Alguns dias depois da “grande notícia” nos mudamos para Woodstock, dividir meu quarto com Camille não foi muito fácil, ela tinha realmente muita tralha que teve que ser movida e seu closet era lotado de roupas caras e nunca usadas.

A caminho do colégio resolvo saber um pouco mais sobre o colégio e tentar ser amigável com Camille, pois além dela, eu não teria ninguém para conversar.

— Então, você poderia me apresentar suas amigas – digo

— Eu não tenho amigas – responde ela grossamente

— Sério? Nem uma que você pelo menos se senta no refeitório?

— Tem a Peggy, ela é legal, mas não somos muito próximas.

— Sério, como ela é?

— Gorda.

— Eu digo como ela é, a pessoa, o que ela gosta?

— Eu não sei.

— Mas não são amigas?

— Eu já disse que não tenho amigas

— Mas você disse...

— Eu não disse nada, Christine, você que perguntou, ugh, você é tão irritante.

— Ok, desculpe. E as aulas extras? Onde me inscrevo para o estudo religioso?

— Umm... sobre isso... não temos estudo religioso, e não seria muito bom você ficar falando sobre religião, as pessoas aqui não são fanáticas como na sua aldeia.

— Eu não moro em uma aldeia, eu moro em uma comunidade.

— Morava. – diz ela apertando o passo e me abandonando na entrada do colégio.

Ao entrar, pareço que estou em outro mundo, as pessoas se vestem diferente, falam diferente, até se parecem diferente. No meu caminho para a primeira aula me deparo com uma garota em seu armário com um colar de cruz

— Oi, meu nome é Christine, sou nova aqui.

— Han?

— Sou Christine, vi que você tem um colar de cruz, você é religiosa?

— Não, eu só comprei porque achei bonitinho.

— Você sabe o que a cruz significa? É sobre a nossa salvação.

— Me desculpe, quem é você?

— Eu já disse, Christine.

— Você é de algum culto ou coisa assim?

— Sim temos um culto na nossa igreja, se você quiser visitar podemos ser amigas.

— Não, obrigada. – diz a garota se retirando

Na minha primeira aula, fiquei sem falar muito, era de geografia então só li o livro e resolvi ficar na minha. Ao sair da sala de aula todos estavam me olhando, talvez por eu estar com um vestido florido e botas ou talvez por não me conhecerem.

— O que você fez? – chega Camille me puxando para um canto

— Nada. O que aconteceu?

— Estão falando coisas sobre você

— Que tipo de coisas?

— Escute, não fale mais nada com ninguém, ok?

Na aula de inglês foi pedido para formarmos duplas para escrevermos um conto baseado em nossas vidas

— Senhorita Williams, será que pode fazer dupla com o senhor Brown? – diz a professora

— Oi, eu sou Christine, prazer em conhece-lo.

— Oi, sou Jayden.

— Que nome diferente.

— Legal, agora você vai escrever o tal conto? Porque eu não sei escrever histórias e não tenho história de vida para escrever.

— Eu tenho uma história sobre minha mãe, antes de ela morrer, ela era minha melhor amiga.

— Ela morreu de que?

— Foi um acidente horrível, próximo a nossa igreja.

— Que pena, escuta, eu tenho que responder umas mensagens urgentes, então eu vou ficar aqui mexendo no celular e quando você terminar, me fala.

Escrevi facilmente o conto e assim que o sinal tocou, Jayden se levantou e saiu sem dizer nada, após ir a mais uma aula, estava na hora do intervalo e fui ao refeitório, vi Camille sentada na mesa com uma garota que provavelmente deveria ser a Peggy.

—Oi, você deve ser a Peggy, eu sou Christine.

— Oh, você é a garota da seita? -responde ela

— O que?

— Estão dizendo por aí, que você faz parte de um culto tipo do Charles Manson, e que sua mãe morreu na sua igreja em um sacrifício para sua seita.

— Não, é por isso que estão todos me olhando estranho? Quem inventou isso? Camille foi você?

—Não, eu disse para você não falar com ninguém, você falou com alguém?

—Sim, com aquela garota. -disse apontando para a garota com a cruz no pescoço

—Não, por que você fez isso Christine?

—Ela tinha uma cruz, parecia ser legal, apesar de estar vestida com roupas curtas, eu não julgo a aparência.

— Não é sobre a aparência...

— Está dizendo que é porque ela é negra? Você é racista Camille?

— Não, o que ela quer dizer é que aquela é Nia Brown uma das maiores fofoqueiras da escola e uma das Bees -disse Peggy

— Eu não estou entendendo.

