Entre o Céu e o Inferno. escrita por Sami


Capítulo 34
Capítulo XXXIII


Notas iniciais do capítulo

Olá amores, como vão?
Mais um capítulo prontinho para vocês e com o tão aguardado resgate da Alana, tem algumas respostas aqui e outras perguntinhas que terão respostas sim!!

Boa Leitura!



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CAPÍTULO XXXIII

 

Lena West tinha certeza de que nunca se arriscara tanto como estava prestes a fazer naquele momento e mesmo tendo em mente do quão arriscado seria fazer o que planejara fazer, ela nunca se viu tão firme em sua decisão como estava. Seus olhos recaíram sobre o braço escondido pela manga de sua blusa, o contato de sua pele com a lâmina fria e afiada da adaga lhe causava um arrepio discreto, seu sangue parecia estar quente em seu corpo e ela sabia o que isso significava: Raiva.

Ouviu Lucius resmungar algo mais atrás, estava o escutando desde a última conversa com Alana, de acordo com suas próprias contas, pelo menos três dias se passaram ali no inferno. Retornou a encarar o inferno do outro lado do vidro, a visão não era das melhores, mas com os quatorze anos vividos naquele lugar, ela aprendera a pelo menos se familiarizar com aquele cenário horrendo e tão perturbador. Principalmente o som que vinha das almas condenadas.

O demônio continuou a resmungar, ela não estava prestando tanta atenção assim, mas bem sabia que se tratava do acordo que ele fizera com Alana, desde que ela pedira para falar com Kambriel — que a mulher sabia ser o arcanjo enviado para a terra — ele tentava encontrar uma maneira de burlar o trato. Ouvira pouco sobre o assunto, apenas o suficiente para entender que Lucius não iria simplesmente permitir que ela falasse com o arcanjo sem que ele não tentasse algo a mais e, era por esse mesmo motivo que Lena não pensou duas vezes em agir. Tinha diante de si dois pesos em sua própria balança, a vida da filha e a própria vida, um dos lados pesava mais e, não foi difícil tomar a decisão, afinal, estava já condenada. Lucius já havia lhe privado de tudo, de uma vida comum na terra, a privou da liberdade de sua alma, o que mais ele poderia fazer com ela?

— Lena. — A mulher se virou ao ouvi-lo lhe chamar, Lucius estava de pé atrás de sua poltrona e encarava as chamas da lareira com estranha devoção. Ele demorou para se virar, parecia pensar em algo antes de fazê-lo, ela aproveitou esse momento para se aproximar dele, parando numa distância segura. Longe o bastante dele, mas ainda perto o suficiente.

Os dois se entreolharam por alguns segundos, o demônio parecia decidido.

— Preciso resolver uma questão, quero que fique aqui até meu retorno. — Ditou, arrumando as mangas de sua camisa como se as mesmas estivessem desalinhadas. — Posso confiar que você não tentará fazer visitinhas para nossa filha?

A morena assentiu lentamente, um movimento ensaiado por ela.

— Ótimo — Lucius esticou os lábios também com lentidão e então se aproximou dela com passos mais rápidos, cortando a distância entre eles. Na sua frente, o demônio parecia estar mais alto, o uso de suas roupas e das cores claras davam a ela essa impressão, um método — ela já sabia disso — que ele sempre usufruía quando queria impor algum respeito ou medo em alguém. Geralmente em humanos. — Garanto que poderá vê-la quando eu retornar, depois disso estaremos juntos aqui, por toda uma eternidade.

Seu tom de voz demonstrava uma convicção apavorante de um futuro muito próximo, sua fala fez com que um tremor corresse por seus ossos, uma hesitação da qual ela não conseguiu esconder a tempo, mas que Lucius ignorou. Novamente se olharam, mentalmente a mulher contava até dez, buscando em si a mesma coragem que usou para ter a adaga em mãos, não precisou de muito, ela nem mesmo pensou nas futuras consequências ou no que ele poderia acontecer segundos depois.

Apenas deixou a lâmina escorregar por seu braço e a segurou com firmeza, foi necessário agir rápido e sem hesitação, Lena deixou que Lucius tivesse seu breve momento de distração e quando ele pareceu enfim perceber o que estava para acontecer, a mulher o empurrou com o cotovelo e quando tomou pouca distância de seu corpo, lançou a lâmina de encontro ao peito do demônio, acertando em cheio no coração humano. Lucius rugiu alto quando sentiu a adaga rasgar a camisa que usava e rasgar parte de sua pele, o demônio começou a ranger os dentes com força enquanto caia no chão, enfraquecido.

Lena se afastou um pouco mais dele, assistindo o corpo do homem demônio se contorcer na agonia causada pela lâmina, poderia até sorrir satisfeita se não estivesse com tanta pressa. Ela então correu, pronta para sair dali e encontrar a filha, cronometrava mentalmente o tempo que tinha até que Lucius conseguisse chamar Zarael ou Baltazar para lhe ajudar, ou qualquer outro demônio que estivesse por perto.

— Você pagará! — Ela o ouvir gritar, um misto entre dor e ódio, algo que a teria preocupado antes, mas não naquele momento, não quando prezava pela vida da filha. Não quando sua alma já não tinha mais salvação. — Lena!

