About Kings and Flowers escrita por Arcchan


Capítulo 1
Single Chapter — Happy Ending


Notas iniciais do capítulo

Um OTP desses... ✊❤



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About Kings and Flowers

By: Archie-sama

Single Chapter — Happy Ending

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Capítulo Único — Final Feliz

 

Você não entende do que se trata tudo isso
Você está muito envolvido em seus dúvidas pessoais
Você tem esse sangue jovem, liberte-o
Você conseguiu tudo
Você perdeu sua mente no som
Há muito mais, você pode recuperar sua coroa
Você está no controle
Livre-se dos monstros dentro da sua cabeça
Coloque todas as suas falhas para dormir
Você pode ser rei novamente
King — Lauren Aquilina

 

Certa vez, observando sua esposa grávida fazer uma pausa para olhar a vitrine de uma floricultura, Kaneki questionou: 

— Gosta de flores, Touka-chan? 

E, como uma sutil confirmação, ela respondeu:

— São lindas. — Parecia admirada. 

Do outro lado do vidro, dentro da loja, havia um belo vaso com tulipas vermelhas muito bem cuidadas e outro com jasmins brancos que pareciam até brilhar sob a luz do sol.

Ao ver o encanto nos olhos da mulher que amava, o antigo rei de um olho, desde então conhecido somente como Kaneki Ken, ficou em silêncio. Presenciando tamanha admiração por parte dela, ele entendeu que existia algo de especial nas flores, algo que só elas podiam transmitir. Como se possuíssem uma linguagem ímpar. Então, decidiu apenas apreciar aquela beleza junto a Touka. E foi em algum segundo desse momento, ao fitar a barriga saliente dela, que ele teve uma ideia. 

Depois de chegarem em casa, Kaneki foi até o quarto deles e pegou um caderno de anotações juntamente de uma caneta. Touka, após colocar na sala o jarro de tulipas que havia comprado, sentou-se na varanda para curtir a brisa de fim de tarde. Ela começou a alisar a barriga calmamente, cantarolando baixinho a  música que tocava na rádio. Até que ele, contemplativo, foi ao encontro dela.

Ao lado da esposa, Ken se perdeu por algum tempo na melodia da música. Foi inevitável que sua mente vagasse entre pensamentos sobre sua vida antiga e a que tinha agora, como se fizesse um comparativo. Indesejado, podia-se dizer. Talvez, só talvez, a sombra do que ele foi um dia ainda estivesse ali. Escondida, pairando sobre ele. Esperando o momento certo para mostrar que ele não tinha qualquer controle sobre a própria vida. Que a qualquer momento poderia ser obrigado a voltar àqueles dias sombrios, pois não merecia toda aquela paz

Kaneki Ken, apesar de tudo, ainda era um pecador

E algum dia isso retornaria para atormentá-lo. 

Porém, balançando a cabeça levemente, ele decidiu espantar esses pensamentos. A solução talvez fosse ignorá-los. Então, virando-se para Touka, perguntou o que já vinha ruminando há algum tempo:

— Já pensou em um nome para nossa filha, Touka-chan? 

Foi quando ela parou de cantar, fazendo uma careta. 

— Sabe que eu deixei você decidir — retrucou. — Sou péssima nisso. 

E o rapaz deu uma leve risada, fazendo-a ficar embaraçada. Ele sabia de antemão qual resposta receberia, mas decidiu perguntar de propósito só para ver aquela reação.

— Você é fofa… — Ken afirmou, fazendo as bochechas dela ficarem vermelhas. Mesmo sabendo que ela detestava isso, ele não podia perder a oportunidade de constrangê-la. — Tudo bem, eu pensei em algo. — Ele sorriu, percebendo que havia despertado a curiosidade da Kirishima. — Veja. — Abriu o caderno e escreveu algo nele, depositando-o no colo dela em seguida. 

Com uma sobrancelha arqueada, a gestante o pegou e começou a ler. 

— Uma flor? — indagou, encarando-o para ver se havia dado a interpretação correta para os kanjis  Ichi (一) e Ka (花).

