Fix You escrita por deemoonyy


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Apenas um devaneio em meio a quarentena. Inspirado na música fix you do Coldplay



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Quando você tenta o seu melhor, mas não tem sucesso

Quando você consegue o que quer, mas não o que precisa

Em que momento percebemos que as coisas já não estão mais no caminho certo e há algo de errado?

Aurélio não sabia responder quando foi que começou a notar o afastamento de Julieta, mas naquele momento tinha certeza de que havia algo errado.

Julieta sempre fora focada no trabalho. Agora, como patrona do Vale, ainda mais. Entretanto desde o casamento ela priorizava recolher-se junto a ele. Com os netos correndo pela casa o dia inteiro, a noite era o único momento de silêncio na mansão e eles aproveitavam para conversar e tirar um instante a sós. Há duas semanas ele mal a via. Cruzavam-se rapidamente nas refeições e durante a noite ela se recolhia quando ele já estava dormindo e quando ele acordava, ela já não estava mais lá.

Naquela noite ele decidiu que a esperaria. Tentaria entender se havia feito algo errado ou se havia algo a preocupando tanto que a fizera simplesmente esquecer dele.

Pouco após a uma da manhã ouviu os saltos dela chocando-se contra o chão do corredor. A maçaneta girou e a porta fora aberta com calma, certamente tentando fazer o mínimo de barulho possível para não o acordar.

O breu do quarto não permitiu que Julieta notasse o par de olhos azuis a sua espreita. Os calçados foram deixados ao lado da porta e os cabelos soltos com um suspiro aliviado.

—Boa noite, minha esposa. – a voz fez com que um arrepio percorresse sua espinha.  

—Boa noite. – o tom de voz cordial o fez suspirar. Poderia ser considerado tolo, mas esperava que ao entrar no quarto e vê-lo acordado, sua amada Julieta reaparecesse.

As vestes rapidamente foram trocadas e seu espaço na cama ocupado, virando na direção oposta a dele.

—Quer conversar sobre o que está acontecendo? – tentou ser o mais compassível. Tentaria a entender antes de acusá-la.

—O que está acontecendo? – Por mais que soubesse a que ele se referia, não queria ter aquela conversa. Se não pudesse evitá-la para sempre, que o fizesse apenas naquele momento.

O silencio pairou por um instante. Só era possível ouvir as respirações, a dele muito mais profunda que a dela.

—Eu fiz algo errado? – a voz saiu entrecortada enquanto ele encarava o teto e ouvia um suspiro vindo dela.

—Claro que não, Aurélio. – o corpo girou, parando na mesma posição que ele.

—Então o que há? – olhou-a de relance. – Parecemos dois estranhos nesta casa. Mal nos vemos, se quer conversamos...

—Eu ando ocupada, apenas isso. – por mais que fosse mentira, buscou a mão dele para acarinhar, tentando assim parecer convincente.

—Eu... – suspirou – só gostaria de ter a minha Julieta de volta. Eu sei que seus negócios são muito importantes, mas... eu sinto a sua falta.

Encontravam-se de frente um para o outro agora e quando ele acarinhou seu rosto e lançou seus lábios contra os dela, Julieta se permitiu levar.

Por que estava escondendo a verdade dele? Era apenas isso que passava em sua mente.

Quando você se sente cansado, mas não consegue dormir

Preso em marcha ré

Julieta o afastou quando sentiu sua língua tentar ganhar espaço.

—Eu realmente estou cansada. – ela sussurrou ao encostar suas testas.

Ele a soltou e tentou dar-lhe um sorriso, mas algo lhe dizia que aquela conversa não havia servido em nada.

—Descanse, meu amor. – depositou um beijo em sua testa.

Os corpos viraram em direções opostas novamente e agora ele se perguntava qual era a pior sensação, não a ter com ele ou tê-la daquela forma.

A noite pareceu interminável para ambos. Por mais que estivessem cansados, o sono resolveu não os visitar.

