Listras, Poesias e Paixões escrita por Geovanna Danforth


Capítulo 9
Eight


Notas iniciais do capítulo

Não, não é fácil escrever. É duro como quebrar rochas. Mas voam faíscas e lascas como aços espelhados. (Clarice Lispector)



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/792763/chapter/9

O sábado chegou e com ele minha ansiedade para a noite que me aguardava. Não tinha falado com ninguém ainda sobre aquilo, decidi que falaria com Gabriel apenas à noite, mesmo que eu fosse ansiosa demais muitas vezes tinha a habilidade de me controlar, um comportamento oposto ao da minha família, e isso iria me fazer permanecer estável até a hora de declamar minhas palavras.

Fiquei mais tempo que o normal no banheiro tentando decorar meu poema, eu havia sentido uma espécie de arrepio quando falei em voz alta o que tinha escrito, nunca tinha dito em voz alta o que eu sentia como havia feito agora, exceto quando recitei para Paulo e olha no que deu.

Quando saio do quarto Carol me olha do pé da escada, ela está segurando um Garfield de pelúcia que ganhou da filha do meu único tio que não temos tanto contato, e isso já faz bastante tempo, ela abre a boca com total exagero.

— Nossa Nicole, você que fez isso no seu olho?

— Está falando do delineado de gatinho?

— É esse nome?

— Sim, aprendi num tutorial no You Tube.

— Ah Nicole, eu quero!

Chego ao pé da escada junto com Carol e me agacho pra falar com ela.

— Primeiro que isso não é pra crianças, mas se a mamãe deixar podemos fazer outro dia desses, mas só pra tirar fotos!

— Eba! _ diz ela sorrindo e batendo palmas. _ Aposto que hoje você vai namorar né?

— Me respeita Carol, o que tem a ver o meu delineado de gatinho com namorado?

— Não é só isso, é que você tá toda arrumada. _ fala ela com um sorriso péssimo.

— Agora sim... a pessoa não pode nem se arrumar mais que já pensam que é pra agradar macho.

— Macho?

— É, masculino de fêmea.

— Então você é fêmea?

— Carol, tenho que ir, depois te explico sobre palavras masculinas e femininas.

Beijo a cabeça da garota sapeca e observadora e sigo pelo corredor com meu vestido azul de saia godê.

***

Quando estacionamos no clube Gabriel está mais animado que eu, sinto uma fraqueza nas pernas, estou super nervosa, a última vez que me senti assim foi no seminário da semana passada mas Geane soube contornar a situação e fizemos uma boa apresentação.

— E então, não vai me contar qual poema vai recitar? _ pergunta Gabriel.

— Acho que eu preciso primeiro ir falar com o carinha lá...

— O seu boy?

— Não, o tio responsável.

— Ah sim. Falando na tentação... _ Gabriel murmura e em seguida acena com a cabeça pra Paulo que está perto da porta, ele segue em direção a uma mesa e eu paro um instante, meio sem jeito.

— Boa noite, tudo bem?

— Boa noite, tudo pampa, e com você?

— Estou meio nervosa. _ falo e cruzo os dedos.

— Por que está nervosa?

— Eu acho que... vou recitar um poema hoje.

— Sério? Nossa Nicole, isso é muito bom. E já se inscreveu?

— Acho que vou fazer isso agora...

— Certo, o Caio está bem ali. _ diz ele e aponta para o tiozinho animado perto do palco.

— Ok, obrigada.

— Ei, vai dar tudo certo.

— Espero que sim. _ dou um sorriso amarelo e vou atrás de Caio.

Por sorte ele diz que posso recitar hoje e concorrer com os novos poetas da próxima temporada, porque essa já está findando, dou meu nome e o título do meu poema, depois sento perto de Gabriel com o coração a mil, e espero a minha vez.

***

Eu não sabia que essa luz que iluminava em cima do palco era tão forte, como meus olhos eram sensíveis eu já estava lacrimejando então tentei me concentrar em outro ponto que não me deixasse mais nervosa, os jurados estavam diante de mim, ansiosos pra me ouvir, um vento subia por minhas pernas e coxas por debaixo do vestido até que eu encontrei um olhar perto da porta.