— Isso. — Ele anuiu, ainda sorrindo. — O que você acha? Combina ainda mais por ser a nossa primeira filha — salientou, fazendo menção ao "Ichi", que podia significar tanto "uma" quanto "primeira".

Então, Touka pareceu deixar de lado a implicância com sua suposta fofura e correspondeu ao sorriso que ele lhe lançava. E Ken teve certeza, só de olhar para ela, que a felicidade que ela sentia naquele instante não podia ser descrita em palavras. 

— É perfeito — ela concordou, fazendo o coração dele se aquecer por inteiro. Ichika seria a pequena flor deles, profundamente amada assim como eles amavam um ao outro. — Você é mesmo bom nisso. 

— Só porque você me inspira, Touka-chan — confessou Ken, sincero, com um sorriso ainda mais gentil no rosto.

Touka enrubesceu novamente, franzindo um pouco as sobrancelhas. 

— Não me provoque, idiota — rebateu, fazendo-o rir de sua fofura outra vez.

— A próxima pode ser Suiren — ele sugeriu, segurando a mão da esposa e entrelaçando seus dedos com os dela. 

— Suiren… — a Kirishima repetiu para ver como "flor de lótus" soava em seus lábios. — Definitivamente é um nome que eu escolheria — aprovou, voltando a alisar a barriga com a outra mão. 

Para Kaneki, essa era a confirmação de que, assim como ele, ela pretendia ter mais filhos depois de Ichika. E isso o fazia sonhar como um tolo, sufocando seus medos. Internamente estava comemorando, porque ser o marido de Touka já era muito mais do que achava merecer, mas ter um serzinho especial que simbolizaria uma parte sua e dela, o amor dos dois em sua forma mais pura, era a verdadeira representação de sua felicidade. 

Ele não queria abrir mão disso. 

— Mas e se for um menino? — Touka questionou de repente, pegando-o meio que de surpresa.

Ken coçou a nuca. O próximo podia realmente ser um menino…

Ele novamente fitou os olhos azuis da esposa, que continham um brilho de expectativa, e se lembrou de vários momentos que passou com ela desde que a conhecera. E, embora ela o tivesse tratado duramente no início, ele podia entender os motivos dela e compreender toda a gentileza que havia por detrás daqueles atos. 

Touka, apesar de durona, era realmente gentil. 

Ele pegou o caderno e escreveu outros dois kanjis, Yuu (優) e Ma (真), devolvendo a ela. 

— Gentileza… hmm… verdadeira? — Touka recebeu a confirmação e o mirou com amabilidade, apertando a mão dele de volta. 

— Seu japonês está ficando melhor, Touka-chan — ele elogiou, rindo outra vez. A ghoul, porém, estava séria.

— Eu fico feliz que pense isso de mim, Ken — sussurrou, ignorando o comentário dele e prendendo-lhe a atenção. — Mas, sabe… — Levou a outra mão até o rosto masculino, tocando-o com suavidade, traçando com os dedos a linha da mandíbula e olhando-o profundamente nos olhos. — Yuuma será a sua cara. 

E, quando Touka dizia que ele era a pessoa mais gentil que ela já havia conhecido, Kaneki não contestava mais. Apenas se deixava levar pela admiração que vertia dos olhos dela, aceitando todos os sentimentos que ela estava disposta a lhe oferecer. 

Aquela, então, foi a vez dele de ficar rubro diante de um sorriso tão genuíno. 

.

..

….

Quando Kaneki acordou, seus olhos não conseguiram focalizar o ambiente imediatamente. Sua cabeça doía e as pálpebras pesavam, mas se esforçou para abri-las, sentindo um leve incômodo nas pupilas por conta da claridade que entrava pela janela. 

Por quanto tempo esteve sonhando? 

Respirando lentamente, ele logo observou o teto branco. Sentia-se meio tonto, mas, ainda assim, suas vistas percorreram o lado esquerdo do cômodo. Sobre uma mesa de canto havia alguns vasos de flores, os quais preenchiam o recinto com  uma mistura agradável de cores, e uma jarra de água. O restante do espaço era tomado por um pequeno sofá bege.

Ken não conseguia se lembrar de onde estava.

Então, avistou-a.