Aurélio não conseguia se recordar de nenhum momento em que uma situação parecida se instalou entre eles durante os seis anos de casados. E por mais que refizesse o último mês inteiro em sua cabeça, não conseguia entender o que estava acontecendo com a mulher que dormia a seu lado, ou fingia.

Cansada de tentar e não conseguir dormir, Julieta se levantou com os primeiros raios de sol.

E as lágrimas começam a rolar pelo seu rosto

Quando você perde algo que não pode substituir

A casa ainda estava silenciosa quando Julieta se trancou no escritório. Aquele havia sido seu refúgio durante a tormenta que acontecia dentro dela.

O couro da cadeira se moldou a suas costas, acomodando-a e ela deixou-se descansar um segundo antes de mergulhar nos contratos que estavam espalhados por cima de sua mesa.

A mente vagou para a conversa que tivera com o marido na madrugada e a mão buscou o ventre vazio. Queria ter gritado para ele tudo o que estava sentindo, queria ter posto para fora o que a estava matando, queria ter partilhado a dor pela qual ele nem sabia que ela estava passando, mas fora fraca. Não conseguia se quer falar para si mesma o que havia acontecido, como poderia dizê-lo?

As lagrimas vieram sem permissão e ela quis gritar. Aquilo seria carma pelo ser desprezível que havia se tornado após Osório? Aurélio certa vez lhe dissera que a vida lhe devia felicidade e ela realmente estava sendo feliz ao lado dele, mas em algum momento teria que pagar pelas coisas ruins que havia feito.

Quando você ama alguém, mas é desperdiçado

Pode ser pior?

Duas batidas foram depositadas na porta e ele ouviu a permissão para entrar. Varreu o local atrás da mulher e a encontrou reunindo documentos.

—Bom dia. – ele sorriu. – Mercedes me disse que você não tomou café...

A bandeja fora deixada em sua frente e ela tentou sorrir ao ver que ele havia colocado uma rosa sem espinhos nela.

—Bom dia. – ela respondeu e buscou o seu olhar. – Obrigada, mas eu estou atrasada para a reunião com o senhor Domingos Guimarães. E além do mais, não sinto fome.

Fora impossível esconder o desapontamento que sentira.

—Certo. – ele suspirou e passou as mãos pelos cabelos grisalhos. – Tudo bem.

A bandeja fora recolhida e a passos largos ele a deixou sozinha novamente.

Céus, o que havia acontecido a Julieta? Por que ela nem se quer dava-se ao trabalho de fingir que ainda se importava com ele?

Luzes te guiarão até em casa

E aquecerão seus ossos

E eu tentarei consertar você

O livro fora abandonado no criado mudo e a cabeça recostou-se no travesseiro a espera do sono. Já não tinha noção das horas e não fazia questão de ter. Mais uma vez ela não estava ali com ele e ele se perguntou se aguentaria esperar que tudo aquilo passasse. Tudo aquilo que ele se quer sabia o que era.

A porta se abriu e ele fechou os olhos, tornando a abri-los após ela deitar-se. E mais uma vez o silêncio o fez questionar-se.

Um soluço que tentava ser abafado o fez olhá-la rapidamente. A respiração desregulada o deu certeza de que ela chorava e por mais que quisesse respeitar o espaço que ela havia posto entre eles, seu corpo ela ligado ao dela magneticamente. Quando se deu conta já a envolvia com seus braços e tentava acalmá-la.

Bem lá em cima ou lá embaixo

Quando você está apaixonado demais para desistir

—Eu preciso saber o que está acontecendo, Julieta. – a apertou mais entre seus braços. – Me sinto de mãos atadas. E eu não sei como ajudá-la assim.

—Não está acontecendo nada, já lhe disse. – ela tentou conter o choro para soar fria.

—Você não é o tipo de pessoa que chora por nada.

—É apenas exaustão. Somente isso.

—Eu já a vi exausta muitas vezes antes e posso garantir que nunca chorou por isso também. – cansada de mentir ela simplesmente calou-se. – Até quando pretende esconder as coisas de mim?

