Se tinha algo que Kim Yugyeom odiava, esse algo era o dia dos namorados. Ele preferia ter que assistir a aula de matemática da Senhora Lee por três horas seguidas toda segunda do que ter que viver por mais um dia dos namorados. O menino de cabelos negros não conseguia entender qual era a necessidade daquele tipo de data. Só servia para as empresas de chocolate lucrarem em cima dos outros e para enaltecer os meninos populares enquanto entristecia aqueles não tão favorecidos.

O dia dos namorados em seu país funcionava da seguinte maneira: No dia 14 de fevereiro, as meninas davam chocolates caros ou feitos em casa para os homens que amam e chocolates mais baratos e genéricos para parentes ou colegas de trabalho. Um mês depois os meninos retribuiam os chocolates que ganharam com doces.

Desde que se entendera por gente, os únicos chocolates que Yugyeom recebeu foram os de sua mãe. Não que isso importasse, afinal, o menino odiava chocolate com todas as suas forças.

Dando um longo gole em seu achocolatado, Kim abriu o seu armário apenas para arrancar o livro que precisaria para a próxima aula.

— Bom dia, Gyeom. — A voz de Bambam chamou a atenção do garoto, que foi em direção ao seu amigo, resmungando uma resposta para o tailandês, que ajeitava o cabelo platinado no pequeno espelho que tinha preso dentro de seu armário. — Que humor, hein.. — riu antes de se virar novamente para o rapaz mais alto. — Como estou?

— E o que importa? — retrucou, ganhando um olhar torto de Bambam.

— Eu preciso estar bonito. Eu já te falei, Gyeom. Eu vou aproveitar o dia dos namorados para me declarar para o Jackson. — O tailandês voltou a sorrir, ajeitando o uniforme antes de enfim fechar a porta do seu armário.

— Dia dos namorados é coisa de idiota. — resmungou.

— Sei… Você só fica assim porque nunca ganhou um chocolate de ninguém. Mas não fique assim, Gyeomie. O seu dia chegará.

— E quem disse que eu quero? Você sabe que eu odeio chocolate. 

— É, por isso que você está bebendo essa bebida de chocolate? E é por isso que você me fez pagar uma fatia de bolo de chocolate para você semana passada? — retrucou com uma risada, recebendo um tapa no ombro do amigo. — Eu já disse. O seu dia vai chegar.

Yugyeom já havia mencionado o quanto ele odiava o dia dos namorados? Pois ele realmente odiava aquela data e isso estava escrito em seu rosto. Por um momento desejou ter mentido para sua mãe dizendo que não estava se sentindo bem para poder ficar em casa e não ter que passar por esse inferno na escola. Já não bastavam as aulas chatas, ainda tinha que ficar ouvindo todo mundo ao seu redor falar sobre isso. Como ninguém havia percebido o quão idiota essa data era? Para que gastar seu tempo e dinheiro com chocolate? Quer dizer, gente como Park Jinyoung não precisava de mais uma sacola enfeitada cheia de chocolate dentro. Só no momento, ele já carregava umas quatro, sem contar as que Yugyeom viu penduradas em sua mão ou sendo entregues para si no decorrer do dia. Com certeza o menino de sorriso amigável, uniforme impecável e aparência angelical não iria se dar ao trabalho de comer tudo aquilo. Muito pelo contrário. Yugyeom tinha a teoria de que gente como ele acabaria jogando boa parte daquilo fora, afinal, quantos chocolates um homem desses conseguiria comer? Tinha certeza que não muitos. Ele nem ao menos parecia gostar de chocolate! Não que Yugyeom gostasse.

O já não tão esperado intervalo chegou, fazendo o moreno se arrastar até o refeitório indo de encontro a Bambam, que segurava uma caixinha firmemente, murmurando alguma coisa para si sem parar. 

— Ainda não entregou essa merda? — perguntou assim que sentou no lugar vago, vendo seu amigo murchar ao seu lado.

— Estou com medo. E se ele não quiser nada comigo? — Largou a caixinha na mesa, suspirando. Jackson, um menino chinês do terceiro ano, era seu amigo há alguns meses, desde que se esbarraram em uma lanchonete qualquer e Bambam acabou derrubando o lanche do mais velho e, como em uma típica cena de um filme clichê qualquer, o tailandês se apaixonou à primeira vista pelo garoto.

— Então ele vai ser um idiota. Deixa de besteira e fala com ele. Tenho certeza de que ele vai ficar feliz em receber um presente do dia dos namorados. Ele parece ser o tipo de pessoa que se derrete por esse tipo de besteira.

— Você fala como se não fosse ficar feliz em receber algo assim. — O tailandês riu.

