Prisão de Gelo escrita por Miah


Capítulo 4
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura ❤



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Quando falaram que os preparativos seriam logo cedo era sério mesmo. O sol não havia nascido e eu já estava em pé com varias criadas ao meu redor, a garota de franja estava entre elas, mas não me olhou nenhum momento.
Pelo que eu fiquei sabendo a primeira parte era um ritual de purificação. Havia um riacho ao norte da cidade eu seria levada até lá e ao despertar do sol iria entrar. Vestira-me com um fino vestido de alças branco, “pureza”, mas pelo frio até a entrada da água eu usaria um manto de peles. Meus cabelos estavam sendo arrumados em um tipo de coque. Mechas caiam em volta do meu rosto. A garota de franja veio com uma vasilha com tinta vermelha, passou em meus lábios e começou a fazer desenhos nos braços, peito e testa.
— são as marcas exteriores da impureza. Elas saíram após o ritual – comentou baixinho.
— esse ritual é só para a noiva? O noivo não participa?
— o ritual só é feito para garotas estrangeiras. Todas as mulheres de Ghropol são purificadas após o primeiro sangramento. – respondeu Loreis atrás de mim. – já está na hora de sair. Você não poderá falar com nenhum homem além do Sacerdote que esperará no local, seu cocheiro irá levá-la por não ser um homem de Ghropol.
Assim colocaram o pesado manto em mim. Usaria chinelos de madeira, já via meus pés vermelhos e doloridos pelo frio. Desci as escadas sozinha, já havia decorado em caso de emergência e também ninguém poderia chegar em mim. O único ser que eu vi foi Roz parado na saída, sua expressão espanto quando me viu. Nem imaginava como estava minha aparência já que mais uma das regras era não me ver.
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Minha estadia em Ghropol não era das piores. Fiquei alojado junto aos criados e guardas de patente menor, todos foram muito receptivos, mas eu manti distância não iria socializar com responsáveis pela morte de meu povo. Não vi a princesa Anastácia depois que a mulher de gorrinho a levou pra dentro, fui ajudar os criados a levar os cavalos pro estábulo e guardar a carruagem. Ela agora estaria em seu quarto, em seus mantos mais confortáveis. Usufruindo dos luxos de uma princesa.
Fiquei sabendo do ritual antes de dormir, seria responsável a levá-la até um riacho, deram-me as coordenadas. Achei a maior maluquice, se banhar em um riacho que possivelmente estaria congelado e um simples vestido de seda. Achei que ela não fosse concordar, mas quando a vi chegar no salão principal me espantei. Parecia que Anastácia tinha saído de uma chacina, estava toda pintada de vermelho que lembrava sangue e olhando de perto tinha uma simbologia estranha. Estava com um manto de peles que ia até seus pés. Seu cabelo preso atrás só deixava duas longas mechas caírem em volta de seu rosto. Uma deusa vingativa. Ela tremia.
Peguei a sua mão fria, disseram que não podia haver comunicação, mas não falaram nada de contato. Levei-a até a carruagem negra que proporcionaram. Ela me acompanhava com o olhar e em certo ponto aquilo me incomodou.
Embarcados toquei os cavalos. A viagem não era muito longe já que o castelo era mais afastado da cidade. Em certo ponto entramos em uma trilha cercada de árvores, estava ruim de passar pela neve então teríamos que ir a pé. Desci e conduzi Anastácia até o riacho, conseguia ouvir a respiração dela. Chegando ao local encontramos um senhor que seria o Sacerdote e mais dois homens com vendas que estavam atrás de tambores.
— senhorita Anastácia entregue o manto a esse rapaz e se dirija até mim. – disse o Sacerdote.
Anastácia retirou o manto. Conseguia perceber a pele dela toda arrepiada pelo frio. Ela se dirigiu até o Sacerdote, seu vestido era fino e enroscava em suas pernas. Sua voluptuosidade me encantou.
— Anastácia, hoje será o dia do seu renascimento... – quando ela se aproximou ele tocou o polegar em sua testa manchando um desenho oval -... o dia onde os pecados mortais destituíram da carne e será salva.
Se seguiu em murmúrios que eu não compreendia, se duvidasse eram em outra língua. O Sacerdote se colocou na frente dela e desprendeu seu cabelo, a cascata negra caiu em torno de toda aquela palidez. Ela tremia.
— agora irmã, livre-se de seus pecados – proclamou ele
Anastácia estava com uma expressão assustada, os tambores começaram a tocar conforme ela entrava no riacho consegui perceber as contrações do corpo dela em contato com a água, em alguns pontos estava já até congelada. Ela foi e quando a água já estava acima de sua cintura mergulhou. Fazia parte do ritual ficar alguns segundos submersa, mas assim que ela emergiu corri e a enrolei no manto. Ela tremia violentamente.
Os desenhos já não existiam mais só rastros vermelhos em sua pele.
— seja bem vinda irmã – disse o Sacerdote a beijando na testa.
Ele se retirou assim com os outros homens, pelo que eu vi sua igreja não era muito longe. Levei Anastácia a onde estava a nossa carruagem. Ela tremia demais, estava com medo que aquilo resultasse em uma hipotermia. Que gente doida!
— senhorita Anastácia, como se sente? – perguntei entrando junto na carruagem.
— f-frio...m-muito frio – gaguejou ela.
Peguei alguns cobertores que tinha trazido por precaução. O que me preocupava era o vestido molhado....
