Segredos Primaveris escrita por Camélia Bardon


Capítulo 3
Confidências


Notas iniciais do capítulo

Alô, cuidado com a atrasada xD era para eu ter postado na quarta-feira, porém acabei me atrapalhando no trabalho e com a escrita de outra história, deixei essa de lado por um minuto. Era também para esse ser o capítulo final, mas os planos mudaram e esse é oficialmente o penúltimo.
Boa leitura procês ♥



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Jade aguardou até que ela retornasse. Por uma semana, duas… a cada dia, a primavera trazia uma nova temporada casamenteira. Com tantos cavalheiros indo e vindo atrás de rosas ⎼ não podiam ser mais originais? ⎼, ocorreu-lhe o inquietante pensamento de que a ausência de Mary fosse igualmente em decorrer da temporada. Sendo quem era, era bem possível que fosse uma das peças raras a serem exibidas naquele show de horrores.

Uma pontada em sua consciência particularmente o aborrecia, como se estivesse lhe dizendo "pois bem, eu o avisei, isto é problema seu". De fato, era. Se ao menos tivesse dado ouvidos à sua consciência enquanto tinha tempo… mas não. Tinha de ter dado voz ao lado romântico e cheio de esperanças na gentileza do universo.

Ajustando o carrinho na intenção de fugir do sol forte, Jade tropeçou numa pedrinha e quase derrubou-o todo no chão. Com o coração apertado, ignorou a dor latejante do corte recém-aberto na palma da mão, resultado de ter tentado segurar o carrinho pelo metal de apoio. Grunhindo de desconforto, o florista soltou um longo suspiro.

Ao virar-se para recuperar sua boina caída no chão, Jade nada mais pode fazer do que observar outro par de mãos recolhê-la com cuidado. Mãos delicadas, que não combinavam com o resto dos trajes simples.

― Está ferido? ― a moça indagou num tom de voz quase inaudível, a preocupação acentuada. ― Deixe-me ajudá-lo com isso, por favor.

Reconhecendo-a pelos olhos, Jade teve dificuldade de respirar corretamente por uma fração de segundo. Ao invés de aceitar a boina, permaneceu observando sua duquesinha em estado de incredulidade.

― Senhori…? 

― Não! ― elevando o tom da voz, Mary exclamou com urgência. ― Não diga nada. Por favor.

― Mas eu… não compreendo… 

― E a compreensão é assim tão importante?

―Apesar de ter sido dito num suspiro, a duquesinha olhou-o com insistência. Mary temia que seu coração estivesse palpitando a ponto de ser escutado de onde ele estava. No entanto, Jade pressionou uma mão contra a outra, tentando conter o sangramento por ora. Se era quietude que ela desejava, o florista não iria se opor.

― Guarde as vendas por hoje… eu lhe pago pelo lucro que teria. O senhor… pediu para que eu retornasse uma vez mais, não foi? Estou aqui. E esta é possivelmente minha única chance. Me arrumei, me disfarcei, vim até aqui a pé e… ― recompondo-se, Mary pigarreou. ― Se não quiser que eu esteja aqui, me avise o quanto antes, pois é uma caminhada generosa.

― Não quero comprometê-la de modo algum, lady Mary. Não sou ninguém.

― É alguém para mim. Se fosse um ninguém, não teria me colocado à prova de comprometimento.

Com sua fala, Jade ficou dividido entre admirar sua coragem e temer as consequências da decisão que estava em suas mãos. Jade pôs-se a analisar suas roupas ⎼ tomadas emprestadas de sua sua aia, talvez? E se ela também estivesse se arriscando na tarefa de acobertar a ama? ⎼, sua expressão exasperada e o olhar que escondia do mundo todos os motivos para estar ali.

― Está bem ― ele cedeu, trocando o peso dos pés. ― Confio na senhorita. Eu… para onde gostaria de ir?

― Para um lugar bonito que eu desconheça!

Jade sorriu, enquanto Mary o auxiliava a fechar e guardar seu carrinho. Ainda auxiliou-o a procurar um trapo na trouxinha, amarrando-o em volta de sua mão com cuidado.

