Implicância Fora de Série escrita por Saori


Capítulo 4
Implicância fora de série.


Notas iniciais do capítulo

Olá, amores. Aqui está o último capítulo. ♥



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Scorpius Hyperion Malfoy.

Eu não gostava de festas. De fato, eu repudiava qualquer tipo de aglomeração ao meu redor. Ir à festa de James Potter, em um sábado à noite, definitivamente não estava em meus planos e, se Albus não fosse o meu melhor amigo desde os meus onze anos de idade, eu teria facilmente recusado o convite. No entanto, eu sabia que James e Albus tinham uma relação um pouco conturbada, principalmente devido às costumeiras atitudes infantis do irmão mais velho, que divertia-se pregando peças no mais novo. 

Em meu caminho para a casa dos Potter, pensei em dar meia-volta e desistir. Ficar em casa, assistir um filme, ler um livro, todas essas alternativas pareciam muito melhores do que qualquer comemoração sem fundamento com uma galera da faculdade que eu detestava. No entanto, havia um outro fator primordial que pesava na minha decisão: Rose Granger-Weasley estaria lá. Albus havia me contado que sua irmãzinha, Lily Luna Potter, havia insistido para que a prima fosse, e que ela seria o seu mais novo projeto de moda. Confesso que fiquei curioso com essa última afirmação. Não que eu quisesse ver a Weasley, mas seria divertido poder implicar com ela em um ambiente que não fosse de trabalho. Eu queria vê-la vermelha de raiva quando eu colocasse os pés na casa, prestes a querer me matar a qualquer segundo. Eu não sei dizer exatamente o motivo, mas todo o clima de tensão entre nós, apesar de me irritar na grande maioria dos momentos, às vezes, era como um passatempo, quase uma diversão, porque, por mais que eu odiasse ter que admitir, ela ficava adorável quando estava irritada.

Obviamente, a minha motivação principal de ir à festa estava longe de ser Rose Granger-Weasley, e se concentrava em Albus Potter, mas eu também não podia negar que ela havia contribuído para essa grande decisão da qual eu tinha certeza de que me arrependeria depois. Quando avistei a casa, com vários carros estacionados ao redor e pessoas desengonçadas no jardim, tive o enorme impulso de voltar para casa e confesso que provavelmente faria isso, se já não tivesse sido avistado por Albus, que acenava para mim com uma empolgação fora do normal. 

Eu sabia o motivo de ele estar tão feliz, que era exatamente o mesmo de ele ter decidido ir à festa, já que ele também não gostava desse tipo de coisa. Isso era porque a garota pela qual ele tinha uma queda, ou melhor, um abismo, havia decidido ir. Honestamente, eu nem sequer sabia o que ele via nela, mas Albus estava quase apaixonado, ou algo do tipo. Eu não saberia dizer e, particularmente, também não me importava.

De qualquer modo, acenei de volta para Albus e, em passos lentos, de puro desânimo, aproximei-me dele, parando ao seu lado. 

— Nem imagino porque está com esse sorriso besta no rosto. — Falei, sarcástico. 

Albus revirou os olhos, parecendo impaciente. Ignorei aquela atitude. 

— Olha quem fala, está aqui pela minha prima! — Ele proferiu, com uma careta, como se aquela fosse a coisa mais nojenta do mundo. 

Eu ergui minhas sobrancelhas, desafiador e permaneci encarando-o. Será que Albus era tonto assim, ou se fazia? Porque devo dizer que, apesar de ser meu melhor amigo, às vezes ele me tira do sério de uma forma que eu não sou capaz de explicar. 

— É completamente diferente, Potter. — Suspirei, cansado de ter que me explicar para Albus. — Eu estou aqui por você e também porque é divertido irritar a sua prima. — Expliquei, com uma calma que eu nem sabia que tinha. — Já você, está aqui para dar uns amassos, o que está longe de ser o meu objetivo hoje a noite, especialmente quando se trata da Weasley. 

