Depois da Ruína escrita por Bzllan


Capítulo 2
Estação Ferroviária Zona Central




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Duas trocas de roupas limpas e artigos de higiene básica. Ivan coloca tudo em sua melhor mochila e olha em volta do quarto. Percebe seu corpo tremer, à beira de um ataque de pânico, quando sua mãe entra no recinto. 

— O que está esperando?  

O garoto apenas a olha. Simplesmente não entende como a mãe pode estar tão tranquila com a situação. Ela entregaria os filhos ao mundo sem pensar duas vezes em menos de uma hora, e deixaria a responsabilidade de cuidar de uma criança nas mãos dele, outra criança, com somente dezessete anos nas costas.  

Os olhos azuis marejaram. Não queria aquilo. Segura o choro e teme abrir a boca para responder à pergunta. 

A mãe se adianta e lhe puxa para um abraço apertado, e Ivan se permite chorar. Mais alto que ela, envolve-a com os braços. 

— Eu amo você, querido. Estamos fazendo o que é certo, tudo bem? 

Ela leva uma das mãos ao rosto do filho, e tira o cabelo molhado de lágrimas de seus olhos. 

— Estamos? - É tudo o que consegue dizer. 

Uma longa pausa de incerteza. 

— Vão ter que confiar em nós. 

 

 

Sara e Thiago Annenberg praticamente corriam com os filhos ao encalço.  

Com máscaras de respirar improvisadas - lenços, bandana, uma camisa velha – a família corria escadaria abaixo no prédio.  

Alex agarra a mão do pai, que a segura com força. Com as chaves na outra mão, Thiago abre a temida porta da rua.  

Não saíam há tempos. E muito menos viam as ruas com tanto movimento. Famílias na mesma situação que eles dispersavam-se na viela residencial do centro. Os Annenberg deixam a porta fechar sozinha atrás deles e se misturam ao caos da multidão. Todos com o mesmo destino. 

 

 

A estação ferroviária da Zona Central estava sobrecarregada de pessoas às 3:58 da manhã. Não importava mais a recomendação de manterem-se afastados e isolados uns dos outros. Todos tinham prioridades agora. 

Alex vê sua mãe entregar os documentos dela e do irmão na catraca da estação, quando finalmente conseguem alcançá-la. 

O segurança devidamente protegido com seu traje analisa os documentos em sua mão, e acena positivamente com a cabeça.  

— Podem passar, vai ter a checagem de sintomas logo a frente. - Alex se adianta, puxando o pai pelo braço, mas o segurança impede seu caminho. - Só vocês. - Se refere a ela e Ivan, que não falara nada desde que saíram. 

Inconscientemente Alex ainda tinha esperança de conseguir levar os pais consigo. Não podiam estar falando sério sobre deixá-los. 

A multidão atrás deles só aumenta. 

Sara se adianta e puxa os dois filhos para um abraço apertado. Depois, o marido se junta à família. 

— Vamos nos ver de novo, eu prometo... - A mãe sussurra nos ouvidos dos filhos. Alex chora, porque sabe que sua mãe não tem como ter certeza. 

A despedida acalorada não demora tanto quanto seria suficiente para eles. 

Ivan joga sua mochila nas costas e pega a irmã pela mão. 

Antes de se virar para seguir seu novo caminho, vira para a mãe e lhe dá mais um abraço apertado, usando-o como desculpa para perguntar: 

— O que injetou na gente? 

Sara disfarça e lhe sorri tristemente.  

— Essa é a minha contribuição para protegê-los, filho. 

Sem mais perguntas. A multidão os separa e Ivan puxa a irmã para dentro da catraca. Não ousa olhar para trás, por mais que Alex olhasse. 

 

 

A plataformas lotadas de crianças e adolescentes. Nenhum dos dois dissera nada. 

Tinham uma típica relação de irmãos. Discussões e provocações, mas no fundo, afeto e carinho, amor. Nunca precisaram demonstrar. Não com palavras. Era o caso dessa situação. 

Ivan passa um dos braços pelos ombros da irmã e a puxa para si. O corpo de Alex treme de medo do desconhecido. 

 

Os trens passam em minutos, todos com o mesmo destino – que, sinceramente, não sabiam qual era.  

Quando finalmente Ivan consegue cortar caminho para entrar com a irmã no vagão, sentam-se no chão, ao lado da porta.  

Não diriam nada um ao outro pelas próximas horas. 


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Notas finais do capítulo

Vou postar esse agora e, dependendo de como for, o próximo mais pra noite. :)