Seus Olhos escrita por JosiAne


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Esta one é especial por que eu a fiz como um presente de aniversário para alguém especial que se tornou uma grande amiga e que me incentiva e dá o help quando to com dificuldade com minha escrita e ideias.


Parabéns Regina Rhodes Merlyn, espero que goste do presente tanto quanto gostei de escrevê-la.

Boa leitura.



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Janeiro de 1997 - Gatlinburg, Tenneessee

Onde está mamãe? — a garotinha de olhos castanhos e amedrontados pensa.

Em seu casaco e gorro vermelhos ela caminha pela calçada procurando atentamente pelo rosto da mãe, mas ela não a encontra e por mais que tente ser forte como a mãe sempre diz que ela é, ela sente vontade de chorar. Eu quero minha mamãe. Olha a volta com os olhos marejados.

— Olha que garotinha estúpida, ela está chorando. — ela ouve a voz desconhecida e risadas atrás dela, enxugando os olhos ela se vira.

Três garotos não muito maiores que ela zombam e riem apontando pra ela.

— Me deixa em paz. – grita irritada. Ela odeia meninos.

— O que foi se perdeu da mamãe? – o maior deles fala rindo mais alto.

— Não é da sua conta. – ela se vira para correr para longe dos garotos, mas eles são rápidos e um deles entra em sua frente.

— Onde pensa que vai? – ele está sorrindo pra ela e ela sente medo. Ela olha  a volta, há poucas pessoas e ninguém parece se importar com três garotos assediando uma menina.

— Eu já disse pra me deixar em paz. – fala com toda bravura possível a uma menina de seis anos.

— Ei por que vocês não vão mexer com alguém do seu tamanho. — alguém fala e ela se vira para olhar, os três garotos fazendo o mesmo, seus sorrisos morrendo em seus lábios – Eles estão incomodando você criança? – o garoto do tamanho do seu primo Myles pergunta, ela sabe que não deveria, sua mãe sempre diz para não confiar em estranhos, mas ela se sente protegida ao olhar em seus olhos azuis.

— Nós só estávamos brincando. – o mesmo garoto que a barrou fala recuando um passo longe dela.

— Sugiro que procurem diversão em outro lugar e de preferência não com garotinhas indefesas. – o garoto alto fala se aproximando, sem um segundo aviso os garotos saem em disparada.

Ela olha para seu salvador, ele parece tão alto de perto. Ele se abaixa.

— Ei onde estão seus pais? – ela sente os lábios tremerem ao lembrar do por que está na rua sozinha.

— E... E... Eu... – ela começa chorar baixinho, lágrimas e ranho escorrendo por seu rosto, rapidamente ela limpa o rostinho rosado na maga do casaco – Eu só... Só queria... Ver... Ver os cachorrinhos. – gagueja. Ele toca em seu ombro chamando sua atenção.

— Ei, tá tudo bem, se acalma. – olha para os lados e ela faz o mesmo procurando o quê, não sabe – Tá tudo bem. Respira fundo. – ele inala e exala para que ela faça o mesmo. Ela faz como pedido piscando rápido para vê-lo melhor .

Ele parece preocupado e curioso. Seus grandes olhos azuis chamando sua atenção e ela paralisa, ela nunca tinha visto ninguém olhar assim pra ela, os adultos não costumam lhe dar atenção. Mas ele não parece um adulto.

— Muito bem mocinha. Que tal eu te ajudar a encontrar seus pais.

— Mãe. – ela responde respirando fundo.

— Ok, sua mãe. – ele levanta e olha pra baixo, ela precisa inclinar toda a cabeça para o alto para que possa ver o rosto dele – Será que consegue me dizer de que direção veio? – arqueia a sobrancelha e ela meneia a cabeça.

Olhando a volta ela pensa, ela lembra do prédio alto e antigo de onde saíra, ao lado tinha uma loja de roupas e antes de chegarem lá ela e a mãe passaram por essa loja, também passaram pela sorveteria e a loja que tinha os cachorrinhos que ela queria tanto brincar com eles. Ela não consegue ver nenhuma dessas lojas dali, mas então ela teve que atravessar a rua.

— Pra lá. – aponta o lado esquerdo em direção a parte mais movimentada da cidade – Mas eu tava do lado de lá.

— Você atravessou a rua sozinha? – ele questiona parecendo espantado e ela sorrir orgulhosa do feito – Vamos lá então, vamos procurar sua mamãe. – estende sua mão e ela pega com alegria. A mão dele é quente e macia. Ela não quer nunca soltar – Então você queria ver os cachorrinhos?

— Uhumm. – ela anui distraída – E por que não pediu a sua mãe?

— Ela estava ocupada com os homens de terno.

— É mesmo. – ela não entende por que sua voz parece ter um tom diferente, mas ela não liga muito por que logo ela ver os cachorrinhos e perceber que ele a está levando pelo caminho certo – E você sabe o que sua mãe faz com os homens de terno?

— Não, mas ela ajuda a colocar caras mal na cadeia.

— Ah! Entendi, sua mãe é policial.

— Não.

— Advogada?

— Isso. – ela diz com um gritinho eufórico.

Ela está abrindo a boca para dizer como ele é inteligente quando ouve o grito de sua mãe.

— Sarah!

— Mamãe. – ela grita de volta se virando na direção da mãe, soltando a mão do garoto alto ela corre em direção a ela. Ela pula em seu braços, feliz e aliviada.

— Meu bebê. – a mãe fala em seu ouvido, apertando-a em seus braços.

— Eu estava com tanto medo mamãe. – confessa, novas lágrimas escorrendo por seu rosto.

— Eu sei meu amor, mas já passou, você está aqui. – a mãe afasta seu rostinho e os bracinhos que estão ao redor do pescoço para olhá-la – Eu estou aqui.

— Eu só queria ver os cachorrinhos. – volta a se agarrar ao pescoço da mãe.

— Sshuiii. Eu sei querida, eu sei. – ela fica mais um tempo agarrada a mãe até se lembrar do garoto grande.

Ela se afasta virando o rosto para onde ela sabe que ele está – O garoto grande me achou e me ajudou. – aponta para ele que está sorrindo.