— O que tem a Weasley? — Senti o meu corpo gelar da ponta dos pés até os fios de cabelo quando ouvi aquela voz feminina e só relaxei novamente quando percebi que ela não havia ouvido o que eu tinha acabado de dizer. 

Albus encarou-me como quem estava prestes a me matar, mas eu fingi não perceber, uma vez que Rose parecia não ter ouvido nenhuma palavra minha. Eu ainda estava a salvo. Finalmente, agora já tranquilo, virei-me para ela, deparando-me com uma Rose completamente diferente da que eu estava habituado a ver. 

Eu nunca neguei, Rose Granger-Weasley era uma menina muito bonita, mas estava especialmente mais graciosa naquela noite. Os fios de cabelo ruivos encontravam-se ondulados e soltos, diferentemente do penteado cotidiano, preso em um rabo de cavalo. Estavam ainda mais rebeldes que o habitual, dando-a um charme a mais que eu não saberia explicar. Aquela também foi a primeira vez que eu a vi fora do uniforme do trabalho, e ela trajava um vestido de tom azulado que parava um pouco acima do joelho. Aquela cor realmente combinava com ela. No rosto, havia uma maquiagem leve, tão sutil que eu ainda conseguia ver as sardas espalhadas por toda a sua face.

— O que foi, Malfoy? — Um sorriso divertido dançava em seus lábios. — O gato mordeu a sua língua? — Perguntou, desafiadora. 

Apenas naquele momento eu percebi que havia ficado olhando para ela por um período de tempo longo demais, sem dizer uma única palavra. No entanto, apesar de tamanho constrangimento, mantive minha postura, permanecendo calmo e firme. 

— Não, a minha língua continua aqui, Granger. — Respondi, seco, sem achar qualquer graça naquela piadinha desnecessária. 

— Uma pena, eu gosto mais de você quando está calado. — Rebateu, orgulhosa de sua resposta. 

Eu, por outro lado, dei de ombros, simplesmente ignorando aquele insulto extremamente infantil. 

— Pelo visto, está mudo hoje. — Falou, dirigindo-se ao primo, que pareceu concordar. — Parece tudo o que eu pedi nos meus sonhos, Scorpius Malfoy calado. 

— Apesar de tudo, ao menos eu sei que você me acha bonito. — Não que eu me importasse com aquela informação, mas eu achava completamente agradável incomodá-la daquela forma. — Você disse no outro dia, não se lembra? — Perguntei, com um tom de voz levemente debochado. Touché, Rose Granger-Weasley. 

— Poxa, que pena… — Iniciou, parecendo irônica. — Ao menos quando você estava calado, eu conseguia apreciar um pouco a sua presença.

— A minha presença ou a minha beleza, Granger? — Indaguei, fingindo completo desinteresse por aquela resposta, embora eu estivesse curioso para saber o que viria. 

Entretanto, a verdade era: Rose Granger-Weasley nunca, sob hipótese alguma, ficava sem palavras. 

— Pensando melhor… — Levou uma das mãos até o queixo, fazendo uma pose pensativa. — Acho que você é inapreciável. E convencido. — Deu ênfase na última palavra. 

Sério, Weasley? Você admitiu isso há pouco tempo atrás. Querendo ou não, eu tenho uma boa memória e não deixarei essa informação se perder tão facilmente, afinal, ela pode ser útil para implicâncias futuras. 

— Vocês podem parar de alfinetar um ao outro feito um casal?! — Albus finalmente se pronunciou, parecendo farto do assunto. 

— Mas, primo, seria impossível. — Rose começou a dizer, fazendo-me questionar a razão de tamanha sutileza. — Porque nós não somos e nunca seremos um casal. 

Ouch. Devo admitir que meu ego foi um pouco, minimamente, quase imperceptivelmente, ferido. Por quê? Eu não saberia dizer exatamente. Talvez porque eu nunca houvesse sido recusado daquela maneira, tão diretamente. Era normal ter o ego ferido em uma situação como aquela, era algo completamente e perfeitamente aceitável. Não tinha nada, absolutamente nada a ver com o fato de Rose Weasley ter dito aquelas palavras.