― Está muito apertado? ― questionou ela, preocupada. Como não usava luvas devido aos trajes de empregada, foi possível sentir o toque delicado de seus dedos finos. Engolindo em seco, seus próprios dedos gelaram. ― Jade?

― Ah! Não, não, está ótimo ― sorrindo, ele sustentou os dedos dela nos seus. ― Obrigado, lady Mary.

Retribuindo o sorriso, Mary segurou um dos lados do carrinho, desafiando qualquer que fosse a criação de boneca de porcelana que recebera. Ajeitando a postura para a pompa tradicional, ela gracejou:

― Então? Para onde vamos?

― Por acaso a senhorita já esteve em Monceau?

― Não, apesar de já escutar há muito que se trata de um local adorável.

― Gostaria de tirar essa dúvida pessoalmente, lady Mary?

Seus olhos faiscaram de excitação, ao passo que ela assentiu corajosamente com a cabeça. Jade, então, pegou o outro lado do carrinho, erguendo-o nos ombros com as forças renovadas. Seria uma caminhada boa, como de praxe, no entanto a companhia era das mais agradáveis o que era um pouco de sol e cansaço, afinal?

 

Ao longo de toda caminhada, Jade e Mary conversaram sobre os mais diversos assuntos ⎼ sobre o cotidiano de ambos, histórias de suas infâncias e adolescências, do convívio com pessoas variadas tanto em vendas quanto em bailes ⎼, assimilando os pontos que tinham em comum acima dos que os diferenciavam.

Quando enfim "estacionaram" em Monceau, os olhos de Mary automaticamente se voltaram maravilhosos para as ruínas do templo, ao lago entre as colunas de pedra e aos salgueiros que o rodeavam. Por entre eles, pequenas margaridas selvagens salpicavam os arbustos como pequenos flocos de neve. Àquela hora, eram poucos os que se aventuravam a se esgueirar em meio à grama quente, e ainda os poucos não deram atenção a uma dupla de maltrapilhos.

― Como é lindo! ― Mary sorriu, sentando-se no gramado abaixo do salgueiro. Jade juntou-se a ela, após amarrar o carrinho à árvore para que não escapasse. ― Visita-o com frequência? 

― Já o fiz. Agora, com o trabalho, fica difícil fazê-lo mais vezes… 

― Então, eu deveria obrigá-lo a folgar mais vezes!

Ambos gargalharam, se recostando no salgueiro. Trocaram um olhar significativo, explicitando os pensamentos sem que estes precisassem ser ditos em voz alta. No entanto, havia ainda uma dúvida certeira que, uma vez instalada na cabeça do florista, não sumiria até que fosse elucidada. Virando o corpo para olhá-la, Jade sussurrou:

― Nos trouxe até aqui para uma despedida formal, não foi…? 

Mary não precisou responder, uma vez que sua cabeça baixa em constrangimento respondeu-o por ela. Jade assentiu com a cabeça, mesmo que Mary não pudesse vê-lo ⎼ uma tentativa de se convencer, talvez? Um suspiro contido, entretanto, delatou que duquesinha se pusera a chorar disfarçadamente. Movido pela compaixão e ternura que sentia por ela, tomou a iniciativa de passar o braço ao redor de seus ombros, a abrigando num abraço. Mary, por sua vez, estremeceu.

― Eu sinto muito, Jade… não desejaria em um milhão de anos que as coisas fossem assim… ― a cada pausa, um soluço sutil. ― Queria que tivéssemos tempo ou… outras oportunidades, quem sabe… 

― E eu gostaria de estar à vossa altura, Mary. Deus sabe o quanto.

A duquesinha ergueu a cabeça para olhá-lo, os olhos brilhando devido às lágrimas.

― Que quer dizer com isso? Estar à minha altura?

― Queria poder lhe dar uma vida digna de quem é. Com… posses, luxos, conforto… contudo, o máximo que está ao meu alcance oferecê-la é um punhado de flores patéticas e um encontro sigiloso que mais parece uma ação ilegal ― Jade finalizou o monólogo com um resmungo. ― E aqui estamos, na provável última oportunidade de estarmos… e eu estou… 

Mary permaneceu fitando seus olhos esverdeados, deixando-o constrangido para equilibrar a situação. Não estou dizendo nada que faça sentido, como ainda pode me olhar deste modo? Então, Mary sussurrou:

― Jamais desejaria que fosses qualquer outro além de vosmecê. Pois tudo isso que mencionou foi exatamente o que me fez estar aqui, agora. 