Lucius gritou seu nome, tentava se arrastar para alcançá-la enquanto rugia cada vez mais alto conforme a dor crescia em seu corpo. Lena sabia sobre as adagas que feriam os demônios, tivera muito trabalho em conseguir uma que ferisse a Lucius, pois teria de encontrar uma que viesse do Céu, não foi fácil, precisou recorrer a Eligus e seus favores... Algo que ela com toda certeza faria novamente se precisasse para manter a filha segura. A mulher olhou uma última vez para o demônio, conseguia imaginar o tipo de consequência que teria pela traição, pouco se importava com isso.

O deixou agonizando e gritando de dor, correndo de encontro para salvar a vida da filha e com esse mesmo pensamento, virava cada esquina, passava por cada condenação particular de algumas almas, era tocada por outros demônios que já estavam acostumados com sua presença até virar uma última esquina e dar de cara com Eligus e Eva — a demônio que caiu tempos atrás —, a mulher estava com sua real aparência e a olhou de maneira ameaçadora, mas Eligus, parecia já mais amigável.

— Lena. — O demônio dissera seu nome com extrema calma, apesar do claro contraste entre sua expressão e a que vinha do rosto da mulher ao seu lado.

— Suponho que seja você a mãe da Alana — Eva a olhou com uma sobrancelha arqueada, correndo os olhos por sua imagem desde a cabeça aos pés. Lena sabia de sua semelhança com a filha e, a constatação da mulher era óbvia. Assentiu. — Ótimo, viemos tirar sua filha daqui.

Ouvir tais palavras a fez sentir-se mais leve e mais aliviada também, apesar de ter pedido a ajuda de Eligus para tirar a Alana do inferno, ela não esperava encontrar a demônio que caiu no inferno para aquele resgate.

— Eu sei onde ela está — Contou, porque realmente sabia e estava muito perto de encontrá-la. — Não temos muito tempo, então precisamos agir rápido.

Eva esboçou um sorriso animado, o típico de demônios que não dispensavam uma boa confusão — como já vinha em Zarael e em Paimon uma vez — já Eligus, olhou ao redor como se estivesse sentindo-se extremamente exposto, assentiu com pressa e então, os três saíram em disparada, sendo guiados por Lena que, tinha como único objetivo encontrar e salvar a filha.

 

●●●

 

 

Alana sentia que seu corpo estava prestes a entrar em colapso. O tempo no inferno não estava em nada lhe ajudando, pouco dormira — tirava apenas cochilos breves demais para que fossem considerados como um sono real e nada mais que isso —, se alimentava quando bem queria, porque não confiava em Lucius e no que ele estava lhe oferecendo. Aos poucos os sinais de seu corpo e de uma possível crise se tornavam cada vez mais evidentes e ela nem parecia se importar muito com isso, estava tensa demais pensando no que iria acontecer quando se encontrasse com Kambriel para pensar em futilidades como sua alimentação e descanso.

Aquilo lhe soou como uma grande ironia da vida, tempos atrás era ela a mostrar esse mesmo tipo de preocupação com o arcanjo quando ele não se alimentava e sequer dormia devidamente e estava sempre pegando em seu pé, mas a história mudou e bem, ela nem conseguia pensar direito a respeito desse assunto sem que sentisse uma forte pontada em seu peito ao recordar-se dele.

West não tinha uma noção exata do tempo em que estava naquele quarto, desde sua última conversa com Lucius e sua mãe, Alana tinha a ideia de que algumas horas se passara, talvez alguns dias. Nesse meio tempo ela tentou descansar, mas sempre que fechava os olhos quando acabava cochilando acordava de repente ao se recordar que acabaria tendo mais um pesadelo. Ela não tinha isso como uma certeza e não queria descobrir se seria verdade ou não.

Naquele momento, ela estava andando de um lado para o outro dentro do quarto imaginado o que estaria acontecendo em Grória, pensou em Kambriel e quando o viu lutar contra Lucius, pensou até mesmo em Eva e em como ela estaria, se ela estaria ajudando-o com a situação de Grória ou se estava se mostrando útil em outros assuntos que tinha conhecimento. A verdade era que, Alana West se encontrava ansiosa para o próximo passo — a conversa que teria com Kambriel — e no que iria dizer a ele. Poderia alertá-lo, mas sobre o que exatamente? Lucius mencionou que estava esperando que o arcanjo tentasse salvá-la no inferno, mas o que isso significava? Poderia falar sobre o acordo que fizera com o demônio e o tranquiliza-lo. Mas nada do que ela pensava parecia fazer algum sentido, teria de esperar até o momento em que o visse para soltar o que viesse em mente, contava com isso.

Ainda andando de um lado para o outro, Alana parou bruscamente quando sentiu um forte cheiro de enxofre, apesar de estar no inferno e fedor já ser algo que predominava o lugar, sempre que Lucius a vinha visitar ela sentia o odor impregnar o quarto; anunciando com antecedência sua chegada. Não foi diferente naquele momento. Alana apenas tomou uma distância maior da parede por onde sabia que ele aparecia, esperou quando uma porta se materializou e foi aberta, estava preparada para sua visita dessa vez.

— Eva?! — A jovem praticamente gritou o nome da mulher ao vê-la passar pela porta. Eva não tinha as mesmas características humanas de sempre e, pela primeira vez desde que a conhecera, ela realmente parecia um demônio. Seu rosto estava em carne viva, porém apodrecida, os olhos amarelos brilhavam, mas estavam opacos e sem qualquer vestígio de vida. Ela imaginou ver algo semelhante a aparência bestial de Lucius, mas Eva era bem diferente, sua aparência demoníaca era... O de alguém entrando em decomposição e não de um monstro. Alana nunca tinha visto algo daquele tipo e mesmo que tenha se assustado com aquela imagem, ela não se sentiu amedrontada com ela; não como se sentia com Lucius.