— Que tal um jogo? — James surgiu de repente, quebrando o clima daquela conversa altamente desnecessária. — Eu tive uma ideia. — Ele disse, passando os braços ao redor dos pescoços de Albus e Rose, ao mesmo tempo em que carregava um sorriso sacana nos lábios. — Podemos brincar de verdade ou desafio. Ou do jogo da garrafa. O que acham? 

— James, nós não somos mais adolescentes. — Rose proferiu, como se fosse óbvio e revirou os olhos.

Confesso que, naquele momento, eu concordei com ela.

— Não, de fato. — Concordou. — Mas também não somos velhotes de sessenta anos, que nem como você age. — Proferiu, impaciente. — Medrosos. 

— Ok, eu vou participar! — Albus falou, rendendo-se à pressão do irmão. 

— E você, Rose? — Indagou, esperançoso. — Não vai me dizer que tem medo. — Provocou, nem um pouco sutil. — Quer dizer, o que pode acontecer de pior? Você pode revelar um segredo ou, sei lá, pagar uma prenda. Existe algo que esteja escondendo da gente?

— Não, claro que não! — Claramente, uma mentira. Era perceptível na forma afoita com a qual ela o havia respondido. — Ok, eu vou participar desse seu joguinho idiota. — Finalmente, concordou, mesmo que contra a sua vontade, o que resultou em um sorriso vitorioso na face de James.

— Ótimo. — Disse, ainda vitorioso. — Malfoy?

Minha intenção era discordar, falar do quão idiota aquela brincadeira soava, como se fôssemos um bando de pessoas no auge da adolescência. No entanto, eu tive a péssima ideia de olhar para Albus, que possuía uma feição de súplica, como se implorasse para que eu não o deixasse sozinho nessa situação decadente. Fechei os olhos e respirei fundo, tentando acalmar-me, caso contrário, eu o mataria.

— Ok. — Uma resposta breve e sucinta, mas que serviu para fazer os três arregalarem os olhos.

James Potter estava tão empolgado, que saltitou pelo local em busca de mais pessoas que aceitassem participar daquele jogo estúpido. Por um breve segundo da mais pura sanidade, peguei-me pensando: “O que raios estou fazendo aqui?”, mas assim que olhei para Albus e analisei sua expressão facial completamente ansiosa e nada confortável, instantaneamente lembrei que não se tratava nada mais, nada menos, do que de um ato de altruísmo. 

A pedido de James, sentamos todos em uma roda, que, em minha concepção, estava maior do que o esperado. Ainda observando o Potter mais velho, adotei a expressão mais entediada que conseguia ao vê-lo posicionar uma garrafa no meio da roda. Aquele jogo era tão idiota, tão previsível. Honestamente, eu nem sequer entedia o motivo de tanta euforia quando todos já sabíamos o que ia acontecer: as pessoas mentiriam quando escolhessem verdade, a não ser que tivessem um grande senso de sinceridade, o que eu achava duvidoso e, quanto aos desafios, renderiam alguns beijos e talvez ideias imbecis, como beijar o pé de alguém. 

James foi até o centro do círculo improvisado e posicionou uma garrafa qualquer de bebida. Olhei ao meu redor e, dentre as faces, notei que a grande maioria era familiar, mas decidi ignorar esse fato, pois parecia menos constrangedor. Ou menos deplorável. Empolgado, o Potter girou a garrafa pela primeira vez, e confesso que respirei aliviado ao perceber que eu não havia sido um desafortunado. 

— Rose pergunta para Amelia. — James Sirius falou e, por um instante, notei a Granger respirar aliviada. 

Senti Albus me cutucar, nervoso, o que me fez desviar a atenção para ele. Amelia era a garota da qual ele gostava, então absolutamente qualquer coisa relacionada a ela o fazia quase entrar em colapso. 

— Verdade ou desafio? — Rose perguntou, embarcando na formalidade da brincadeira. 

