[1]

“Shouyou, você é interessante”. Essa foi uma das primeiras frases que trocou com o alaranjado.

Ele se lembrava perfeitamente daquele dia, onde o aluno de Karasuno estava perdido no meio da prefeitura de Miyagi e começou a falar consigo. Não imaginava que fosse chamar a atenção dele, até porque estava quieto jogando no seu PSP esperando seu amigo achá-lo, já que estava tão desorientado quanto o outro, afinal, estava ali para jogar partidas amistosas e aquela não era sua cidade.

Quando Kuroo o achou, despediu-se do menor, dando um até logo. Sabia que encontrá-lo-ia em breve.

[2]

Na segunda vez que o encontrou, estavam jogando um contra o outro. Viu o quão impressionante era o ataque rápido da dupla de levantador e central, ou seria atacante? Lembrava-se que avisaram que Hinata era responsável pelos bloqueios mesmo que tivesse aquela altura, então suspeitava que fosse algo para manter-se em alerta — e realmente era.

Karasuno era um bom time, tinha que admitir, contudo ainda faltava muito, precisavam se aperfeiçoar mais e corrigir suas muitas falhas. Estava feliz de poder enfrentá-los e, quem sabe, mais vezes no futuro. Seu interesse no menor parecia crescer todas as vezes que o encontrava, ainda lembrando uma das primeiras palavras trocadas por eles. “Eu vou te fazer falar que gosta de vôlei”.

No final daquele dia, o corvinho — como gentilmente apelidou sem o conhecimento do outro — pediu para trocar de número com o loiro, que aceitou sem pensar duas vezes. Tudo para mantê-lo ao meu alcance, era o que pensava enquanto se reunia com os outros jogadores de Nekoma.

— Até a próxima, Shouyou — acenou enquanto se despedia do recém-amigo.

— Quando nos encontrarmos de novo, vou fazer você gostar de vôlei, Kenma.

Ele duvidava que isso seria possível, mas sua curiosidade o chamava, dizendo-lhe que poderia sim, desenvolver um gosto por algo não fosse seus jogos, quem sabe um interesse romântico—

— Isso é influência do Kuro. — Cochichou pra si mesmo, balançando a cabeça. Tinha que afastar esses pensamentos de sua mente e nada melhor que seus jogos para distraí-lo.

[3]

Não demorou muito tempo para se encontrarem novamente, já que o primeiro treino de acampamento em Tóquio chegou e, graças à relação retomada pelo professor responsável Takeda Ittetsu — Kozume nunca pensou que agradeceria tanto por esse homem ter insistido para restabelecer as conexões antigas — e seu coach Nekomata, Karasuno estaria lá, podendo treinar com alguns dos melhores times das províncias que tinham contatos.

Kuroo já estava notando o comportamento diferente do cabeça de pudim, como foi gentilmente apelidado por Yamamoto logo quando pintou o cabelo, tinha uns dias. Quando tentava puxar assunto para entender a mudança, não conseguia arrancar nada, chegou a pensar até que pudesse ser de um jogo novo que o menor queria comprar ou já estava jogando, porém naquele primeiro dia do acampamento, percebeu que não era nada disso ao ver como os olhos caramelos cintilaram rapidamente com a chegada do animado bloqueador, comparando com a mesma cara que ele fazia enquanto brincava no console.

O loiro fingiu que não ouvia nada que o moreno falava, percebeu que o outro já tinha se tocado de seu interesse em Shouyou e por isso estava o enchendo de perguntas. Era melhor ameaçar que não jogaria mais nenhuma bola para ele durante os treinos inteiros para conseguir um pouco de paz — o que deu certo, já que logo o mais velho fechou a boca, sem deixar de dar um sorriso vitorioso.

Durante todo o tempo, Kenma tentou, de seu jeito introspectivo, se aproximar da bola de alegria que era Hinata Shouyou, tentando falar sobre tudo que poderia, conhecê-lo melhor. Quanto mais conhecia aquele raio de sol, mais tinha certeza de uma coisa: ele estava apaixonado. E tinha o conhecimento de que não era nenhum príncipe, nenhum santo, muito menos um sonho selvagem de alguém, mas ele queria estar por perto e dar todo o apoio para aquele rapaz, ser alguém com quem poderia contar.

