Algumas horas passaram-se, Takeda e Kurokawa foram acordados por alguns guerreiros da tribo, aparentemente a força deles era necessária para ajudar na busca diária de alimentos. Depois de terem sido salvos e oferecidos tamanha hospitalidade, eles não se encontravam na posição para recusar. Kurokawa não tinha conseguido dormir bem, mas aquela parecia a oportunidade perfeita para descontar a sua frustração em monstros. 

Eles fizeram uma pequena refeição, juntaram os guerreiros e armas necessárias e partiram. Aqueles túneis eram extremamente extensos e alcançar os lugares onde haviam reservas de água subterrânea demorava horas. Mas apesar de ser uma missão perigosa, Kurokawa estava se divertindo muito menos do que esperava. Os guerreiros da tribo eram cautelosos, evitavam batalhas e matavam monstros de forma rápida e eficaz: 

—Isso é uma perda de tempo. -Resmungou ele. -Eu podia estar na superfície lutando contra monstros muito mais fortes, tipo o tio. 

—Você foi quase morto por um grupo de formigas e quer lutar contra monstros mais fortes? -Perguntou Takeda. 

—Elas não são fortes, é simplesmente impossível lidar com um número tão grande num espaço pequeno como esse. 

—Tenho certeza que Lyonel nos mandou para cá para que pudéssemos aprender algo. 

—Você está superestimando ele... 

Muitas horas mais tarde, eles finalmente retornaram à base de operações daquela tribo e Kurokawa sentia que tinha perdido um dia da sua vida. Nenhum membro do grupo havia sofrido um ferimento, nenhuma batalha cuja vitória não fosse óbvia foi travada e nenhuma emoção foi sentida. Aquele sentimento de calor e descontração se instalou novamente. Risadas e gargalhadas ecoavam. Todos comiam, conversavam e se divertiam, menos Kurokawa: 

—Eles vivem num dos lugares mais perigosos desse mundo e eles não usam isso para ficarem mais fortes... -Reclamou. -Isso não faz sentido... 

—Eles não querem ficar mais fortes, apenas sobreviver. -Respondeu Takeda. 

—Isso é tão irritante...eles vivem todos os dias como se fossem o mesmo, apenas focados em sobreviver, sem objetivos, como é possível alguém estar feliz com uma vida tão simples e monótona? 

—Eles provavelmente também não entenderiam o teu estilo de vida. 

Kurokawa terminou de comer e se dirigiu para o lugar onde dormiria. Um novo dia teve início, mas nada novo aconteceu. Buscar por alimentos, comer, conversar, sobreviver, dormir era mais do que o suficiente para aquelas pessoas, mas Kurokawa não conseguia esconder o seu tédio e desinteresse. Percebendo que dois dias haviam passado, eles se despediram daquelas pessoas sem saber se voltariam a vê-las e caminharam até o buraco por onde caíram.  

Após esperarem algum tempo, Kurokawa e Takeda viram algo cair. Sem muito tempo para reagir, eles esquivaram-se por pouco daquele grande objeto: 

—Oh, vocês estão vivos. -Comentou Lyonel. -Bem, segurem-se em mim, eu vou levar-vos de volta para a superfície.  

Takeda e Kurokawa fizeram como o instruído. Lyonel afundou os seus pés no chão e impulsionou-se de volta para a superfície. Os dois agarrados aos braços de Lyonel balançavam e quase caíam devido à velocidade com que Lyonel estava se movendo. Ao chegaram no fim da viagem, Takeda caiu de joelhos no chão com enjoo e falta de ar: 

—Eu...achei...que fosse morrer... 

—Estranho, você parece bem, Kurokawa. -Comentou Lyonel. 

—Claro que sim, eu- 

Antes de terminar sua frase, Kurokawa não conseguiu controlar-se e vomitou. Lyonel desatou a rir: 

—Você estava tentando parecer forte!  

—Cala a boca, tio! 

Lizzy e Sasesu que caminhavam ao longe avistaram o resto do grupo: 

—Bem vindos de volta. -Sorriu Lizzy. 

—Como foi lá em baixo? -Perguntou Sasesu. 

—Conhecemos um monte de pessoas legais. -Respondeu Takeda. 

—Foi horrível. -Retrucou Kurokawa. 

—Vocês fizeram um bom trabalho então podem descansar o resto do dia, amanhã começamos de novo. -Ordenou Lyonel. 

—Ei, espera aí, lute comigo primeiro! -Gritou Kurokawa sacando Eclipse. 

Lyonel instantaneamente derrubou-o com um tapa: 

—Para de ser irritante e vai para casa, pirralho. 