— Mãe?! — Exclamou quando viu a mulher também, a surpresa por ela estar presente sem que Lucius estivesse ao seu lado a fez sentir-se mais tranquila.

— Olá Alana, seu resgate finalmente chegou! — A mulher pareceu não notar sua hesitação ao vê-la com sua real aparência, na verdade, esboçou um sorriso largo ao olhar para a humana e continuou se aproximando. Eligus, o demônio com quem Alana conversara em sua primeira visita ao inferno veio logo atrás delas, porém com sua aparência humana e já conhecida.

A moça demorou um pouco para sentir o corpo reagir e quando se deu conta, estava caminhando em direção a mãe sem ouvir de fato o que a demônio estava falando e só parou quando os braços se fecharam em volta do corpo da mais velha. O que sentiu naquele momento foi um misto de alívio e alegria, poderia ficar por um bom tempo ali, abraçada com a mãe como gostaria de ter feito antes.

— O que está fazendo aqui? — Perguntou de repente, quando pareceu finalmente se lembrar da presença de Eva e Eligus ali com elas.

Lena deu com os ombros.

— Fazendo o que uma mãe sempre faz pela filha, a mantendo segura. — Respondeu sorrindo ainda mais, passando a mão pelo rosto mais jovem, olhando-a com intensidade.

— Você está bem? Lucius te machucou? Fez alguma coisa com você? — Era Eva quem falava agora e todas as três perguntas saíram de seus lábios num tom apressado. Alana então notou que Eligus parecia tenso, olhava para todos os lados como se estivesse esperando que algo viesse a acontecer.

Alana negou com a cabeça para todas as perguntas feitas, poderia dizer a verdade, que Lucius realmente a feriu, mas não de uma forma física, mas ela não iria atormentar Eva com seus problemas familiares.

— Ótimo! — Exclamou Eva.

— Não temos muito tempo — Lembrou Lena, olhando para os dois demônios. — A essa altura, Lucius já deve ter conseguido alguma ajuda e...

Seu cenho se franziu com a fala acelerada da mulher, West nem mesmo teve tempo de responder ou reagir, Eva já tinha a segurado por um dos braços e a puxava com força quando começou a caminhar junto a Lena e Eligus logo atrás. Havia uma pressa estranha na demônio e também na maneira como sua fala andava e falava, um tipo inédito de urgência que ela não tinha nem visto quando estavam em Las Vegas.

Os quatro passaram pela porta e no segundo em Alana se viu livre daquele quarto bizarro, ela foi dominada por uma sensação pavorosa; estava diante do real inferno, ouvindo pela primeira vez todas as vozes e gritos das almas condenadas. Houve um momento breve em que ela se deu conta de que estava trancada naquele quarto e sequer tinha observado o lugar fora das quatro paredes. Era uma prisão particular personalizada para ela.

— Temos que voltar logo, avisar a Kambriel sobre... — Eva não terminou sua fala, pois fora interrompida ao ouvir o que seria um tipo estranho de tremor acontecer. Ela lançou um olhar urgente para Lena que, assentiu ao que pareceu responder uma pergunta mental feita pela outra. — Droga!

Xingou ela, parando e Alana parando junto a ela; o mais próximo que as duas estiveram desde que se conheceram. Lena se manteve ao seu lado e agora segurava sua mão com força enquanto a demônio parecia pensar no que deveria fazer.

— Vocês duas precisam ir, o inferno está começando a se agitar com a presença dela — Eligus lançou um aceno rápido para Alana e ela entendeu o que sua fala significava. — Eu cuido das coisas por aqui e você, quero dizer, vocês, cuidam das coisas lá na terra. Lena sabe de um lugar seguro para que voltem para a terra sem interferência, mas precisam ser rápidas!

Eva acenou positivamente com a cabeça e pareceu se despedir do demônio, ela então falou algo com ele, mas Alana não compreendera o que era porque ela usara língua estranha com a qual já viu Kambriel usar também em uma de suas tantas conversas com a mulher. 

— Adeus Alana e dessa vez, posso garantir de que se trata de um adeus definitivo. — Murmurou rápido, gesticulando brevemente com a mão enquanto sua mãe a puxava pelo braço para cada vez mais longe dele. Eva seguia mais a frente, grunhindo sempre que uma alma condenada fazia menção de se aproximar delas ou rugindo como um animal quando um demônio aparecia por entre os escombros.

Confusa ela correu os olhos pelos arredores, não viu nada além de algumas almas escondidas por entre os escombros dos prédios. Ao fundo ela ouvia o que seria um murmúrio baixo que parecia ecoar em sua mente, a voz de Lucius parecia real dentro de sua cabeça e dominava seus pensamentos de maneira assustadora.

— O que você exatamente fez com ele? — a pergunta de Eva foi direcionada a Lena, a mulher apenas deu com os ombros.

— O feri com uma das adagas.

— Nem quero saber como conseguiu uma dessas — Foi tudo o que a outra respondeu quando se deu conta de que a mãe de Alana não parecia muito preocupada com o demônio, Alana sabia sobre as adagas que feriam demônios e anjos e, pelo que pôde compreender daquela conversa, fora isso o que sua mãe fizera.