Sentada numa cadeira ao lado da cama, adormecida e mais bonita do que nunca, estava Touka. Sua esposa e mãe de seus filhos. Com a cabeça apoiada no colchão ela ressonava tranquilamente, os cabelos escuros caindo graciosamente sobre o rosto. 

Mesmo em seu sono, Touka segurava a mão do marido firmemente, sabendo que esse gesto era o suficiente para transmitir a ele a segurança que nem mil palavras poderiam expressar. “Eu estou aqui”, “jamais vou te deixar”, “serei a sua força”, algo de tamanha particularidade que apenas eles podiam entender. Ela sabia que ele estava ciente disso. Era como uma linguagem só deles, única e especial. 

Como a linguagem das flores.

— Touka-chan — Kaneki chamou suavemente, apertando a mão da esposa de volta. Sua voz saiu meio baixa por conta da garganta seca, mas sabia que ela ouviria mesmo assim.

E, com o chamado do marido, Touka abriu os olhos devagar, encarando-o ainda sonolenta.

— Ken... — ela pronunciou o nome dele devagar. Então, foi como se seu cérebro processasse as informações em tempo recorde. Kaneki finalmente havia despertado! — Você está de volta! — Endireitou a postura, permitindo que um sorriso terno tomasse seu rosto. Kimi estava certa quando disse que poderia ficar tranquila, pois a situação dele era estável. — Que alívio… 

Ao ouvir essas palavras, o ghoul de um olho enfim percebeu onde estava. Do outro lado do quarto havia um monitor de batimentos cardíacos e um suporte de soro — onde provavelmente tinha alguma substância própria para seu organismo híbrido — cujo cateter estava introduzido diretamente em sua mão direita. Além disso, ao olhar para baixo, ele percebeu que usava uma bata hospitalar. 

Aquele lugar era claramente um hospital. Um hospital de humanos. Mesmo após tudo que havia acontecido, ainda era meio estranho para ele constatar que ghouls e humanos realmente estavam convivendo em harmonia. Não importava o quanto pensasse nisso, continuava sendo uma conquista surpreendente. Ele podia, enfim, sentir orgulho de si mesmo por sempre ter acreditado que isso era possível — embora essa fosse, certamente, a última coisa que sentia.

— Eu não irei a lugar algum, Touka-chan — ele garantiu, mesmo com todas as dúvidas que ainda possuía, e devolveu o sorriso gentil que ela lhe oferecia. — Mas o que aconteceu? Onde estão Ichika e Yuuma? — questionou, um tanto confuso. Seus pensamentos ainda estavam meio embaralhados. 

— Deixei eles com o Yomo-san hoje — Touka respondeu.

— Yomo-san? — Ken piscou os olhos algumas vezes, vendo-a confirmar com a cabeça. — Ele adora os dois. — Soltou uma risadinha, começando a tossir em seguida.

Touka começou a dar uns tapinhas de leve nas costas dele, tentando ajudá-lo em silêncio. Apesar de tudo, sentia-se consolada por aquela visão. Seu esposo estava vivo, estava acordado e parecia bem. O alívio que a preenchia naquele instante era indescritível. Ele não estava mais semimorto, e sua pele já não parecia pálida e fria como a de um cadáver.

Kaneki parecia ter feito o possível para não deixá-la.

A Kirishima respirou fundo e, depois de chamar o médico responsável para fazer um check-up em seu marido e garantir que estava tudo em ordem, encarou-o incessantemente. 

— Você desmaiou em casa — começou o relato, tomando completamente a atenção dele. — Eu estava lavando a louça do jantar e você estava lendo um livro depois de ter colocado Ichika e Yuuma pra dormir. — Ela tentou disfarçar, contudo Kaneki percebeu quando ela cerrou os punhos sobre as próprias coxas, provavelmente se culpando. — Você estava com uma febre de 40 graus, Kaneki. 

Ele ficou em silêncio por um momento. Sabia que, mesmo que agora seu organismo fosse diferente do de um humano, uma febre tão alta ainda era um risco à sua saúde. 

— Me descul-

— Você tem ideia do quanto eu fiquei preocupada?! — Touka o interrompeu, tentando evitar que seus lábios tremessem. — Por que não me disse o que estava sentindo? 