—Você pode pegar. Pegar e levar. Levar tudo de mim. Tudo que eu sou. Porque é tudo que eu tenho. _ Respiro fundo. _ Você pode pegar. Pegar meu coração. Coração idiota. Que insiste em dizer que é seu...

O olhar de Paulo, mesmo com aquele desejo inflamado, acabava por ser tão delicado, e eu não sabia explicar como eu acabava por me sentir confortável, nem parecia que várias outras pessoas estavam me olhando, talvez eu me sentisse bem melhor ao recitar aquelas palavras olhando pra ele, porque ele também era a razão de eu tê-las escrito.

— Você pode pegar. Pegar meus sentimentos. Sentimentos que brotaram numa terra dura. Como uma flor num dia sem chuva. _ continuo. _ Você pode pegar. Pegar e levar. Levar meu coração. Porque ele decide quem eu sou. Ele é tudo que eu tenho. _ Respiro fundo novamente. _ Por favor pegue e leve. Dê um fim a esse tormento...

Engulo em seco enquanto a plateia libera uma salva de palmas pra mim. Agradeço timidamente e saio em direção a Gabriel que me encara com uma cara muito boba. Sento na cadeira perto dele ainda nervosa mas com uma sensação de alivio enorme.

— Nicole, _ diz ele _ eu sinceramente não sei o que dizer, estou muito orgulhoso de você.

— Acha que eu fui bem? O poema era bom?

— Estava tudo ótimo, até esse seu olho de gatinho.

— É delineado, tá?

— Certo, _ Gabriel ri _ tenho certeza que você vai passar pra próxima fase.

— Espero que sim. _ falo e suspiro. No mesmo instante encontro o olhar de Paulo, sorrimos um para o outro e eu me controlo com todas as forças pra não ir até ele, porque eu sei que se eu for ele pode até perder o emprego.

***

Eu e Gabriel saímos do clube sorrindo já comemorando minha aprovação pra próxima fase do concurso, até que ouço alguém chamar meu nome. Quando me viro Paulo vem andando rapidamente até nós.

— Nicole, só queria te dar os parabéns, e desejar sorte pra próxima fase. _ diz ele.

— Ah obrigada. _ falo sorrindo.

Ficamos meio sem jeito e Gabriel nos encarando com os braços cruzados até que ele percebe meu olhar.

— Vou ali pegar a moto. _ diz ele.

— Tá, vou te esperar aqui. _ respondo.

O olhar de Paulo me analisa.

— Você está muito bonita hoje.

— Obrigada. _ respondo sorrindo.

Mais silêncio. Até que ele estende a mão pra mim. Coloco a minha sobre a dele e apenas sentimos, não sei se é a mesma sensação pra ambos, mas eu sinto calor e conforto, até que percebo Gabriel se aproximando.

— Eu preciso ir. _ murmuro.

— Certo.

Antes que eu me vire Paulo me puxa e seus braços me envolvem. É automático como nossas mãos sabem onde ficar. Sinto um beijo leve em meu pescoço e me despeço do cabelo dele onde meus dedos se enfiaram. Nossos olhares se despedem silenciosamente enquanto as mãos dele ainda permanecem na minha cintura. E a buzina da moto de Gabriel nos traz de volta pra realidade.

— Vamos lá madame. _ chama ele.

— Boa noite. _ me despeço sorrindo e ao mesmo tempo querendo esganar Gabriel.

— Boa noite. _ a voz de Paulo ressoa atrás de nós enquanto seguimos na rua.

— É impressão minha, _ falo meio que gritando na moto _ ou você está com ciúme?

— Eu? Com ciúme de quê?

— De quem né amado...

— Nada a ver Nicole, só não quero que você se machuque.

Sorrio comigo mesma e respondo:

— Obrigada bebê.

Abraço Gabriel na moto e seguimos assim até em casa.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Listras, Poesias e Paixões" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.