A chegada do doutor Chilton naquela tarde deixou todos boquiabertos. Só um verdadeiro milagre faria Miss Polly permitir que ele voltasse a frequentar sua casa. Aquilo significava mais do que um ótimo tratamento para Pollyanna. Na verdade, ninguém sabia dizer o que era mais difícil de curar: as pernas de menina ou o coração de sua tia.

O quarto de Pollyanna se encheu de comoção com a entrada de Chilton, e a doentinha deu-se a falar freneticamente sobre como estava contente. Já Miss Polly não conseguia dizer nada para disfarçar os solavancos que a presença daquele homem causava em seu peito. Corada como um romã, saiu às pressas para seu quarto, na tentativa de manter alguma compostura.

"O que está acontecendo comigo?" Miss Polly se perguntava, trêmula, fitando sua imagem no espelho da penteadeira. Suas pernas falhavam em sustentá-la e suas mãos deslizaram pelo vidro do espelho, de tão suadas, obrigando-lhe a cair na poltrona. Seu rosto estava tão quente que parecia que todo o seu sangue estava concentrado ali. Toda a polidez, dureza, reserva e aparência firme se havia perdido. Miss Polly não podia mais controlar-se. Perdera seus escudos e nunca antes sentiu-se tão vulnerável e livre. Cada aspecto de seu semblante denunciava que quinze anos não foram suficientes para sufocar o amor que sentia pelo doutor Chilton.

Ele estava lá, afinal, depois de tantos anos. Não se tratava de uma fonte de contentamento para Pollyanna somente, mas também para ela, que finalmente admitiu para si mesma: jamais haveria outro lugar onde desejasse a presença daquele homem, se não ali.

Alguém bateu à porta.

— Miss Polly, - chamou Nancy -  os médicos querem ter com a senhora e te esperam na sala!

A dama se recompôs, passou uma toalha no rosto, ajeitou o cabelo e desceu a passos apressados. No instante em que entrou na sala, não pôde impedir seus olhos de procurarem os do doutor Chilton, que já estavam postos nela. Procurou manter-se cordial durante a discussão dos médicos acerca do caso de Pollyanna, esperançosa e impaciente para descobrir as verdadeiras chances de reabilitação de sua amada sobrinha. Não se conteve de alegria quando o doutor lhe afirmou o mesmo que dissera ao Mr. Pendleton.

— As chances de cura são reais. Na verdade, é muito provável que Pollyanna volte a andar, se iniciar o quanto antes um tratamento com meu amigo especialista.

— Oh, isso é maravilhoso! - exclamou Miss Polly, emocionada - Meu anjinho voltará a andar! - as lágrimas rolavam por seu rosto.

Quem conhecia Miss Polly de outros verões não acreditaria naquela cena. Muitos estranhariam ou ficariam confusos, mas Chilton apenas sorriu, com um brilho nos olhos.

— Sim - confirmou ele, profundamente comovido.

 O doutor Warren se despediu ao fim da tarde, mas Chilton ficou por um pouco mais de tempo. Não foram necessárias muitas palavras, nem rodeios, pois quando ele se dirigiu a Miss Polly, um pouco tímido, seus olhares esclareceram o que a teimosia e o orgulho lhes fizeram ocultar até então.

— Obrigada - disse Miss Polly, quase que num sussurro, até repetir com firmeza  -, muito obrigada!

Chilton nada pôde dizer, mas, movido por um impulso incontrolável, envolveu-a em seus braços, e se abraçaram com força, por longos segundos.

Não muito longe dali, Tom via-se outra vez importunado por Nancy.

— Ah, senhor Tom, você não acreditaria no que acabei de ver, nem se o visse com seus próprios olhos!

— Ora, Nancy, diga logo e deixe-me em paz.

— Pois bem, eu digo... - disse ela, em tom de implicância - Eu já sei! Agora eu tenho certeza absoluta e você não dirá que estou errada dessa vez!

— Certeza de quê, criatura? Olhe lá, olhe lá...

Nancy ria, triunfante.

— Descobri, finalmente, quem era o felizardo namorado de Miss Polly.