— Verdade. — Em geral, essa normalmente era a escolha das pessoas tímidas. 

— É verdade que você é a fim do Albus? — Perguntou, sem delongas, com um sorriso provocativo nos lábios.

Albus paralisou ao meu lado, resmungando algo sobre não ter certeza se Rose era a melhor ou a pior prima do mundo. Esse julgamento provavelmente dependeria da resposta de Amelia. 

A menina parecia morrer de vergonha, uma vez que suas bochechas encontravam-se avermelhadas. Ela balbuciou, sem saber como se expressar, mas, por fim, respondeu com um aceno de cabeça, indicando uma resposta positiva. Ao meu lado, Albus continha um enorme sorriso bobo em seus lábios e, na minha frente, a Weasley também sorria, mas com um ar misterioso. 

— Ok, próxima. — James proferiu, girando a garrafa mais uma vez. — Olha só, que interessante… Eu pergunto para Rose. — O seu tom de voz era completamente desafiador, e Rose pareceu engolir seco. — Verdade ou desafio? 

Ela pareceu altamente dividida, e eu acho que entendia o porquê. Pelas histórias que Albus havia me contado, todos os primos haviam crescido juntos, inclusive James e Rose e, por sinal, James era o mais arteiro entre eles, mas, apesar disso, todos eles possuíam uma ótima relação familiar e grande proximidade. Sendo assim, escolher verdade se tornava um risco, uma vez que o primo já conhecia todas as verdades superficiais sobre ela, então faria uma pergunta mais complexa e questionaria abertamente, caso ela mentisse. No entanto, escolher desafio também não parecia uma boa ideia, já que ele certamente não pegaria leve, considerando que era o mais travesso entre os primos. Realmente, ela parecia estar em maus lençóis. Albus, ao meu lado, ria baixinho da infelicidade da prima, ao mesmo tempo, aliviado por não estar naquela situação.

— Desafio. — Ela pediu, por fim, parecendo decidida.

— Péssima escolha. — Albus murmurou baixinho, apenas para que eu escutasse, mas eu dei de ombros.

Sinceramente, eu não me importava com aquele jogo. 

— Ótimo. — O sorriso pomposo no rosto de James indicava que ele provavelmente tinha uma excelente ideia reservada para Rose. 

Sinceramente, confesso que até mesmo eu senti pena dela naquele momento, observando sua face desesperada ao notar que estava sem escapatória.

— Eu te desafio… — Fingiu estar pensativo, mas eu tinha certeza de que ele já havia escolhido o desafio. Era nítido pela sua feição orgulhosa antes mesmo de se pronunciar acerca de sua real escolha. — Eu te desafio a beijar o Malfoy.

Eu não saberia dizer quem ficou mais surpreso com aquela informação: eu ou Rose Granger-Weasley, mas o fato era que nós dois estávamos nos encarando, ambos sem saber o que dizer um para o outro. Suspirei fundo, perguntando-me o motivo de eu ter decidido participar daquela brincadeira estúpida e passei a mão pelo meu cabelo platinado, tentando acalmar-me. 

— Eu não vou beijá-la. — Afirmei, por fim, sem demonstrar qualquer espécie de emoção. 

De repente, todos os olhares da roda voltaram-se para mim, e dividiam-se entre um julgamento que eu não compreendia e curiosidade. 

— Malfoy, isso é um jogo, e você concordou em participar. — James insistiu. 

— Eu não quero beijá-la. — Repeti, breve e claro.

— Ah, qual é… — Ele deixou uma risada escapar. — É só uma brincadeira.

— Ele não beijaria nem se quisesse. — Lily Potter, que não participava da brincadeira, mas observava, finalmente se pronunciou. — Ela foi embora, e você é um idiota, Scorpius.

— Ótimo. — Dei de ombros e levantei-me, saindo daquele círculo e, consequentemente, da brincadeira.

