a recepção do outro lado do Hall e todos olharam pra mim. Era desconfortável, intimidante e constrangedor. Mas continuei de cabeça erguida. Eu iria estudar ali, aprender com os melhores, me adaptar, já tinha feito isso muitas vezes. Vai dar tudo certo.

—Bom dia, sou Vicktória Santiago e tenho um encontro com alguém da reitoria.

A mulher que estava na recepção ficou olhando pra mim como se eu fosse algum tipo de doida ou houvesse algo muito errado com a minha cara. Acho que ela ficou bastante tentada à chamar os seguranças, acho que ninguém nunca foi ali vestido dessa maneira.

Ela ainda assim digitou o meu nome no computador e sua expressão ficou um pouco chocada com o que ela tinha encontrado.

—Me desculpe a demora, aqui, pegue esse cartão e suba direto para o décimo terceiro andar e entregue ele a secretária de lá. Ela vai saber o que fazer. Seja bem vinda à ULXIV.

Ela me deu um sorriso profissional e me indicou o caminho até o elevador. Ufa, eu não seria chutada logo na entrada. Mas o que foi realmente desnecessário era sair do aeroporto direto pra cá, se eu soubesse disso teria me arrumado um pouco melhor.

A secretária, uma senhora que parecia ter uns cinquenta anos, parecia já estar me esperando e ao que parecia não se surpreendeu com a minha roupa, tenho certeza que a moça do térreo ligou pra ela avisando.

—Bom dia, aqui está o cartão. Me disseram pra entregar a você.

—Claro querida, por aqui por favor. Ela já está esperando.

É me levou apressada por um corredor que tinha três salas. Paramos na primeira e ela bateu, e então ouvimos um "entre" com uma voz de mulher.

Eu entrei e o que me esperava era uma sala enorme cuja parede que ficava de frente pra porta era feita de vidro as paredes eram bancas ornamentadas com alguns quadros e diplomas. Os móveis pareciam feitos da mesma madeira dos anteriores, havia um sofá branco encostado em uma das paredes e uma mesinha segurando um jarro de flores na outra. O piso era totalmente forrado com um tapete vermelho, a única coisa que dava cor àquele lugar, além das flores, rosas vermelhas.

A mulher sentada era relativamente nova. Eu diria que ela tem uns trinta anos. Era alta magra e tinha uma aparência severa. Ela me olhou de cima a baixo e crispou os lábios obviamente desaprovando minhas roupas, que diferiam totalmente das delas. Ela vestia um terninho preto por cima de uma blusa branca, e uma saia que ia até a altura dos joelhos, o cabelo preto preso em um coque apertado lhe dava um ar de superioridade natural.

—Entre senhorita Vicktória, sou Emma Deluffer, você está um pouco atrasada e temos muito o que conversar.

Ela falou suavemente e apontou a cadeira de frente a mesa para que eu sente.

—Sei que tem muitas perguntas, mas me deixe falar por enquanto, explicarei as regras daqui e espero que não me interrompa. Pra começar administração é um curso obrigatório a todos os bolsistas, ajuda a entender um pouco o mundo dos negócios, já que todos os outros alunos estão aqui pra gerir as empresas da família, ajudamos os bolsistas dando a oportunidade de se associar a alguns deles e se demonstrarem algum talento podem conseguir um emprego antes mesmo de se formar. Pelo que vi você pretendia fazer história certo? - ela não me deixou responder - não é muito útil para seu futuro, a não ser que queira ser professora. Deus me livre pensar nisso. Professor é uma profissão muito mal valorizada apesar de, na minha humilde opinião, a mais importante de todas. E de qualquer forma, o curso de História só ficou aberto até o período passado, infelizmente o público alvo da nossa universidade não se interessa por nada que não envolva ser bem sucedido nos negócios da família. Mas voltando ao assunto, com a sua nota você poderia fazer o curso que quisesse, por que perder tempo em história?

E mais uma vez ela não me deixou responder, mesmo que eu quisesse esfregar na cara dela a importância de estudar o passado pra evitar repetir as merdas que aconteciam em épocas passadas.

—Vejo que temos uma vaga em Hotelaria. Por que não transferimos você pra lá? Você mora no Nordeste não é? Tem ótimas oportunidades de emprego, lugar lindo lá. O Turismo também é uma ótima opção. Ah, não temos vagas nesse curso vejamos... É, acho que Hotelaria é a melhor opção,vou matricular você nesse. E como já tem administração na grade curricular não faz muita diferença o curso obrigatório.

Eu não queria Hotelaria, Administração nem nada do tipo. Mas era isso ou a rua. Então vamos seguir o barco e ver onde isso vai dar.

—Sim, é obrigatório ir de uniforme as aulas, bolsistas não podem faltar, a não ser que tenha atestado médico, qualquer outro motivo perde a bolsa. O material escolar e o uniforme serão fornecidos pela Universidade. Junto com a moradia, transporte e alimentação. Você só tem que se preocupar em estudar. A média pra ser aprovada nas disciplinas é 8, então se esforce pra consegui-la. E por último mas não menos importante, é terminantemente proibido comunicar a qualquer outro aluno, ou professor, ou quem quer que seja, que você é bolsista.

—O que? Por quê? - não consegui segurar a pergunta.

—Aqui temos a regra de todos serem iguais. Não importa se é filho do presidente ou morador de rua. A identidade de alguém não interfere em como é guiada sua educação. Portanto não dizemos quem é bolsista ou não, não dizemos quem é o pai de quem, nem nos importamos com poder, dinheiro ou fama. Se está aqui pra aprender é só isso que importa. Alguma pergunta?

Tenho certeza que assim que saísse dessa sala teria várias, mas no momento nenhuma delas apareceu na minha cabeça. Então neguei com a cabeça.

—Ótimo. Aqui está um cartão de crédito em seu nome. Todo mês depositamos dez mil reais pra suas despesas básicas na cidade. Terminamos por hoje. Você pode ir. Peça a Samuel pra levá-la ao Kartner o quanto antes, uniformes demoram a ser feitos e você precisa deles pra segunda.

Então ela voltou a digitar no computador e eu percebi que fui dispensada. Ainda em estado de torpor sai da sala fechando a porta devagar. Não lembro nada do caminho do elevador vazio, nem como entrei no carro. Só percebi onde estávamos quando o Samuel perguntou pra onde iríamos a seguir, uniformes ou casa?

—Me leve pra casa por favor.

—Okay, casa então.


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Notas finais do capítulo

Se vocês puderem e quiserem, interajam comigo pelos comentários, vou adorar conhecer vocês, abraços ♥️



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