— Obrigada. – a mãe se aproxima, também sorrindo e ela percebe, chorando, ela nunca vira a mãe chorando.

— Não foi nada, fico feliz por ter ajudado. – ele desvia o olhar da mãe dela – E você mocinha, não saia mais de perto de sua mãe. – ele entona sério e ela sente o rosto esquentar, envergonhada.

Maio de 2004 – Guadalajara, México

Um saco de viagem. Um saco grande e cheio de nada. Isso é que é. Sarah está indignada. Quando sua mãe avisou da viagem de uma semana em Guadalajara ela logo se animou, uma viagem internacional, a primeira dela. Ela se afundou em indignação quando percebeu que seria mais uma viagem de negócios. Ela estava odiando a viagem, odiando tudo nessa cidade quente onde ela não entendia nada do que diziam e passava a maior parte do tempo sozinha no hotel.

Ela não entende por que a mãe quis trazê-la se a deixa sozinha o tempo todo. Hurf! Ela bufa impaciente.

Disculpe, señorita, pero necesitas volver a tu habitación.— a voz grave chama.

Ela se vira para olhar quem está a atrapalhar suas divagações. Ela ofega ao dar de cara com o homem mais lindo que ela já vira em toda sua vida. Que diga-se de passagem, para ela treze anos já são muitos.

— Señorita? – ele se aproxima e ela pode ver os azuis de seus olhos em meio a pouca luz que vem da parte externa no hotel, são hipnotizantes.

— Quê? – ela pergunta pateticamente.

— Eu disse 'precisa voltar ao seu quarto'. – ele pronuncia em inglês fluente e sem sotaque denunciando sua origem americana.

— Não sabia que era proibido ficar fora do quarto aqui. – voltando a si dá de ombros, os pés balançando dentro da água da piscina. Estava se sentindo sufocada dentro do quarto, por isso resolveu sair para o pátio.

— Não é – ela gira a cabeça para olhá-lo imediatamente –, mas é perigoso para uma criança estar aqui fora a essa hora da noite.

— Eu não sou... – ela para, o que ela vai dizer? Que não é criança, bem não seria verdade, seria? – Hurf! – bufa mais uma vez indignada, além de ter que ficar só, ainda deve ficar presa no quarto. Mas ela não é uma menina desobediente e por isso ela levanta para voltar ao quarto – Isso é tão injusto. – reclama de cabeça baixa.

— Sinto muito, mas seria imprudente de minha parte se a deixasse aqui – ele fala meio que se desculpando – coisas ruins acontecem a todo momento e em qualquer lugar. – ele parece preocupado e ela perde a indignação, ele não deixa de ter razão, ela vê quase todos os dias na TV coisas ruins acontecerem com inocentes, além de sempre que possível ela ouve a mãe conversar com colegas sobre algum caso que está trabalhando, ela já chorou muitas vezes ouvindo as notícias chocantes.

— Tudo bem.

— Obrigado. – ela começa a se afastar quando ele pede que espere – Vou acompanhá-la até o quarto. – ela franze o cenho desconfiada – Só quero ter certeza que chegará em segurança.

Em silêncio ele a acompanha até o quarto, todo o percurso ela pensa em diversas formas de iniciar uma conversa, mas ela é tímida demais para isso, tudo o que ela consegue pensar ela imagina ele a ignorando, afinal quem vai dar atenção a uma adolescente de treze  anos, principalmente um cara lindo e adulto? Ela rejeita qualquer ideia de conversa. Ele a deixa na porta com um boa noite e um lindo sorriso que faz ela perder a voz e apenas ficar olhando ele se afastar.

Ela não o vê pelos dois dias seguidos, até que em uma tarde que parece muito mais quente que os dias anteriores ela vai para a piscina, ela está em um short azul e camiseta branca, apesar de já ter entrado na adolescência seu corpo parece não concordar com sua mente e mal entrou na puberdade, com seios pequenos, corpo magro e cintura quase rente ao quadril ela não quer correr o risco de se envergonhar. Ele finalmente aparece, camiseta vermelha, bermuda branca e um boné de mesma cor.

Ele está lindo como ela lembrava e constatando que não foi alucinação aquela noite, que o calor não havia fritado seus neurônios, por que foi isso que ela quase chegou a acreditar depois de procurar por ele cada vez que saia do quarto. Ele permanece parado no mesmo lugar enquanto conversa com outro rapaz vestido igual a ele e ela simplesmente não consegue parar de olhá-lo.

Enquanto conversa ele olha atentamente tudo a sua volta então seu olhar encontra o dela e ela sente o rosto esquentar e tem certeza que está vermelha. Ela desvia o olhar. Ainda bem que ela está distante.

— Você sabe que ele nunca vai olhar pra você não é. – alguém diz próximo a ela e ela se vira na direção da voz.

Um garoto magricela está a lhe encarar da espreguiçadeira ao lado.

— Como é?

— Você, não parava de suspirar pelo guarda-vidas.

— Eu não tava suspirando. – rebate e tem certeza que se pudesse se olhar no espelho agora veria o rosto vermelho como um pimentão maduro.

O garoto faz um som estranho discordando dela e rindo.

— Não está?

Ela não estava, estava? Ela não tem mais tanta certeza, esteve tão compenetrada em olhar para o deus da beleza que qualquer coisa ou som que tenha produzido passou despercebido, completamente involuntário.

— Billy. – o garoto estende a mão e ela retorna o cumprimento.

— Sarah e eu não estava suspirando – se apressa a explicar – eu sei que ele jamais olharia pra mim.

— Que bom que não é tão idiota assim Sarah – ela anui e faz uma careta para a palavra que o garoto usa –, tá vendo aquelas ali. – ele aponta para o outro lado da piscina e ela dirige o olhar na direção indicada, duas garotas aparentando ter a mesma idade que ela dão risadinhas e não param de olhar para o homem que não demonstra ter percebido os olhares de cobiça sobre ele. – Patéticas. – o garoto sussurra e ela não consegue controlar o riso.