Não que eu me importasse com o comentário de Lily ou com os olhares julgadores que eu estava recebendo de cada pessoa da roda, mas o sumiço repentino de Rose havia me preocupado, de certa forma. Porque eu não compreendia o que eu havia feito de errado. Na verdade, por um breve momento, eu até mesmo tive a sensação de estar ajudando ao recusar aquele desafio, porque eu tinha certeza que, sob hipótese alguma, Rose Weasley gostaria de me beijar. Especialmente depois de trocarmos tantas ofensas e grosserias sem fundamento.

E não que estivesse preocupado, ou algo do tipo, mas, por um momento, senti uma espécie de senso de responsabilidade e culpa pelo sumiço dela. Por isso, retirei-me daquela casa superlotada, procurando-a em cada centímetro pelo qual passava. 

Eu já estava pronto para ser repreendido. Ouvir os ataques de nervos e ficar quieto, pois, aparentemente, eu havia perdido a minha razão. Eu aguentaria todas as ofensas calado e, ao fim de tudo, me retiraria, sem sequer me explicar por ter sido um tamanho babaca. Porque eu entendia agora: eu havia dito, na frente de todos os amigos de Rose e de todos da festa, que eu não a beijaria sob hipótese alguma, como se fosse um crime. Até mesmo Albus tinha me olhado de cara feia antes de eu sair e foi ali que eu notei que havia cometido um grave delito. 

Como o esperado, ela já não estava mais dentro da casa. Por fim, saí da residência, pela porta dos fundos. Aquele certamente era o lugar mais calmo da casa e, se Rose ainda estivesse na casa dos Potter, provavelmente havia optado por um lugar mais silencioso. 

Distante, sentada em um balanço, no fundo do quintal, finalmente a avistei, mais quieta do que eu jamais havia visto em toda a minha vida. Então, naquele exato momento, a culpa me invadiu, principalmente conforme fui me aproximando e ouvi o som do que parecia ser um choro baixo. 

Rose era sempre tão durona e tão forte, que era difícil vê-la daquela forma. Ela parecia tão vulnerável que me fazia sentir vontade de cuidar dela. Silenciosamente, sem dizer uma única palavra, sentei-me ao lado dela, no outro balanço e, ainda que eu não conseguisse enxergar o seu rosto, que estava coberto pelos fios de cabelo ruivos, pela sua gesticulação, eu conseguia perceber que estava limpando as lágrimas.

— Quando éramos pequenos, eu e Albus adorávamos balanços, sempre pedíamos para ir para os parques de diversões, apenas para usar o balanço. — Ela riu baixinho, parecendo nostálgica. Aquela fala calma acabou com toda a minha expectativa de um eventual sermão ou algo do gênero.  — Um belo dia, a tia Gina e o tio Harry decidiram ter um balanço em casa. Nós nunca ficamos tão felizes. 

— Rose, eu… — Eu era patético, nem sequer sabia o que dizer. — Acho que preciso te pedir desculpas, talvez eu tenha sido um pouco rude.

— Você me chamou de Rose. — Ela riu baixinho. Apenas então eu percebi que ela havia ignorado todo o meu pedido de desculpas, e que havia focado naquele único e simples detalhe. — Não de Granger, nem de Weasley, mas Rose. Tinha o meu nome inteiro no crachá, eu sempre me perguntei porque não me chamava de Rose.

Aquelas palavras me fizeram refletir um pouco e, inevitavelmente, eu respirei fundo, reunindo toda e qualquer coragem que ainda me restava.

— Naquele dia, eu não fiquei bravo porque você me trouxe o meu pedido de sempre. — Falei, referindo-me à primeira vez em que tivemos uma conversa de verdade. — Eu fiquei incomodado porque você reparou em mim. Você prestou atenção em mim, e pensar nisso era tão assustador. — Eu ri baixinho, estava nitidamente nervoso. — Você pareceu me conhecer antes de sequer falar comigo e, bem, eu não sou lá o cara mais extrovertido do mundo. 

— O que você quer dizer com isso? — Ela indagou e, pela primeira vez durante aquele diálogo, voltou seus olhos para mim. 