O que eu podia fazer era voltar o mais rápido para o palácio.
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Já não conseguia sentir meus pés. Estava deitada enrolada no manto de peles e nos cobertores que Roz tinha trazido, sentia o balanço da carruagem quase me derrubar. Não conseguia me esquentar parecia que o frio adentrava mais ou o calor saía.
A pior sensação foi entrar na água, ali submersa naquela escuridão e com um frio que penetrava em minha pele como milhões de agulhas querendo tirar toda a vitalidade que eu possuía. Foi horrível!
Fui levada diretamente pra meus aposentos, ao chegar no palácio Roz me carregou até o quarto chegando lá as criadas esperavam com a banheira com água que dava pra ver o vapor. Fui colocada devagar na banheira, o contato com aquela água “queimava”.
Então cá estava, deitada na grande cama que ocupava meu quarto. Já sentia meus pés e mãos, estava quente. Já não havia resquício da tinta vermelha em minha pele e eu realmente não entendia o motivo daquele ritual.
Um batida na porta era a garota de franja, trazia uma bandeja com comida. Havia saído sem nada no estomago.
— trouxe sua comida. Esta uma confusão na cozinha, pelos deuses!! – disse ela colocando a bandeja em meu colo – a propósito, aquilo foi uma tentativa de morte não é possível.
— como?
— Anastácia – ela não usou o tratamento referido, sentiu meu olhar –... não vou ficar te paparicando, sinta-se a vontade a cortar minha cabeça se necessário. Como eu ia dizendo, o ritual de purificação é sempre feito na primavera, quando a Deusa...
— calma aí. Deuses? Vocês cultuam divindades?... – perguntei com um pão já na minha boca, sem classe mesmo. Mas já me sentia confortável com a garota de franja, de alguma forma.
— você vem para nosso país, casar-se com o príncipe sem saber uma grama da cultura local? – perguntou, acenei com a cabeça, ela deu um tapa na própria testa -.... tudo bem vou resumir a historia pra você, não posso demorar muito.
Nos primórdios do tempo, quando não havia “nada vivo”, Tsukyom o Pai de Todos conhecido como o próprio tempo resolveu retirar-se, temendo o desequilíbrio de todas coisas, de seu próprio corpo tirou quatro costelas ungiu com seu sangue e dali surgiu quatro seres em sua total semelhança além de serem tão fortes quanto Tsukyom. Amestisah, Quetmetl, Visnasau e Khartyw foram os nomes dados aos quatro seres. Ficaram responsáveis pelo equilíbrio. Então Tsukyom voltou ao seu sono convicto que deixará o universo em boas mãos.
Estes quatro foram os responsáveis pela criação de nosso mundo, por serem seres tão poderosos queriam ser cultuados então Amestisah soprou a vida. Os humanos surgiram em plena evolução até começarem a cultuar aquelas divindades.
Amestisah era a personificação da “Primavera”, Deusa da Fertilidade era vista como uma mulher linda de cabelos loiros, cultuada nos festivais de fertilidade e no ritual de purificação. Corporificando as forças da vida, da morte e do renascimento. Abarcava não somente o mundo humano, mas também animal, vegetal, mineral e astral. Ela está na origem das divisões, das fases da lua, das estações do ano e do ciclo menstrual feminino. Todos estes eventos são a mesma expressão do fenômeno que é a vida, as forças cíclicas da criação, preservação e destruição que mantém o universo em movimento. Trabalha em conjunto com Khartyw.
Khartyw era a personificação do “Inverno”, Deus da Morte visto como um homem alto de longos cabelos brancos como a neve e olhar gélido. Não havia festejos pra ele já que na chegada do inverno trazia a morte, dor, sofrimento e fome. É quem gira a roda da vida. Rei do Hades, local destinados a almas impuras e pecadoras, um lugar totalmente congelado.
Visnasau era a personificação do “Outono”, Deusa das Boas Graças vista muitas vezes como uma mulher de cabelos curtos e negros como o breu. É cultuada mais em templos relacionados ao misticismo, dizem ter um terceiro olho em sua testa. É a própria “Sorte ou Azar”, dona dos caminhos, das escolhas e da manipulação. Ao ser irritada transforma a vida do ser no próprio Hades.
E por ultimo temos Quetmetl a personificação do “Verão”, Deus do Fogo visto como um homem de pele bronzeada e olhos na tonalidade da mais ardente chama, cultuado em festivais de verões e na iniciação de soldados por ser um guerreiro esplêndido, por isso também é visto como Deus da Guerra.
Seguiu-se um silencio após o monólogo dos deuses.
— Eu realmente não fazia ideia de nada disso. Em Tripólis não tem nenhuma divindade, agradecimentos só a vida, aos dias.... a oportunidade de sermos vivos. – disse enquanto a garota de franja olhava pra longe.
— não quer dizer que eles realmente existam – completou balançando a cabeça – o que eu quero dizer com isso tudo é que o ritual de purificação significa além do desprendimento de impurezas e fertilidade a entrega total a Deusa Amestisah por isso é feito no solstício de primavera. Porém seu ritual foi feito no inverno....
— e isso significa o que? – perguntei já sabendo a resposta.
— que você foi entregue a Khartyw. O Deus da Morte.


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Notas finais do capítulo

Espero que estejam gostando e se estiverem.... Deixe um comentário e faça a vida de uma simples autora muito,muito feliz ❤ kkk



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