O restante do tempo dela passou bem menos maçante após a aproximação de Billy. Ele se mostrou um garoto legal e não se importou se ela é uma nerd magricela e quase sem peito, ele a fez rir mesmo assim e juntos se divertiram muito.

Mas o deus da beleza de olhos azuis continuava em seus pensamentos e de vez em quando em seu campo de visão, agora ele parecia estar em todo lugar que ela estava e cada vez mais ocupando espaço em seus pensamos a noite. Sua primeira paixão platônica, ela percebeu. Se não fosse por Billy sempre a cutucar quando estava olhando demais ela poderia se fazer passar por boba, diversas as vezes que ela deu bandeira olhando-o demais.

Novembro de 2015 - Chicago, Illinois

Primeiro dia no novo departamento de emergência do Gaffney Chicago Medical Center e o ambiente já está um caos, um acidente no metrô, não parece que há alguns minutos eles estavam inaugurando o novo departamento. Pessoas feridas, paramédicos se apressando pela entrada, médicos e enfermeiros correndo contra o tempo. Como uma estudante ela está a espera de alguma ordem quando ouve doutor Halstead e uma voz desconhecida discutindo um paciente, o desconhecido está de costas, sobre a maca tentando salvar alguém gravemente ferido. Quando passam por ela, ela paralisa. Ela reconheceria aquele rosto em qualquer lugar. Está mais velho, ombros mais largos, rosto mais másculo e definitivamente mais adulto, a barba bem feita conferindo-lhe mais beleza e charme.

— Pare a massagem. – ele ordena antes de começar uma incisão no espaço pleural do paciente, ela olha fascinada – Você é? – ele mal dá uma olhada quando pergunta e ela demora um pouco a responder.

— Sarah Reese, estudante do quarto ano. – ela consegue dizer sem gaguejar.

— Pode fazer um impulso e aplicar um na virilha?

— Hu...Hunhum. – ela quase gagueja, saber ela sabe, conseguir ela não tem certeza, ela não tem tempo de pensar mais quando ele determina.

— Pegue uma femoral na esquerda aí.

— Tá. Sim senhor. – é o que ela consegue dizer antes de fazer o que ele manda.

O nervosismo a deixa patética e começar errando, ela tem vontade de cavar um buraco no chão e enterrar a cabeça quando ele em segundos faz o que ela deve ter feito e esteriliza o local, ela sente na voz dele a impaciência por seu erro estúpido. E quando ela não consegue achar a veia e é repreendida por uma enfermeira ele toma o lugar dela, ela quer chorar. Ela tinha que cometer todos os erros logo na frente dele, o deus da beleza que ela agora sabe chamar-se Connor Rhodes a nova aquisição do Med e que povoou seus sonhos e pensamentos por muitos meses até que ela tivesse outra paixonite. Ele deve estar pensando nela como uma menina boba e burra. Tudo o que ela consegue fazer é observar de boca aberta ele terminar o atendimento e enviar o paciente para cirurgia, não dando uma segunda olhada nela quando sai do trauma.

Ela passa as horas seguintes ajudando a outros residentes quando pedido e evitando encontrar ele. Quando ela pensou que as coisas estão melhores a criança que ela foi fazer uma simples checagem a pedido da doutora Manning entra em choque e perde o pulso, foi o pior momento da vida dela quando ela precisou fazer massagem cardíaca na menina e por mais que ela tenha conseguido trazê-la de volta ela não conseguiu deixar de se sentir culpada por no processo ter quebrado sua costela, nem o elogio do doutor Choi foi suficiente para tranquiliza-la.

Ela quase teve sucesso em evitá-lo até o final do turno quando ela está praticando o acesso venal e ele a encontra.

— Acesso central. Ah, eu não sei dizer quantas vezes errei até finalmente conseguir. – ele tira a concentração dela, mas ela não se importa, diferente de mais cedo a voz dele é calma e até compreensivo.

— Eu sei como fazer, só não consegui fazer lá. – ela diz ainda chateada com toda a situação.

— Precisa de prática, só isso.

— Eu acerto com ele – ela o olha rapidamente, envergonhada – eu nunca erro.

— É... Ele é o paciente ideal, não pode machucá-lo e a vida dele não está correndo perigo. – diz o óbvio.

— Se esse rodízio não fosse obrigatório, eu não estaria aqui. – confessa ganhando confiança e o olhando de verdade, ela encontra então, depois de anos os azuis que tanto a fascinaram, não é pela cor e sim pela intensidade neles contida, ele é um homem transparente que diz tudo apenas com os olhos.

— Onde estaria? – ele tenta disfarçar, mas ela perceber o tom zombador dela.

— Num laboratório. – ela dá de ombros.

— Patologia?

— Talvez. – ele da um pequeno sorriso que ela não consegue interpretar.

— Todo estudante de medicina depois que começa a lidar com pacientes acha que se sairia melhor na patologia, eu achei. – ele fala sério e ela tem vontade de retrucar que esse não é o caso dela, mas apenas se mantém calada, ela sabe que ele está apenas tentando ajudar, o que ela acha admirável da parte dele, ele não a conhece e poderia muito bem ignorá-la depois do momento desastroso dela.

~~

Logo ela percebeu o quão fácil gostar dele, é. Ele é atencioso, focado na medicina e educado em suas palavras e de repente a paixonite que ela superou há anos começa a ganhar vida. Merda, merda, merda. Se ela não tomar cuidado pode se apaixonar de verdade e para evitar esse desconforto ela se envolve com Joey, estabilidade e segurança é o que ela precisa. Eles são bons juntos.

Ela começa a ganhar espaço no hospital, aos poucos se aproxima de April e Maggie, trabalha bem ao lado de Ethan, Connor e principalmente de doutor Charles que se torna uma presença quase paternal. Ela descobre que Connor está envolvido com a egocêntrica doutora Samantha Zanetti e tá tudo bem pra ela, ela está firme com Joey e a paixonite se torna passado.