Claro que existiam momentos em que o estudante de Nekoma fugia com todas as forças do corvinho, já que aquele menino não parava quieto e parecia ter estamina infinita, totalmente o oposto de si. Se perguntava se daria certo um relacionamento assim, pensando nas possibilidades de como colocar um calmante na bebida do outro para deixá-lo mais silencioso e– se tocou não suportaria a ideia daquele ser perder seu brilho, afinal, como seu nome, ele era o sol.

Sorriu com a descoberta de que, sim, realmente estava gostando do menino de Miyagi, daquele sorriso e olhos brilhantes, do cabelo alaranjado, do jeito desastrado e ao mesmo tempo perfeito em quadra, da personalidade entusiasmada. Quando percebeu, estava enumerando todas as qualidades do outro em seu bloco de notas do celular.

Para sua infelicidade, o acampamento passou muito rápido. Já estavam se despedindo quando viu Hinata olhando-o, com um sorriso no rosto, dirigindo-lhe a fala:

— Você ainda vai gostar de vôlei, Keeenma! É uma promessa. — Virou-se para ir embora, sendo observado pelo felino, até que parou e voltou para perto dele, como se tivesse esquecido algo. — Ah, e eu vou vencer a próxima! — Sem muitas delongas, abraçou na velocidade da luz o maior, que ficou tão espantado que não teve tempo de reagir. — Até a próxima, Kenma!

— Até, Shouyou — conseguiu acenar de volta, ainda não recuperado do choque.

Sorriu ao ver o mais novo fitá-lo novamente antes de mostrar-lhe aqueles pares de dentes brancos e a felicidade estampada em seu rosto, animado com a resposta que recebeu. Gritou que iria mandar mensagem assim que chegasse em Miyagi, pedindo para ser respondido e que não aguentaria esperar pelo próximo encontro.

Ah, como ele esperava por aqueles dias que podia estar perto daquela criaturinha.

[4]

Novamente uma chance de rever Shouyou em um novo acampamento perto da época do Torneio Nacional de Voleibol Colegial do Japão, agora em Saitama. Estava tão animado para poder conversar com o alaranjado que esqueceu do amigo de infância sorrindo de forma provocativa ao seu lado, como se dissesse “eu não falei sobre sua cara um tempo atrás”. Amaldiçoaria Tetsurou em outro momento, agora estava tentando conter seu entusiasmo com a chegada do outro.

Finalmente poderia jogar contra aquele raio de sol que iluminava seus dias — mesmo que sem intenção —, fazendo-o passar horas a mais no telefone na esperança de ser respondido. Trocavam algumas mensagens, claro, o que deixava Kozume mais caidinho do que ele gostava de admitir.

Aproveitou todos os momentos fora das quadras para criar mais laços afetivos com Hinata, esperando que o outro também sentisse as mesmas vontades que ele — de abraçar mais, conversar mais, beijar— não, beijar não. Quem sabe no futuro.

Compreendia seus desejos, só esperava que o outro também sentisse as mesmas coisas.

Quando teve seu momento a sós com Hinata e as melancias, por dentro explodiu de felicidade, apesar de não demonstrar o quão alegre estava só de ter alguns minutos sozinhos. Trocaram o máximo de palavras que poderiam, falando as histórias que viessem em mente, sobre seus video games.

Estava se aproximando aos poucos, sentando mais próximo. De relance, viu que o de Karasuno tinha sua mão direita apoiada no chão para lhe dar suporte — já que estava do seu lado esquerdo, pensou que poderia tentar aproveitar o momento. Como se não quisesse nada, ele colocou a sua mão no chão, sentindo a grama verde sob seus dedos enquanto lentamente movia-os para perto do membro do outro, finalmente roçando os seus nos dele.

Ouviu o som de surpresa de Shouyou quando encostou seu mindinho no dele, achou até que sentiria o menor retirar sua mão rapidamente, porém foi surpreendido quando teve o toque correspondido e o seu dedo foi entrelaçado. Uma sensação boa preencheu seu ser, um quentinho tomou conta de seu peito e um sorriso pequeno apareceu em seus lábios.

