It Happened Quiet escrita por isa


Capítulo 1
Love is wild.


Notas iniciais do capítulo

Um carinho dedicado à Little Alice, Winnie e Abbie :)
Obrigada por me motivarem a escrever. ♥


~

Musiquinha de título e inspiração: https://open.spotify.com/track/5lFOBt2vYaxoh0oq6EMS4l?si=Ll85Fb9fQu6I5UGDfTDaGQ



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Aconteceu devagarinho e de maneira silenciosa: quando Malfoy se deu conta, lá estava ela em cada brecha de pensamento. Nos quatro pontos do seu coração. Ele conseguia evocar o som de sua risada sem sequer se esforçar e a lembrança tinha um efeito permanente e incorrigível: iluminava todos os recônditos escuros de sua mente atormentada.

Para muitas pessoas, constatar o fato de que se está apaixonado é visto como positivo, ainda que possa ser recebido com doses homeopáticas de receio. Para alguém como Draco, no entanto, o evento se assemelhava bastante à experiência de assistir um filme de terror – gratuitamente violento, sem sentido e reator para desconforto, embora ele não pudesse atestar com certeza, já que nunca havia visto um filme dessa natureza, ou, para fazer justiça, qualquer tipo de filme.

As sensações, no entanto, estavam lá, enfileiradas uma por uma, esperando educadamente a sua vez para saltar diante dele em forma de pensamento autodepreciativo. Por essa razão, ele estava se defendendo do único modo que conseguia conceber aos vinte e poucos anos de idade: se embebedando de uísque de fogo como se não tivesse um fígado para lidar num futuro próximo. Mais do que isso: ele estava se embebedando de uísque de fogo no lugar onde isso poderia lhe gerar grandes chances de levar – e dar, se tivesse alguma sorte – uns socos em algum outro bruxo também bêbado e inconveniente.

Astoria nem precisava ser tão esperta quanto de fato era para imaginar que o encontraria na travessa do tranco. Ela o amaldiçoou três vezes (antes de também se amaldiçoar três vezes pelo gosto extremamente questionável que tinha para homens) e teve tempo de ver Draco sendo jogado para fora de um pub pequeno, malcheiroso e suspeito. À distância ele parecia um boneco quebrado na neve, mas a risada grogue e a fileira de palavrões que saíram de sua boca em tempo recorde foram o suficiente para que ela não andasse nem um passo mais rápido do que o habitual.

 - Ei. –  Astoria cumprimentou, cutucando a perna direita de Draco com a ponta da bota gasta.

— Ei. – ele respondeu, sorrindo. Seu cabelo estava todo desalinhado e um pouco de sangue seco havia grudado no canto interior da boca. Para Astoria era estranho como de algum modo aquilo parecia terrivelmente sexy.

— Você parece bem. – ela ironizou.

— Você precisava ver o outro cara. – e tentou piscar, sem sucesso.

Astoria olhou por cima do ombro para ver se achava indícios de algum outro bruxo estúpido através da vidraça imunda. Tudo o que pôde conferir foi o dono praguejando enquanto passava um pano cinza questionável no balcão engordurado.

— Ah, é? Não tô vendo ninguém.

— O outro cara, Greengrass. – Draco repetiu. – O que fica aqui dentro. – ele explicou, apontando para a própria cabeça. 

 - Aposto que ele tem o hálito melhor que o seu. – replicou, impaciente. – Vem. Vamos embora antes que algum espertinho decida lucrar traficando seus órgãos no mercado bruxo ilegal que, por sinal, não me deixaria surpresa se funcionasse exatamente nessas redondezas.

— Eu posso ficar com você hoje? – alguma coisa nos olhos dele, um desespero quase infantil, como se houvesse alguma resposta além de “sim” para a pergunta, sempre a sensibilizava.

— É claro. – ela disse, torcendo para manter uma expressão neutra. – Sua mãe já tem dores de cabeça o suficiente, certo?

— Certo. – Draco murmurou, se sentindo culpado.

O apartamento dela era o lugar preferido dele no mundo. Tratava-se de uma espelunca com um papel de parede desbotado e brega com motivos de abraxans (havia algo de engraçado em cavalos alados gigantes voando em diagonal do rodapé até o teto) e ficava há três minutos de caminhada do St Mungus, onde ela estudava para ser medibruxa.

