Somos Nó(s) escrita por Anny Andrade, WinnieCooper


Capítulo 16
Pra Me Refazer


Notas iniciais do capítulo

Olá Leitoras(es) Maravilhosas(os), tudo bem com vocês...
Um dia escutei de alguém que a vida é um equilíbrio de dias bons e de dias não tão bons assim, acho que chegamos a esses dias e apesar de não serem os melhores dias continuam sendo bonitos, únicos e especiais.

Espero que consigam encontrar a beleza nas lágrimas como conseguimos encontrar nos sorrisos.

Boa Leitura.



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Me diz o que é que eu faço
Dessa vida sem você
Quem é que vai me levantar agora
Eu já não tenho hora pra me refazer

Quando encontrei aquela caixa desgastada e corroída pelo tempo sabia que contraria algo que me faria lembrar. Lembrar dele e de nossa vida, de como fomos construindo tradições e criando vínculos eternos. Entre minhas lágrimas conseguia ler os nomes. Tinha cartas minhas, várias de Rose, principalmente da época de Hogwarts. De Hugo e seus irmãos, tinha rascunhos de suas próprias cartas, mas uma letra que não reconhecia me chamou atenção. 

Era curvilínea e tinha os finais marcados. Seus dizeres me surpreenderam porque não esperava encontrar uma carta de tal pessoa.

Ronald,

Os anos fizeram com que eu entendesse o tamanho dos meus atos. Como eu escolhi deixar a vida de muitas pessoas pior do que precisavam ser. Ofendi sua família inúmeras vezes, a cor dos cabelos, as vestes. Ofendi sua esposa da pior forma possível a chamando de coisas que nenhum bruxo aceita. Mas não saí impune de tudo isso.

Sei que pensam que eu ficava satisfeito em dizer tudo, em ficar do outro lado. Muitas vezes fiquei, de fato, satisfeito. Mas não quando me obrigaram a matar Dumbledore, algo que falhei. Não quando precisei prender pessoas em meu porão e assistir a tortura deles. Não quando torturaram sua esposa, nossa ministra. Não quando meu amigo morreu em chamas.

Somando, percebo que me arrependo mais do que me orgulho. Porém me orgulho de Scorpius e de como ele é completamente diferente do que eu fui. Minha Astoria conseguiu fazer o que Narcisa e Lucio não souberam. Ela amou, cuidou, ensinou. Me ensinou a ser o tipo de pai que sei que você também é.  Um pai que deseja o melhor para os filhos, que quer toda a felicidade e que conquistem o mundo.

Perante esse desejo mutuo, peço que não desconte nele, em Scorpius, tudo que gostaria de descontar em mim. Além disso, desejo que consiga me perdoar. Por eles. Não por mim.

Sua doce e encantadora filha protegeu o meu filho durante os dias naquela escola que conhecemos tão bem. Ela assim como você e como Hermione fizeram, um pelo outro, inúmeras vezes, também o fez. Ajudou meu filho a sobreviver aos dias mais sombrios.

Vejo a maneira como ela consegue arrancar dele sorrisos desconhecidos. E percebo o quanto ele consegue fazer com que ela sinta-se segura. Era como se revivesse de maneira tranquila a cena de você protegendo a ministra em minha sala, quando Harry roubou minha varinha.

Então, por eles. Aceite o convite para o jantar. Ature o sobrenome Malfoy. E permita que vivam uma história bonita como a sua, salvadora como a minha.

Draco Malfoy

 

Lembro-me do jantar, da conversa agradável com Astoria. Da felicidade nos olhos de Rose e Scorpius. Rony não havia me contado sobre tal carta. Sobre a conversa franca e aberta que teve com Draco Malfoy. Não me contou sobre o motivo de ter se comportado tão bem, acreditei que era por mim, meu pedido. Era por eles. Principalmente por Rose. E saber disso faz com que meu coração o ame ainda mais, faz com que sua falta seja ainda mais intensa. Me permite desejar reencontra-lo o mais breve possível para voltarmos a viver nosso amor como sempre vivemos.

Limpo as lágrimas e parto para a próxima carta, essa de outra pessoa. E eu lembro dessa letra, de anos e anos atrás, nunca mais tinha visto ela. E a carta parecia rasurada, como se alguém tivesse mexido, logo imaginei quem seria.