— Eva? — Ela chamou pela mulher enquanto praticamente corriam pelo inferno, Alana não sabia aonde exatamente estava sendo levada e nem mesmo conseguia entender o motivo da urgência que vinha da outra; tentava apenas acompanhar seus passos. — O que estamos fazendo? Para onde estamos indo?

Lena deu um puxão mais brusco na filha quando as três chegaram a um ponto estreito de um vale já quase todo destruído, Eva olhou ao seu redor, mostrando os dentes apodrecidos quando avistou a presença de alguns demônios aos arredores. Passaram por beco mais afastado da destruição, encontrando alguns corpos sem vidas, naquele ponto, não existiam almas condenadas e nem mesmo os demônios, porém Alana os sentia por perto. 

— Você está aqui de corpo e alma e eu também, quer dizer, sem a alma porque não tenho uma. — A explicação fora breve e não fez muita diferença para ela, mas ela anuiu com a cabeça. — Precisamos ir para o ponto isolado do inferno, acredite, isso existe aqui, mas apenas para que a gente consiga voltar sem que eles — Ela estava se referindo aos demônios ao redor. — Tentem alguma coisa conosco. Sua mãe conhece um lugar assim, é para lá que estamos indo.

— Sei. — Foi tudo o que ela conseguiu responder antes que sentisse Lena novamente a puxar, elas saíram daquele lugar e se encontraram em um campo aberto e sufocante. Domado por trevas e um cheiro forte e enjoativo de enxofre, o silêncio daquela parte do inferno era algo preocupantemente e assustador. Como se não existisse nada ali além delas. — Mas...

Ela não prosseguiu com sua fala, mas isso acabou atraindo a atenção de Eva e sua mãe, as duas a encararam, esperando que ela completasse a fala.

— O quê? O que foi?

A moça demorou para responder, encarou a mãe durante um longo período e logo lembrou-se de que ela ainda continuaria no inferno assim que retornassem para a terra, tinha de fazer algo para tirá-la também.

— A minha mãe... — Começou a falar, contudo a mulher logo a interrompeu. Sua expressão — apesar da aparência demoníaca — pareceu mais compreensiva, apesar de existir um claro pesar em suas feições. As duas se encararam brevemente, Lena apenas assentiu de forma discreta para a demônio, como se estivesse dando a ela o aval para que fosse ela a respondê-la.

— É eu soube sobre a situação dela, — Contou com pressa. — Mas isso teremos de resolver em terra, no momento eu preciso tirar você daqui e logo.

Alana correu os olhos pelo ambiente, encontrando apenas a mesma escuridão de sempre a cercá-la, a fumaça escura e densa lhe dava uma sensação claustrofóbica e perturbadora.

— Esse é o momento em que você se despede de sua mãe. — Avisou, afastando-se alguns passos das duas para dar a elas um pouco de privacidade. A West mais nova olhou para a mulher com o olhar perdido, ela não sabia o que dizer, o que fazer e nem o que pensar, tudo estava acontecendo rápido demais; ela tinha muito para falar com ela e, não tinha tempo para isso.

— Mãe... — Alana começou a falar, mas então parou quando sentiu as palavras tropeçarem umas nas outras, ela queria mais tempo com ela.

— Escuta — A mulher segurou o rosto da moça com as duas mãos, seu toque era firme. — Eu não quero que se preocupe comigo, meu objetivo aqui é apenas mantê-la segura e longe de Lucius, como eu lhe disse antes, eu vou fazer de tudo para conseguir isso.

— Mas...

— Alana, eu já estou condenada. — O peso de sua fala tirou de Alana um soluço. — Nada do que Lucius fizer será tão ruim quanto isso... Ele apenas me fere se tocar em você, porém eu tenho total certeza de que isso não vai acontecer — Ela tentou sorrir diante a própria fala, mas seus lábios não se moveram mais do que apenas um tremor. — Não temos muito tempo, mas saiba que eu vou estar sempre cuidando de você, mesmo daqui.

Alana se viu sem ter o que falar, porque simplesmente não sabia o que dizer para a mulher, suas mãos tremeram quando Lena aproximou os lábios de sua testa e depositou um beijo ali mesmo. Sem nada dizer ela se afastou, dando espaço para Eva. Não houve adeus, não houve nem mesmo um abraço e Alana sentiu-se estranhamente vazia e pequena, a mesma sensação que havia lhe dominado quando seu pai — Jacob — contara sobre o desaparecimento da mãe anos atrás. Nesse mesmo momento, Eva se aproximou da moça, segurou suas duas mãos e, apesar de ela nem sequer estar lhe olhando, ela disse:

— Não vou mentir, mas nossa volta não será lá muito agradável, mas será mais fácil agora. — Conforme Eva falava Alana sentia a cabeça se balançar em afirmativa, apesar de ela nem mesmo estar ouvindo-a como achava que estivesse. Sua atenção estava sobre a mãe, a figura da mulher a olhá-la com os olhos marejados e um sorriso leve nos lábios. — Tudo o que vou pedir a você é que fique de olhos fechados e respire fundo, será rápido, mas por você ser humana será um pouco desconfortável o que vai sentir quando estivermos em terra.

— Tudo bem. — Respondeu, imaginou que aquela fosse a única instrução que receberia e então fez o que Eva pedira antes. Alana se apressou em olhar para a mãe uma última vez, Lena pareceu murmurar um eu te amo antes de ela fechar os olhos.  