O que eu não sabia era que Nia Brown era do grupo mais popular da escola, as Bee’s: Abelhas Rainhas, elas eram um grupo de três garotas. Nia Brown era a fofoqueira do grupo, Nia era a garota negra mais bonita da escola, além de ser a cantora principal do grupo de canto, muitos diziam que ela era uma Naomi Campbell com a voz da Beyoncé, ela tem um irmão, Jayden Brown, os dois moravam próximo a casa de Peggy e ela dizia que eles davam as melhores festas de toda a Woodstock onde até universitários frequentavam, os Brown’s tinham muito tempo para dar festas pois seus pais aos fins de semana iam para uma fazenda da família no interior e passavam até 5 dias fora de sua luxuosa casa. Provavelmente Nia juntou a história do culto com o que eu disse para seu irmão, e resultou nesse boato.

Seguido de Nia Brown, temos Penélope Casanova ela era a garota que todos mais temiam na escola, haviam boatos de que seu pai era um mafioso italiano mas ninguém sabia se era verdade, porém Penélope morava em uma mansão rústica e seu instagram era lotado de fotos de seus cachorros, era ela quem levava as amigas para o colégio em sua Lamborghini, aparentemente ela era a mais rica, mas também a de coração mais mole, no ultimo ano Penélope fez todo um programa no colégio para ajudar os mais pobres e lucrou 5 toneladas de alimentos.

Mas acima de Nia e Penélope havia alguém, a estrela, a líder do bando, Valetina Rodriguez chamada de Tina era a que dava a palavra final e a inicial no grupo das Bee’s, as três eram amigas desde a 5°série e sempre foi Tina que ditava tudo, Tina proibia as amigas de terem qualquer roupa ou acessório que fosse similar ao seu, boatos de que um dia ela arrancou um brinco de Penélope, e Penélope teve que ir ao hospital costurar a orelha que foi rasgada pela amiga, apenas porque o brinco tinha o mesmo design mas cores diferentes. Tina também era a mais dramática, no ano passado Tina teve 4 namorados e todos os relacionamentos terminaram em brigas em festas, gente indo para o hospital e roupas sendo atiradas da janela de sua casa no bairro chique da cidade.

— Já que agora você sabe sobre elas, prefiro que você fique longe Christine, você viu os boatos que inventaram sobre você. -disse Camille

— Onde está Tina? Ela não veio? -pergunto

—Boatos que Tina está em férias ainda, que ela está viajando com um jogador muito rico. - diz Peggy

 - E quanto a você Peggy, o que fez nas férias? O que você gosta de fazer? – pergunto ela

— Eu fui a um acampamento de cantores, tipo Camp Rock sabe?

— Sério? Você é cantora?

— Sim, eu participo do grupo de canto daqui do colégio

— Peggy canta muito bem de verdade, você deveria ver, ela deveria ser a cantora principal, mas Nia comprou a vaga – diz Camille

— Camille, não precisa falar isso, eu nunca teria uma chance de ser a cantora principal, eu sou gorda,e não tenho um rosto bonito, nem estilo... um desastre

— Você não precisa ser como elas Peggy -digo

— Diz isso pra Camille, que tenta ser como a Penélope em tudo. – Rebate Peggy

— Garotas, vocês são únicas, Deus fez todos nós únicos, não deixem ninguém dizer que vocês não são bonitas, ou estilosas, vocês podem ser tudo que quiserem e se sentirem bem com isso, parem de ligar pro julgamento delas e ao padrão que elas impõem, elas são fúteis, metidas e Deus me desculpe, mas preciso falar que aparentam ser vadias. -Digo

— Você está certa, que elas se danem. Vamos enfrentar elas, falar tudo na cara delas – Se empolga Peggy

— Eu não quis dizer assim... – Digo

— Eu não acredito que estou aqui discutindo isso – diz Camille revirando os olhos

Foi quando eu descobri o problema de Camille e Peggy, elas tentavam ser como outras garotas e nunca serem elas mesmas, e assim era com todas as outras garotas da escola, estavam sendo dominadas e controladas por um grupo de garotas que se diziam as Abelhas Rainhas, mas toda colmeia tem seus problemas e os delas, estavam prestes a explodir.

— Onde está Tina? – pergunta Jayden

— Eu não sei, ela não responde minhas mensagens faz uns 5 dias – responde Nia

— Relaxa gente, ela deve estar com algum homem rico e famoso, quem foi o último a falar com ela? – diz Penélope

— Eu falei com ela sei lá, segunda passada. Ela me mandou “Nia, estou tomando champanhe na França” e uma foto aleatória.

— Sim, ela me mandou essa foto também. – Fala Penélope

—  Então, o que vamos fazer sobre a garota da seita? – pergunta Jayden

— Eu não sei, melhor esperar a Tina chegar. -diz Nia

— Será que eles podem fazer coisas sinistras tipo sacrifício, levitação, exorcismo? – pergunta Penélope

— Pessoas de seita não tem tipo uma tatuagem de seita? – pergunta Nia

— Podemos tentar despir ela para todo mundo ver a tatuagem de seita dela.