Mas, se você nunca tentar, nunca saberá 

Exatamente qual é o seu valor

— Eu não posso continuar assim. – ele suspirou soltando-a. – Eu não posso continuar. Não posso me punir a cada segundo por algo que eu nem sei se foi culpa minha. Não posso continuar esperando que as coisas voltem ao normal quando você se quer conversa comigo. Não posso continuar me esforçando sozinho por esse relacionamento.

O que ela esperava que acontecesse? Estava acostumada com Aurélio sendo compreensivo com tudo e esqueceu-se que ele também era humano, e que em algum momento chegaria em seu limite.

Luzes vão te guiar para casa

E incendiar seus ossos

E eu vou tentar consertar você

—Eu estive grávida. – começou meio incerta e o viu encará-la. – Há um mês senti-me mal e houve um atraso em minhas regras. – Suspirou e encarou os próprios dedos. – Pensei que fosse os sinais que a idade estava chegando e não me importei muito. Dias depois começaram as tonturas, os mal-estares aumentaram e eu soube que havia algo a mais. – a língua umedeceu os lábios e ela buscou forças para continuar. – Procurei doutor Jonatas e depois de um monte de exames descobrimos que eu estava gravida. – a voz vacilou um pouco e as lagrimas tornaram a brotar. – Céus, uma gravidez na minha idade não é algo comum e ele me alertou que poderia ser uma gestação bem complicada, mas eu estava tão feliz. Tão feliz que tinha um pedaço seu crescendo em mim, Aurélio. O fruto do nosso amor. Uma criança que havia sido concebida da melhor forma possível. – As lágrimas já não podiam ser controladas e ela sentia como se estivessem lavando sua alma. – Contudo no dia que eu ia lhe contar fui tomada por cólicas horríveis e... – teve de respirar fundo ao relembrar. – naquela tarde tive um sangramento...

Lágrimas rolam no seu rosto

Quando você perde algo que não pode substituir

Lágrimas rolam pelo seu rosto

E eu

—Por que não me contou isso antes? – as lagrimas também banhavam o rosto do homem que estava em choque com tudo aquilo. – Você não precisava ter passado por isso tudo sozinha, eu estava aqui, sempre estive.

—Eu não sabia como te contar que Deus nos abençoou e que não fui forte o suficiente para proteger o nosso bebê. – o pequeno corpo se encolheu. – Pensei que talvez não contar fosse o melhor a se fazer.

—Você não podia ter tomado essa decisão por mim. – a voz saiu mais alta do que ele gostaria e mão passou nervosamente pelos cabelos buscando se acalmar. – Tínhamos de ter passado por isso juntos. – se aproximou dela e a acolheu entre seus braços. – Você não está mais sozinha no mundo, meu amor. Precisa entender que eu estou aqui para ampará-la seja em momentos bons ou ruins. E esse era um momento que precisávamos sofrer juntos.

Lágrimas rolam pelo seu rosto

Eu te prometo que vou aprender com meus erros

Lágrimas rolam pelo seu rosto

E eu

—Me desculpa. – sua voz soou baixo em meio aos soluços ao entender que ele estava certo.

—Eu só preciso saber que você não o fara mais. Que não omitirá as coisas de mim e me afastará sem motivos. – acarinhou seu rosto e a fez olhá-lo. – Eu entendo a sua dor, um filho teria sido nossa maior benção, mas me partiu o coração vê-la tratar-me com indiferença.

—A partir de hoje sem mentiras ou omissões. – ela levou a mão até o rosto másculo e enxugou suas lágrimas.

Luzes te guiarão até em casa

E aquecerão seus ossos

E eu tentarei consertar você

—Sem mentiras ou omissões. - ele reafirmou a aconchegando contra seu peito e beijou-lhe a testa.

Tinha todos os motivos para estar chateado com ela, mas deixaria tudo de lado para ampará-la. Se para ele estava sendo difícil raciocinar tudo aquilo, para ela deveria estar sendo mil vezes mais dolorido.


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