Kethaar e a alferes Kyhien estavam deitados em leitos de monitoramento colocados lado a lado. Entre eles fora instalada uma unidade computadorizada de transfusão sanguínea. A Dra. Crusher e a Dra. Selar estavam ao lado de Kethaar junto com a enfermeira-chefe Ogawa, que seria a instrumentadora delas durante os procedimentos cirúrgicos. A dois metros delas, atrás de um campo de força que mantinha o ambiente estéril, encontrava-se a capitã Thylia, que acompanhava tudo, preocupada.

Beverly olhou para a amiga, notando seu semblante tenso. Para tentar lhe transmitir um pouco de  tranqüilidade, ela explicou o que estavam prestes a fazer.

— Nós já ministramos na alferes Kyhien a droga que vai acelerar a reposição sanguínea dela e como este processo é arriscado demais para ser usado mais de uma vez na mesmas pessoas, teremos de realizar as duas cirurgias em Kethaar simultaneamente. Enquanto a Dra. Selar implanta a nova mão biônica nele eu farei o transplante do baço artificial. Vou tentar filtrar os fatores Aenar do sangue de Kyhien durante os procedimentos antes de transferi-lo a Kethaar, mas não posso garantir que terei sucesso

A andoriana apenas assentiu, silenciosamente, com suas antenas se mexendo nervosamente.

— Você não prefere esperar na sua cabine? – perguntou-lhe a médica.

— Não se preocupe doutora. – respondeu Thylia – Vou ficar bem.

Bervely Crusher olhou então para suas colegas.

— Muito bem, – disse – vamos começar.

*   *   *

Mesmo com as médicas e a enfermeira trabalhando de forma rápida e eficiente, os procedimentos demoram pouco mais de duas horas. Mas a reposição sanguínea funcionou bem e por isso nem o paciente nem a doadora sofreram um desgaste muito grande e já estavam em fase de recuperação.

A capitã Thylia encontrava-se em pé ao lado da cama do seu filho, ouvindo a respiração suava dele, que dormia tranquilamente. Ele ainda estava sedado e de acordo com a Dra. Crusher, teria que descansar por algumas horas.

Ela olhou então para o outro lado da enfermaria, onde a alferes Kyhien estava deitada, conversando em voz baixa com a médica humana. A moça encontrava-se um pouco abatida e por isso Beverly a estava examinado com cuidado. Quando ela notou que a capitã a observava, pareceu ficar um pouco constrangida.

A oficial andoriana aproximou-se e parou do outro lado da cama dela.

— Gostaria de lhe agradecer pelo que você fez pelo meu filho – disse Thylia – você salvou a vida dele colocando a sua própria vida em risco e por isso eu estarei eternamente em dívida com você.

A moça a olhou séria.

— Não existe dívida alguma. – respondeu ela – Fiz apenas o que julguei ser a minha obrigação para salvar alguém do meu povo.

Thylia inclinou a cabeça, assentindo.

— Então desejo que você tenha saúde e paz em todos os próximos dias de sua existência. – disse ela.

Ela olhou agora pra a médica.

— Doutora, assim que puder, gostaria de conversar novamente com você.

E saiu silenciosamente da enfermaria.

*   *   *

Quando Beverly Crusher entrou na cabine da capitã Thylia Zh'thathar encontrou-a sentada em sua cama e encostada na cabeceira, de olhou fechados.

A médica também se sentou, olhando para a amiga e esperando que ela iniciasse a conversa.

Quando a andoriana abriu os olhos e a olhou, parecia cansada e triste.

— Enquanto vocês estavam operando Kethaar recebi uma mensagem de Thoval. Ele me disse que os patriarcas do nosso clã ficaram bastante irritados por eu ter dado autorização para que nosso filho recebesse uma transfusão de sangue com traços Aenar e que terei de dar explicações quando voltar a Andoria.

— Sinto muito por isso Thylia. – disse a médica.

— Mas não é isso que está me incomodando. – continuou a andoriana – O que me preocupa são as conseqüências que isso pode trazer para Kyhien e Kethaar, principalmente no tocante à continuidade da linhagem deles.

— Como assim? – estranhou Beverly.

— Conforme eu disse antes – continuou Thylia – qualquer contato com os Aenar é um grande tabu para o meu povo. Por isso, segundo Thoval me informou, vai ser realizada uma reunião com todos os líderes dos clãs da etnia Bish'ee para determinar quais serão as penalidades que a família de Kyhien sofrerá por ter omitido a miscigenação na sua genealogia. Discutirão também se será permitido  que ela e Kethaar possam gerar proles no futuro.

Beverly a olhou surpresa.

— Você está dizendo que eles podem ser proibidos de ter filhos?

A andoriana suspirou frustrada.

— É uma possibilidade – respondeu ela.

— E você vai simplesmente aceitar isso? – perguntou Beverly exasperada.

Thylia a olhou demonstrando irritação.

— Nós pertencemos a culturas muito diferentes, doutora! -  respondeu ela com dureza – Para nós, algumas decisões e comportamentos devem ser avaliados sob uma perspectiva coletiva e não individual. E quando nos desviamos desta conduta, devemos arcar com as conseqüências.

Beverly Crusher a olhou em silêncio por alguns momentos e em seguida estendeu suas mãos e tocou carinhosamente as mãos da amiga.

— Queria poder ajudar de alguma maneira. – disse a médica por fim.

A andoriana a encarou e, apesar de trazer certa tristeza no olhar, sorriu.

— Você já ajudou muito, Bev. – disse – Salvou a vida do meu filho.

*   *   *

O Cruzador de Batalha ASC Thelanikirak, classe Kumari, da Guarda Imperial Andoriana havia se colocado a estibordo da Enterprise e os tripulantes da Gar’Lev já haviam se transportado e todos os feridos haviam sido transferidos para a sua enfermaria. O capitão Shissev aguardava apenas o embarque da capitã Thylia Zh'thathar para retornar a Andoria rebocando a nave atacada.

Na sala de transporte Um da Enterprise estavam a Dra. Crusher, a capitã Thylia e o capitão Picard, além do chefe O'Brien, que iria operar o transportador.

— É realmente uma pena que nós devamos nos despedir novamente em uma situação desagradável, capitã. – disse Picard estendendo a mão para Thylia.

— Também acho capitão. – respondeu ela sorrindo, aceitando o cumprimento – Mas me alegro que você cumpriu a promessa de cuidar bem da nossa amiga.

Jean-Luc sorriu também.

— Não foi preciso. – disse ele, olhando para Beverly – Esta garota sempre soube se cuidar muito bem sozinha.

A andoriana se aproximou de Beverly e ofereceu-lhe o antebraço para o cumprimento particular delas.

— Pequenina, eu não tenho palavras suficientes para agradecer tudo o que você fez por mim, antes e agora – disse Thylia emocionada – por isso resumo em uma só: obrigada.

A Dra. Crusher apertou o braço da amiga com carinho.

— Disponha, grandona – respondeu ela – Sempre.

A andoriana subiu na plataforma e ao se virar novamente, trazia os olhos marejados.

— Sr. O'Brien, acionar – ordenou o capitão Picard.

Quando o feixe luminoso do transporte começou a se formar, Thylia Zh'thathar colocou a mão aberta sobre seu coração e em seguida a estendeu em direção a Beverly Crusher.

E a médica repetiu o gesto para a amiga, momentos antes da plataforma ficar vazia.

—      FIM    -