— Eu sinto muito… — Ele suspirou, abaixando os olhos. Agora que começava a refletir, havia sido estupidez esconder dela que estava passando mal. Era só que ele estava tão acostumado a não estar bem de saúde que não via sentido em incomodá-la por algo do tipo. Tudo que menos queria era deixar sua mulher preocupada; ela já tinha trabalho o suficiente cuidando das crianças e gerenciando a cafeteria. 

— A culpa foi minha — Touka sussurrou, dessa vez sem olhá-lo, deixando-o surpreso. — Eu percebi que havia algo de errado, mas aceitei quando você disse que não era nada. Eu devia ter insistido. — Ela parecia brigar consigo mesma internamente, enquanto ele fazia exatamente o mesmo bem ao seu lado. 

— Não diga isso... — Kaneki pediu, sentindo-se envergonhado por estar dando trabalho, justamente o que não queria que acontecesse desde o começo. — Eu errei — admitiu num murmúrio —, me perdoe.

Realmente não havia agido como um adulto diante da situação. Apesar de tudo, reconhecia que podia ser alguém bem teimoso. 

— Não quero suas desculpas, Bakaneki! — Touka se irritou, franzindo o cenho, e ele coçou a nuca com a mão livre. Estava desconcertado. — Eu só quero que você fique bem... — ela resmungou então, corando levemente. — Não ouse me deixar viúva, 'tá me ouvindo?

— E-Eu serei mais cuidadoso. — O rapaz também ficou rubro de vergonha. — Não sairei do seu lado, Touka-chan. — Voltou a encará-la, dessa vez prendendo o olhar dela com o seu. — Eu prometo. 

E, naquele ínfimo momento, um simples olhar foi capaz de fazer transbordar todas as emoções que eles vinham guardando e escondendo um do outro. Principalmente o medo intenso da perda. 

— Acho bom estar falando sério. — Os olhos de Touka lacrimejaram e ela fungou, fazendo de tudo para que as lágrimas não caíssem. 

Kaneki sorriu amavelmente, fazendo com que ela se aproximasse ainda mais e voltasse a segurar sua mão, dessa vez entrelaçando seus dedos como de costume. 

— E qual foi o problema? — Ken indagou, curioso para saber o que havia lhe deixado tão mal mesmo sendo um meio-ghoul. 

— Falência múltipla de órgãos — Touka revelou, deixando-o perplexo. Ela imediatamente entendeu o questionamento no rosto dele. Como ele ainda estava vivo depois de um problema tão grave? Sua regeneração havia sido assim tão eficaz? — Você ficou desacordado por dias, Ken — ela expôs, deixando-o ainda mais estático. 

Para ele, era como se tudo tivesse acontecido um dia atrás. Mas, se parasse para pensar, Touka havia dito que seus filhos estavam com Yomo-san hoje. Ou seja, provavelmente seus amigos estavam fazendo um revezamento para cuidar das crianças enquanto ela ficava com ele no hospital. O que só o deixava mais aflito. 

Por quantas noites Touka havia dormido naquela cadeira desconfortável ou naquele sofá pequeno por sua causa? 

— Você não devia se esforçar tanto — ele disse, chateado consigo mesmo e com a situação. — Acabou de ter o Yuuma. — Lembrou que seu segundo filho ainda era um bebê de cinco meses. 

— Eu estou ótima — ela rebateu, revirando os olhos. — Você é que não estava bem.

Havia se passado um bom tempo, a marca da cesariana já estava bem cicatrizada por conta de sua habilidade de regeneração e, além disso, era uma mulher muito forte. O nascimento de seu filho não poderia ser usado como desculpa para se ausentar do hospital. Sem contar que, durante os dias que passara ali, Hinami sempre trazia Yuuma para que pudesse amamentá-lo.  

— Mesmo assim, passar noites no hospital… — Kaneki ainda tentou protestar.