Fitou-o por inteiro, um leve rubor estava presente no rosto do bloqueador, assim como um sorriso envergonhado. Aquela visão foi um estímulo para Kenma ser um pouco mais ousado, procurando entrelaçar sua mão na dele por completo, porém seus planos foram atrapalhados quando ouviu alguém se aproximando. Rapidamente o alaranjado desvencilhou seu dedo do dele e pulado mais para o outro lado, afastando-se do loiro.

— Hinata, você está aqui! — Lev disse, sentando-se do referenciado.

Maldito russo. Atrapalhou todo o momento.

Novamente lá estavam eles se despedindo, prometendo encontrar-se nas Nacionais. Depois daquele dia, não conseguiu mais ter um momento privado com o menino de Karasuno, o que o deixou frustrado.

Contudo, dessa vez, recebeu um abraço forte, um beijo na bochecha e um cochicho, até breve, Kenma. Conseguiu retribuir o abraço dessa vez.

Talvez ele fosse um príncipe, um santo e, quem sabe, o sonho de alguém.

[5]

Ficou feliz quando soube que suas escolas haviam passado para as Nacionais e, agora, eles podiam se enfrentar em uma partida que não tinha como pedir revanche.

Nesse jogo, Nekoma fez de tudo para ganhar e, claro que Kozume tentou aprisionar de qualquer maneira Hinata. Mesmo que soubesse que sim, amava-o com todo o seu ser, não podia deixá-lo ganhar.

Naquele dia, Karasuno finalmente ganhou de Nekoma. Kenma pôde agradecer a Kuroo por tê-lo feito jogar vôlei e, também, o desejo de Shouyou se realizou: ele disse que gostou do esporte.

Perguntou-se como não percebeu que o corvinho estava diferente na partida que jogaram e na próxima que jogou, tanto que quando o menor foi retirado da partida, foi atrás para oferecer apoio — sabia que não poderia seguir ao hospital com ele, mas poderia dar um pedacinho de si para dizer que estava ali.

— Shouyou, melhoras para você. Aqui, pegue. — Entregou o tablet nas mãos dele, sorrindo — É pra isso que os amigos servem.

Viu a felicidade nos olhos castanhos e aquilo foi o suficiente para fazer seu coração dar uma cambalhota. Podia não querê-lo como amigo, mas ali prestava-se como um.

Ele ainda teria sua chance de ser algo além disso.

[+1]

Três anos haviam se passado, Hinata tinha decidido ir ao Brasil para aprender vôlei de praia com um ex-aluno de um coach que esperava resultado nesse pequeno. Kozume, apesar de estar doído com a realidade de viver longe de seu amor — que ainda não havia declarado, diga-se de passagem —, estava disposto a oferecer algo em troca para ajudá-lo a se manter no novo país. Agradeceu por poder fazer isso, ainda bem que tinha criado a Bouncing Ball e conseguia ganhar um dinheiro com as streams de jogos. Ele definitivamente conseguiria manter Shouyou em outro país se ele quisesse.

Foi encontrá-lo no aeroporto para despedir-se, esperando a multidão de pessoas que julgou serem amigas do alaranjado para poder dar um até logo decente. Quando finalmente teve a chance, aproximou-se dele.

— Shouyou — chamou-o pelo nome para chamar sua atenção. — Você vai passar quanto tempo por lá?

— Coach Washijou me deu dois anos para aprender, então eu volto daqui a… — ele largou sua mala e começou a contar nos dedos, confuso. — Dois anos e dois meses, eu acho?

— Eu acho? — Riu, porque não era possível a incerteza daquele ser que agora tinha quase seu tamanho.

— Kenma, não é pra zoar!

— Só queria lhe dizer boa viagem. — E que eu vou sentir saudades, quis complementar, porém achou desnecessário.

— Vou sentir sua falta, Kenma. — Piscou, não acreditando no que ouviu. Virou-se para o ex-aluno de Karasuno e ele o encarava com um sorriso no rosto.

— … Eu também, Shouyou.

Permitiu-se abraçá-lo sem medo, seus sentimentos florescendo dentro de si, com todas as declarações nunca ditas antes entaladas na garganta. Não queria prendê-lo ali, queria deixá-lo voar, diferente do que fez naquela partida na Nacional.

