Amanheceu, PRIMAVERA escrita por Bubuh 2008


Capítulo 3
Capítulo 3




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Na manhã seguinte, quis ir até a casa dela mas minha mãe achou melhor deixar as coisas do jeito que estavam.

O dia estava nublado longe do que vivi na manhã anterior. Parecia que espelhava os sentimentos embutidos em meu coração.

Contrariando minha mãe, fui até a casa dela. Olhei aquele lugar pela última vez, com esperanças de que minha musa aparecesse na janela. Eu queria beijá-la novamente, tocá-la ou apenas dar um “adeus”.

—Poncho, se apresse ou perderemos o avião!

—Já vou, mamãe!

—Filho, é melhor esquecê-la! Falo isso para o seu bem!

—Ela é o meu bem, mamãe!

Meu único consolo era saber que a encontraria nas férias dela. Ela iria pra minha cidade e tudo ficaria perfeito de novo. Pelo menos, bem próximo disso.

Quando chegamos em Liubliana, me apaixonei pela paisagem e isso não estava nos meus planos.

Minha família é descendente de italianos. Descobri isso quando cheguei lá, ao ver meu pai tagarelando de forma engraçada com o taxista que nos levara a nossa nova casa.

Apesar de ser domingo, aquele lugar era bastante movimentado. Todas as lojas funcionavam como em uma quarta-feira.

—Poncho, nós vamos colocar a casa em ordem! Tome esse dinheiro e vá dar uma volta aqui por perto. Em uma hora sairemos para jantar.

—Ok, mamãe!

Se eu estivesse no Brasil, no meu bairro, aquela ordem seria motivos de felicidade. Eu iria à casa da frente e gritaria: “Galega, vamos andar!”. E ela me encontraria correndo com seus longos e loiros fios de cabelo brincando com o vento. Mas ali eu estava só.

Todos que passavam por mim, falavam coisas estanhas. Riam ou faziam cara feia pra mim e eu não sabia como agir. Em algum momento eu teria que me comunicar com aquelas pessoas. E foi aí que decidi usar as palavras que meu pai usou com o taxista.

Atravessei a ruela e lá no fim, bem distante vi os Alpes. Parei ali no meio da rua, enfeitiçado com a beleza daquela paisagem até o som de uma buzina aguda me acordar de minha distração. Era uma bicicleta. E uma menina magrela, alta e morena a pilotava.

A morena conseguiu frear a tempo. Aquilo nos assustou e ficamos olhando um pra cara do outro até eu resolver falar.

—Come si chiama?!

—Mi chiamo Maite!

—Piacere em te conhecer!-misturei sem querer o italiano com português. -Xi, me emboloei!

—Eu sabia que você era brasileiro! Kkkkkk…

—Como assim sabia?

—Por causa do seu sotaque!!! Qual é o seu nome, bambino?

—Me chame de Poncho.

—Ok, Poncho!-ela desceu de sua bicicleta e subiu na calçada. -Se perdeu?! –ela sorriu de forma engraçada.

—Pois é, menina! É o meu primeiro dia aqui e nem sei aonde ir. Na verdade, você sabe se tem uma livraria aqui por perto?

—Olha, que bacana! Minha mãe é dona de uma livraria!

—Sério?! Uau… Estou começando a gostar mais desse lugar!

—Venha comigo, te levarei até lá!

Maite me guiou pelas ruas de Liubliana, como se estivéssemos em sua própria casa. De certa forma, era isso que ocorria mesmo. Apesar de ela ter nascido naquela cidade, seus pais eram brasileiros e isso eu pude notar quando vi a livraria.

Dentre todas as lojas que havia naquele quarteirão, aquela era a que mais chamava atenção. Suas cores fortes, verde e amarela, deixavam qualquer pessoa curiosa. Tanto que corri até ela e abri a porta deixando Maite para trás. E assim como por fora, as cores patriotas tomavam conta do lugar. Ao fundo se ouvia Djavan e um senhor moreno, robusto, veio até mim.

—Salve. Como sta?!

—Sto molto bene, grazie.

—Papai, ele é brasileiro!-Maite falou afobada, atrás de nós.

—Brasileiro? Oh, maravilha! Alguém com quem eu possa treinar minha língua materna. Como você veio parar aqui, bambino?