 

Caro Ronald,

Não entendi direito o que quis dizer com sua última carta. (Óbvio que ainda não entende inglês direito). Perdi uma competição contra você? Qual competição seria essa? Não lembro de você direito, sei que era amigo de Harry Potter. Aliás, como ele está? Fiquei sabendo que teve seu primeiro filho, saiu em todos os jornais. Sei que era amigo dele certo? (Mesquinho de merda!).

Olhe, fique tranquilo não tenho interesse nenhum em Hermione Granger. (Hermione Granger Weasley, se não percebeu pela carta que lhe enviei, além de não entender inglês, não sabe interpretar). Foi uma ótima amiga, sinto falta de conversar com ela, me ajudava muito a praticar meu inglês, era uma ótima companheira de danças, infelizmente perdi o contado, pelo o que entendi se casou com ela. Pode dizer que fiquei um pouco chateado em não receber o convite do casamento, achei que éramos ótimos amigos. (Não recebeu o convite porque foi interceptado, aliás, me custou uma enorme briga com ela ao ponto de quase cancelarmos o casamento).

Quero lhe desejar felicidades, independente de um passado conturbado, - não me lembro de ser tão conturbado, mas você disse que atrapalhei seu relacionamento. (Sim! Foi graças a você que Hermione não foi comigo ao baile de inverno, pra começo de conversa). Mande lembranças a Hermione. Diga-lhe que estou os convidando para conhecerem a Bulgária e seus pontos turísticos, faço questão de tirar um dia de folga para fazer isso. (Como se fossemos querer passar algum momento de nosso tempo com você!!!)

Até breve. Viktor Krum.

(Olá Viktor, não sabe a vontade que tenho de lhe mandar uma carta frisando bem as partes importantes, achei que fosse entender minhas palavras, mas como vi, é bem lerdo para ler as entrelinhas. Então venho aqui dizer em letras garrafais. HERMIONE ME AMA. Aliás, acabamos de fazer amor, ela está dormindo com um sorriso no rosto. Quando sua carta apareceu em minha frente. Não faz ideia do quanto queria lhe enviar isso. Com todas as letras, com todos os detalhes. HERMIONE ME AMA, fazemos amor o tempo todo, porque, sabe? Estamos casados, somos felizes e não há passado nenhum para nos assombrar! Passar bem, e nunca iremos para a Bulgária!).

Estou rindo diante das palavras de Rony na carta para Viktor. Não fazia ideia que ele tinha se correspondido com ele, não fazia ideia que ainda sentia ciúmes dele mesmo depois de casados. Aliás, fazia uma certa ideia, já que briguei com ele para convidá-lo ao casamento. Não estou chorando de tristeza, estou chorando de alegria e nostalgia de meu Rony ser ele mesmo em qualquer circunstância e em qualquer época.

Sinto mãos em meus ombros, me viro para olhar quem estava ali, claro que muitas pessoas ficavam verificando se eu estava bem, se meu sofrimento estava controlado ao ponto de conseguir seguir em frente.

.

.

 

Então me diz o que é que eu faço

Dessa vida sem você
Quem é que vai me levantar agora
Eu já não tenho hora
Pra me refazer

 

Eu a encontro sentada na beira da cama, a caixa aberta e os olhos vermelhos. Estava chorando e sorrindo ao mesmo tempo. Parecia uma louca, com os cabelos soltos e cheios de volume, desde que virará ministra poucas vezes a via dessa maneira.

― Querido, eu estou bem. – sua voz faz com que eu saiba que é verdade. – Apenas descobrindo coisas novas sobre seu pai.

― O que descobriu? – Pergunto a ela me sentando ao seu lado, deixando que ela me abraçasse como se eu tivesse voltado para infância.

― Que até os segredos deles eram sobre o melhor para nós.

― Tenho algumas cartas dele, guardadas. Não imaginava que ele também guardava as minhas.

Seguro um pacote com todas as cartas com minha letra, fico emocionado. Peço licença para minha mãe e vou para o antigo quarto que chamava de meu, que permanecia intacto apesar dos anos, das mudanças.