— Você sabe que não. Eu não gosto de chocolate. — repetiu pela milésima vez.

— Se você não gosta de chocolate, imagino que não vá querer isso. — A voz de Youngjae cortou os dois meninos, chamando a atenção de Yugyeom. O menino de rosto redondo, bochechas fofas e olhos pequenos escondidos atrás de um sorriso segurava uma sacola lilás na ponta de um de seus dedos.

— Youngjae…? O que é isso? — O moreno perguntou, completamente confuso. — Youngjae, você…

— Antes que você fale alguma besteira, não, isso não é meu. Eu já dei meu chocolate pro Jaebum hyung e eu só vou dar chocolate para o meu namorado e para ninguém mais. — o sorriso desapareceu do rosto do rapaz, que fez uma careta antes de deixar seus lábios subirem novamente. — Mas alguém me pediu para entregar isso diretamente para o Yugyeom e apenas para o Yugyeom. — Colocou a sacola na frente do destinatário, antes de se sentar no lugar vago naquela mesa.

— Quem foi que pediu pra entregar isso? — Bambam perguntou antes que o mais alto do trio pudesse ter qualquer reação.

— Eu não vou falar. A pessoa me pediu para manter segredo. — O sorriso se transformou em um bico.

— Se vocês estão tentando fazer alguma brincadeira comigo ou me dar isso por pena, já aviso que não vai funcionar e eu não quero. Eu já falei que odeio chocolate. — O moreno interrompeu seus amigos que discutiam, o platinado querendo que Youngjae falasse quem havia enviado aquilo e o outro insistindo que não iria lhe dizer nada.

— Gyeom, meu querido, eu gastei todo o dinheiro que eu tinha comprando esse chocolate para o Jackson.

— Eu já falei que eu só dou chocolate para o meu namorado. Yug, se você não aceitar ele vai ficar triste.

— Então é um homem! Já pode me falar quem é. — Bambam interrompeu, voltando à briga que estava tendo. Mas Yugyeom não parecia prestar mais atenção, os olhos fixos na sacola lilás à sua frente. Um pouco receoso, abriu a embalagem, encontrando uma pequena caixa com uma fita igualmente lilás e um bilhete escrito à mão em um papel da mesma cor.

“Perdoe-me por ter sido covarde e ter pedido para Youngjae te entregar esse presente ao invés de fazê-lo pessoalmente, mas não teria coragem de te olhar nos olhos e te deixar saber o que sinto dessa maneira.

Passei a noite fazendo esses chocolates para você, me perguntando se você iria realmente gostar do que eu fiz, me perguntando se apenas essas trufas caseiras seriam o suficiente para transmitir tudo o que sinto.

Mas ainda assim espero que esse pequeno presente faça com que o seu belo sorriso volte ao seu rosto. Seu sorriso é capaz de animar o meu pior dia e iluminar a manhã mais nublada e triste de qualquer inverno. 

Feliz dia dos namorados, Kim Yugyeom.”

Ao ler aquelas palavras, Yugyeom não conseguiu conter o sorriso que brotou em seus lábios, se apressando para abrir a caixinha, desfazendo o laço lilás sem pensar duas vezes. Logo pegou uma das pequenas trufas e a levou até a boca, comendo-a em uma mordida. Estava tão focado no presente à sua frente, que não notou quando seus amigos pararam de brigar ou quando Jaebum, namorado de Youngjae, chegou na mesa.

— Achei que você odiava chocolates, Gyeom. — A voz do tailandês tirou o moreno do transe, fazendo seu rosto ganhar uma coloração avermelhada ao perceber que o olhar dos três estava em si.

— E eu odeio. — mentiu, fechando a caixinha com uma careta.

— Está escrito na sua cara como você odeia. — Bambam riu, recebendo um tapa de Yugyeom. — Eu te disse que seu dia iria chegar, não disse?

— O hyung vai ficar muito feliz quando souber que você gostou do chocolate, Yug. — Youngjae falou com um sorriso no rosto.

— Então é um homem do terceiro ano? — O tailandês interrompeu, recebendo uma careta de Youngjae e uma risada de Jaebum. — Hyung, você sabe quem é, né? — Ignorando a discussão que novamente começava à sua frente, Yugyeom se permitiu abrir novamente a caixinha, comendo mais uma das trufas.

Não importa o que aconteceu, Yugyeom continuava odiando o dia dos namorados e ninguém poderia afirmar o contrário. Mesmo que aquele maldito sorriso não tivesse saído do seu rosto desde o momento em que recebeu aquela sacola lilás que carregava consigo de um lado para o outro, mesmo no intervalo entre uma aula e outra. Não era como se quisesse se agarrar naquilo com medo do pequeno presente sumir e no fim descobrir que aquilo não se passava de um sonho, mas se deixasse o chocolate dentro de seu armário, ele poderia acabar derretendo, o que seria um desperdício. Não que gostasse de chocolate, mas seria triste se o esforço de alguém fosse jogado fora assim, por um descuido de Yugyeom.