— Não posso cuidar do meu marido? — retorquiu Touka, calando-o. — Sei que você odeia estar sozinho, Kaneki. Então apenas me deixe ficar ao seu lado — brigou. Mesmo doente, Kaneki ainda era capaz de tirá-la do sério com sua teimosia. — Não aja como se eu não fosse te fazer falta, porque sei que não é verdade. — Ela fez questão de reforçar. E ele sabia que aquelas palavras, além de certeiras, eram totalmente sinceras. Touka estava ao lado dele porque queria, e não porque se sentia obrigada. — E não subestime a resistência de uma mulher, baka. 

—  Tudo bem. — Ken suspirou, rendendo-se e rindo suavemente. — Você venceu. 

— Eu sempre venço, devia estar acostumado — ela exprimiu, fingindo desdém. Segundos depois estava rindo junto a ele. 

Um silêncio confortável pairou sobre eles, e Kaneki encarou a esposa sem piscar, como se ela fosse a melhor coisa que havia acontecido em toda sua vida — e  de fato era. Além de ser aquela que o salvou de um cenário de horror, estancando suas dores e mostrando que ainda valia a pena viver, ela também preencheu sua existência com os mais agradáveis sentimentos. Dentre eles, um amor que ninguém jamais poderia mensurar. Ele era pai agora.

Então, como uma brisa soprando de repente e deixando uma grande impressão ao arrepiar os pelos da nuca, Kaneki confessou:

— Eu te amo, Touka.

E, para Touka, foi como se o tempo parasse naquele instante. Ela arregalou os olhos e engoliu em seco, o coração acelerando no peito e as maçãs do rosto voltando a ruborizar. Como pensava, aquele definitivamente era o dia das declarações. Kaneki e ela não eram um casal de dividir pensamentos íntimos tão abertamente; eram mais de gestos que de palavras. Porém, desde que haviam se casado, um dia de confissões acabou sendo estabelecido silenciosamente. Era quando eles simplesmente falavam o que sentiam. E ela sabia que, quando seu marido a chamava sem o sufixo, era porque estava ainda mais sério. 

Sendo assim, ela também se daria a oportunidade de dizer tudo aquilo sobre o que vinha refletindo nos últimos dias. 

Desconcertada, a Kirishima soltou um leve pigarro, achando por bem desviar o olhar e o assunto:

— Como já sabe, existem vários desconhecidos dentro de você. Órgãos que nasceram quando você se transformou naquela… coisa. — Ela hesitou, referindo-se à monstruosa anomalia dragão que instaurou o caos em Tokyo alguns anos atrás.

Kaneki não ligou para a falta de resposta à sua declaração, apenas assentiu com a cabeça, mostrando que estava acompanhando o raciocínio. 

— Alguns deles falharam. Os médicos ficaram aterrorizados porque nunca tinham visto algo assim. Por sorte, a pessoa que me ajudou a te trazer pro hospital foi o idiota do Nishiki, e ele ligou imediatamente pra esposa dele. Mesmo fora do turno, a Kimi-san veio correndo te socorrer.

— Preciso agradecê-la depois — ele afirmou, e ela concordou prontamente. 

— Desde a última vez em que tivemos contato, ela esteve se empenhando nos estudos sobre os seus novos órgãos. Ela disse que suas células RC sofreram mutações e podem salvar vidas além da Shirazu Haru. Isso não é incrível? 

Kaneki ficou aturdido por alguns segundos, tentando assimilar aquelas palavras. Não podia dizer que aquela era a notícia mais surpreendente que já havia recebido, levando em conta toda a sua incrível jornada até ali, mas ficava muito feliz em saber que poderia ajudar outras pessoas. Além disso, pensar em Shirazu Haru trazia muitas memórias sobre seu falecido pupilo e amigo, Shirazu Ginshi. Onde quer que estivesse, Shirazu com certeza estava grato por sua irmã estar a salvo, e isso trazia um alívio sem igual a Kaneki. 

— Essa é uma ótima notícia. — Ele aquiesceu com um sorriso. Era alguém que odiava sentir-se inútil, do tipo que não podia deparar-se com algum problema e não fazer nada. Então, era satisfatório saber que poderia ajudar mesmo naquelas circunstâncias. 