Aproximando-se a ponto de conseguir sentir seu hálito quente, Mary estendeu uma mão na intenção de acariciar uma bochecha do florista. Por sua vez, Jade arrepiou-se sob seu toque, não resistindo a repousar a mão sobre a sua.

― Sou eu quem gostaria de estar à vossa altura, Jade. Em toda sua simplicidade, chamou-me mais atenção do que centenas de bailes e pretendentes luxuosos.

― E isso ― Jade sinalizou com a cabeça para o ambiente. ― É suficiente para a senhorita?

― Para lady Maillard, não. Para Mary é tudo que nunca imaginei querer, bem aqui na palma de minhas mãos. E… antes tendo tão somente um punhado de tempo do que tempo nenhum.

Se ele estava se controlando para não tomar nenhuma decisão de que fosse se arrepender, o comentário de Mary serviu-lhe de incentivo. Ela tem razão… o tempo é precioso para pessoas como nós. Não vamos perdê-lo fantasiando sobre o que poderia ser ou deixar de ser.

― Tens toda razão.

Sorrindo de orelha a orelha, foi Mary quem tomou a atitude de inclinar-se para frente e hesitar antes de enfim roçar os lábios nos dele quase imperceptivelmente. Passado o choque inicial, Jade arquejou; não deixando, no entanto, de corresponder ao gesto com cuidado redobrado.

Apesar de não querer que ela pensasse disparates a seu respeito, o contato mínimo provou ser pouco. Portanto, o florista aprofundou o beijo, fazendo Mary suspirar de prazer e retribuí-lo com carícias na nuca. Reconhecendo desta vez terem ultrapassado o limite da decência, ambos apartaram-se, mantendo apenas as testas unidas. Sem abrir os olhos, Mary sussurrou:

― Esta é uma forma sublime de se passar o tempo… que bom que sentamo-nos e frente para as árvores!

Rindo baixo, Jade acariciou seus lábios inferiores com o polegar para não quebrar a magia do momento.

― Imagino que seja nosso segredo, agora.

― Muito mal-guardado, pois as flores serviram como testemunhas oculares fundamentais… 

Permanecendo no estado de riso frouxo, Jade voltou a acolhê-la sob seus braços. Mary se ajeitou confortavelmente, olhando para o florista com admiração e afeição.

― Terás de dar cabo em todas elas, é uma lástima… ― Mary brincou. ― Isto ou então usamos de chantagem para que não abram o bico futuramente.

― Pobrezinhas. Elas são cúmplices!

― Decerto que sim. Cúmplices de uma paixão compacta, intensa e genuína.

Jade olhou para baixo, para ela, atento às suas palavras.

― Hoje ganhei um coração para bater do lado de fora do meu peito, e ele continuará batendo até que cessem minhas forças ― finalizou ela, com um sorriso triste.

Sentindo os olhos umedecerem, Jade apertou-a contra o peito, consolando tanto a ela quanto a si mesmo. Balançando-se para frente e para trás com calma, ele suspirou ao apoiar o queixo nos cabelos de Mary.

Minha flor…! Como posso deixá-la assim ao relento? 

Determinado a encontrar um modo de não terem apenas aquele dia, Jade e as margaridas salpicadas nos arbustos estabeleceram um acordo silencioso: enquanto aquele sentimento vivesse, Jade viveria para estar ao lado de sua amarílis. Nem que para isso precisasse desistir de seu próprio estilo de vida.


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Notas finais do capítulo

Uma das frases finais vem da música "Fleur de Ma Vie", do Rosa de Saron (https://www.youtube.com/watch?v=wKzMgfLUgXM) e, apesar de ser sobre uma relação entre um pai e uma filha eu me inspirei bastante para a composição do capítulo.

É isso! Por hoje é só, pessoal (◕‿◕✿) O que vocês esperam do próximo, uma vez que esse foi uma montanha-russa que só? Beijão no coração ♥



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