Don´t so Cute escrita por Itiana Chan


Capítulo 1
Capítulo 1- Não, querido!


Notas iniciais do capítulo

Olá caro(a) leitor(a) essa história é simples, gostaria que a existência dela ajude a nós mulheres, a ter o devido reconhecimento e um incentivo a força feminina.
Espero que tenha uma boa leitura e se gostar deixe sua opinião pois, ajuda bastante essa aspirante a escritora!



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O dia amanheceu como qualquer outro, exceto pelo sol escaldante que entrou pela janela do pequeno quarto onde durmo desde o início do ano. Diferente da França, o sol aqui é muito quente, mesmo sendo uma das capitais mais frias do país. Acredito que estejamos no verão.

Tomei um banho, me vesti e sai de casa comendo uma fruta qualquer que achei na geladeira, era amarelada e se não me engano era uma fruta tropical, carambola talvez.

Enquanto descia a longa escadaria que aparentava ter pelo menos seis metros de cumprimento, no meio do percurso parei em frente a uma pequena padaria e achei o lugar tão agradável que acabei entrando, pedi um café simples e misto quente.

 O trabalho como jornalista não paga sequer o suficiente para um café da manhã reforçado, quero dizer, o meu salário como jornalista.

 Obviamente, homens recebem bem mais que mulheres, estas que inclusive ainda estão entrando nesse ramo. Sai dos meus devaneios quando percebi que duas velhinhas, aliás, senhoras de meia idade – acho que são mais jovens que minha mãe – elas não paravam de me observar enquanto conversavam, olhei para a caderneta dentro da bolsa, será que falavam algo que merecesse uma reportagem?

Me esforcei para ouvir a conversa e assim que ouvi do que se tratava, fechei a cara e guardei o material de trabalho. Mais um par de preconceituosos para a coleção!

— Ela é jornalista! Disse uma senhora com voz rouca, a outra fez uma careta e torceu o nariz como se lembrasse de algo nojento.

— Sua mãe deve sentir vergonha da filha se prestar a um papel tão vulgar! A segunda senhora falava ainda com expressão de nojo. – E aquela saia, como pode trabalhar rodeada de homens vestida assim?

Ao ouvir isso levei meus olhos para saia que eu usava, faltavam quatro dedos para o joelho, um palmo maior do que as que estão na moda atualmente na França. Seria até composto, suspirei. A última coisa que precisava era ouvir aquele tipo de pensamento fechado logo cedo, mas não consegui manter a língua dentro da boca, acabei o lanche e me dirigir até as duas senhoras ali sentadas.

— Querem um conselho? Questionei. – Leiam mais! Não é vulgar uma mulher fazer trabalho masculino, buscar seus sonhos, fala mal de desconhecidos sim, é vulgar, e aliás, minha mãe sente muito orgulho de mim!

Quando eu terminei, respire fundo, dei um sorrisinho entre dentes e segui meu rumo. Essa maldita dor no estômago que não passava. Ao que tudo indica esse dia vai ser terrível. 

Segui em direção a biblioteca municipal e peguei livros sobre arte enquanto observavam os cartazes sobre a Semana de Arte Moderna que estavam coladas em várias paredes, seria um grande evento e provavelmente daria uma boa matéria, peguei meu bloco de notas e escreve alguns dos nomes ali.

 Enquanto estava sentada num dos bancos do bonde abri um dos livros que falavam sobre cultura, eram pinturas medievais, pensei em fazer uma ponte entre os dois movimentos, que na minha opinião são extremamente distintos, tenho que admitir que gosto muito das novas artes plásticas, estava em uma das cadeiras no meio do automóvel, tenho que admitir que sou supersticiosa e acredito que acidentes são fatais para quem está nas extremidades do veículo.

Acabei saindo novamente dos meus devaneios quando notei que era observada por um grupo de rapazes, que pela idade deveriam ser estudantes, seus sorrisos arrogantes acabaram me irritando, uma mulher não pode andar num bonde sem ser tratada como uma qualquer?

Tentei mudar minha atenção para a senhora que fazia palavras cruzadas no seu jornal. E quando finalmente desci do ônibus, dei graças a Deus por finalmente ter chegado na estação. Corri para o prédio onde funcionava o jornal, entrei e fui na direção da sala de trabalho, tentando controlar a respiração perdida na corrida.