— Eu quero dizer que eu fui um covarde com você, Rose Weasley. — Expliquei e suspirei fundo, dando-me por vencido aos meus próprios sentimentos. — Porque eu tive medo de alguém me conhecer a fundo, de enxergar além do meu sobrenome. Aliás, você nunca sequer ligou para o fato de eu ser um Malfoy. 

— E por que eu ligaria? — Deu de ombros, como se não se importasse. — O que sobrenomes podem dizer sobre alguém? 

— Muitas coisas. Nem todas verdadeiras, mas as pessoas tendem a acreditar. — Ri baixo, sem qualquer humor. — Mas não você.

— E por que você só me chamava pelo meu sobrenome, então? — Ela perguntou, com os olhos expressando curiosidade.

Eu sorri ao pensar sobre aquilo, porque, apesar de ser algo praticamente involuntário, eu sabia exatamente o significado. 

— Porque me amedrontava a ideia de me imaginar próximo a você, e chamá-la pelo sobrenome me dava a sensação de distância. Eu sei que isso soa completamente ridículo, mas é a mais pura verdade. — Expliquei, completamente sincero, e voltei o meu olhar para o chão, levemente constrangido de minha postura. 

— E por que você tem tanto medo de mim? — Ela perguntou, parecendo ofendida, como se tudo o que eu houvesse dito fosse algo ruim. 

Honestamente, Rose podia até mesmo ser uma ávida e excelente leitora, mas era péssima em ler as entrelinhas. 

— Eu não tenho medo de você. — Respondi, como se fosse óbvio, mas ela obteve uma expressão de dúvida. — Eu gosto da sua personalidade explosiva, do seu jeito desastrado, de como é observadora e de como fica brava tão facilmente.

— Você é um idiota, Scorpius Malfoy. — Acho que aquela foi a conversa mais pacífica que eu tive com ela até esse exato momento. — Você tem esse muro que impede que as pessoas cheguem perto, mas esquece que ele não impede que te vejam. Basta ser um pouquinho insistente e, bem, é possível ver você, com todas as inseguranças e todas as qualidades que esconde atrás dessa personalidade difícil. 

— Sendo assim, acho que somos mais parecidos do que imaginávamos. — Respondi, com um sorriso singelo no rosto. 

Talvez fosse por isso que entrássemos tanto em conflito, éramos como explosivos prestes a detonar a qualquer momento, mas, por debaixo dos panos, havia uma relação amistosa que apenas nós dois conseguíamos ver. O único grande problema é que, apesar de ser algo mútuo, nós fingíamos não ver, pois parecia mais simples e fácil assim, manter aqueles sentimentos ocultos por debaixo daquela implicância fora de série, sem qualquer fundamento ou embasamento científico. Algo simples e infantil, mas que servia como um bom escudo para ambos. 

— Eu acho que sim. — Ela concordou e logo retribuiu o sorriso. 

— E sobre hoje mais cedo, eu… 

— Está tudo bem, eu te ouvi falar com o Albus mais cedo, como foi mesmo? — Ela levou uma das mãos até o queixo, pensativa. — Especialmente quando se trata da Weasley. — Rose proferiu, fazendo uma péssima imitação minha. 

Eu fechei os olhos e respirei fundo. Não era para ela ter ouvido aquela conversa, porque aquilo era apenas o meu orgulho falando mais alto do que eu gostaria.

— Eu sabia que não ia acontecer, mas, bem, você certamente não precisava ter sido tão rude. — Tentou explicar, conforme se levantava do balanço, parecendo prestes a ir embora, ela estava bastante sem graça. — Quer dizer, não que eu quisesse que acontecesse, mas também não seria um problema, mas é só que… 

As palavras de Rose já não faziam mais qualquer sentido para mim. Em um impulso que notei já segurar por algum tempo, aproximei-me dela e, de modo completamente inesperado, levei minhas mãos até a sua cintura, puxando-a para perto com delicadeza, até que, por fim, selei os nossos lábios e calei-a com um beijo. Era uma sensação boa que invadia-me da cabeça aos pés, como se finalmente estivesse fazendo algo pelo qual havia aguardado muito tempo. Era como nos clichês de livros românticos que eu, particularmente, detestava, como se fôssemos o encaixe perfeito um do outro. Talvez essa fosse uma coisa ridícula a se pensar, mas era o que se passava na minha mente ao ter Rose tão perto de mim e, especialmente, sob aquelas circunstâncias.

