Trinta e sete graus escrita por Senhorita


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Aviso: morte da personagem principal e alusão a um purgatório.



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Era um dia quente de verão, trinta e sete graus, umidade em 70%, quando Célia viu o carrinho de picolé. Andar até o outro lado da rua foi difícil - calor infernal, o chinelo verde quase derretendo no asfalto - e ela quase perdeu o homem. Havia suor acumulado na testa dela - “um picolé de uva, por favor” - e Célia limpou com as costas da mão antes de tirar o dinheiro do bolso. Trinta-e-sete-graus, verão, umidade em 72%, e Célia abriu o picolé. O homem seguiu seu caminho, um sino barato balançando, a rua vazia porque ninguém sairia nesse tempo. Havia o ti-li-lim do sino, o chiado do asfalto, a respiração de Célia e o Sol. Já na terceira mordida - o sorvete tentando derreter antes de ser devorado, o suco pingando nos dedos, o açúcar grudento -, Célia decidiu continuar andando. O chinelo verde derretendo no asfalto, o calor aumentando e aumentando. Célia terminou o picolé e jogou o palito no lixo do fim da rua. Atravessando a faixa, a correia do chinelo arrebentou. Célia xingou a sorte, se abaixou para puxar o chinelo.  Um caminhão virou a esquina, a luz nos olhos do motorista.

Célia ainda tinha que voltar para casa. 

 

Era um dia quente de verão, trinta e oito graus, umidade em 71%, quando Célia viu o carrinho do picolé. Andar até o outro lado da rua foi difícil - calor infernal, o chinelo rosa quase derretendo no asfalto - e ela quase perdeu o homem. Havia suor acumulado na testa dela - “um picolé de limão, por favor” - e Célia limpou com as costas da mão antes de tirar o dinheiro do bolso. Trinta-e-oito graus, verão, umidade em 73%, e Célia abriu o picolé. O homem seguiu seu caminho, um sino barato balançando, a rua vazia porque ninguém sairia nesse tempo. Havia o ti-li-lim do sino, o chiado do asfalto e o sol. Já na terceira mordida - o sorvete tentando derreter antes de ser devorado, o suco pingando nos dedos, o açúcar grudento. Célia decidiu continuar andando. O chinelo rosa derretendo no asfalto, o calor aumentando e aumentando - trinta e oito, trinta e nove, quarenta. Célia terminou o picolé e jogou o palito no lixo do fim da rua. Atravessando a faixa, a correia do chinelo arrebentou. Um caminhão virou a rua - a luz refletida nos olhos do motorista.

Célia ainda tinha que voltar para casa.

 

Era um dia quente de verão, trinta e nove graus, umidade em 72%, quando Célia viu o carrinho do picolé. Andar até o outro lado da rua foi difícil - calor infernal, o chinelo roxo quase derretendo no asfalto - e ela quase perdeu o homem. Havia suor acumulado no testa dela - “um picolé de morango, por favor” - e Célia limpou com as costas da mão antes de tirar o dinheiro do bolso. Trinta-e-nove graus, verão, umidade em 74%, e Célia abriu o picolé. O homem seguiu seu caminho, um sino balançando, a rua vazia porque nunca haveria mais ninguém. Só o ti-li-lim do sino, o chiado do asfalto e o Sol. Já na terceira mordida - o sorvete tentando derreter antes de ser devorado, o suco pingando nos dedos, o açúcar grudento. Célia decidiu continuar andando. O chinelo roxo derretendo no asfalto, o calor aumentando e aumentando - trinta nove, quarenta, quarenta e um. Célia terminou o picolé e jogou o palito no lixo do fim da rua. Atravessando a faixa, a correia do chinelo arrebentou. Um caminhão virou a rua - a luz refletida nos olhos do motorista.

Célia ainda tinha que voltar para casa.

 

Era um dia quente de verão, quarenta graus, umidade em 73%, quando Célia viu o carrinho de picolé e percebeu que nunca voltaria para casa.


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Notas finais do capítulo

Eu queria dizer que a Célia fez alguma coisa de errado para merecer isso, mas eu criei isso em cinco minutos, então eu não sei o que ela fez para desperar a fúria de quem quer que seja o responsável.