Vejo meus desenhos, as paredes cobertas deles e de fotos. Procuro no fundo do armário, tantos cadernos e álbuns. Uma outra caixa, toda desenhada com heróis trouxas.

Pego a última carta, aquela que me fez decidir.

Hugo,

Meu filho eu sei que não é fácil saber o que queremos da vida. Qual caminho devemos seguir. Você sempre foi tão maduro para a idade, muito diferente de mim. E ao mesmo tempo tão perdido em alguns aspectos, exatamente como eu.

Sei que durante sua infância eu acabei deixando que sua mãe ocupasse o lugar de destaque. Ela e sua irmã eram como óleo e água, mas você parecia dissolver tudo. Era bom com as duas. Mesmo assim ainda estava sempre de olho em você, sempre me reconhecendo em algum pequeno aspecto.

Foi sua mãe que começou a me ensinar a observar, foi sua irmã que me ajudou a me tornar pai, mas foi você que me fez ser quem sou hoje. Um filho que me obrigou a observar, amadurecer e me esforçar. Então me ajudou a ser melhor a cada dia.

Quando apresentou sua noiva para nós parecia que estava finalmente realizando sonhos. Você sempre foi um sonhador. Queria a garota perfeita, uma princesa da Disney. Que bom que encontrou mais do que isso, encontrou alguém real exatamente do tipo certo, o tipo certo para você.

Então se ela esta ao seu lado porque você não tomaria a decisão correta? Seus olhos brilhavam naquela viagem, temos mais fotos dessa visita do que qualquer outra. Se aquela cidade chama seu nome e se seu coração chama o nome dela, mude-se.

Estou ao seu lado. Sentiremos saudades, sua mãe certamente culpará Íris e seus cabelos coloridos, Rose irá gritar com ela e eu vou fingir que não quero participar da decisão. Mas estou aqui lhe dizendo vá. Seus sonhos merecem se realizar.

Estou orgulhoso de suas escolhas. E honrado por sermos afinal de contas tão parecidos como nunca deixamos transparecer. Seja o brilhante desenhista nova yorquino que sei que será.

Seu pai coruja,

Ronald Weasley.

 

Eu fui. Eu e Íris começamos nossa vida lá, longe de Londres. Foi a carta dele que me deu a coragem necessária, o orgulho de suas palavras. Começo a rir porque a cena descrita na carta foi exatamente a que aconteceu na vida real. Como se ele conhecesse nós melhor do que nós mesmos.

Fecho meus olhos e deixo minha cabeça abaixar. Quando as lágrimas quentes molham meu rosto sei que precisava delas, precisava dele. E como se ele soubesse disse me permitiu sentir a brisa leve entrando pela janela. Um novo recado para a busca pelos sonhos continuar.

Então eu me lembrei de outra carta que me fez libertar, ela estava guardada no meio das coisas e foi algo que precisava ler na época e algo que precisava entender.

Hugo,

Sinto falta de você, todos os dias aqui nos Estados Unidos, todos os dias, eu sei que não devia te mandar essa carta, sei que não devia me meter em sua nova vida, sei que sou um passado que não pode ser remexido. Mas a verdade me atinge todos os dias. Eu sinto sua falta. E sei que a melhor fase da minha vida já passou.

Tenho sucesso, dinheiro, fama, mas não tenho amor. Nada me completa, nada me atinge como quando estava com você. Nada parece fazer sentido. Me desculpe. Eu sei que faz pelo menos uns três anos que não nos falamos, sei que está feliz, perguntei para minha mãe de você, ela me disse que estava morando com a Íris.

Aliás, Íris, preciso te confessar que venho me correspondendo com ela. Estranho eu sei. Mas ela me mandou uma primeira carta, e achei que precisava lhe responder. Agora estou te enviando nossa conversa. Ela me disse que você sabia sobre as cartas, então não há porque esconder isso de você.

Espero que esteja bem e que permaneça bem. Em anexo estão as cartas que troquei com Íris, espero que não me odeie mais do que já acho que me odeia.

Lily.

