Impossível escrita por kjuzera


Capítulo 7
“Por que não vacas?”




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Bakugou sempre gostou muito de voar com a vista pro mar. O campo de visão praticamente infinito, se estendendo por todo o horizonte. O cheiro da brisa salgada e o frescor do clima traziam boas memórias e uma grande sensação de liberdade. 

O mar sempre trazia uma calma, um acalento no sangue normalmente borbulhante de raiva do bárbaro. Mas naquele dia não estava funcionando. A fúria era praticamente palpável, e Kirishima não ousava nem mudar um pouco a rota, para não atiçá-lo. 

Voaram rumo ao norte, para o mais longe possível daquela cidade. Mesmo quando anoiteceu eles não pararam. Kirishima definitivamente preferia o Bakugou com raiva e gritão, que o Bakugou com raiva silencioso. Ele quieto lhe dava muito medo. 

Naquele clima pesado, os dias e noites foram passando sem grandes eventos. Um dia decidiram finalmente usar o dinheiro que agora tinham em abundância para comprar as tais ovelhas prometidas.

Sobrevoando uma área de plantações e fazendas, Kirishima localizou pelo cheiro uma propriedade com um enorme rebanho de ovelhas e cabras. Era engraçado ver lá de cima os animais que pareciam umas bolas de lã. 

— Por que não vacas? - Bakugou não entendia - Ovelhas são pequenas e aquela lã toda só atrapalha. 

Kirishima grunhiu informado que a dificuldade é que tornava tão especial. Bakugou suspirou derrotado e indicou um local para pousarem, próximo ao que parecia ser a casa da família que cuidava da fazenda. 

Obviamente a família entrou em pânico ao ver o dragão pousar. Os mais velhos, mulher e crianças correndo para dentro da casa enquanto um homem adulto e um dos filhos, pretendiam se defender com uma enxada e uma machadinha. 

Antes mesmo de desmontar do dragão, uma mulher já saía desesperada da casa pedindo misericórdia, que poupasse sua família, e todas aquelas coisas que Bakugou já tinha ouvido um milhão de vezes. 

O loiro suspirou entediado, se aproximando e olhando de cima os homens apavorados. 

— Quanto vocês querem pelas ovelhas? - Bakugou perguntou.

O homem mais velho e o mais novo se olharam um tanto incrédulos. 

— Você… você não vai nos m-matar? - o mais novo perguntou, sem baixar a machadinha. 

— Se eu fosse, você não teria tempo de me fazer essa pergunta. - o bárbaro respondeu irritado. - Vocês vão vender as ovelhas ou não?! 

Foi a vez da mulher, que parou de chorar quase que imediatamente, ir até os dois os fazendo baixar as armas. 

— Cla-claro que vamos!! - ela disse sorrindo, incorporando uma vendedora nervosa - Quan-quantas você gostaria?   

— Todas. - Bakugou disse simplesmente. - O dragão vai comer todas. E ele não gosta da lã então vocês precisam tirar. 

A mulher pareceu um tanto apavorada sem saber exatamente o que fazer, os homens muito menos. Da janela o resto da família olhava à distância e com curiosidade. 

— Então… Você quer tosquiar as ovelhas pro.. pro seu dragão comer…? - ela confirmou insegura.

— É isso mesmo, mulher, algum problema? Vocês vão fazer ou não?!

— Vamos, sim, claro! É, bem… são então… - ela pareceu pensar algum tipo de cálculo - 35 ovelhas… umas 15 moedas? 

Bakugou não questionou pegando seu saquinho cheio de moedas e se pondo a contar. Tanto a mulher como os dois homens ficaram em um silêncio mortal, observando ele contar o dinheiro muito assustados. 

Contadas as quinze Bakugou despejou as moedas nas mãos da mulher em choque e se afastou dizendo para se apressarem que ele não tinha o dia inteiro.

— Isso são… moedas de ouro? - o filho perguntou bem baixinho para a mãe que nem respirava. 