— A Kimi-san instruiu algumas enfermeiras e conduziu a cirurgia para a retirada dos órgãos que estavam falhando. Eu assinei os papéis de autorização. Ela disse que se tivéssemos demorado mais um pouco a prestar o socorro, os seus órgãos comuns também seriam afetados. — Touka apertou a mão dele um pouco mais, alisando-a com o polegar. Ter que relembrar o nervosismo daqueles momentos fazia com que se sentisse um tanto medrosa. A possibilidade de perder Kaneki a deixava simplesmente apavorada. Depois de tudo que passaram para chegar até ali, perdê-lo definitivamente não era uma opção. —  Mas a cirurgia correu muito bem, e você passou mais alguns dias se recuperando. 

— Humanos e ghouls convivendo pacificamente… — Kaneki sussurrou, uma alegria sem tamanho invadindo seu peito. — Nós lutamos tanto por isso, fico feliz de não ter desistido. 

— Realmente parece um sonho. — Touka concordou, fitando o marido com um misto de emoções. — No começo eu achei que era impossível, mas você me fez mudar de ideia, Kaneki. Você me deu esperanças de um mundo melhor. E eu agradeço tanto por ter acreditado e por estar do seu lado. 

Ken a olhou com apreço. 

— Vamos continuar caminhando juntos, Touka-chan.

Ela anuiu, involuntariamente colocando o cabelo atrás da orelha e permitindo que o esposo pudesse ver seus brilhantes olhos azuis. Eram raras as vezes em que ela deixava suas verdadeiras emoções à mostra, e quando exibia ambos os olhos assim, Kaneki sabia que esse era o momento em que ela estava bem com isso. Era quando expor seu interior não era um problema. 

— Ah, eu trouxe algo pra você. — Ela lembrou num estalo. 

— Hm? — Ele piscou, curioso. 

Touka sorriu e se levantou, indo buscar um dos jarros de flores.

— Aqui. — Ela voltou e entregou a ele um pequeno vaso com alguns lírios-aranha vermelhos. — São os seus preferidos, não é? — perguntou, observando Kaneki acariciar com cuidado as flores. 

— Como sabia? — questionou, um tanto surpreso. Não lembrava de ter dito isso a ela.

— Porque o seu livro favorito está cheio deles. — Ela deu de ombros, como se fosse óbvio. 

— Você leu? — Ele a mirou meio confuso.

— Sim… Enquanto você dormia. — Ela preferiu não dizer, mas aquela foi a forma que encontrou de sentir-se próxima a ele mesmo com a dificuldade que estavam passando. — E também percebi que havia um desses entre as páginas. — Apontou para um lírio-aranha. 

— Obrigado, Touka-chan — Ken agradeceu. Não contaria a ela que a higanbana era uma flor que o deixava extremamente melancólico. Era a sua preferida porque, desde que se tornara um meio-ghoul, representava bem todo o caos que era a sua vida. Nunca o deixava esquecer sua natureza. 

Aquelas flores faziam com que ele se recordasse de um passado não muito distante no qual era aterrorizante pensar. Um passado onde ele lutava constantemente, mas perdia em praticamente todas as vezes — para os outros e para si mesmo. 

Aquela solidão era algo de que não gostava de se lembrar. 

— Hide trouxe girassóis. — Touka apontou para as flores amarelas sobre a mesa. — São realmente lindos, não são?

Kaneki assentiu.

— São a cara dele. — Riu, ciente de que girassóis transmitiam energia positiva e simbolizavam alegria e lealdade. — E de quem são aquelas outras? 

— Saiko-chan e Urie-kun compraram juntos. São astromélias — ela respondeu, observando as flores róseas que representavam amizade eterna e felicidade.  

— Eu nunca tinha visto — ele confessou, admirado com a beleza das astromélias.

Em seguida, Touka começou a apresentar todas as flores que as visitas haviam trazido. Depois, como já vinha planejando, questionou-o:

— Já  ouviu falar em hanakotoba, Kaneki? — Manteve os olhos atentos sobre a fisionomia dele.

— Já li um pouco sobre isso. Por quê?