Ao fazer a ação ela sentiu o turbilhão de pensamentos vierem à tona em sua mente, tudo o que viu quando Lucius a tocou voltara com tanta força que ela se sentiu atormentada. Ela relutou em não abrir os olhos, mas foi muito difícil, Alana viu muitas imagens que não conseguiria se esquecer tão fácil; nem mesmo quando tocou sem querer Eligus ela ficara tão assustada. Foi então que sentiu seu corpo ser puxado, ela não estava vendo o que acontecia e nem mesmo queria saber, mas sentiu-se mais confortada por ter Eva a segurar suas mãos. O toque da mulher parecia lhe trazer a calma que ela precisava para continuar de olhos fechados. Seu coração acelerou, seu corpo tornou-se tenso e então ela sentiu como se fosse jogada de pé em uma superfície pouco confortável.

O ar mudou, era algo mais leve e límpido. A brisa que soprou ali era fria e fez com que seu corpo inteiro se arrepiasse. Lentamente ela abriu os olhos, não ouviu a voz de Eva e nem mesmo a sentiu segurar suas mãos e viu aquilo como um sinal de que já poderia abri-los. E fez. Alana julgou que não deveria ser mais do que meio dia, o sol ainda que fraco, estava alto e forte. O lugar estava silencioso e estranhamente calmo.

— Grória. — Disse ao reconhecer o ambiente. Na verdade, reconheceu que estava do lado de fora de sua casa.

Alana olhou para o lado e viu Eva mais afastada dela, seu rosto estava como o de sempre agora, mas a mulher parecia cansada; de sua testa escorria algumas gotículas de suor como ela se tivesse acabado de sair de uma longa maratona.

— Eva, você está bem? — Perguntou ansiosa, aproximando-se da mulher e quase caindo quando sentiu seu corpo amolecido e trêmulo. Alana precisou pensar rápido e o quando percebeu que iria cair, firmou os pés no chão e usou as mãos para apoiar-se sobre os joelhos.

Um forte mal-estar a deixou levemente zonza, Alana piscou algumas vezes e respirou fundo para retomar o próprio controle.

— É a viagem e o enxofre. — Explicou a demônio, ela mesma se aproximando de Alana e a segurando pelos ombros. — Isso vai passar logo. Vamos.

Com a ajuda da mulher, Alana começou a ser guiada para dentro de sua casa. Para ela, fora muito estranho voltar do inferno estando em Grória outra vez, porque sentia que tinha passado longas semanas longe da terra. Era estranho, sua mente tentava se acostumar com o cenário conhecido como se realmente tivesse passado por uma longa viagem de volta.

As duas seguiram em direção a entrada de sua casa, com o silêncio anormal da cidade, a moça conseguia ouvir os próprios passos pelo gramado e, no momento em que Eva empurrou a porta destrancada, Alana sentiu o corpo tenso. Aos poucos aquele mal-estar foi a deixando e deu lugar para a preocupação, a mulher nada dissera sobre Kambriel ou onde ele poderia estar, mas ter a porta de sua casa destrancada a deixou nervosa. Lentamente ela se endireitou, pronta para falar sobre aquilo e parou quando ouviu uma movimentação que vinha do curto corredor que levava para o jardim nos fundos da casa. Eva tirou as mãos de seus ombros e Alana conseguiu recobrar o próprio equilíbrio e já conseguia ficar de pé sem ajuda. Seus olhos se direcionaram para a origem do som que ouviu, ficou nervosa durante alguns instantes até que aquela sensação estranha a deixou completamente.

— Kambriel? — Ela perguntou quando o viu parar próximo a escada. West ainda sentia-se um pouco tonta, mas isso se mostrou apenas um detalhe sem muita importância no momento. Em sua consciência, era como se ficasse longe rapaz durante muito tempo.

O rapaz parou no segundo em que ouviu a voz de Alana correr pela casa, pestanejou como se tivesse sido desperto de algum tipo de sonho e então a olhou com surpresa. Seus olhos azuis correram por toda a imagem da moça, o espanto ainda era visível em sua face, mas então os lábios de curvam em um sorriso amplo e genuinamente alegre.

— Alana! — Ele a chamou, começou a se aproximar dela com urgência e a moça não tardou em também fazer isso; a distância entre eles era pouca, mas em sua mente parecera como se estivessem a quilômetros de distância um do outro.

A West mais jovem sentiu o momento exato em que os braços largos e fortes de Kambriel a envolveram em um abraço firme, fechando-a em seu corpo como um casulo para protegê-la do que tinha em volta. Alana firmou seus braços ao redor dos ombros do arcanjo sentindo o calor de seu toque correr por cada extensão de seu corpo. O alívio que sentiu foi imediato, se ele estivesse ou não fazendo o que ela aderiu como truque de anjo, ela não sabia, mas quando ele a tocou, já sentia como se um monte de pesos fosse tirado de seus ombros; até mesmo os pensamentos perturbadores que tinha momentos atrás foram a deixando.

Eles ficaram abraçados durante um bom tempo, Alana ousou até fechar os olhos para intensificar aquela sensação de tê-lo tão próximo dela. Conseguia ouvir o coração humano de Kambriel bater forte contra seu peito e tinha certeza de que o seu se encontrava do mesmo jeito; ansioso e feliz.

— Eu sinto muito... Deveria ter feito alguma coisa quando ele... — Ele começou a falar, mas não terminou a frase, estava mesmo se lamentando?

— Não foi sua culpa. — Alana respondeu quase de imediato, não acreditando que ele estivesse mesmo se sentindo culpado pelo que houve. Era Lucius o verdadeiro culpado de tudo aquilo. — Eu estou bem, eu voltei...