O pai trêmulo pegou uma na mão, mordendo nos dentes de trás para checar a autenticidade. 

— Parece que sim… 

A mãe pareceu voltar de seu transe numa respiração profunda. O bárbaro certamente não entendeu que ela falava de moedas de cobre, mas não iria ser ela quem iria explicar isso pra ele. Pegou todas as moedas e guardou entre os peitos fartos.

— Ao trabalho, homens! Ovelhas para tosquiar!! Andando!!  

Em pouco tempo a família inteira, inclusive os mais velhos e as crianças estavam freneticamente tosquiando as ovelhas. Kirishima ficou deitado próximo só esperando os animais serem liberados quase que diretamente para sua boca, entretido no seu próprio paraíso. 

A família estava horrorizada pela cena sanguinária. Tentavam ignorar os berros dos animais antes de serem mastigados, fingindo que tudo aquilo estava perfeitamente tranquilo. Bakugou se sentou num tronco de madeira e ficou observando o trabalho frenético. 

Apesar de estar feliz por ver seu amigo se babando de alegria pela refeição tão aguardada, Bakugou não conseguia deixar de pensar em outras coisas. A quilômetros dali provavelmente um rei maluco planejava alguma coisa muito horrível, que afetaria todos, inclusive aquela família distante que nada a ver tinha com o assunto. Isso graças a uma certa garota com cara de lua cheia que ele tinha largado por lá. 

Provavelmente agora ela estaria aproveitando a vida boa no castelo, com suas novas roupas cor de rosa, perfumes doces e comidas à vontade enquanto o rei buscava um jeito de levá-la de volta pra casa em troca de armas poderosas. Ou talvez ele tivesse aprisionado ela num calabouço escuro e ela estivesse passando frio e fome, mas ele gostava mais de acreditar na primeira opção.

Era preocupante sim, mas ele também não tinha nada a ver com isso. Nenhuma responsabilidade, nem culpa alguma. Nadinha. Ele era uma pessoa totalmente livre, que não se envolveria nas políticas, pois era isso que significava ser livre. Não se preocupar e apenas curtir as coisas boas da vida. Talvez ele devesse inclusive separar uma ovelha para ele assar e se fartar também. 

Enquanto brincava com o saquinho cheio de moedas, Bakugou percebeu que a liberdade nunca tinha sido assim tão chata.

 

*~*~*~*~*~* 

 

As semanas passaram e Bakugou morria de tédio. Ele e o dragão faziam refeições estupidamente grandes, e o bárbaro via motivo nenhum para atacar qualquer caravana já que tinha um monte de dinheiro à disposição. A vida boa que buscou não passava de uma chatice.

Foi numa noite nublada que, deitado, olhando para o céu, Katsuki viu a lua cheia sair de trás de uma nuvem, se revelando perfeitamente redonda. Imediatamente lembrou de Ochako e ele nunca quis explodir o astro tanto como quis naquele momento. Lembrou-se também que a primeira noite que acampou com ela também tinha sido uma noite de lua cheia. 

— Mas você realmente acredita na história dela?! - Bakugou quebrou o silêncio da noite como se fosse óbvio do que ele estava falando. 

Kirishima abriu os olhos de lagarto surpreso. Reparou que o loiro mirava a lua cheia e ligou os pontos. Fez apenas um barulho grave com o fundo da garganta. 

—  Eu também acho que ela não parecia louca. Mas ao mesmo tempo essa história de outro mundo é muito impossível. 

Kirishima fez um muxoxo para depois completar com um grasnado mais agudo. 

— Ela conseguiu o que queria, né? O rei maldito deve estar se revirando pra tentar descobrir como fazer ela voltar. Pelas armas que ela prometeu né, não por ela. Será que ela tá presa? Vão ir pro outro mundo e oferecer ela como troca? 

O dragão rosnou, num som totalmente desgostoso. 

— Eu também não gosto dele, escamoso. Parece que nem o filho dele gosta. 

