Entre um Amor e um Perseguidor Psicótico escrita por Maria Chinikoski


Capítulo 4
Capítulo 04


Notas iniciais do capítulo

Reúnem-se nesta história, relatos de terceiros, experiências próprias e observações feitas a partir de jornais e matérias sobre uma triste grande realidade da nossa época. Por favor, comentem a história, contem casos de vocês ou de terceiros. Já passaram por algo parecido? Se já, como agiram?



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Dormi boa parte do caminho, com um travesseiro de pescoço que comprei no aeroporto. O banco ao lado estava vago, então me espichei bastante. Estava com enjoos e dor no estômago. Talvez seria melhor ter comido alguma comida de verdade no caminho.

Já era final da tarde quando o ônibus parou para embarcar os passageiros em uma cidade no meio do caminho. O motorista anunciou que parariam por meia hora para jantar, então esperei algumas pessoas subirem e outras descerem até arrumar meu cabelo e pegar minha carteira para ir jantar.

Antes que eu levantasse, um rapaz mais velho que eu, moreno e forte, chegou e pediu licença.

— Com licença, moça. Meu lugar é o da janela!

Eu iria sair para o corredor, mas ele foi entrando sem se tocar da minha situação. Puxei minhas pernas próximas ao corpo e deixei que ele entrasse no lugar. Fiquei incomodada, mas tudo bem.

— Eu ia sair - Ri.

— Vai ficar nesta cidade?

— Não, estou indo jantar. Vou deixar esse travesseiro em cima do meu banco.

Coloquei o travesseiro de pescoço no banco e fui descer para jantar. Antes que eu saísse no corredor, Francielle passou, esbarrando com força em mim e riu ao me desequilibrar e me fazer me segurar no banco. O rapaz que estava no meu lado colocou a mão na minha cintura e me segurou para eu não desequilibrar e cair.

— OPA! - Ele falou, num susto. Depois gritou para Francielle - EI! Toma mais cuidado, moça!

— Obrigado! - Falei, sem jeito.

— Por nada. As vezes acontece de ter uns "sem educação" por aqui - Disse ele, colocando seus fones de ouvido.

Ele usava um perfume bom. 

Espantei qualquer pensamento e desci rapidamente. Peguei um prato e me servi. A comida era por quilo, mas era muito variada. Tinha opções de salgados também, mas fiquei satisfeita com o jantar. 

Tinha um caldo de frango com um cheiro maravilhoso, mas a moça disse que ainda estava terminando de cozinhar e que levaria uns quinze minutos para ser servido. Desisti da ideia.

Paguei a minha refeição e peguei um refrigerante, voltando para o ônibus mais rápido que qualquer outro.

Depois de voltar ao ônibus, vi que estava quase vazio, exceto por um homem ao fundo, uma mulher que comia salgadinhos com as crianças no primeiro banco e o rapaz do meu lado.

Sorri e sentei ao lado dele. Por alguns minutos ficou um silêncio total, até que ele tirou os fones e me perguntou:

— Você não é do Mato Grosso, é? 

— Na verdade, eu era, mas tem muitos anos que moro em São Paulo.

— Nossa! Seu sotaque é diferente! E o que está fazendo tão longe de casa?

— Vou para Juína visitar uns parentes e depois passear pelo Mato Grosso... E você?

— Eu trabalho lá. Estava aqui trabalhando por falta de pessoal na empresa, dai agora vou voltar para lá.

— Legal. Trabalha em que empresa?

— Ah... Trabalho em uma empresa lá... - Ele desviou do assunto e olhou ao redor. Parecia que estava com medo de dizer, então sussurrou - Eu... Trabalho no banco.

— Banco? E porque esse sussurro todo? - Dei risada.

— Sempre alguém vem me perguntar algo sobre meu serviço e...

Olhei para ele e vi uma oportunidade de fazer piada.

— Então, sabe, já que trabalha no banco, poderia me tirar uma dúvida? É que...

Olhei a cara dele perplexa e cai na risada. 

— Estou zoando com a sua cara! - Dei um tapinha no ombro dele.

— Eu realmente ia ter um treco do coração! Não faz mais isso!

Eu ri novamente e estendi a mão:

— Me chamo Cátia!

— Prazer. Meu nome é Bernardo.

Ficamos novamente em silêncio por um tempo.

— E Juína, tem alguma coisa nova na cidade? Saí de lá há muito tempo.

— Bem... Se quiser, tem o cinema, os shoppings... - Eu até fiquei animada, mas ele riu da minha cara - Sério isso? Você acreditou?

Ri junto dele.

— Olha, Cátia, se gostar de rio, tem a praia do rio Juruena. Tem que ir de barco, mas é bem legal lá.

 

— Eu vou ver se consigo dar uma visitada antes de ir embora.

— Pretende ficar quantos dias?

— Ainda não sei, depende de onde minha irmã vai comigo. Eu queria fazer um passeio por Nobres, Chapadas dos Guimarães, as cachoeiras de Tangará... - Ele fez uma careta engraçada e eu ri - O que foi isso?

— Boa sorte! Nesta época do ano vai estar tudo cheio. Compensa irem de carro ou vão perder muito tempo na estrada!