 

Eu lembrava das trocas de cartas com Íris. Ela me falou que estava cuidando de mim conversando com Lily. Lembrava das respostas de Lily a ela. Nunca tinha lido desde então as cartas de Íris, só quando as recebi. Percebendo agora alguns anos depois, penso o quanto Íris cuida de mim, assim como meu pai cuidava. Eu parecia cuidar de todos, mas na verdade tinha as pessoas certas que percebiam quando eu precisava de ajuda sem dizer absolutamente nada. Pego uma sequência de cartas que havia lido várias vezes, durante todos aqueles anos.

Lily,

Eu conheço você, através de histórias do passado, através de retratos e desenhos espalhados em todos os lugares do apartamento que moro. Você está aqui, me olhando, me analisando, parece esperar que eu dê um passo em falso para que venha tomar meu lugar. Um lugar que era seu e somente seu.

Mas você o destrói. Entenda isso, você o destrói, todas às vezes que sorri para uma foto que ele bate, toda vez que aparece em lembranças de um passado perfeito, toda vez que te alcançar se torna impossível. Sabe o nome do pesadelo que ele tem todas as noites? Lua, e ele nem é um lobisomem para temê-la. Entende esse conceito? Você está nos pesadelos dele, aquela inalcançável e quando foi alcançável ele percebeu que preferia a terra firme ao invés de perder a gravidade. Que amava o arco-íris cheio de cores e que se mostrava somente por uns instantes.

Te desejo sorte, siga sua vida. Não fique mandando mais cartas, ou ligue para ele, ou relembre fatos do passado ou o quanto se arrependeu de beija-lo. Sei que é uma mentira. Sim, ele me contou que você o beijou.

Passar bem, Íris.

—_______________________________________________

Íris,

Desculpe às últimas intromissões em sua vida, aliás, na vida de vocês. Ele era minha vida antes de você chegar e aparentemente conheceu algo melhor. Desculpe ser a lua temida que virou pesadelo. Parei com as cartas. Mas ele ainda está comigo, todos os dias, em lembranças e em como minha vida cheia de glamour e dinheiro não significa nada comparada a amizade dele que tinha e perdi. Entenda, eu me arrependi, assim que percebi que ele não precisava mais de mim quis ele automaticamente. Eu o beijei, mas o beijo, que foi um renascimento do sentimento por ele que levo em mim, foi a ruína para ele. Tudo acabou naquele beijo, a paixão platônica acabou, o meu tempo com ele acabou. Eu entendo isso agora. Odeio entender isso só agora.

O que só mostra o quanto você o salvou a tempo. E o quanto sou egoísta em relação ao amor dele. Me desculpe.

Lily.

—_______________________________________________

Lily,

Não precisa se desculpar para mim, se desculpe a ele, sei que já tentou fazer isso. Sei que saiu de perto dele e foi para outro país para esquecer e tentar viver sua vida para que ele viva a dele. Obrigada por isso. Eu cuido dele por aqui, se cuide por aí.

Íris.

As lágrimas voltam ao meu rosto. De certa forma tinha acabado de fazer as pazes com Lily através de nossa viagem para o passado com a morte do meu pai. Ela me ajudou, mesmo depois de vários meses sem nos falarmos. Descobrimos o final do filme, desejei saber o meu final. Mas entendi que o meio difícil fazia parte do percurso todo. Agradeço mentalmente mais uma vez as oportunidades e as pessoas que cruzaram meu caminho. Sei que tudo teve seu tempo certo para acontecer. E não mudaria nada do que vivi todos esses anos.

.

.

 

O vazio é difícil acostumar
Ainda bem que não hesitei em te abraçar

Me diz o que é que eu faço
Dessa vida sem você
Quem é que vai me levantar agora
Eu já não tenho hora pra me refazer

 

Nunca pensei que seria assim que faria com que meus filhos o conheceriam. Pensava em brincadeiras no quintas, em passeios em família. Com meu pai os carregando nos ombros. Fico feliz que tenhamos as cartas, quando ele começou a mandá-las achei estranho, mas talvez algo dentro dele soubesse que existia a possibilidade dos netos precisarem de fotos, de palavras, quando não poderiam tê-lo pessoalmente.

Começo a ler e quase o escuto dizer as palavras. Sua voz é nítida em minha cabeça, mas a que toma conta da sala é a minha.

Olá jovens Weasley.