Quando finalmente nos separamos, ela me encarou, em total e genuína surpresa. Minha reação automática foi olhar para os meus próprios pés, constrangido, e bagunçar os meus fios de cabelo loiros, como um ato simbólico do meu nervosismo. 

— O que aconteceu com o “especialmente quando se trata da Weasley?” — Ela perguntou, por fim. Era como se tivesse informações demais para processar. 

— Isso não importa, Rose. — Proferi, completamente arrependido de ter dito aquelas palavras. — A verdade é que, hoje mais cedo, na brincadeira, eu não queria te beijar em um jogo, porque isso parece tão… 

— Idiota? Infantil? Deplorável? Patético? — Ela completou, o que me fez rir. 

— Isso. — Concordei, também com um aceno de cabeça. — E superficial. Além disso, eu pensei que você ficaria aliviada. 

— Scorpius Hyperion Malfoy, para um leitor tão assíduo, você parece ser péssimo em interpretação. — Disse, indignada. 

Eu ergui as sobrancelhas, completamente confuso e sem saber como reagir. 

— O que quer dizer com isso? — Perguntei, por fim.

— Quero dizer que, caso você não tenha percebido, de alguma forma, você sempre atraiu a minha atenção. Não foi à toa que eu levei o seu café naquele dia. — Explicou, parecendo tímida. — Você me intrigou desde o primeiro dia em que botou os pés naquela cafeteria, mas não ouse se gabar por isso.

— E não foi à toa que eu reclamei do meu café. — Respondi, deixando uma risadinha baixa escapar mais uma vez. 

— Então quer dizer que você começou a implicar comigo só porque sentiu algo por mim? — Ela perguntou, achando graça. 

— Eu sou um cara de gostos peculiares, você não entenderia. — Rebati, com um sorriso orgulhoso em meus lábios. 

— Ótimo, senhor peculiar. — Ela revirou os olhos, fingindo impaciência, mas logo gargalhou. — Você está prestes a embarcar em uma vida repleta de desastres, implicâncias, discussões desnecessárias e spoilers. 

— Eu aceito tudo, mas spoilers não serão tolerados. — Falei, tentando manter uma postura séria. 

— Ok, eu acho que posso viver com isso. — Ela deu de ombros e riu baixinho. 

— Isso quer dizer que podemos parar de nos alfinetar o tempo todo? — Perguntei, un pouco esperançoso.

— Definitivamente não. — Falou, sorridente. — Eu disse que não te daria tréguas por ser um Malfoy, lembra?

Eu sorri para ela, e a minha resposta veio da forma mais simples e direta possível. Meus lábios tocaram os dela novamente, desta vez, em um beijo mais calmo e menos urgente. Notei também que Rose agora parecia menos tímida, já que levou uma das mãos até a minha maçã do rosto, fazendo uma carícia muito agradável. 

De repente, a festa já não importava mais. Nós passamos o resto da noite ali, sentados nos balanços e conversando sobre assuntos completamente aleatórios. Como o de costume, terminamos em uma discussão banal sobre qual livro eu deveria começar a ler agora. Rose, teimosa como sempre, tentava arduamente me fazer ler um romance e eu refutava com todas as minhas forças, já que era um dos gêneros que eu mais detestava. No fim, ela me chamou de coração de gelo e cruzou os braços, feito uma criancinha. Ao contrário do que eu habitualmente faria, eu sorri, pois foi exatamente ali que eu me dei conta que eu até que gostava daquela implicância fora de série.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado da fanfic. Aguardo ansiosamente pela opinião de vocês. Obrigada pelo JunhoScorose, amei participar do projeto. ♥