 Fevereiro de  2017 - Chicago, Illinois

O tempo passa, ela perdeu o namorado e de quebra quase perde a chance de uma boa residência ao se demorar na escolha, não fosse doutor Charles vir em seu auxílio. A Psiquiatria nunca passou por sua cabeça, mas se torna uma boa opção, melhor que opção nenhuma.

O início foi penoso e por diversas vezes ela quis desistir, apenas a ideia de não decepcionar doutor Charles lhe fazia desejar continuar, mas ele é paciente e um ótimo professor e aos poucos ela foi se adaptando e aprendendo e apesar de a área a manter mais distante dos colegas ela estava aprendendo a apreciar e se identificar.

Até a tragédia que abalou a todos no Med, o suicídio de Wheeler a fez questionar se estava no caminho certo.

Aquele dia ela foi requisitada na emergência, ela estava sem condições nenhuma de continuar, mas não teve coragem de dizer não. Novamente ela sentiu a insegurança dos primeiros meses. Ela estava fazendo certo? Que tipo de psiquiátra ela seria se não foi capaz de perceber o sofrimento do próprio colega de trabalho?

Foi Connor, com quem ela acabou interagindo a maior parte do dia, quem tentou mostrar a ela que não deveria se sentir culpada.

— Sei que acha que decepcionou Wheeler, não viu os sinais de pedido de ajuda. Como médicos, só podemos aprender e tentar não deixar acontecer de novo. – ele disse após confessar que por um erro perdera um paciente antes.

Suas palavras a fizeram verdadeiramente olhar para ele, ela sempre o teve como alguém perfeito, um tipo de deus que nunca erra, mas ali ela percebeu que ele é apenas um homem como qualquer outro e que todas as vezes que ele a aconselhou e encorajou não foi apenas por pena, mas por que ele sempre soube em todos os momentos como ela se sentia. Ela aprendeu ali que novas lições sempre vão aparecer.

Após o final do turno e uma conversa emocional com doutor Charles, ela está tão esgotada mentalmente que assim que chega a seu carro no estacionamento ela apenas se escora neste e chora. Ela está agachada ao lado da roda dianteira, as mãos cobrindo o rosto, o choro fraco sendo acompanhado por soluços, quando alguém se abaixa ao se lado.

O perfume dele invade seus sentidos e ela levanta o rosto limpando-o com a manga da camisa.

— Está melhor? – pergunta sem olhar para ela.

— Acho... Sim...

— Ótimo, agora vamos. – levanta-se, uma mão estendida em direção a ela.

Ela pega com cautela e sem entender nada enruga a testa.

— Precisa relaxar, vamos beber algo. – fala despreocupado.

— O que? – pergunta assustada desprendendo sua mão da dele – Isso não...

— Vamos Sarah. – ela o encara de boca aberta, a primeira vez que ele não a chama de Reese.

— Mas e doutora Charles. – contesta fracamente, lembrando-o da nova namorada.

— E o que tem ela? – arqueia a sobrancelha como se dissesse 'e daí'.

— Ela não vai gostar.

— Não se preocupe com Robin, sim. – ele se aproxima, olhando-a com aqueles olhos que a hipnotiza – É apenas uma bebida entre colegas. Você precisa, eu preciso, vamos relaxar um pouco e não falar sobre esse dia. – ela finalmente ver a vulnerabilidade em seu olhar, ele está tão abalado quanto ela, mas provavelmente se manteve firme até agora para que ela não desmoronasse.

Ela assente em silêncio e o segue.

~~

Eles não vão para o Molly’s como é habitual. Eles estão sentados no canto de um bar desconhecido e esperando as bebidas chegarem quando ela se sente subitamente tímida.

O que estou fazendo aqui?

Eles não são amigos, ele não é mentor dela, ela deveria ter seguido a primeira ideia e ido pra casa.

O que ela vai falar? O que ele vai falar? Se não for sobre o hospital, sobre o quê?

Ela parece voltar aos treze  anos, quando ela era uma adolescente desengonçada é apaixonada pelo cara muito mais velho que jamais vai olhar para ela. Ele ainda não vai olhar para ela agora, não como ela quis por muito tempo antes. Mas agora ele está na frente dela e estendendo um cartão de amizade único, uma espécie de amigo por uma noite.

As bebidas chegam e ela leva a mão para pegar a sua.

— Espera. – ele segura a mão dela sobre o copo – É melhor comer algo antes. Não a vi comer o dia todo. – ela inclina a cabeça – Não é bom beber de estômago vazio. – explica soltando a mão dela.

Para que ele não insista ela pede batatas fritas, seu estômago embrulha com a ideia de comer qualquer coisa, mas ela tenta.

— Por que eu? – ela se encoraja finalmente para perguntar – Sei que está muito mais próximo dos outros médicos que de mim, então por que quis vir comigo e não com nenhum deles? – bebê um gole de dry martini e disfarça uma careta, ela deveria ter permanecido no vinho que já é velho conhecido seu. O doce do cocktail não fazendo nada para suavizar a queimadura do álcool que desce rasgando sua garganta.

— Por que você estava precisando de mim está noite. – ela abre a boca estupefata com sua sinceridade.

— Tá bom. – desvia o olhar e bebendo mais um gole, seu paladar ainda adormecido e a bebida desce com mais facilidade.

— Eu sei como está se sentindo Sarah, eu já passei por tudo isso antes e o que vi ao longo do dia é que para a maioria deles essa é uma nova experiência, mas que acham que devem continuar firmes e que chorar é uma fraqueza. – ele não desvia o olhar obrigando-a a baixar a cabeça conforme suas palavras a atingem com força.

— Ou seja, eu sou a mais frágil do grupo que pode quebrar a qualquer momento. – toma o restante da bebida em um único gole e desvia o olhar para as pessoas a sua volta.

— Pelo contrário. – a pega de surpresa e ela o olha  com olhos arregalados – Você não tem problema em se deixar levar pelos sentimentos. – ela bufa, é exatamente o contrário. Ele é a única pessoa que já chegou mais próximo de quebrar suas barreiras e conhecer seus medos, nem mesmo doutor Charles chegou tão perto – Mas eu disse que viríamos aqui para esquecer esse dia e não para uma sessão de terapia.