E falar em alguém, o menino moreno continuava a se perguntar quem havia sido o autor daqueles chocolates, já que Youngjae saiu batendo o pé do refeitório dizendo que não podia contar quem havia mandado o presente, seguido de Jaebum que só conseguia rir da situação. Era apenas uma questão de curiosidade, nada mais do que isso. E foi apenas por curiosidade que passou a última aula com os olhos fixos no quadro branco coberto de fórmulas de física da qual Yugyeom não parecia ter ouvido para que elas serviam. Sua mente estava muito ocupada fantasiando como seria o menino que lhe enviou aquele presente. Pelo sabor do chocolate, deveria ser um rapaz com mãos suaves e delicadas, usando esse talento para fazer trufas deliciosas. Yugyeom conseguia imaginar um sorriso tímido mas sincero no rosto do desconhecido enquanto cozinhava, seu corpo pequeno coberto com um avental amarelo, os cabelos presos para que nenhum fio caísse na panela. 

Antes que sua imaginação pudesse ir além, o sinal tocou, avisando o final daquela aula. O moreno rapidamente juntou suas coisas, esperando por Youngjae e Bambam para enfim sair da sala de aula.

— Me desejem sorte. — O tailandês respirou fundo, recebendo palavras de apoio dos seus amigos, antes de se despedir para ir encontrar Jackson, como havia combinado com o chinês no dia anterior. Youngjae o deixou pouco tempo depois, já que havia compromisso com o clube de música da escola. Yugyeom ainda tinha algum tempo antes da reunião do clube de dança que participava começar, então aproveitaria aquele tempo para comer algo e, quem sabe, descansar um pouco.

Ainda com a sacola em mãos, o moreno se dirigiu ao seu armário para guardar seus livros e pegar sua roupa de treino. Foi então que encontrou com Jinyoung. O rapaz estava do outro lado do corredor, uma sacola azul com alguns laços saindo de si pendurada em seu braço, enquanto tentava encaixar as que recebeu ao longo do dia em seu armário. Mas o olhar do mais velho foi de encontro ao de Yugyeom, como se notasse que estava sendo observado. No momento a vontade do mais novo foi de sair de lá rápido, com o mal humor estampado em seu rosto, no entanto o peso da leve sacola lilás em suas mãos o lembrou do presente que havia recebido e, antes que pudesse pensar no que estava fazendo, levou o embrulho de encontro ao próprio peito, abraçando-o. O olhar de Jinyoung foi do seu rosto para o objeto em suas mãos, fixando-se ali por alguns segundos antes de voltar a encontrar os olhos de Yugyeom enquanto seus lábios subiam sutilmente em um sorriso, o que causou uma careta no rosto do mais novo, fazendo-o se retirar do corredor no mesmo instante.

Como o senhor popular da escola tinha a audácia de rir de si? E daí que não estava desfilando pelos corredores com vários presentes diferentes? Era melhor receber apenas um e poder aproveitar com calma do que receber vários e no final não aproveitar nenhum.

No final, Yugyeom passou o resto do seu intervalo com uma careta no rosto e agarrado na sua sacola lilás.

~☆~

O dia seguinte ao dia dos namorados era sempre uma incógnita, mas Yugyeom gostava de poder voltar para a escola sem precisar ouvir sobre a data comemorativa a cada passo que dava. Não que o assunto ainda estivesse totalmente morto, afinal, ainda dava para ouvir as fofocas sobre acontecimentos marcantes do dia anterior pelos corredores, grupinhos de amigos se gabando sobre os chocolates que deram, encontros ou namoros que começaram ou se lamentando por não terem recebido nada ou por suas confissões não terem dado certo. E foi nesse clima que encontrou Bambam e Youngjae, parados na porta do armário do coreano.

— Por favor, me fala quem foi que enviou o chocolate pro Gyeom! — O tailandês insistia, batendo o seu sapato preto que combinava com o uniforme da escola no chão.

— Eu já falei que não vou te dizer quem é! — O outro rebateu, claramente sem paciência.

— Ainda discutindo sobre isso? — O mais alto do trio se fez presente.

— Eu só estou tentando descobrir quem te enviou os chocolates.

— E eu já falei que não vou te dizer! — Youngjae bateu a porta do próprio armário para fechá-la, deixando claro sua irritação.