—Eu estava perdido até que encontrei sua filha, senhor!

—Não me chame de senhor, por favor! Sou muito jovem, pode me chamar de Mariano.

—Prazer, Poncho!-vendo sua mão estendida para mim, a apertei.

—É muito raro encontrar brasileiros por aqui. Você está sozinho, fazendo intercâmbio?

—Não! Meu pai veio a trabalho. Minha mãe e eu viemos acompanhá-lo.

—E quanto tempo ficarão aqui, Poncho?!-Maite me perguntou toda risonha. Por um instante, me iludi com seu jeito. Era muito similar ao da minha loirinha querida.

—Não sei te dizer. Essas coisas são bem imprevisíveis.

—Verdade, meu rapaz! Tem como eu te ajudar em alguma coisa?

—O senhor tem como me arranjar alguns cartões postais daqui, papéis de carta e uns envelopes?!

—Claro, bambino!-pela primeira vez me senti realizado naquele lugar. Havia feito minhas primeiras amizades com pessoas que quando conversavam ao meu lado, eu tinha certeza de que não estavam me xingando.

—É para sua avó?-achei diferente a pergunta.

—Quem me dera ter uma. São pra minha amiga!

—Traga ela pra cá! Ela irá adorar isso aqui.

—Ela já conhece! Por isso aqui estou, =D!

—Ah, o primeiro amor! Lembro-me como se fosse ontem o dia em que conheci Maricel! Andava pelas ruas de Porto Alegre totalmente distraído e ela me atropelara com a bicicleta. -olhei assustado pra Mai e sorrimos um para o outro.

—Bem, adorei conversar com vocês! Mas agora tenho que ir!

—Fique para jantar conosco, amigo!

—Meus pais me esperam, me desculpe!

—Até amanhã então!-Maite veio até mim e me deu um beijo na bochecha.

Fui embora da livraria correndo para minha nova casa. Não podia esperar mais nenhum minuto pra escrever minha primeira carta para a loirinha do meu coração.

Meus pais tinham colocado realmente todo aquele ambiente em ordem, já tinha cara de lar. Eu corri até o lugar em que eles colocaram meus guardados. Quando cheguei lá, fiquei impressionado. Cabia três vezes o meu antigo quarto ali.

Deixei as coisas do jeito que estavam, peguei uma caneta e me joguei na cama. Escolhi as palavras certas pra colocar na carta.

“Acabei de chegar nesse lugar estranho que você chama de lindo. Certo, ele realmente é lindo.

Mas seria perfeito se você estivesse aqui comigo. Bom, eu acabei de conhecer uma família de brasileiros aqui. Isso não é legal?! Eles têm uma filha que deve ter a minha idade. Super simpática e meio bonitinha. Nada que se compare a sua beleza, vida! Por sinal, como estão as coisas aí? Conte-me tudo. Saber que você está aí é o que me ajuda a sobreviver!”

Foi fácil até! Meus sentimentos estavam prontos pra invadirem o Brasil.

No dia seguinte, fui para a escola. O ambiente mais esquisito em que já pisei na minha vida. As paredes tanto dentro como fora tinham cor verde musgo, aquilo parecia uma academia militar. Mas pra minha felicidade, Maite estudava naquela academia e na minha sala. Eu tinha alguém pra conversar e pra me ensinar a viver ali.

—É só seguir as regras, Poncho! E tudo dará certo!

—E quais são as regras?

—Te passarei daqui a pouco, agora fique quieto!

Os professores pareciam treinadores do exército. E a diretora, uma capitã enérgica. Isso me rendera sérios problemas psicológicos. Tanto que comecei a fazer curso de culinária como terapia.

Minha mãe, que sempre pareceu frágil e quebrável, lidou melhor com a situação do que eu. Ela não parava em casa um segundo que fosse. Um dia estava dando aulas de etiqueta na casa do vizinho, outro dia ensinando uma criança de nove meses a falar. Meu pai mal aparecia em casa por causa do bendito trabalho. Se eu soubesse que seria assim, teria feito de tudo pra convencer minha mãe a ficarmos no Brasil. Eu estaria feliz e ao lado da garota que amava.


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