Tudo bem, o vovô sabe que vocês são Weasley – Malfoy. Mas um avô tem o direito de sonhar, não é mesmo?

Primeiro vou contar um segredo para vocês, existe um espaço trouxa que se chama piscina comunitária, no começo parece ser um lugar horrível, mas depois traz as melhores recordações da infância. Peçam para a mamãe levar vocês, briguem por cadeiras, estejam sempre lado a lado.

Segundo, sorvete resolve tudo. Quando o dia estiver triste e nublado um pouco de sorvete vai ajudar. Sua mãe é especialista, dona de muitas sorveterias. Não deixem de experimentar o que tem sabor se chocolate e maracujá. É espetacular. Meu preferido.

Terceiro, quando forem para a piscina peçam para mamãe entregar a camiseta também conhecida como saída de praia para o papai. Sim, querida Rose. Não precisa guardar aquela camiseta para sempre, talvez seu marido precise dela para ajudar alguma garotinha maravilhosa que precisa de bons conselhos e de uma camiseta que pode tudo. Eu confio em você.

Agora, meus netos...

Espero que estejam loucos para sair da sala e correr pela casa e quintal. Vovô Weasley confia em vocês. Até a próxima carta.

Com amor,

Ronald Weasley.

 

Claro que as crianças amavam as dicas do avô, correram o mais rápido possível, enquanto eu segurava a carta contra o peito. Queria abrir todas. Eram tantas que ainda estavam lacradas. Mas ele pediu. Uma por ano, depois releiam, quando esquecerem as reencontrem. Mas apenas uma por ano.

Scorpius ficava ótimo com a camiseta, mas eu ainda odiava a piscina comunitária. Compramos uma para as crianças, e deixamos que Hugo e Íris aproveitem a sensação de brigar por cadeiras.

Gostaria de poder responder as cartas, de levar as crianças para acordá-lo nos domingos de manhã. Pulando sem parar na cama. Mas abraço a carta. Respiro seu cheiro. Sinto saudades enquanto contorno palavras específicas. Ninguém avisa como é perder o pai ou como sobreviver a isso.

É quando Scorpius rela em meu ombro e me entrega um papel, novo para mim, velho em sua aparência. Gasto com o tempo.

― É sua agora. – me diz com a voz entrecortada.

O encaro sem entender e abro a carta. Reconheço a letra assim que bato os olhos nela.

Scorpius,

Sei que pareço seu inimigo, na verdade, acho que eu mesmo criei essa versão de nós dois. Disputamos Rose e seu amor de uma forma e em um lugar que não há disputa. Depois de conversar com seu pai ontem na sua casa, depois de ver como trata Rose. O carinho com ela, como cuida para que ela sempre se sinta confortável, o fato de seus olhos brilharem quando a olha, o fato de ter entrado em brigas na escola para defende-la de dores que até então não sabia que ela sentia. Posso dizer que eu perdi.

Perdi para você. Mas ela ganhou. Somou.

Sei que a ama de verdade e espero que esse amor perdure. Me desculpe por tentar disputar um amor que não precisava de disputas e sim de somas. Não há divisão. Há multiplicação. E sei que você sabe a deixar feliz de um jeito que jamais tinha visto antes.

Cuide bem de minha menina. Não a deixe sofrer.

Ronald.

Termino de ler a carta com lágrimas inundando meu rosto mais uma vez. É tão bom ler algo que não havia ideia de que ele tinha escrito, tão bom ver que meu pai aceitou meu amor antes mesmo de eu perceber isso.

― Ele me aceitou, logo depois do jantar em minha casa. Nunca me senti tão aliviado.

― Ele logo percebeu o quanto você me fazia bem.

E em meio aos choros começam os risos. Lembranças de anos atrás. Lembranças tão perfeitas. Lembranças que sempre ficaram em mim.

.

.

 

Então me diz o que é que eu faço
Dessa vida sem você
Quem é que vai me levantar agora
Eu já não tenho hora
Pra me refazer

 

Vejo em seus olhos o quanto as coisas parecem difíceis. Ele está cansado, lutando para parecer forte mesmo que as poções estejam perdendo o efeito. Sento ao seu lado e entrego o papel que me pediu pouco antes. Ele já escreveu tantas cartas, eu nem imaginava que gostava tanto de escrever.