— Também pensei nisso. Mas ela e o marido dela tem um. Vamos no carro deles, se é que eles vão...

— Como assim?

— Ela sempre está muito ocupada e...

Mas antes que eu falasse algo, os passageiros começaram a subir no ônibus e eu senti algo extremamente quente queimar meu peito e barriga. Quando minha cabeça finalmente compreendeu a situação, Bernardo estava me puxando pelo braço enquanto eu me estivava para frente.

Francielle e Maicon tentavam disfarçar, mas estavam rindo. Eles "tropeçaram" e "sem querer" haviam derrubado um pote inteiro de caldo fervendo em cima de mim. Minha blusa, decotada, deixou entrar o caldo e eu estava completamente queimada do pescoço para baixo. 

Os dois se afastaram na confusão enquanto o motorista correu para ver o que um passageiro gritava.

Bernardo foi super rápido, me ergueu pelos braços e me levou para fora, gritando ao motorista que esperasse.

Senti o ar fresco no rosto, mas minha pele queimava.

Ele me levou até o banheiro feminino, enquanto um monte de gente me perguntava o que houve e o motorista berrava com os passageiros.

 

Mais rápido que nunca, o rapaz fez algo completamente impensável para mim no momento: com as mãos fortes e ajuda de uma mulher desesperada que também me ajudava, rasgou a frente da minha blusa em um puxão e me empurrou para a pia, onde ligou a torneira e me fez jogar água fria no peito, por cima do sutiã.

A mulher correu dizendo algo sobre ir na farmácia do outro lado da rua e voltou em menos de dois minutos com uma pomada anestésica para queimaduras e uma funcionária da farmácia logo atrás de mim.  A menina pediu que Bernardo esperasse do lado de fora e começou a me examinar. 

Eu sentia tanta dor que meu cérebro não raciocinava nada. Eu chorava amargamente. 

Depois de passar a pomada e colocar uma gaze em cima da bolha que formou, perguntou se eu tinha uma blusa na mala que fosse fácil de pegar. 

Eu fiz que sim com a cabeça. Só ouvia uma gritaria lá fora e o motorista, provavelmente zangado, gritando com Francielle. Antes que eu saísse naquela situação, Bernardo, ainda na porta, tirou sua camisa social e eu vi que, por baixo, usava uma outra. Ele tirou essa camisa normal e jogou para mim, voltando a abotoar a social. 

— É melhor ela usar minha camisa, por ser mais larga, para não apertar a queimadura.

— As queimaduras não estão tão feias, mas fez uma pequena bolha. Deve sumir em uns dias. Por favor, tome cuidado.

— Quanto... Quanto custa os remédios? - Perguntei.

— Claro que não vou te cobrar! Pode deixar que eu pago! - Disse a mulher do restaurante. Logo percebi que era ela que havia me ajudado junto com o Bernardo.

Sentei um instante, enquanto eles falavam alguma coisa entre eles. Só percebi quando questionavam o motorista sobre o que aconteceu.

Meu sangue ferveu nas veias e eu levantei furiosa, dizendo:

— Foram aqueles dois! 

— Foi um acidente, não foi? - Perguntou Bernardo, confuso.

— Aquele rapaz! O Maicon! Ele e a loira estavam me perseguindo desde São Paulo!

— Querida, você está nervosa... - Dizia a mulher.

— NÃO! Eu quero a polícia! Aquele cara é um maluco!

Foi uma confusão que só! Mas quando foram procurar, quem disse que acharam os dois?

Bernardo perguntou ao motorista do ônibus e ele também não sabia, até que o segundo motorista disse:

— Um casal? Ah, eles que estavam gritando comigo agora há pouco. Reclamaram que com toda essa bagunça o ônibus chegaria atrasado e me fizeram abrir o bagageiro para retirar as malas. Eles acabaram de pegar um táxi e foram embora.

Esfreguei meu rosto com as mãos. Eles fugiram! 

— Vamos entrar, Cátia? - Chamou Bernardo - Eles acabaram de limpar o ônibus... Vamos embora... 

Levantei e o segui, ainda desorientada, até o ônibus.

Sentei e desabei no choro.

O motorista, visivelmente incomodado, entrou e seguimos viajem, sem polícia e sem saber onde estava meu ex maluco.

Bernardo me ofereceu um copo de água que o motorista trouxe.

— Obrigado... - Falei - Por ter me ajudado quando fiquei sem reação... E por emprestar a camisa... Eu te devolvo depois...

— Não se preocupa com isso... Agora me escuta, Cátia. Que papo era aquele de o cara te perseguir desde São Paulo?

Comecei a soluçar.

— Não... Não quero falar sobre isso... Eu...

Mas ele segurou minha mão com força e com a outra mão, puxou meu rosto para ele.

— Olha nos meus olhos! Quero que confie em mim! 

Fiz que não com  a cabeça, mas ele me fez olhá-lo de novo.

— Ou me conta ou, assim que chegarmos em Juína, chamarei a polícia e te acompanharei para prestar depoimento. Se ele está te ameaçando, essa é a hora de dizer!

Olhei naqueles olhos castanho escuros e chorei ainda mais...

Era um longo caminho até a cidade...

Talvez não  fizesse mal desabafar.

 

 

 


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