— Bom dia! Falei entrando na sala. Imediatamente senti olhos sobre mim, o que já era de se esperar já que a maioria dos focas são homens, resolvi ignorar aqueles olhares irritados e me sentei na minha mesa, cruzei as pernas e coloquei o sobretudo sobre elas para não “tirar” a atenção dos meus colegas de trabalho.

 Me chamo Alison, tenho 25 anos, me formei recentemente em jornalismo, francesa, cabelos loiros na altura dos ombros, sempre liso escorrido, meus olhos são grandes e verdes. Hoje acordei pouco depois das 5:00 da manhã, terminei minha matéria sobre a modernização das mulheres em busca dos seus direitos, espaço na vida profissional onde antes era estritamente masculina.

— Algum problema?  Questionei ao notar um murmurinho chato. – Posso participar do murinho? Perguntei ríspida, minha intenção foi ser arrogante mesmo. Às vezes é necessário para evitar piadinha constrangedoras, de outra forma não conseguiria nada.  E se não fosse assim teria sido melhor me casar e ficar submissa a um marido opressor que não me deixaria sequer escrever uma crônica do dia-a-dia. Honestamente, eu não nasci para trocar fraldas e cuidar da limpeza da casa. Em pleno século XX, uma mulher não tem direito a seguir o que deseja, é um pensamento ultrapassado e ridículo!

Christophe sorriu amarelo e perguntou se eu participaria do evento relacionado a Semana de Arte Moderna, e perguntou se poderia ir comigo, quando recebeu uma resposta positiva me lançou uma um sorriso animado.  Ele é um homem alto, bonito, barba perfeitamente feita, olhos extremamente pretos como ônix, porte forte, costas largas que se destacavam na camisa social branca. Acredito que tenha uns 28 anos, seus olhos mostram mais que o sorriso galanteador, eles dizem o mundo é dos fortes e os Pequenos são esmagados.

Depois de insuportáveis dez horas de trabalho, finalmente voltei para casa, pouco depois das 17:30, tomei um banho rápido e fui escolher o vestido ideal para o evento, revirei literalmente meu guarda-roupa inteiro, até que finalmente achei algo que me agradasse, um vestido todo preto, nos braços e ombros o tecido é fino e transparente, longo e elegante, coloquei sapatos de bico fino sem meias, está quente demais para usa-las.

Agora que já estou pronta soltei meus cabelos e coloquei um pequeno enfeite prateado em forma de flor, brincos de mesmo modelo, maquiagem simples. Peguei minha parceira de crime, a minha bolsa preta de que não desgrudo, dentro dela está meu bloco de notas e caneta.  Pronto, meu visual está completo!

 Peguei um bondinho que passaria próximo ao bairro do teatro onde estava ocorrendo o evento e encontrei Christophe na porta do local me esperando.

— Está linda! Ele elogiou abertamente, não gostei muito disso, porém agradeci o elogio um pouco hesitante, ele pareceu satisfeito.

Decidimos nos encontrar aqui pois, tenho absoluta certeza de que se ele fosse me buscar em casa, segundos depois meu nome já estaria rolando na boca de todos em São Paulo e acredito que não seria nada bom para minha bela reputação de moça decente que deixei em Paris, junto a minha querida mãe.

Assim que coloquei os pés no salão, perguntei a ele se tinha conseguido algum furo e com um sorriso sacana, respondeu que não havia entrado ainda, pois estava me esperando. Conversamos mais um pouco sobre o evento, aparentemente temos a mesma opinião a respeito dos autores modernistas. Meia hora depois, meu companheiro sumiu, provavelmente deve estar degustando o ótimo champanhe que estão servindo.

Tenho que admitir que esse local realmente parece muito refinado, tudo está muito bonito e organizado, uma grande quantidade de cadeiras milimetricamente alinhada, haviam comes e bebes variados despostos em longas mesas com forro branco de renda ricamente bordadas em detalhes, lembra-me um casamento tradicional espanhol.

 De súbito, uma grande multidão entrou no local assim que as grandes portas negras se abriram haviam diversas expressões, algumas pessoas em expectativa, alegres, outros curiosos, porém, haviam alguns que aparentavam estar apenas esperando o show começar para distribuir vaias.