Em circunstâncias normais acho que estaria rindo, fazendo piadas, descontraindo o ambiente. Nós não somos tão bons com isso.

Sei que ele deve ter deixado a minha carta com alguém.  Deixou as de Rose e Hugo comigo. As para os netos com Scorpius. Insisto para que se poupe, quando estiver bem poderá nos dizer pessoalmente o que quiser. Mas ele insiste. Insiste tanto que não tenho como negar.

Harry,

Meu velho amigo. As coisas não serão fáceis. E eu preciso contar com você.  Se o pior acontecer cuide de tudo. Cuide dela. Hermione é forte, mandona e sempre está preparada para tudo. Só que não para isso. Ela vai precisar de você e de Gina.

Aquele dia no trem a tantos anos atrás nos tornamos família, não sabia que o famoso Harry Potter seria meu melhor amigo, não sabia que anos depois eu seria a pessoa mais importante em sua vida. Somos irmãos por circunstâncias, cunhados pelo destino, compadres por escolha.

Tive ciúmes de vocês dois por tempo demais, quando percebi que na verdade assim como eu era família para você, ela também era. Então continuem sendo família. Cuide de Hermione. De Rose. De todos que precisarem de você.  Hugo estará ao seu lado. Ele é como eu, só que muito mais inteligente e controlado.

Vou me despedir agradecendo por ter feito parte do trio, por você nunca duvidar de minha, como eu tanto duvidava. Por se importar, por ser um grande amigo. De todas as escolhas que Gina fez, a melhor certamente foi você.

Um dia voltaremos a jogar xadrez, treinar quadribol, conversar sobre nossos filhos cheios de problemas. Até lá aproveite a vida. Ela pode passar mais rápido do que imaginamos, e trazer mais alegrias do que buscamos.

Um abraço,

Do Elo, Ronald.

 

Tento não me emocionar, sei que sempre foram amigos e irmãos. Que Rony tinha dado ao Harry o que mais ninguém conseguirá. Uma família.

― Rony, não precisamos disso. – Digo tentando controlar toda as lágrimas que querem escapar.

― Hermione... – ele sorri. – Guarde. Se algo acontecer está ai. Se na acontecer uma dia usamos como presentes de amigos secretos.

Isso me faz rir, o que provoca nele um sorriso.

― Te amo. – Digo beijando sua testa.

― Te amo. – Ele responde em um sussurro.

Guardo a carta torcendo para que nunca precise entregá-la. Torcendo para as novas poções terem resultado. Torcendo para acordar e ser tudo um pesadelo.

.

.

 

Então me diz o que é que eu faço
Dessa vida sem você
Quem é que vai me levantar agora
Eu já não tenho hora
Pra me refazer

 

Estávamos todos na toca. Mesmo que nem Molly e nem Arthur mais estivessem vivendo ali. A toca significava algo aconchegante para nós. Irmos almoçar todos juntos depois da morte de Rony, era algo que fazíamos sempre. Mas pra mim era sempre mais difícil.

Harry chega perto de mim e aperta meus ombros, parece querer me dizer que ainda está ali para o que eu precisar. Tira um pedaço de papel de seus bolsos e me entrega.

― Achei ontem em meio as minhas gavetas, quis te mostrar. Outro pedaço dele perdido.

Reparo no papel, a letra de Rony novamente aperta meu coração, seu conteúdo até então desconhecido para mim. Quero descobrir.

Harry,

Vim te pedir desculpas, sei que não sou e não chego aos pés do que pretendia comigo na carreira de auror. Ser auror para você parece simples e fácil, algo que deve fazer, o bem a todos, ajudar a todos. Sinto que não é para mim. A verdade amigo, é que estou ficando doente.

Estou perdendo meus filhos crescerem, trabalho demais e não quero isso para mim. Ontem tive uma conversa com Hermione, fui muito sincero com ela, você a conhece, tem tudo programado, cada passo nosso, parece querer prever nosso futuro em post-its. Mas ela se mostrou do meu lado, deu a entender que não teria vergonha de mim se eu por um acaso desistisse, se eu por um acaso fosse a pessoa da casa que chega cedo e prepara o jantar, que cuida dos filhos, que manda uma carta para ver se está tudo bem na escola, se eu por um acaso fosse a pessoa do casal a ganhar menos.