O dragão abriu a boca bem grande para o alto e fez mais uma sequência de sons ameaçadores. Bakugou sorriu sádico. 

— Eu também adoraria estraçalhar ele em mil pedacinhos e vê-lo queimar. - ele disse com fogo nos olhos. 

Kirishima pareceu se divertir um pouco, para em seguida baixar a cabeça, voltando a um humor mais entristecido. Bakugou também pareceu um pouco desanimado. 

— Eu também não sei...é estranho. Até que ela não era ruim, né? Aquele dia que mergulhamos no mar foi muito engraçado! - o loiro disse se sentando e recobrando a animação, passando a gesticular enquanto falava - Ela tentando se segurar, o que nem precisava porque era eu quem estava segurando ela né, e eu não ia deixar ela cair. Ela parecia um pintinho molhado na chuva, pequena e fofa por todos lados. Depois ela sorriu, ela tava um pouco em pânico, mas eu tenho certeza que no fundo ela sorriu. Você viu como ela sorriu?!

Bakugou olhou para o dragão que o mirava com cara de quem tinha entendido tudo. A expressão reptiliana nunca tinha transparecido tanta malícia quanto naquele momento. 

— Ah vai a merda. - Kirishima viu o loiro se virar pro outro lado, claramente tentando esconder o rosto vermelho. - Você não tem como cheirar e saber, mulheres não são como dragões!

O dragão fez mais alguns sons incompreensíveis para um humano comum e Bakugou o ignorou completamente. Insistente, ele se levantou e foi com o focinho cutucar seu amigo humano exigindo que respondesse. 

— Me deixa em paz, lagartixa voadora. - o loiro disse simplesmente, tentando se livrar dele displicentemente. 

Kirishima não aceitou, abrindo a boca grande cheia de dentes rosnando praticamente em cima do loiro. Era impossível ignorar duas toneladas de dragão babando e rosnando em cima de você, e Kirishima sabia muito bem disso. 

— Não, não e não! Eu não sinto nada por ela, para com isso! - Bakugou disse segurando a cabeça dele pela pele mais mole das narinas e o tirando de perto dele. - Estamos perfeitamente bem por aqui, sem ela, como sempre foi. Se a lua cheia decidiu se aliar com aquele rei desgraçado, o problema é dela. Escolheu o lado errado da guerra. 

Kirishima grasnou, balbuciou, rosnou e chacoalhou no que parecia ser um discurso altamente elaborado. Bakugou acompanhou inicialmente sem interesse, mas as vezes ele precisava admitir que o dragão tinha um pouco de razão.

Ochako apenas queria voltar pra casa, não fazia idéia de quem era o Rei Todoroki. Se ela se aliou a ele, a culpa era deles que a tinham levado até lá. Se eles tivessem ajudado ela a voltar pra casa, ela não pediria ajuda ao rei, e o rei não teria nem como saber da existência desse outro mundo. Se a paz terminasse e o rei dominasse os povos livres com essas terríveis novas armas, a culpa seria deles dois. 

— Isso supondo que ela veio mesmo de outro mundo e não é uma maluca. - Bakugou completou.  

Se sua pata dianteira não fosse curta demais, Kirishima teria batido na testa em total desapontamento. Para ele era óbvio que Uraraka não era maluca, e ele sabia que Bakugou também concordava, só não queria admitir. 

— Você espera o quê então, Kirishima? - Bakugou disse se levantando irritado e em tom de absurdo ele continuou - Que depois de todo esse tempo a gente volte correndo lá, entre na torre, pegue a lua cheia de volta, descubra como devolver ela pro mundo dela, evite uma guerra mundial, tudo isso sem o rei nos matar?

O dragão sorriu concordando feliz. 

— Impossível. - Bakugou completou cruzando os braços, sério. - Vamo logo então, caralho.


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Notas finais do capítulo

Próximo capítulo: "O senhor tem interesse por arquitetura?"



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