Deu com os ombros num jeito pouco alegre, levando as duas mãos para o rosto perfeito do rapaz, ela se dando conta pela primeira vez que tinha sentido falta de olhá-lo e tocá-lo. Kambriel franziu a testa e a encarou de volta, estava pronto para falar quando Eva precisou interromper aquele momento.

— Eu sei que estão com saudades do outro e detesto ser a pessoa a estragar esse momentinho fofo, mas temos assuntos bem sérios para tratar. — Anunciou com pesar, olhando diretamente para Kambriel. — E ele precisa ser tratado logo!

 

●●●

 

Alana sentiu quando a sala de sua casa ganhou um ar muito pesado e todo o ambiente pareceu diminuir de consideravelmente de tamanho, dando a ela uma sensação de estar sendo sufocada pelas quatro paredes existentes ali diante a fala de Eva. Sua primeira reação foi olhar na direção de Kambriel, o arcanjo sequer estava se movendo e nem mesmo parecia respirar, os olhos estavam fixos no rosto da mulher em uma expressão firme e indescritível. Eva pareceu um tanto insensível ao começar a falar, a mesma urgência que West percebera antes estava ali presente, mas a maneira como as palavras saíam dos lábios da mulher demônio era como se estivessem ferindo o arcanjo de alguma maneira.

— Ele foi claro em dizer que Gabriel e Miguel estão vindo para cá, Grória. — As palavras foram como um tipo potente de soco para o rapaz, Alana notou quando a face dele se modificou em um tipo de temor nunca visto antes; quer dizer, ela já o vira daquela maneira, mas era um caso diferente. Ele piscou incrédulo, uma, duas, três... Parou de contar assim que ele começou a se afastar delas.

Kambriel levou as duas mãos para sua cabeça, ele parecia estar prestes a puxar os próprios cabelos em uma atitude nervosa e eufórica, mas nada disso aconteceu. Contrariando suas expectativas, o arcanjo apenas soltou um longo suspiro, encarando um ponto aleatório de sua casa enquanto continuava a caminhar pela sala. Ele estava claramente perturbado com a notícia, seja lá o que aquilo significava, Kambriel estava completamente mudado ali. Estava tenso, ansioso, irritado... Era uma mistura de sentimentos que, seu rosto sempre tão perfeito parecia não dar conta de expressar.

— Eligus fez isso? Os chamou para a terra? — Questionou com um misto de irritação e ansiedade, a moça percebera que sua voz pareceu falhar ao mencionar os dois arcanjos; como se os temesse. Eva apenas assentiu no início.

— Ele contou que a mãe de Alana pediu que ele fizesse isso. — Completou a mulher, nesse momento tanto Alana quanto Kambriel se mostraram espantados com a fala dita. A moça mudou a direção de seus olhos e encarou a mulher demônio com expectativa, esperando que ela continuasse falando. E foi exatamente isso o que aconteceu. — Eligus contou que ela já sabia que Lucius iria arrastar Alana para o inferno, mas que essa ajuda não era apenas para a filha, mas para você também, Kam. Então pediu que ele chamasse pelos arcanjos líderes.

Eva prosseguiu, Alana então desviou os olhos de Eva e sentiu os próprios olhos se arregalarem em uma surpresa incômoda. Aquilo não parecia fazer muito sentindo para ela. Alana mudou a direção de sua atenção durante um longo tempo, seus pensamentos se mostraram agitados demais e ela não soube como reorganizá-los em sua mente outra vez. Centenas de lembranças do longo tempo em que passou no inferno estavam vindo em sua mente, alguns deles das tantas falas malucas ditas pelo demônio; ela parecia buscar algo que fizesse sentido na atitude tomada pela mãe.

“eu vou estar sempre cuidando de você.”

— Alana? — Ao ouvir seu nome ser chamado por Eva, ergueu o rosto e olhou para a mulher ao lado, depois olhou para Kambriel, os dois pareciam esperar por alguma resposta dela. Como se ela soubesse de alguma coisa, mas apenas não estava querendo compartilhá-la com eles.

— Eu não sei o motivo de ela ter feito isso. — Confessou, sem que percebesse começou a ficar bem mais tensa em pensar o que levaria a mãe a fazer algo assim, na verdade, ouvir isso apenas a deixou mais confusa. Ela deixara claro que estaria sempre cuidado de si, mesmo que estivesse no inferno, mas por qual motivo chamaria dois arcanjos para ajudar Kambriel? — Na verdade, Lucius me disse algo... Mas não tenho muita certeza se faz sentido ao que houve ou o que Eva acabou de falar.

— O que ele disse? — Foi Kambriel quem perguntou, seu olhar interessado e ao mesmo tempo aflito cortou qualquer tipo de pensamento aleatório que Alana poderia ter durante aqueles poucos segundos em que ficara em silêncio.

Ela sentiu um pouco de dificuldade ao recordar-se exatamente das palavras que Lucius lhe dissera durante uma de suas discussões e percebeu que precisava contar bem mais a eles do que apenas o que ele contara. A moça engoliu seco quando começou a formar as frases mentalmente, tomando cuidado com o que diria já que, com toda certeza os dois se chocariam.