— Então você sabe o significado da higanbana, não sabe? — Observou-o balançar a cabeça lentamente, parecendo meio desanimado. — Morte, solidão, dor, saudade, separação… — ela começou a citar, deixando o marido todo arrepiado. Talvez ele devesse rever seu conceito de favorito, porque aquelas palavras, embora tivesse se acostumado a elas devido ao passado, talvez fossem as palavras que mais odiava no mundo. — É um significado trágico, hm? Assim como você achava que era a sua vida. 

Dessa vez, ela o deixou atônito. 

— Eu não- Quando eu te disse isso? — Kaneki interpelou, dividido entre sentir-se estranho e desorientado. Realmente era o que sempre pensara, mas achou que nunca havia dito isso em voz alta. 

Touka meneou a cabeça numa negativa.

— Eu apenas sei.

O meio-ghoul desviou os olhos, hesitante. Não era como se não quisesse se livrar daquele olhar pessimista que tinha acerca de sua própria vida. No entanto, velhos hábitos não podiam ser mudados com tanta facilidade. 

— Aonde quer chegar, Touka-chan? — Ele não entendia muito bem o motivo daquele diálogo.  

— Nós tivemos uma conversa na :re uma vez… — Touka continuou. — Ninguém desejava que você desaparecesse, Kaneki. Ninguém além de você mesmo. — A expressão dela, agora, era de pesar. — Você sempre foi querido e amado. Mas eu sei que, bem aí no fundo, você ainda tem dúvidas sobre isso. Também sei que você pensa constantemente na sua vida antes de… Bem, de nós dois. 

— Não consigo evitar. — Ele suspirou. — É como se essas vozes… — Colocou as duas mãos na cabeça — …não quisessem me deixar em paz — admitiu, lembrando-se de como sua mente traiçoeira sempre fazia questão de contestar o seu autocontrole. 

Ele não era mais o rei de um olho, isso era verdade. Mas tampouco era o rei de sua própria vida. 

— Ken. — Ela o olhou com um semblante que esbanjava determinação, sustentando o olhar dele. — Você pode retomar o controle! — E, com essa frase que o impactou mais do que ele gostaria de demonstrar, ela sorriu com tanta ternura que o deixou sem palavras. Era um gesto ao mesmo tempo otimista e reconfortante. — Tenha um pouco mais de confiança em si mesmo. — Você pode ser rei novamenteera o que ela queria dizer. 

Ken não pôde evitar: seu rosto corou fortemente. Havia subestimado a capacidade que sua esposa tinha de compreendê-lo. 

— Você 'tá falando bastante hoje, Touka-chan… — ele desconversou, deixando-a constrangida. 

— E-Eu precisava deixar isso claro, 'tá bom? — retrucou ela. — Essa é a sua flor, Kaneki. — Apontou para a higanbana. — Ela pode ser o que você quiser que seja.

O meio-ghoul ponderou essa frase por um segundo, prestando atenção na beleza exuberante dos lírios-aranha. E abriu um sorriso tranquilo, lembrando-se de que, apesar de tudo, ele ainda estava vivo.

— Talvez você tenha razão. 

— É claro que tenho. — Ela sorriu e, quando deu uma piscadela para o marido, a porta do quarto foi aberta.  

Uma jovem de semblante amável adentrou o cômodo, segurando um bebê adormecido nos braços e acompanhada de uma garotinha que agarrava entusiasticamente a barra de sua saia. E não foi surpresa para ninguém a figura que apareceu logo atrás dela: o irmão mais novo de Touka, de mãos dentro dos bolsos da calça. 

Ayato sempre estava onde Hinami estava.

— Onii-chan! — Hinami exclamou assim que viu Kaneki sentado e de olhos abertos. — Você acordou! — Ela abriu um sorriso, aparentemente aliviada. 

— ‘Tou-chan!! — Ichika foi a primeira a correr ao encontro do pai, abraçando-o sem muito cuidado. — Eu senti tanto a sua falta! 

— Ichika, tenha cuidado! Seu pai acabou de acordar — Touka a repreendeu, suspirando. Mas, a despeito disso, entendia bem os sentimentos da filha.

