Esconde Esconde - Contos de Terror escrita por Bzllan


Capítulo 1
Esconde Esconde




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A chuva caía fina naquela tarde. O céu nublado de 20 de junho anunciava a chegada de um inverno rigoroso. Bruno tinha acabado de completar onze anos no mês anterior, mas aquele era o dia do melhor amigo, Ícaro.

Ícaro convidou os amigos mais próximos para passar a noite em sua casa, e com muita insistência de Bruno, os pais deixaram.

Bruno e Ícaro se conheciam desde o jardim de infância, e Bruno adorava a casa do amigo. A casa tinha dois andares, e na sala de estar, os melhores jogos de Playstation da época, com controles suficientes para que todos jogassem juntos. E o melhor de tudo - eram praticamente vizinhos. Moravam na mesma rua, há apenas um quarteirão de distância.

Aquela noite se iniciou com uma inesperada tempestade. A chuva não cessou. Pelo contrário - assim que Bruno chegou à casa de Ícaro, pedras de granizo bateram assustadoramente à porta.

Eles esperaram horas - ninguém mais apareceu.

Mesmo os pais de Ícaro que haviam saído para uma visita à avó materna do garoto tiveram que esperar a tempestade cessar.

— Está tudo bem, cara. A gente repete amanhã. - Bruno consolou o amigo, mas sentiu pena de Ícaro. Era seu aniversário, e queria que o amigo aproveitasse. - Vamos jogar alguma coisa?

Ícaro concordou. Mal percebeu o passar do tempo. Jogaram Call of Duty horas a fim, parando quando os pais do amigo ligaram para desejar boa noite.  Já passava da meia noite e a tempestade insistia em bater-lhes à porta. Assistiram à um filme de terror fajuto, mas o sono custava a chegar, quando Ícaro propôs a ideia genial que animaria suas noites.

— Vamos brincar de esconde esconde?

Ambos eram muito bons nisso, e a casa de Ícaro era perfeita para a brincadeira. Ainda no clima de terror, Bruno topou, mas com uma condição.

— Ok, mas com as luzes apagadas. Sem celular, sem nada.

Ícaro topou na hora.

Ambos apagaram as luzes de toda a casa, excitados com o espaço da casa inteira que teriam para usarem. A brincadeira poderia durar por horas dentro da casa de Ícaro, só com os dois.

— Eu escondo primeiro! - Bruno pediu, e o amigo concordou.

Assim que Ícaro voltou-se para a parede para contar até vinte, Bruno tirou os sapatos para não fazer barulho no piso de madeira e voou escadas acima no escuro.

Tinha quinze segundos para se esconder. Ele se lembra de ouvir a voz de Ícaro distante contando mais rápido do que deveria.

Não teve o tempo que gostaria para pensar no melhor esconderijo. Entrou em território proibido - o quarto dos pais do amigo. Correu o mais rápido que pôde e escondeu-se dentro do armário, mergulhando nas camisas passadas e com cheiro de amaciante do pai de Ícaro. Fechou a porta e deixou apenas uma fresta para enxergar quando o amigo se aproximasse.

A chuva batendo na janela o impedia de ouvir o amigo contando no andar de baixo. 

Não sabe quanto tempo ficou escondido até ouvir o som dos passos se aproximando pelo corredor. 

Bruno prendeu a respiração. No escuro, viu uma massa aproximar-se do quarto vagarosamente. Pensou em fechar a porta do armário, mas já era tarde. Ícaro o encontrara rápido demais.

A passos pesados, a sombra aproximou-se de Bruno, que manteve a respiração presa. A de Ícaro estava o completo oposto - pesada e ofegante. 

Bruno pensou em se render, quando escutou passos no andar de baixo, seguidos pela voz do amigo:

— Sei que está aí em cima!

 

Bruno congelou. A sombra escura ainda olhava para dentro do armário, mas não é Ícaro. Sentiu o corpo inteiro tremer. Esperava que quem quer que seja não tenha o visto na escuridão. O dono da respiração ofegante escondeu-se no canto do quarto, saindo de seu campo de visão assim que os passos de Ícaro chegam no andar de cima.

Bruno nunca tivera tanto controle em sua vida quanto naquele instante.

Assim que viu o amigo passar pelo corredor, saiu de fininho de dentro do armário. Os segundos até sair do quarto foram torturantes, sentindo o arrepio de ser observado em sua nuca. O garoto correu a passos silenciosos atrás do amigo e o assustou. Ícaro o xingou.

— Não é assim que funciona! 

Bruno agiu como se tudo estivesse normal. Riu e disse que o pegou direitinho.

Tentou manter a voz controlada enquanto guiava o amigo, sem entender nada, até o andar de baixo.

Assim que pisaram no último degrau, Bruno cochicha para o amigo.

— Chame a polícia.

Ao dizer isso, olhou escada acima. A figura os seguiu. Ao ouvir as palavras, seus passos ligeiros correram atrás dos dois garotos. 

Ícaro não entendeu, mas viu o pavor nos olhos do amigo ao puxá-lo pela sala escura até a porta da frente, gritando.

Estava destrancada. Eles não lembram de tê-la destrancado.

Em meio à chuva pesada que caía sobre eles e cortava-lhes a pele, os dois correram de volta à casa de Bruno à pedidos de socorro. A mãe do garoto ouviu antes mesmo de eles dobrarem a esquina.

A porta aberta os esperava. 

Sob os relatos das crianças, a mãe chamou a polícia. Eles ouviram as sirenes cortar a rua poucos minutos depois. 

O policial que cuidou do chamado bateu-lhes à porta pouco tempo depois.

Os dois garotos, encharcados, ouviram a história com os pelos da nuca eriçados.

 

Tanto sua porta quanto a do vizinho estavam escancaradas quando chegaram. Como não encontraram o invasor, entraram na casa ao lado.

Encoberto pela chuva, alguém matou a sangue frio os vizinhos de porta de Ícaro, um casal que dormia tranquilamente em seu quarto. Acompanhando o caso, descobriram depois que se tratava do filho mais velho, que matou os pais e poupou o irmão no quarto ao lado.

O indivíduo se escondeu na casa do garoto que havia esquecido a porta destrancada acreditando que, pela escuridão, não teria ninguém em casa.

Não o encontraram e nem à arma do crime, uma faca, pela autópsia. Ele ainda estava em posse da mesma quando perseguiu os garotos.

Todos os dias, os dois se lembram do trauma.

Ícaro teve um aniversário inesquecível.

 


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Notas finais do capítulo

curtiram?



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