— Antes de tudo eu sei que isso o que vou falar agora vai parecer uma grande loucura sem sentido, mas eu mesma não acredito então tanto faz... — Alana não terminou a frase, ela ousou olhar para a demônio e o arcanjo e nesse instante os dois a encaravam com intensidade. — Lucius disse que é meu pai biológico e me levou para o inferno porque queria que estivéssemos juntos porque teríamos poder — Ela não conseguiu esconder a repulsa ao contar aquela parte e desviou os olhos dos dois. — E quando eu estava insistindo para que ele me levasse de volta para a terra ele disse que esperava que você fosse até lá para me buscar, ele foi claro quando disse que queria que você entrasse no joguinho dele, especialmente que, se você fosse até lá me buscar isso começaria uma guerra.

O silêncio ali formado era já algo esperado por ela, não apenas por suas últimas palavras, mas pela revelação — impossível — de Lucius ser seu verdadeiro pai. Kambriel foi o primeiro a reagir, os olhos se arregalaram quando ele pareceu se lembrar de algo que passou em sua mente, Eva o olhou no mesmo instante.

— Ele me falou sobre isso quando nos encontramos noite passada, principalmente sobre nossos papéis nisso — Mencionou, a surpresa em seu rosto era um detalhe muito marcante e quase impossível de ser ignorado. — Eu perguntei sobre você e ele disse que você estava em uma reunião de família, não entendi muito bem já que a única pessoa da sua família que estava no inferno é sua mãe... — Kambriel abriu a boca e deixou um longo suspiro sair, ele pareceu compreender algo que ela perdera. — Isso... Tudo faz sentido agora.

Ela franziu o cenho sem entender.

— Lucius não é meu pai! — Alana exclamou após entender as palavras do rapaz, as dissera com tanta certeza que, por um instante ela realmente se esqueceu de como aquela fala soava insana. — Isso é impossível! Ele queria apenas brincar com a minha cabeça... Ele...

— Alana. — Foi Eva quem começou a falar, interrompendo sua fala e fazendo-a olhá-la. — Imagino que deve achar que pode parecer algo impossível que demônios tenham filhos, mas é apenas muito raro de se acontecer. Mesmo que seja contra as regras esse tipo de envolvimento com humanos, alguém da terra consegue carregar um filho de um enviado... Seja ele do Céu ou Inferno.

A moça piscou sem ter o que responder, nem mesmo saberia o que dizer.

— E Lucius ser seu pai explica muitas coisas que tem acontecido aqui em Grória — Agora era Kambriel quem falava, apesar do tom manso e muito gentil de sua voz, Alana se sentia dominada por uma ansiedade angustiante. Uma impaciência que a deixava agitada e trêmula. — O interesse dos demônios em te vigiar, você ser atacada e ter sobrevivido ao ataque... Sei que não quer ouvir isso, mas faz sentido você ser filha dele. É a única explicação para que um demônio como ele esteja tão interessado em atacar uma cidade pequena como Grória.

Em sua garganta um grande nó se formou, impossibilitando que ela conseguisse ter uma fala tranquila e perfeita, ela permaneceu encarando-os, sua mente tentava de alguma maneira desvincular aquela ideia absurda; negando até mesmo que existia poucos traços na fisionomia humana de Lucius que estavam também presentes em si. Sacudiu a cabeça e fez o que melhor sabia fazer, mudar de assunto, afinal, tinha dois arcanjos vindo para Grória, discutir sua paternidade não era tão importante como Kambriel e Eva pareciam fazer ser.

— Tudo bem, — Alana sacudiu a cabeça em um movimento já há muito ensaiado por ela, a ação conhecida era um escape que ela encontrara para afastar qualquer pensamento indesejado de sua mente; geralmente isso funcionava apenas com assuntos simples como a morte de seu pai, Jacob West e tentou fazer o mesmo acontecer com aquele assunto de Lucius. — Mas Lucius disse que se você descesse ao inferno para me buscar isso começaria uma guerra e ele estava contando com isso, o que quer dizer?

Nenhum dos dois se surpreendera com a mudança tão drástica de assunto, o rapaz era quem mais se mostrou acostumado com aquela atitude dela, mas Eva, mantinha um olhar pouco preocupado sob a moça. Como um tipo de cuidado distante, apesar de ela sequer ter se movido desde que a escutou.

— É uma regra antiga, quando os lados foram escolhidos e a terça parte dos anjos expulsa do Céu, foi limitado um terreno para ambos os lados. A terra é o meio termo, aonde podemos fazer aquilo que bem quisermos devido ao livre arbítrio. Mas se um ser do Céu descer ao inferno ou um ser do Inferno subir para o Céu, não importa o motivo, temos isso como quebra de tratado. Uma invasão. O conflito se segue como uma consequência disso. — Kambriel começou a explicar, ela percebera que sua voz parecia tensa ao contar aquilo para Alana e ela se perguntou se era por causa do que estava revelando a ela ou se tinha a ver com a sua mudança drástica de assunto.

— E, se ele estava esperando que Kambriel fizesse isso, então está mais do que óbvio que ele planeja muito mais além de ter a filha de volta. Até porque, eu não acho que a mãe de Alana tenha pedido a Eligus para chamar pelos arcanjos apenas por temer pela vida da própria filha e para ajudar Kambriel a tirá-la de lá. — Eva completou o pensamento, assustando Alana com sua honestidade em já mencioná-la como filha do demônio. — E também, tiramos Alana do inferno e Lena o feriu com uma adaga, com toda certeza não vai deixar barato, talvez seja por isso que ela tenha pedido a ajuda. Porque já estava planejando fazer tudo isso e sabia o que poderia acontecer.