— O papai também sentiu sua falta, Ichika-chan. — Ken alisou carinhosamente os cabelos bicolores da garotinha, seus lábios repuxados em um sorriso. O coração dele acalentou-se ainda mais com a visão dos filhos. — Como vão, Hinami-chan, Ayato-kun? 

— Estamos muito bem, onii-chan — Hinami respondeu ainda sorridente, entregando Yuuma aos braços de Touka enquanto Ayato dava de ombros atrás dela. — Você também não parece nada mal.

— Obrigado.

— Estão bem, huh? — Touka provocou, percebendo que Hinami referiu-se a eles como "nós", e não separadamente. Aquilo era bem interessante. 

— O que quer dizer com isso? — inquiriu Ayato, semicerrando os olhos ao perceber o tom caçoísta da irmã. — Garota tonta.

— Nada, nada. — A Kirishima riu baixinho, a atenção voltada para o rosto adormecido de Yuuma. Ele parecia com calor e suava sob a franja, fazendo com que a mãe passasse a mão gentilmente em sua testa, penteando os cabelos arroxeados para trás com os dedos. O bebê se remexeu um pouco, porém não acordou. — Ken — ela chamou em seguida, capturando a atenção do esposo. — Quer segurá-lo? — Aproximou-se dele com Yuuma. 

Depois de ele assentir, Touka entregou o filho nos braços dele e assistiu-o embalar a criança com cuidado, tracejando com o dedo indicador os contornos do pequeno rostinho. Ichika continuava agarrada ao pai, olhando com fascinação para a face do irmãozinho.

— Ele realmente se parece comigo — admitiu Kaneki, suas bochechas corando levemente devido à admiração. 

Hinami e Ayato disfarçaram o riso, e ela se aproximou do rapaz, apoiando a cabeça no ombro dele com naturalidade. Ele a olhou pelo canto do olho, envergonhado, mas nada disse. Observando a família bonita e pacífica de sua irmã, ele se perguntava se um dia seria capaz de formar uma igual. Claro, com a garota que estava bem ao seu lado. Contudo, não havia com o que se preocupar, pois naquele exato momento Hinami estava pensando o mesmo que ele.

Touka recolheu o vaso de flores que ainda estava na cama com o marido e encarou-o. Pegando apenas um lírio-aranha dali, ela o colocou atrás da orelha direita de Ichika, enfeitando-lhe. Uma pequena flor adornando outra.

— E então, o que você quer que essa flor seja? — A Kirishima incentivou o marido a pensar, indicando a flor na orelha da filha. 

Kaneki observou as pessoas presentes no quarto naquele momento e, ao se lembrar de todos que não estavam ali também, mas que gostaria que estivessem, ele só conseguiu pensar em uma coisa. Todos aqueles sentimentos negativos já não importavam mais; os pensamentos ambíguos e que lhe enchiam de dúvidas foram simplesmente abafados, deixados para trás, para aquela outra vida à qual ele não pretendia mais voltar.

— Felicidade — ele finalmente respondeu. E, mesmo que as visitas estivessem confusas sobre o que falavam, ninguém se pronunciou. 

— Então é isso que ela significa — afirmou a ghoul, com toda convicção. — Porque a sua vida, essa vida, tem um final feliz. 

Aquela era a flor do reiporque ele tinha controle sobre ela, assim como também tinha sobre a própria vida. 

— Touka… — Ele buscou os olhos dela, fitando-os com intensidade. — Não sei o que seria de mim sem você. 

— Idiota — ela resmungou, ficando envergonhada especialmente por estar na frente de Ayato e Hinami. Os dois, contudo, conversavam baixinho entre si, procurando ficar de fora do momento íntimo da família. 

Touka, então, abraçou o marido suavemente pelo pescoço, plantando um beijo carinhoso na bochecha dele. E sussurrou em seu ouvido a resposta que não havia dado antes, mas que era óbvia para qualquer um que a conhecesse:

— Eu te amo muito mais, Ken... Obrigada por compartilhar esse final feliz comigo.

E, sim, eles continuariam a trilhar aquele caminho juntos. Para um amanhã totalmente ressignificado e ainda mais cheio de esperança: não mais morte, nem tristeza, nem saudade. Apenas uma completa, terna e indiscutível felicidade. 


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