Ele pede uma nova rodada e propõe um jogo que a faz sorrir. Quem diria que Connor Rhodes gosta de jogos típicos adolescentes. Eles teriam o direito a uma pergunta por vez e a pessoa deve responder com a verdade ou passar, contanto que beba um gole do cocktail.

— Você começa. – ele instiga.

Dezenas de perguntas vieram a mente, mas nenhuma que ela saiba que ele iria responder.

— Hmm. – morde o lábio inferior pensativa, ela decide começar por uma simples e que não vai deixar o clima estranho – Quando soube que queria ser médico? – ela o ver inspirar lentamente e percebe que esta não é uma pergunta de resposta simples.

— Depois da morte de minha mãe. – ela assente, fascinada com a forma aberta com que ele lida com o questionamento – Certo, minha vez. É de Chicago?

— Nashville. Por quantos países já passou?

— Como médico, cinco. Como turista onze.

— Uau! – completamente chocada ela leva a bebida à boca esquecendo das regras do jogo.

— Se não fosse a prática médica teria aproveitado mais. – ele complementa.

— Na próxima viagem me leva na bagagem, por favor? – ops! Põe a mão na boca abismada com a própria ousadia. Menos álcool Sarah. Ele apenas rir.

— E você, já passou por quantos? – ela enruga o cenho tentando lembrar de todas as viagens quando acompanhava a mãe em seus negócios para a empresa que advogava.

— Cinco.

— Nada mal para alguém tão jovem.

— Todas na infância ou adolescência acompanhando minha mãe. Por que não voltou assim que terminou a faculdade? – mal ela termina a pergunta ele já tá virando o copo.

— Qual a melhor viagem? – fazendo bico ela quase abre a boca para dizer nenhuma quando lembra da viagem em que o viu a primeira vez.

— Guadalajara. – só por que foi lá que ela o conheceu.

— Já esteve em Guadalajara, quando? – ele se inclina sobre a mesa, curiosidade estampada em seu rosto bonito.

— Uma pergunta por vez doutor, lembra? – ele revira os olhos – Já pensou em desistir da medicina?

— Nunca. – é enfático, orgulho transborda em seus olhos que brilham sob o reflexo das luzes baixas do ambiente.

— Certo – limpa a garganta se forçando a não reparar demais nele –, sua vez.

— O que aconteceu com o garoto da patologia, Joey o nome dele né? – opa! Pergunta pessoal demais. Um novo gole no álcool disfarçado com o sabor adocicado.

— Sem perguntas sobre namorados, entendi. – ele levanta o canto da boca, ela se pergunta se ele está apenas tentando ser mais descontraído ou se por algum motivo o álcool está agindo rápido em seu organismo.

Eles permanecem no joguinho bobo, o álcool lhe dando a ousadia necessária para fazer perguntas mais íntimas que ele ignorou cada uma com longos goles do cocktail e se aproveitou para fazer o mesmo que ela, parecia mais uma forma de um fazer o outro beber. Quando ela se dá conta já está tarde demais e que já bebeu o suficiente para ficar o resto do ano sem beber.

Ela fica envergonhada quando ao levantar seu corpo não obedece seus comandos e balança quase caindo sobre a mesa. Ele a envolve por um dos braços e ela aproveita para apoiar a cabeça no ombro dele, o cheiro de perfume e álcool inebriando seus sentidos. O álcool está subido sua cabeça Sarah. Levanta a cabeça recriminando-se por se aproveitar da situação. Ele é um homem comprometido.

Ela é uma bêbada alegre e o caminho todo ela canta e rir e o fato de fazer ele rir a dá mais incentivo para continuar com sua melodia desafinada.

Me contraaadigo cuando piensooo... – leva a mão a altura dos olhos, o indicador sacudindo de um lado ao outro – Eeeel tiempo no me muuueve... – ela olha para ele no banco ao lado e ele está sacudindo a cabeça, um meio sorriso no rosto – Yoo me muevooo con el tiempo. — volta a olhar para a rua pouco movimentada.

— ¿Habla español?

— Hã? – ela para, a pergunta aos poucos ganhando forma em sua mente – Ah... – soluço – Opa! – põe a mão na boca, um risinho saindo descontrolado – Não, apenaxx uma múzzxxica que aprendi com um amigo.

Ela se agarra ao braço dele quando ele a leva até a porta de seu apartamento.

— Exxpera, exxtá aqui por algum lugar. – ela diz enquanto procura pelo molho de chaves na mochila – Achei! – grita entusiasmada e quando vai enfiar a chave na fechadura a porta se abre e se não fosse Connor a segurando ela cairia de cara no chão.

— Sarah. – a voz masculina e preocupada a chama e ela olha pra cima, a visão desfocada – Onde estava, eu te liguei tantas vezes. Estava preocupado.

— Billy? – franze o cenho confusa – O que faz aqui? E como entrou?

— Com as chaves que me deu claro. – levanta a chave ao nível do olho – Oh, olá. – ele olha além dela e ela lembra que Connor ainda está aí. – Sou Billy. – estende a mão, e apesar do álcool no organismo ela percebe seu sorriso um pouco forçado.

— Connor, colega de Sarah.

— Connor e eu fomoxxx beber, foi um turno difícil. – ela se apressa em explicar – Obrigada doutor Rhodes. – se desvencilha de seus braços desequilibrando-se no processo, Billy a amparando – Pela noite e pelox conselhos. – ela não consegue apagar o sorriso, foi a noite mais incrível em meses.

— De nada. – olha dela para Billy – Rapaz. – ele sai logo em seguida e quando ela olha para Billy, seu rosto está vermelho.

— Está bêbada? – ela revira os olhos com o óbvio.

Doce Billy. Depois de Guadalajara eles perderam o contato, mas há alguns meses eles se reencontraram por acaso, exatamente quando ela e Joey haviam terminado. Uma coisa levou a outra e quando ela percebeu ele estava dormindo três vezes por semana em seu apartamento. Ela deu uma cópia da chave pra ele.