— E o que uma coisa tem a ver com a outra? — Alana questionou, recebendo um olhar severo de Eva, um ainda pior do que ela recebera quando as duas ainda eram apenas estranhas a outra. Os lábios da humana se fecharam no mesmo instante e qualquer outra palavra escapou de sua boca, West ficou em um silêncio estranho.

Ela tentou desviar seus olhos da mulher e olhar para Kambriel, porém isso se mostrou algo completamente impossível de ser feito, era como se existisse algo nela que a puxasse e a forçasse para que continuasse com aquela troca intensa e sem explicação de olhar.

— Não é óbvio? — A mulher perguntou de volta, arqueando uma sobrancelha. — Lucius a queria no inferno, esperava que Kambriel viesse resgatá-la para que uma guerra começasse e agora que você foi tirada de lá, o que acha que ele vai fazer? Ele vai simplesmente ficar sentadinho pensando em como conseguiu voltar para a terra ou ele vai tentar pegá-la de volta? Sua mãe o feriu e também chamou pelos arcanjos líderes, o que acha que vai acontecer?

A dureza de suas palavras não tirou de Alana uma resposta concreta, tão pouco um resmungo ou qualquer som; na verdade, até mesmo Kambriel se encontrava em total silêncio.

— Alana, você é filha de um original da alta hierarquia, a primeira que foi gerada de um fora do inferno e longe do pai. Por que acha que Lucius quer tanto mantê-la no inferno? Por que todo esse esforço de causar ataques e matar tantas pessoas? Acha que é apenas por ele querer a família reunida? — As perguntas pareceram se ligar aos pensamentos de Alana que, no mesmo segundo se colocou a pensar em tudo o que aconteceu durante o tempo que passou no inferno. Desde as várias conversas com Lucius, até suas falas incoerentes e que ela tentou tanto ignorar. Uma delas chamou a sua atenção e fez com que a moça erguesse os olhos em direção a mulher.

Eva pareceu compartilhar de seus pensamentos, pois esboçou uma feição diferente em seu rosto, seu olhar, ainda que estivesse muito severo como antes, parecia um pouco mais leve; quase compreensível.

— E-ele disse, que quando estivéssemos reunidos, teríamos um poder que nem Céus e Terra suportarão... — Sua voz falhou ao começar a falar, ela sentiu um tipo estranho de frio na barriga. A resposta para a pergunta que pairava em sua cabeça parecia tão óbvia e ao mesmo tempo tão difícil de se descobrir. — Por que ele falaria algo assim?...

— Você é a herdeira dele, Alana. — A voz suave e ao mesmo tempo tensa do arcanjo fizeram com que ela movesse o rosto em direção a origem de sua voz. O modo como ele lhe dera a resposta pareceu acertar o peito da moça com força e rasgá-lo. — Mesmo que não aceite isso, tem parte dele correndo por suas veias, tem a herança dele em você.

— Herança?

— O inferno. — Eva e Kambriel responderam ao mesmo tempo.

— E por que os arcanjos? — Conseguiu perguntar, ainda que estivesse temendo demais pela resposta que ganharia de um deles.

Houve um momento muito breve em que Eva e Kambriel se mostraram igualmente preocupados com a resposta que dariam, em seguida a mulher pareceu ser dominada por um pesar que a fez curvar-se em uma postura arrependida. Já o rapaz, travou o maxilar com força, ele, era quem mais parecia preocupado.

— Porque sua mãe sabia que, no momento em que ele viesse tentar recuperar o que “pertence a ele” Lucius não mediria esforços para trazer, literalmente o inferno sobre a terra. — A mulher contou, dizendo cada palavra com muita calma, apesar da clara preocupação. — E a presença dos dois arcanjos líderes aqui na terra apenas reforça essa teoria, Lucius vai querer atacar com força, não apenas isso, mas com uma herdeira... Droga!

Eva levou as duas mãos para a cabeça e soltou um suspiro longo, a tensão que dominou aquele ambiente era algo impossível de ser ignorado pela moça.

— Estamos fazendo exatamente o que Lucius queria que fizéssemos. Entramos em seu joguinho. — Eva parecia xingar enquanto levava as duas mãos para a cabeça, na mesma aflição de Kambriel. — Uma guerra é o menor de nossos problemas!

— O quê? Qual jogo? — A moça perguntou, aflita e ansiosa. Notando como os dois começaram a reagir.

— Lucius querer começar uma guerra não é o principal problema, afinal, quando Gabriel e Miguel estiverem aqui esse conflito irá acontecer, mas apenas para impedir uma destruição ainda maior, porém o problema não é esse e sim o que Lucius pode acabar fazendo para conseguir levá-la de volta ao inferno... — O rapaz suspirou pausadamente. — Se ele expor sobre você, como herdeira, ele pode conseguir reivindicar o poder do inferno e como condenação te levar junto a ele.

O cenho dela se franziu.

— E o que acontece se ele querer fazer isso?

— Um demônio como ele — um príncipe de Lucifer — ter um herdeiro, mesmo que isso esteja quebrando regras importantes é o bastante para causar uma revolta, muitos outros demônios irão se envolver e a verdadeira guerra acontece. Principalmente porque Lucifer jamais aceitaria algo assim. — Foi Eva quem respondeu, ela não olhava para Alana nesse momento. — E, conhecendo Lucius não temos nem ideia do que ele é capaz de fazer.


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Notas finais do capítulo

Nos vemos em breve (ainda nessa semana)



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