— Mas nem sabemos se ela tem mesmo, o que acha Jayden ?

— Do que? – responde ele

— Não ouviu o que estamos falando? Da garota?

— Desculpa, é que eu fumei muita maconha hoje, e estou meio lento, mas eu entendi, parece bom. Vocês sabem o nome daquela gordinha do coral que está com ela?

— Você quer dizer a Pig? -diz Nia rindo

— Não é Peggy? – corrige Penélope

— É, mais a chamam de Pig

— Por quê?

— Porque ela parece uma porca.

— Não foi ela quem empatou com você na votação de cantora principal do coral? – pergunta Jayden

— Foi, mas não interessa, ela é uma perdedora, só empatou porque os nerds votaram nela. – responde Nia

— Eu tenho que ir pro treino de basquete, mas assim que tiverem notícias da Tina, me avisem. – diz Jayden saindo

É evidente que a disputa entre Peggy e Nia não vem de hoje, no primeiro ano quando as inscrições para o coral começaram era nítido que todas as letras de música, ideias e apresentações que Peggy fazia, eram melhores que as de Nia, foi ai que um dia no meio da apresentação de Peggy, Nia pediu para que Tina e Penélope gritassem “Peppa Pig” e todos riram de Peggy, fazendo com que o colégio passasse a chamar ela de Pig e até escrevessem “Piggie” em seu armário com caneta permanente.

— Então, você sabe atuar Christine? O coral vai fazer um musical de boas vindas e precisa do máximo de pessoas possíveis. – diz Peggy

— Ah eu fiz Maria em “A Paixão de Cristo”, acho que posso fazer um teatro sim, qual será o musical? -pergunto

— Iremos decidir hoje, você deveria vir a reunião conosco, todos que querem participar irão.

— Ok, eu irei sim.

Ao entrar no auditório todos olham para mim e Peggy com olhares atravessados, e ouço piadas e risadas de fundo, mas isso não me afeta, eu sou uma pessoa forte, o que me preocupa é como Peggy está se sentindo.

— Olá alunos, hoje iremos decidir qual será o nosso primeiro musical do ano letivo que contará com a presença dos pais, e... conseguimos fazer com que olheiros de faculdades viessem de todo o país para dar uma olhada em vocês e suas aplicações de bolsas de estudo para todos os tipos de artes. – diz a professora de artes – Agora vamos começar com a nossa reunião, temos que decidir qual será o musical para vocês começarem a se inscrever nos papéis e iniciarmos as audições, por isso chamo aqui nossa cantora principal, Nia Brown para realizar a votação.

— Olá queridos colegas. -diz Nia subindo ao palco

— Se apresente para os novos colegas que não te conhecem Nia. – rebate a professora

— Oh isso é impossível, todo mundo me conhece. Enfim, eu sugiro e reforço que o musical que iremos fazer será Heathers, quem concorda? Todos né? Ótimo

— Na verdade, eu não concordo – fala Peggy em alto e bom som com todos se virando e olhando para ela – Eu acho que deveríamos fazer algo menos óbvio!

— Heathers não é óbvio, é novo, e nunca foi feito na história do colégio.

— Digo óbvio para você e suas amigas, todos sabem que o caráter de vocês combina com o das personagens, além de vocês serem três e elas também, não sobraria papel principal para quase nenhum outro aluno talentoso.

— Você só diz isso porque quer um papel principal, além disso, que tipo de caráter?

— Serem garotas fúteis, metidas e vadias. – Todos se calam com a fala de Peggy e olham chocados com a audácia dela, sabendo que Nia poderia acabar com sua vida social em qualquer minuto

— Podemos fazer um musical bíblico. – Sugiro tentando amenizar o clima

— Claro, podemos fazer o conto de Jonas e a baleia, Peggy será a baleia. - Rebate Nia com um sorriso irônico despertando risadinhas de fundo

— Se você tivesse o mínimo de talento Nia, você não faria Heathers – continua Peggy afrontando-a

— Eu tenho talento, todo mundo aqui sabe.

— Então faça outro papel, fora da caixa, diferente.

— Ok, podemos fazer DreamGirls.

— DreamGirls ainda são três garotas, e você sabe que você e suas amigas não alcançariam as notas das músicas.

— Como não? Dizem que canto tão bem quanto Beyoncé

— Sonha demais, você se acha, mas é tão superestimada.

— Certo, vamos fazer Hairspray, assim você pode fazer o papel da gorda, eu aceito qualquer papel, em qualquer papel eu consigo brilhar mais que você.

— Fechado, faremos Hairspray.

— Alguém mais discorda? – diz Nia furiosa

E o auditório não ecoa nenhum som... ela desce do palco e tudo que conseguimos ouvir são seus passos furiosos e a porta batendo atrás de nós.