~~

Após aquela noite Connor e ela passaram a ser mais amigáveis quando se encontravam pelos corredores do hospital. Eles não repetiram mais a noite, mas ela sentiu que haviam progredido e vez ou outra ela o encontrava na sala de descanso e num silêncio confortável eles tomavam um café juntos. Não havia perguntas ou brincadeiras, provavelmente pela falta de álcool, mas ela ainda desfrutava de cada momento.

Estava tudo indo bem até Robin Charles começar com os surtos psicóticos. Uma nova tragédia os aproximou novamente.

Foi o melhor momento dela, mas o pior dele. Cada vez que o via ele estava mais desgastado, olheiras profundas, cabelos despenteados e barba por fazer, ele parecia não dormir por dias e os azuis profundos estavam sem o brilho habitual.

A admiração e respeito que ela sempre teve por ele fez com que por diversas vezes ela quisesse abraçá-lo e confortá-lo, não podendo fazer isso ela deu o melhor de si para ajudá-lo e a namorada. Ela conseguiu, descobriu um tumor cerebral que fez a mulher ser diagnosticada erroneamente com Esquizofrenia. Ela nunca se sentiu mais contente ao ver o brilho de esperança nos olhos dele, como era bom saber ser ela a responsável por isto.

Junho de 2017 - Chicago, Illinois

Ela não sabe o que aconteceu com eles, mas Robin se fora e Connor de certa forma também, em seu lugar apareceu um homem conquistador e que ela soube estava sempre com uma mulher diferente nos braços. Ela fez de tudo para não ver, ela queria bater na cabeça dele até que ele recobrasse o juízo, onde estava aquele homem romântico e apaixonado por tudo o que faz? Homens são tão idiotas. Sempre achando que sexo resolve todos os problemas.

Mas ela não teve muito tempo para pensar nele. Sua vida se tornou uma bola de neve de problemas. Ela quase põe tudo a perder após atacar um paciente com spray de pimenta e quando pensava que a vida estava normalizando o pai aparece para desestabilizar o pouco que conseguiu equilibrar em sua vida. Connor Rhodes passou a ser apenas um nome para ela. Não tinha tempo para pensar nele ou qualquer coisa relacionada a ele. Ela ouvira sobre seu novo relacionamento, mas estava perturbada demais para dar atenção a qualquer fofoca.

O ponto máximo que a levou ao limite foi a descoberta da psicopatia do pai e seu desapontamento com doutor Charles ao vê-lo hesitar pedir ajuda ao pai que estava tendo um colapso após ser acusado pelo mentor de ser um serial killer.

Ela precisava de novos ares e a decisão de sair foi tomada sem um segundo pensamento. Nada a prendia mais àquela cidade, sua relação com o mentor desandara e seu não namoro esfriara. Billy passou de amigo com benefício para amigo de mensagens.

Setembro de 2020 - Gatlinburg, Tenneessee

Vamos mocinho, vamos aproveitar essa linda tarde.

Encaixa a guia na coleira do Mastiff Tibetano que está ansioso pela hora do passeio, há dez meses ela se mudara para a pequena cidade e sua primeira façanha foi adotar o pequeno cãozinho que lhe chamou atenção por traz da vidraça da loja de animais, ter um cão sempre foi seu sonho de menina que ela nunca abandonou. Ela ficou surpresa quando descobriu que não estava a venda, cães de raça costumam ser supervalorizados e usados como objetos de alto valor, mas aparentemente ninguém queria um cachorro que ficaria tão grande, ali.

Descendo pela rua íngreme e arborizada em direção ao parque próximo a sua casa, ela sorrir inspirando o ar fresco do início de outono.

— Que delícia. – olha para o cão que não lhe dá atenção, encantado demais com tudo a sua volta.

E quem não ficaria nessa pacata cidade, mas de extrema beleza com suas árvores de flores coloridas e arredores montanhosos. A cidade não é extremamente pequena, mas perto de Nashville e Chicago onde ela passou a maior parte de sua vida é um paraíso, pouco mais de quatro mil habitantes e vários prédios que só são ocupados no período de férias quando os turistas aparecem. Os pontos turísticos são uma atração a parte.

— Fitz, não.

De repente ela se vê desesperada, distraíra-se tanto que afrouxou a guia e seu monstrinho aproveitou para se soltar. Ela corre atrás dele tentando desesperadamente alcançar a guia e evitar qualquer acidente, pois quando se tratava de seu amado bebê tudo era possível, ele adora derrubar tudo a sua frente sem se importar que seja humano ou não.

Seu medo não é infundado quando em segundos ele passa por entre as pernas de um sujeito que está de costas e levando o homem a cair de bunda no chão.

— Ai Jesus Cristo! – exclama horrorizada.

Se apressa até o homem para ajudar-lhe esquecendo do seu bebê momentaneamente

— Ai moço, me desculpe. – para a frente dele e se abaixa para ajudá-lo a levantar, afobada – Eu sinto muito. Sinto muito mesmo. – ele levanta a cabeça.

Ela para com a tagarelice, ele para com os resmungos.

— Reese.

— Doutor Rhodes.

Dizem ao mesmo tempo. Sem desgrudarem o olhar ele levanta, ela ainda com as mãos nos braços dele. Ele pigarreia.

— Aquele gigante é seu? – aponta na direção do cachorro que parara para escavar próximo a raiz exposta de uma árvore.

Ela olha para o cão, depois para ele – Er... Sim, desculpe por isso. – coça a cabeça constrangida.

Quem diria que voltaria a encontrar Connor Rhodes e numa situação tão embaraçosa.

— Ele ainda é um bebê e um pouco teimoso as vezes.

— Sei... – olha para o cão parecendo desconfiado – Pelo tamanho, não diria. – ela solta um som estrangulado de concordância.

Não querendo correr o risco de se envergonhar ainda mais com seu gigante peludo ela solta a primeira coisa que vem a mente.

— O que faz aqui? Quero dizer, é uma surpresa encontrá-lo por essas bandas.

— Férias.

— Ah!

— Eu já estive aqui antes – desvia o olhar para o cão, pensativo – e sempre quis voltar. – retorna o olhar para ela – E você?

— Eu moro aqui.

— Isso é uma surpresa.