Takeda ajudou Kurokawa levantar e todos começaram a se retirar: 

—Eu já sentia saudades de dormir numa cama. -Reclamou Takeda. 

—Vocês devem ter fome, eu vou fazer um jantar bem gostoso! -Disse Lizzy. 

Kurokawa percebeu que todos estavam caminhando na mesma direção: 

—Ei, calma...para onde vocês estão indo? 

—Para casa? -Riu Takeda. 

—Esse é o caminho da minha casa. 

—Sim, temos dormido lá. -Respondeu Sasesu. 

—O que? Que tipo de desrespeito é esse? 

—Kurokawa, para de ser dramático, a casa está muito mais limpa do que o normal, você não tem nada do que reclamar. -Comentou Lizzy. 

—Nessa altura do campeonato, somos mais moradores daquela casa do que você. -Continuou Sasesu. 

—Vocês são parasitas ousados... 

Eles seguiram aquele caminho sem pressa enquanto conversavam e Kurokawa mesmo reclamando, sentia-se estranhamente confortável. Ao chegarem lá, Kurokawa e Takeda foram tomar banho enquanto Lizzy preparava o jantar e Sasesu ajudava-a. Eles reuniram-se dezenas de minutos mais tarde a mesa: 

—Tcharam! -Sorriu Lizzy mostrando o que tinha preparado com orgulho. -Frango, arroz e polenta! Eu andei treinando então tenho certeza que deve estar muito bom. 

Com aquele aroma incrível, Sasesu e Takeda não conseguiram evitar salivar e Kurokawa que normalmente prefere doces também estava interessado. Ao provarem, eles tiveram certeza que o sabor era tão bom quanto o cheiro: 

—Bom trabalho, Lizzy. -Comentou Sasesu. 

—Isso está tão bom! -Disse Takeda. -Nem se compara com a sopa de cogumelos que eu tive que comer... 

—Eu estou usando uns temperos novos e isso muda completamente o sabor! -Respondeu ela. 

Kurokawa silenciosamente colocou mais comida no seu prato, Lizzy ao perceber isso sorriu de forma maligna: 

—Então, Kurokawa, o que acha? 

—Está...mais ou menos... -Respondeu ele desviando o olhar. 

—É tão fofo ver o Kurokawa não sendo honesto. -Riu Takeda. 

—Ele literalmente comeu metade da comida enquanto conversávamos. -Disse Sasesu. 

—Está tão bom assim? -Provocou Lizzy. 

—Eu tenho fome! -Retrucou ele de boca cheia. -Eu tive que comer pedaços de formigas durante um fim de semana inteiro! 

Após o jantar, eles ajudaram Lizzy a arrumar a cozinha e foram para a sala. Kurokawa deitou-se ocupando grande espaço do sofá, Takeda sentou-se numa poltrona enquanto Lizzy e Sasesu deitavam no colchão que estava estendido no meio da sala. Kurokawa sem se preocupar com a opinião das outras pessoas começou a mudar de canais a procura de algo interessante: 

—Ah, Kurokawa, volta naquele canal! -Apontou Lizzy. -Aquele documentário parece super legal! 

—Ninguém quer saber sobre a vida das zebras, Lizzy. -Respondeu Kurokawa. 

—Você diz isso porque você é chato, elas são bastante interessantes! 

—Podíamos assistir um filme, eu conheço umas comédias românticas dez de dez. -Interferiu Takeda. 

—Não, eu vou escolher o que vamos assistir. -Retrucou Kurokawa. 

—Acho que devíamos fazer por votação. -Disse Sasesu. 

—Eu voto comédias românticas! -Continou Takeda. 

—Eu também sendo assim! -Concordou Lizzy. 

—Eu sou o dono da casa e do controle, democracia não existe aqui. 

—Eu aceito comédias românticas para ser sincero. -Disse Sasesu. 

—Você perdeu para comédias românticas, desiste, Kurokawa! -Gritou Takeda roubando o controle. 

Kurokawa imediatamente tentou recuperar o controle, mas foi impedido por Lizzy e Sasesu: 

—Isso é injusto! A casa é minha! 

—A casa é nossa! -Riu Takeda mudando de canal. 

—Parasitas malditos... 

Apesar de aparentar estar insatisfeito, Kurokawa sentia algum prazer em ter aquelas discussões. O tempo passou, eles acabaram por ver mais de um filme, Kurokawa odiou todos eles e de um momento para o outro percebeu que era o único acordado. Enquanto olhava os rostos de Takeda, Lizzy e Sasesu dormindo, ele sentiu uma sensação estranha no seu peito: 

—Talvez isso não seja tão mal assim...