— Como foi com o Jackson ontem? — O moreno perguntou, tentando desviar do assunto. Por mais que estivesse curioso para saber quem era o autor do presente que talvez tivesse feito Yugyeom gostar um pouco mais de chocolates, não sabia se estava pronto para descobrir a identidade do cozinheiro misterioso e se frustrar. Não que tivesse desejado que fosse alguém em específico. Definitivamente não tinha passado a noite sonhando que aquele chocolate fosse presente de alguém com a aparência angelical, sorriso largo e corpo magro. Alguém exatamente como Mark, o americano do terceiro ano que fazia parte do seu clube de dança. Jamais passaria a noite sonhando com o rapaz de cabelos arroxeados em seus braços depois de confessar por espontânea vontade que era o autor dos chocolates. Só não sabia se estava pronto para encarar a verdade.

— Foi ótimo! — o rosto de Bambam se iluminou, como se o assunto anterior nunca tivesse existido. As feições de Youngjae mudaram, demonstrando como ele estava feliz pela súbita mudança na conversa. — Você tinha razão, Gyeom. Ele adorou, ficou feliz com o chocolate, disse que também gostava de mim, me beijou.. Enfim, nós vamos a um encontro sexta depois da aula. — o sorriso nos lábios do tailandês era sincero e aquilo aquecia o coração do mais alto. Talvez o dia dos namorados tivesse algo de bom. — E é por isso que eu quero descobrir quem te enviou o chocolate e te arrumar um encontro! — a irritação voltou ao rosto de Youngjae.

— Eu já te falei que eu não vou falar quem é! Quando ele quiser ele vai falar com o Yugyeom!

— Por favor! Eu sei que você quer ajudar o Gyeom a desencalhar tanto quanto eu quero. — suplicou, recebendo um tapa do moreno mais alto, mas ignorou o ocorrido. — Se não quisesse, não teria aceitado servir de pombo correio.

— Na verdade, eu só aceitei pro hyung parar de me infernizar e sair logo da casa do Jaebum hyung pra que eu pudesse transar com meu namorado em paz.

— A-há! Então é algum amigo do Jaebum hyung! — Youngjae revirou os olhos, saindo do corredor batendo o pé, ignorando qualquer outro comentário de Bambam.

O resto do dia passou exatamente como qualquer dia de aula normal. As aulas da senhora Lee continuavam sem fazer sentido nenhum, enquanto a aula de história continuava curando a insônia de qualquer aluno presente naquela sala de aula e Yugyeom não poderia estar mais feliz por isso, mesmo que sua mente ainda se perdesse em perguntas relacionado ao chocolate que recebeu no dia anterior.

Quando o sinal avisando o final das aulas tocou, a turma toda se levantou sem esperar a liberação do professor, que não parecia mais se importar com isso.

— Eu vou no banheiro e nos encontramos na porta da escola. — anunciou Youngjae, colocando a mochila nas costas. Como de costume, toda quarta feira depois da aula se reuniam em algum lugar para jogar video game, tomar sorvete ou apenas conversar sobre qualquer coisa. Os outros dois apenas assentiram, reunindo o material com calma.

— Eu também vou ao banheiro. — Yugyeom anunciou, saindo ao receber uma confirmação de Bambam.

Estava distraído com seu celular enquanto caminhava até o banheiro masculino do andar, mas as vozes que ouviu vindo de dentro do lugar chamaram sua atenção e o impediram de entrar.

— Eu to falando, hyung. Ele gostou do chocolate. E eu já te disse que eu não falei que foi você que fez. — a voz de Youngjae era baixa e soava um tanto quanto desesperada.

— Ok, ok, eu acredito… Mas ele não parecia muito feliz ontem quando me viu. — a voz desconhecida suspirou. Era uma voz grossa que Yugyeom nunca havia ouvido na vida, o que instigou sua curiosidade para saber o autor dos doces.

— Eu te falei, ele fica de cara feia todo dia dos namorados, mas eu te garanto que ele sorriu feito um bobo quando abriu o presente e ficou andando com aquela sacola pra cima e pra baixo. — o amigo do moreno riu. — Muito obrigada por fazer meu amigo sorrir, hyung. Só espero que um dia você tome coragem para se declarar pra ele.

— Depois da cara que ele fez para mim, não sei se teria coragem… — a voz desconhecida suspirou. Sem conseguir conter a curiosidade, Yugyeom deu um passo para frente, o suficiente para ver o reflexo dos meninos que conversavam sem se fazer presente. Mas ao ver quem estava na frente de Youngjae tirou toda e qualquer possível reação que o moreno poderia ter. “Não pode ser…” era tudo o que pensava, mesmo no momento em que virou e saiu correndo de encontro a Bambam. “Não tem como ser verdade”