Sem perceberem eles se movem até um banco próximo, sentando-se lado a lado.

— Eu sei, estava farta da correria da cidade grande. – suspira – Eu vinha muitas vezes aqui quando criança então quando terminei a residência foi meu primeiro pensamento. Estou no LeConte Medical Center que fica há apenas alguns minutos daqui em Sevierville.

— É uma linda cidade, foi onde fiz uma das minhas melhores viagens.

— Sim. – fecha os olhos e inspira – E limpa. Sente isso, apenas ar fresco e o cheiro das plantas e flores.

— Sim. – ele diz com a voz rouca e ela abre os olhos, ele está observando-a com os azuis intensos, neles transbordam a paz.

— Como estão as coisas no Med? – ela percebe eles mudarem minimamente a intensidade, de mais claros e cristalinos para mais escuros e... Tristes?

— Saí do Med.

— Oh. Não sabia, evitei qualquer contato com Chicago desde que saí.

— Eu sei, fiz o mesmo, ou pelo menos tentei, Claire não deixaria me afastar como antes.

— Claro.

Ela procura Fitz com o olhar tentando pensar em algo que  não o aborreça. Ele acaba com a agonia dela.

— Como é estar em um hospital pequeno?

— Bom... extremamente bom, não tem aquela loucura do Med ou do Baylor. Gosto de não estar no limite e estressada todos os... – Fitz a surpreende ao se aproximar de repente, com uma pata de cada lado do corpo dela apoiadas no banco, ele começa a lamber seu rosto – Fitz, pare... – tenta empurrá-lo para trás – Pare já. – aumenta o tom da voz e o cachorro para.

Sentando sobre as patas traseiras ele a encara, cabeça inclinada para o lado, seus olhos quase escondidos por seus pelos, língua pra fora e rabo mexendo de um lado a outro, simplesmente adorável. Ela afaga sua cabeça, sua mão se perdendo entre os pelos longos e negros.

— Ah, meu doce menino, o que faço com você. – se inclina encostando a cabeça na dele, ela olha para Connor – Tem como não amar. – ele sorrir balançando a cabeça como se não acreditasse em suas palavras e do jeito fascinante que faz seus joelhos fraquejarem.

— Posso? – leva a mão para acarinhar o animal.

— Ele vai amar. Né bebê? – beija a cabeça peluda e se afasta.

Lentamente Connor aproxima a mão e com cuidado enfia os dedos entre os pelos macios, próximo a orelha, ele começa a coçar o local e o cachorro inclina a cabeça, claramente gostando do afago.

— Fitz, você disse?

— Sim, como Fitzwilliam Darcy.

— Orgulho e Preconceito, eu lembro, é seu romance preferido.

Ela abre um sorriso de dentes a mostra, o peito enchendo de contentamento e afeição por ele. Ele lembrou, foi uma noite bêbada e louca, mas mesmo assim ele lembrou.

Cansando de ficar parado Fitz sai em disparada deixando Connor atônito – Enérgico.

Fitz e cães em geral é o tema da conversa e eles só param quando o assunto da conversa aparece choramingando e ela entende que está entediado e quer ir pra casa.

— Posso acompanhá-la. – Connor pede, seus olhos vagando entre ela e Fitz parecendo nervoso.

— Claro. – responde feliz por ele ter oferecido, não está pronta ainda para se despedir. – Vamos rapaz.

O caminho eles fazem ora em silêncio, ora ela fazendo algum comentário sobre o estilo de vida na cidade e dando dicas de restaurantes ou locais para ele visitar. Eles chegam em frente a loja de animais e ela para, olhando pela vidraça.

— Aconteceu uma coisa engraçada comigo aqui quando era criança. – com o olhar fixo nos filhotes em exposição ela sorrir – Eu não lembro, mas minha mãe costumava falar sobre isso algumas vezes. – olha pra ele, o canto da boca levantado tentando conter o sorriso – Eu era tão fascinada por cães que escapei dos olhos dela para vir aqui e me perdi – retorna o olhar para a loja –, um rapaz gentil me encontrou e me ajudou a voltar pra ela, queria poder encontrar ele um dia para agradecer. – ela para estranhando o silêncio dele e de repente ouve o som da risada dele.

Ele está rindo alto, a mão na barriga e a outra no rosto secando as lágrimas.

— Des... Des... Desculpe. – ele respira fundo procurando se acalmar.

— O que há de tão engraçado?

— Você quer mesmo agradecer? – ela balança a cabeça afirmando – Pois então faça.

— Hã? – ela olha pra ele estranhando sua reação, ele parece que perdeu o juízo.

— Sarah... – respira fundo novamente – Eu era aquele rapaz.

Ela solta um guincho de surpresa e põe a mão na boca não acreditando.

— Não.

— Casaco vermelho e cabelos trançados, seis anos?

— Era mesmo você. – ele dá de ombros antes de dar uma olhada de lado pra ela.

— E meu obrigado? – e então é ela quem rir.

— Deus, eu não acredito. – põe a mão no braço dele – Você foi meu herói aquele dia. Mamãe dizia que por semanas eu não parava de falar no garoto alto de olhos azuis, obrigada.

— Foi um prazer, mocinha. – pisca flertando descaradamente e ela sente o rosto esquentar.

~~

— Até amanhã, Juddy.

Sarah se despede da recepcionista, o expediente chega ao fim e ela já está louca para ir pra casa, tomar um banho relaxante e se enroscar em Fitz no sofá enquanto assiste.

— Sarah, espere. – ela para e retorna a atenção a colega – Preciso avisar que um homem está do lado de fora a sua espera, pedi que ele esperasse aqui dentro, mas não quis. – a mulher encolhe os ombros num pedido de desculpas.

— Obrigada pelo aviso, Juddy.

Ao sair ela olha de um lado ao outro, não vendo ninguém dá de ombros, quem quer que seja desistiu. Melhor assim, só preciso chegar em casa. Pensa enquanto segue pela calçada que leva até a rua.

— Sarah. – ela estanca reconhecendo a voz de Connor.