Hinata retribuiu o gesto, apertando com força, deixando seu rosto na curva do pescoço, respirando ali para sentir o cheiro do outro. Aquilo fez o antigo levantador estremecer, não era possível. Sua mente entrou em curto circuito quando sentiu um par de lábios encostando em sua pele e começar a distribuir beijos discretos e sutis.

— Sho-Shouyou...? — Chamou em meio ao seu autocontrole, tentando não demonstrar como estava tremendo, sem sucesso.

— É um presente de despedida, gatinho. — Deu uma piscadela, ainda sem se afastar muito do rapaz bicolor. — Ainda tem mais um.

Sem esperar por alguma reação do antigo aluno de Nekoma, Hinata depositou um beijo perto da boca dele. Sorriu, desfazendo o abraço e seguindo para a área de embarque, acenando.

— Até daqui a pouco, gatinho.

Kenma esperou todos esses anos para revê-lo, Shouyou havia se tornado muito mais interessante do que imaginava. Passaram esse tempo todo conversando por vídeo chamada quando podiam, já que o mais velho tinha faculdade, as streams de jogo e a Bouncing Ball para cuidar e, o mais baixo, as partidas de vôlei e o trabalho de meio período.

Quando finalmente o alaranjado voltou, ele fui buscá-lo no aeroporto — implorou para o amigo de Shouyou, Yamaguchi, para poder realizar seus planos. Esperou pacientemente o painel de vôos dizer que o avião estava no pátio e desembarcando os passageiros. Cada segundo a mais fazia o agora moreno perder-se em pensamentos, segurando as flores que mais lembravam o mais novo: girassóis.

Ele pulou quando viu que tinham pessoas saindo da área de desembarque. Nervoso, seguiu procurando com os olhos aquele ser que queria chamar de seu e, caso tudo desse certo, a partir de hoje ele seria seu.

Avistou com seus olhos de gato um rapaz que lhe lembrava o seu raio de sol, mas a pele estava mais bronzeada do que se lembrava. Demorou uns segundos para a realização tomar conta de si e perceber que aquele era o seu Shouyou.

— Shouyou — chamou baixo, na esperança que rapaz lhe escutasse. Viu que não teve efeito. — Shouyou!

Ao escutar seu nome, rapidamente virou-se na direção da voz. Um sorriso enorme tomou conta de seus lábios e saiu em disparada até o outro. Só teve tempo de jogar os braços com o buquê de girassóis para cima antes que fosse esmagado por aqueles braços malhados e bronzeados.

Talvez Kuroo estivesse certo na época da escola, ele, Kozume Kenma, realmente estava morrendo de amores por aquele serzinho.

Assim que se sentiu ser abraçado, retribuiu com cuidado para não machucar as flores. Dessa vez foi ele quem colocou o rosto no espaço entre o pescoço e o ombro, inspirando e expirando tudo que podia, percebendo o mais novo se arrepiar todo. Sorriu na pele dele, depositando um beijo perto da nuca.

— Bem-vindo de volta, Shouyou. — Saudou, fitando os olhos castanhos.

— Voltei, Kenma.

Como ele esperou para ouvir aquelas palavras, parecia até um sonho, porém sabia que não era, já que aquele calor era real, tudo era real demais.

— Aqui, para você. — Envergonhado, entregou-lhe o ramalhete. — Elas são sua cara, pequeno raio de sol.

Não se recordava desse sorriso enorme que o outro lhe deu, mas se sentiu satisfeito e realizado, orgulhoso se pudesse acrescentar mais algum sentimento.

— Shouyou, eu tenho um pedido pra você. Eu… eu quero t–

— Sim, Kenma, sim! Você vai namorar comigo, não vai? Porque eu não passei esses anos todinhos esperando por esse momento sozinho e, você tem que concordar comigo, nossos sentimentos são mútuos desde da escola e–

Meu deus, como ele tinha esquecido que Hinata Shouyou era um tagarela. O lado bom é que, nesses anos, aprendeu na internet como podia calar uma pessoa da maneira mais eficaz e satisfatória que poderia desejar. Antes que o de cabelo alaranjado pudesse continuar com seu discurso, tomou-lhe os lábios para confirmar seus sentimentos, sendo prontamente correspondido.

Naquele dia, Kozume Kenma teve certeza de que ele era, sim, o príncipe encantado, o santo e o desejo mais louco de Hinata Shouyou.