— Então... sobre o outro cara, você quer me contar um pouco sobre ele? – ela puxou assunto, despindo-se da pesada capa púrpura e jogando o chapéu cônico em cima do aparador da sala.

— Tenho a opção “não”? – ele ponderou, sentindo um princípio de dor de cabeça que não parecia ter a ver com o álcool ingerido.

— Seja esperto e responda a si mesmo. – com um meneio de varinha, Astoria fez voar para perto dele um copo cheio de uma coisa que ele suspeitava não ser água. – Nesse meio tempo, preciso de roupas confortáveis.

Ela sumiu pelo corredor e bateu a porta do quarto, o que pareceu um aviso sonoro de que ele não deveria ousar segui-la. Não que ele pretendesse fazer isso de todo modo. Qualquer que fosse a poção que ela havia lhe dado, estava fazendo efeito rápido, deixando-o a sós com a vergonha de ser quem era.

Quando ela voltou, foi com uma versão muito deprimente de Draco que se deparou. Uma que Astoria não tinha visto ainda, sem sorrisos ácidos para disfarçar, sem as mãos dele em seu corpo distraindo-a, sem piadas ferinas. E foi a visão desse Draco nu de artifícios que fez com que ela também percebesse a coisa que ele tinha realizado um pouco mais cedo.

— Desde que eu e você começamos a sair, o outro cara... – ele disse com a voz um pouco rouca, sem coragem de levantar os olhos para encará-la. – ...começou a produzir ideias perigosas. De início, eu conseguia ignorá-lo. Mas agora ele fala tão alto às vezes que é insuportável.

— Ideias perigosas? – Astoria insistiu, sentando-se em um banquinho roto de frente para ele.

— Esperançosas. – e seu rosto queimou com a simples menção, então ele correu para acrescentar: - ridículas.

— Draco, você está tentando dizer que alguém dentro de você me ama?

— Eu estou tentando dizer que alguém dentro de mim acha que pode te amar.

— E isso é insuportável porque você não concorda.

— Não, é óbvio que eu não concordo, Astoria. E você sequer deveria. Estamos falando de uma pessoa que precisa beber muito para anuviar a própria cabeça. De uma pessoa que mal consegue processar os sentimentos o suficiente para falar de si mesma na primeira pessoa do singular. Você pode ser insuportável as vezes com essa cara de quem sabe arrancar dos outros qualquer coisa que queira, mas merece mais do que isso. Muito mais do que isso.

— Eu acho que eu posso decidir isso sozinha.

— Tenho certeza de que sim. – ele murmurou, fraco demais para discutir. Tudo nele ansiava por ela e era difícil argumentar quando ele precisava se concentrar tanto em simplesmente ficar parado.

— Eu amo você. – Astoria disse no mesmo tom.

— E eu amo você. Mas o amor não resolve nada, Greengrass. – aquilo estava matando Draco. Ele pensou que era uma péssima ideia estar ali, tão perto dela, escutando o tipo de coisa que jamais conseguiria apagar da memória.

— Eu sei, mas é interessante, não é? – ela riu e ele foi forçado a olhar para ela. Porque quando ela ria, tanto as desesperanças quanto as esperanças entravam em suspenso. Nada era certo ou errado, Draco era catapultado para um mundo que transcendia as ambivalências, os jogos de opostos, a racionalidade, tudo.

— É uma maneira de se colocar. – ele disse, vencido e inebriado, estendendo a mão para ela.

— É uma maneira de tentar.

— E o que nós vamos fazer com isso?

— Eu não tenho ideia. – ela admitiu. - Mas podemos começar fazendo um chá.

Draco riu com vontade, metade incrédulo, metade maravilhado. Ele massageou o local na têmpora onde, até um instante atrás, uma dor fininha se instalara e percebeu que não a sentia mais.

— Parece bom. – disse por fim, acompanhando-a até a cozinha. – Parece quente. – provocou.

— Não é? E é só a primeira parte. Quem sabe o que pode vir pela frente?

Draco não sabia. E isso o apavorava. Mas ali, com ela, ele simplesmente não se importava. Porque é verdade, e em parte, ele estava certo: o amor não resolvia nada.

...Mas era ele que abria perspectiva para tudo.


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