Você sabe, eu sempre me menosprezei, me sinto importante ao seu lado amigo no departamento de aurores, mas sinto também que se eu permanecer ali, ficarei cada vez mais doente e perderei capítulos chaves de minha vida. Conversei agora com George, o que foi o meu último fio de coragem para fazer o que precisava fazer. Estou pedindo demissão, meu irmão me apoia nessa decisão e sei que Hermione também. Espero que não fique chateado comigo, sei que tinha vários planos para mim. Me desculpe.

Percebi que ser protagonista é cansativo, que lidar sempre com coisas erradas e barbaridades me faz mal. Sei que isso tem a ver com o que você é, mas não tem mais a ver com o que quero ser.

Obrigado pela ajuda e pelos anos trabalhando juntos. Ainda somos melhores amigos, cunhados, e vizinhos.

Queria que soubesse por mim primeiro e antes de todos.

Ronald.

Então assim que termino a carta, Harry e eu estamos nos abraçando e novamente revivendo tudo o que passamos aqueles anos todos. Lembrando o fato de Rony nunca mudar, e amarmos tanto aquilo nele.

.

.

 

Então volta, me retoma, desafoga
Vem realinhar
Me estremece, me percebe
Eu vou ser breve
Pra gente não esfriar

 

Nós estávamos namorando há três anos quando Hermione me levou para assistir um filme trouxa, ela disse que era um dos seus preferidos, mas que negaria a todos se por acaso eu quisesse usar isso contra ela. Eu fiquei rindo, mas descobri que ela realmente amava o filme, era sobre amor e cartas. Sobre cartas que a mulher recebia depois da morte do seu marido. E eles brigavam tanto e ao mesmo tempo se amavam tanto.

Segurei ela em meus braços e deixei que chorasse e sentisse o filme da maneira que queria sentir. Eu nunca usaria isso contra ela. Na verdade após deixá-la em casa corri para o meu quarto e encontrei sua ultima carta. Aquela que eu não havia respondido. Reli cada palavra, tendo a certeza que a responderia e mandaria outras. Encheria Hermione de cartas durante nossa vida.

A carta dela dizia:

Rony,

Eu quase comecei a carta com querido, mas isso soou esquisito. Porque seu nome já significa todos os sentimentos. Quando escuto alguém dizer seu nome ou perguntar por você, sinto amor, sinto o tanto que te quero sempre por perto, sinto como se por uma simples menção seu perfume se materializasse no ambiente inteiro.

Ronald Weasley, o que fez comigo é algo que eu não esperava. Faz com que eu deixe de ser a mulher organizada, metódica, estressada que fui durante toda a minha vida. Com você posso ser só eu, com os cabelos feito juba de leão, com os olhos inchados de chorar, com os pés descalços, com roupa ou sem ela. Posso ser o que sou, o que quero ser. Livre.

Obrigada, por transformar eu e você em nós. Por ignorar quem acha que não é o cara certo para mim. Porque acredite, você é o cara certo. Sempre foi. Sempre vai ser.

Sou uma Hermione melhor quando estou com você.

Não ouse mostrar isso para ninguém. Porque negarei. Mas te amo hoje, ontem e por toda a eternidade enquanto eu respirar.

Hermione.

 

Ps. Não se atrase para o filme, o começo é importante.

 

Agora sei que o começo era importante, na verdade todo o filme. Que cartas podem ser as lembranças certas para encontrarmos ao longo da vida. Desejo que tivesse mandado mais cartas enquanto frequentávamos Hogwarts, foram poucos. Pontuais. Eu tinha medo de escrever, de perceber o que poderíamos ser.

Só que a partir de hoje as cartas serão uma constante para ela, para mim. Para todos aqueles que são importantes.

Guardo minha carta com cuidado, sabendo que também amarei Hermione até o último suspiro e depois dele.

 

Então me diz o que é que eu faço
Dessa vida sem você
Quem é que vai me levantar agora


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Notas finais do capítulo

Esperamos que tenham apreciado esse capítulo!
Beijos e até o próximo!



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