Ela não esperava encontrar com ele novamente, depois que a deixou em casa ele seguiu seu caminho, ela lamentou não ter pedido seu número até que se deu conta que não faria sentido, ele está de férias e em breve voltaria pra casa.

— Doutor Rhodes. – ele faz um som reprovador enquanto se aproxima – Sem doutor, apenas Connor. Acho que já passamos da fase do formalismo, não?

— Connor então, er... Algum problema? – ela estranha ele aparecer repentinamente em seu trabalho.

— Precisa ter um problema para lhe procurar?

— Não, é que, a verdade é que não esperava vê-lo novamente.

— Que pena, por que eu queria muito te ver.

— Oh! – ela engasga com a sinceridade dele – Isso é inesperado.

— Não entendo por que, eu gostei da nossa conversa no outro dia, você não?

— Mas é claro que sim. – diz ofendida com a suposição dele.

— Então que tal um café? Se não tiver algum compromisso, claro.

— Compromisso não, mas... – ela olha para ele e pensa em seu bebê em casa esperando por ela e uma ideia louca passa por sua mente – Que tal jantar em minha casa? – abre um largo sorriso de convencimento.

~~

— Cuidado com Fitz, ele tem uma recepção muito calorosa. – avisa enquanto abre a porta e como dito o cão vem correndo em sua direção, pulando em cima dela, ela dá um passo para trás com o peso do animal.

— Ei rapaz. – coça atrás das orelhas retribuindo o carinho.

O cachorro logo se afasta dela e vai até Connor que não lhe nega atenção. Ela aproveita para tirar o casaco e guardar a bolsa.

— Oi garoto, você é muito fofo sabia, grande e pesado, mas muito fofo. – ela sorrir para a cena.

— Venha, se não der um basta ele vai monopolizar todo o seu tempo.

Ela dá um tempo a ele para se livrar do cão antes de seguir para a cozinha e ir até a pia lavar as mãos. Pensando no que vai fazer para o jantar ela enxuga as mãos e se vira enquanto fala.

— Estou pensando em um risoto de toma... – suas palavras morrem no ar, a boca dele está na sua e ela ofega, mas retribui o beijo.

As mãos dele estão de cada lado dela, apoiadas na pia. As suas, uma encontra caminho pelos seus cabelos, a outra vai parar em seu ombro. Os sons que saem de sua boca são vergonhosamente sugestivos e ela se afasta.

— Isso não... É melhor parar por aqui. – põe as mãos no peito dele tentando afastá-lo, mas ele é insistente.

— Desde a hora que a vi hoje que queria fazer isso. – murmura chupando e beijando seu pescoço.

— Connor... – ele mordisca o lóbulo da orelha e ela geme – Não. – empurra ele com mais força conseguindo afastá-lo – Por favor, não.

— Eu... – passa a mão nos cabelos – Me desculpe, achei que também quisesse.

— E eu quero. – chia indignada consigo mesma por não aproveitar a chance – Mas não é o que quero no momento. – com um vinco na testa ele a encara, confuso – Em alguns dias você irá embora e... E eu? Eu sei que vou acabar sofrendo por que é impossível não me apaixonar por você. – confessa baixando o olhar para as mãos.

— Hey. – com uma mão segura as dela, com a outra a faz olhar para ele – Eu também não quero apenas um caso rápido. – não é uma declaração de amor não correspondido, mas a esperança de algo mais depois de tantos desencontros e desilusões.

— Mas...

— Existem muitas maneiras de manter um relacionamento a distância, basta as duas partes quererem, você quer? – a verdade em suas palavras e olhar não deixam que ela diga não.

— Quero. Muito.

— Então não resista. – a beija novamente.

E ela não resiste e se entrega totalmente apenas esperando não se arrepender.

Abril de 2022 - Guadalajara, México

Eles riram muito quando Sarah por fim perdeu a vergonha e contou a Connor sobre como se lembrava de o ter visto a pela primeira vez. Foi em Guadalajara com apenas treze anos. Eles podem não acreditar em destino, mas em uma coisa eles concordaram, foi graças a esses encontros que eles acabaram juntos. Sarah apaixonada pela história contada pela mãe nunca desistiu do desejo de ter um cachorrinho e foi graças a seu lindo, gigante e fofo bebê de quatro patas que ela reencontrou Connor.

A fascinação de Connor pela história dela e sua paixão platônica de adolescente por ele o levou até a cidade novamente e desta vez com ela em sua companhia.- Eu nem acredito Connor, isso é fantástico.

Eles estão em um jantar romântico e ele acabou de contar a novidade, assim que voltarem ele estará preenchendo a vaga na cardiologia do LeConte Medical Center.

— Eu sei e tem mais uma coisa. – os olhos dele estão com aquele brilho que a deixa desconfiada.

— O que?

Ele levanta, limpa a garganta e se ajoelha ao lado dela.

— Connor! – solta seguido de um ronco que sai do fundo de sua garganta ao perceber qual a intenção dele.

— Sarah Reese. – enfia a mão no bolso e retira uma caixinha de veludo vermelha – Aceita se tornar a doutora Sarah Rhodes e aguentar esse homem muitas vezes rabugento e cheio de manias, mas que a ama muito para o resto de sua vida.

O sorriso dele é tenso temendo que ela diga não e a demora para responder o deixa ainda mais preocupado.

— Sim. – ela diz por fim – Sim. – repete com a voz embargada pela emoção.

Com emoção e as mãos tremendo ele coloca o anel, com uma única safira rodeada de pequenos diamantes, no dedo dela, mal concluindo a tarefa ela o está puxando para um beijo.

— Eu te amo. – ela sussurra em sua boca.

— Te amo igual. – devolve voltando a beijá-la.

E quando alguns assovios e palavras de felicitações são ouvidas ao fundo ele a gira em seus braços.


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Notas finais do capítulo

[Edit] Ao longo do capítulo, especificamente no primeiro encontro entre Sarah e Connor no hospital, todo crédito pelo diálogo entre os personagens se deve aos criadores da série.

A música cantada por Sarah se chama La Vuelta al Mundo de Calle 13.

Espero que tenham apreciado...



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