Drania escrita por Capitain


Capítulo 36
Clãs


Notas iniciais do capítulo

mais capítulo, yay!



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A mulher orc lavando roupas à beira do rio não parecia ter a intenção de se mover pelas próximas horas. Sem problemas, eu vou por baixo, pensei.

Você o que?— Goroth perguntou. Opa. Eu ainda não estava acostumada com aquele estranho jeito de se comunicar.

— Nada— eu respondi - só estava pensando alto. Bem, não em voz alta, mas pensando alto. Isso ainda é estranho para mim.

Eu flutuei sob algumas casas, e emergi perto de uma carroça cheia de madeira. Um par de orcs estava encostado à carroça, entretidos em uma conversa.

—...té a noite sem lua, é o que ele disse. - Um dos orcs falava, com uma expressão azeda.

Noite sem lua. O Arauto havia dito algo sobre a lua nova. Talvez esses orcs soubessem mais a respeito.

— Desde o ataque no mês passado, nós não tivemos nada pra fazer além de procurar aquele maldito fantasma.

Ataque? Ele estava se referindo ao ataque na cabana de Aurora? Mas não tinha nenhum orc naquele ataque.

O que?— Goroth não podia ouvir o que eu ouvia, mas podia ouvir minhas reações. Esplêndido. - Você encontrou Aurora?

Não — eu disse - já explico.

Eu precisava chegar mais perto, já que debaixo da terra não dava para escutar direito. Quando me escondi entre as toras recém cortadas, minha cabeça atravessando uma cobra escondida no meio da confusão de galhos e gravetos. Meus instintos tomaram conta e eu esqueci que estava morta, tentando dar um salto para trás. Por sorte, eu não gritei. E como eu não tinha pernas, nem estava presa a nada, eu acabei só rodando no lugar um pouco, sem sair do lugar. Os orcs continuaram envolvidos na sua conversa, e a cobra nem sequer notou minha presença.

— Rasth não para de falar de guerra, mas não tivemos uma única batalha desde que ele se tornou chefe. Só Arauto isso, Arauto aquilo. Pelo menos na época da Apóstola, ela nos deixava cuidar das nossas cidades do nosso jeito. Eu só queria saber o porquê desse jogo de gato e rato. Orcs não se escondem, orcs lutam.

— Você sabe o porquê. - O outro orc respondeu - nós temos que focar na grande guerra, mesmo que tenhamos que ignorar as pequenas.  Precisamos lutar pela nossa terra, antes de tomar as outras, e só há um jeito de fazer isso. Com Rasth e o Arauto.

— Eu não acho - o primeiro orc voltou a argumentar - Se o grande chefe Ogün estivesse aqui, ele riria da nossa cara.

— Ogün está morto. Rasth é o chefe agora. Se você não gosta das regras, desafie Rasth. As tradições pedem um duelo.

— Eu não quero ser chefe - o primeiro orc disse - Só acho que a floresta negra é grande o suficiente para orcs e humanos.

O segundo orc ignorou esse último argumento, virando-se para empurrar a carroça, e eu tive que flutuar para o subsolo. Aproveitei para explicar a situação para Goroth.

Só uma coisa me confunde— eu disse, quando terminei de descrever a conversa que ouvira - Eu achei que os orcs vivessem para lá do grande rio, nos desertos do sul.

Bem, originalmente nós vivíamos nos arredores da cordilheira de sangue — Goroth explicou - mas fomos expulsos pelos elfos quando eles tomaram a floresta negra, e desde que os elfos desapareceram, começamos a migrar para a floresta em segredo. Os orcs vem cruzando o grande rio a gerações. Ogün, meu pai, foi o chefe que mais estabeleceu novas cidades orc neste lado do rio, e o meu clã, o clã Kvöth, foi o primeiro a mover-se totalmente.

Os diferentes clãs nunca se deram muito bem, entretanto - Goroth continuou - É difícil de acreditar que eles estariam simplesmente reunidos em uma cidade secreta com um objetivo em comum. O único chefe respeitado por todos os clãs era Ogün, e eu duvido que Rasth tenha sido aceito pelos chefes de outros clãs. Como eu estive banido pelos últimos anos, eu estou terrivelmente mal informado, mas algumas coisas são quase sempre certas quando se fala da cultura orc.

Goroth passou um segundo em silêncio.

Se existem múltiplos clãs nesse lugar, deve haver um pavilhão central com as tendas dos líderes. - Goroth completou - Se você puder achar o centro da cidade, eu preciso que você me diga quantas tendas estão lá, e descreva para mim os símbolos nas suas bandeiras. O pavilhão é sempre uma grande área circular, e é onde acontecem os julgamentos por combate.

Aurora deve estar presa nas proximidades desse pavilhão, então? - eu perguntei.

Espero que sim. — Goroth disse - Pelo menos, esse seria o costume. Mas com a estranheza nos rastros mais cedo, eu não sei mais se posso dizer o que Rasth planeja. Talvez haja algum outro fator na equação que eu não estou levando em conta. Mas lá é um bom lugar para começar a procurar.

Ok, - eu pensei - vou pra lá. Assim que eu descobrir onde “lá” é.

Eu flutuei sob o chão, pensando no melhor jeito de encontrar o pavilhão sem ser vista. Talvez se eu voasse alto o suficiente? Eu mudei de direção abruptamente, indo em direção às extremidades do vale. Se eu subisse por dentro de um dos paredões de rocha, eu poderia procurar pelo centro sem me preocupar.

Eu errei a parede por alguns metros, mas ninguém me viu. Acho. Eu estava ficando melhor em estimar distâncias e navegar na escuridão completa que é o subsolo. Às vezes uma nesga de luz me pegava de surpresa, vinda de alguma rachadura nas rochas. Como eu atravessava água ar e pedra com a mesma facilidade, e sem sentir nenhuma mudança de temperatura, mapear os arredores na escuridão era impossível, então eu me guiava pelas curtas viagens que eu fazia até a superfície e pela posição geral das criaturas vivas nos arredores.   

Essa última habilidade estava começando a mostrar o seu potencial como ferramenta extremamente útil. Perto do topo do paredão que eu estava subindo, havia outro orc de vigia, então eu mudei minha rota para emergir em uma área com vegetação densa, bem, distante de onde o orc se encontrava.

Olhando para o vale daquele ponto mais alto, eu pude finalmente entender melhor como a cidade orc estava distribuída no espaço. O vale tinha pelo menos uns dois ou três quilômetros quadrados, e o formato aproximado de um grão de feijão. A maior parte das casas ficava na parte de baixo do vale, perto da ravina que parecia ser a única grande saída. Na parte mais distante do vale haviam campos de cultivo de grãos e animais, e mais acima, ficavam morros pedregosos que subiam até mais ou menos a metade dos paredões verticais que formavam as laterais do vale.

Bem na ponta mais distante, onde as paredes se encontravam, havia uma cachoeira vinda de algum riacho formado pelo degelo da montanha próxima. As paredes eram tão altas que a água da cachoeira se desfazia em névoa antes de tocar o solo. Isso fazia com que, ao invés de um grande rio, o vale tivesse naquele lado centenas de pequenos riachinhos convergindo para o lago central, bem antes de chagar aos campos. Eu me perguntei se eles chegavam a receber muita luz solar durante o dia. Talvez por isso que eles têm que sair para caçar nos arredores. Agora devia ser a metade da tarde, e um grande pedaço do vale já estava nas sombras.

Até a lua nova, a voz do Arauto sussurrou na minha cabeça.

Eu já tinha gasto dois dias, e ainda não tinha achado nem Aurora nem Alice. olhando para a cidade com mais atenção, eu consegui encontrar o pavilhão que Goroth mencionou. Ele ficava um pouco afastado do centro real da cidade, próximo à parede oeste. Calculei a rota em minha cabeça e me joguei parede abaixo novamente navegando por sob a cidade orc em poucos minutos. O movimento livre era inebriante, de certa forma.

Emergi mais uma vez por um instante perto do centro da cidade, atravessando o chão do quarto de um garoto orc. Por sorte ele estava olhando para o outro lado, entretido com alguma coisa, e eu mergulhei novamente, ativando a habilidade de sentir os seres vivos para tentar evitar outras aparições acidentais. Havia uma grande área com quase nenhum sinal mais à frente, que eu imaginei ser o tal pavilhão. Com cuidado, eu me orientei para emergir com o rosto paralelo ao chão, para ocupar a menor área possível e ter meus olhos do lado de fora mais rápido.

Isso acabou sendo uma excelente ideia, porque eu emergi bem no meio do pavilhão, e senti uma presença se aproximando rapidamente, me obrigando a mergulhar de novo. a presença atravessou a área do pavilhão e desapareceu na distância. Me concentrando na habilidade de sentir, eu procurei por presenças próximas que pudessem ser Aurora. Não havia nenhuma na área do pavilhão, então eu emergi novamente e olhei ao redor, para informar a Goroth a respeito das tendas.

São sete - eu disse — o símbolo na primeira bandeira é um lobo, o da segunda é uma lança com duas estrelas, o terceiro são três linhas, como as marcas de uma garra, e...

O quarto é um falcão - Goroth me interrompeu — o quinto é uma estrela solitária, o sexto é um escudo com dois machados cruzados, e o sétimo é o símbolo de Kraaz, o círculo com seis espadas.

Um segundo de silêncio se passou enquanto eu tentava entender o motivo da interrupção.

São todos.— Ele explicou — Esses são todos os clãs.

 

 


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Notas finais do capítulo

haverão outros em breve. Tenham uma excelete semana!



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