Finalmente notei uma faixa branca fixa no teto, onde estava escrito: “Primeiro dia da semana 22, Graça Aranha!” Lembro de ter ouvido muito esse nome relacionado a poesia brasileira, estava acometido de uma grave doença desde moço o que não o impedia de escrever.  Assim que a apresentação começou pude ouvir em meio ao recital de poesia, gritos próximos a mim que aos poucos, se transformaram em vaias, e sons desagradáveis.

Tapei meus ouvidos e acabei fugindo da confusão. Me sentei em uma cadeira afastada onde pude escrevia o acontecimento no meu pequeno bloco de notas, fiquei a pensar em como isso deve doer aos autores modernistas. Ali sentada, de repente vi um quadro ao fundo, um arrepio subiu minha coluna, uma angustia muito grande me tomou ao observar fixamente uma mulher que chorava em uma das telas.

— É bonito, não? Ouvi uma voz feminina ao meu lado, me virei para o lado e me deparei com uma jovem de mais ou menos da minha idade, ela sentou-se ao meu lado e continuou: – gosto da arte, ele expressa os sentimentos do autor!

— Concordo com você! Aquele em especial! Apontei o quadro que havia visto agora a pouco, ela confirmou com a cabeça, ficamos em silêncio.

— como se chama? Ela tornou a puxar assunto.

— Alison! Respondi sorrindo. – Sou jornalista! E você como se chama?

— Anita! Anita Malfatti!

Quando ela disse isso, não me contive e pedi para que repetisse, pois não conseguia acreditar no que estava ouvindo, quando ela repetiu comecei a rir. Sem querer eu consegui o que dezenas de homens tentaram a noite inteira.

— Sinto muito pela a crítica ruim! Lembrei do que Monteiro Lobato havia escrito a respeito dela, coisa que na minha opinião, havia sido muito grosseiro.

— Na época, admito que me senti muito mal! Ela começou a rir, e pude sentir o amargor em sua voz. – Com o tempo me acostumei, já estou melhor, mas acabei não ligando muito para o modernismo, acho que não deixei ser vivenciada por frases maldosas!

— Anita, eu sou jornalista, posso publicar essa conversa? Perguntei ao ver que ela já estava indo embora.

— Pode! Ela falou sorrindo. – E escreva também que eu quero que o grande Monteiro Lobato se exploda! Não me importo mais com a opinião dele.

Um rapaz aproximou-se e se ofereceu para tirar algumas fotos nossas, entregou uma para cada, pagamos e ela levantou-se:

— Eu tenho que ir agora! Começou. – Mas, foi muito bom te conhecer!

— Boa sorte, foi muito bom te conhecer também! Eu desejei quando ela me abraçou, nos despedimos e depois que ela saiu sentei-me novamente e naquele curto espaço de tempo escreve exatamente tudo o que conversamos.

Do nada, “meu companheiro” visivelmente desanimado, sentou-se ao meu lado e suspirou: – vir aqui foi perda de tempo! Resmungou soltando um palavrão logo em seguida.

— Eu gostei! Falei lhe provocando, isso está se tonando meu passa tempo ultimamente. – Porque está tão desanimado?

— A senhorita se quer levantou-se, o que de interessante tem nisso? Respondeu com outra pergunta, me olhando de cima a baixo.

— O champanhe parecia bom! Alfinetei, mesmo sabendo que ele não se embriagou, mas tenho consciência de que foi a única coisa que ele fez a noite inteira.

Ele balançou a cabeça negativamente, mas logo sorriu dizendo que deveríamos ir embora pois, ainda deveria ter conduções circulando.

— Oh! Sorri de canto e apertei a agenda em minha mão. – Não se preocupe comigo!

— Sei que não nos damos bem! Ele sussurrou me olhando dentro dos olhos. – Mas, não quero seu mal e não é nada bom uma moça andar só à noite, pode ser assaltada ou algo pior!

Seu argumento parecia verdadeiro, então suspirei e disse que aceitava a sua companhia. Quando cheguei em casa tratei logo de tirar aquele bendito sapato que apertava meus pés, não me surpreenderia se começasse a mancar depois disso, não lembro de ter dormido, mas acordei numa posição extremamente desconfortável.  

Finalmente consegui me levantar, preciso ir trabalhar, lembrei da minha grande conquista, e isso me deu forças.

— Bom dia! Cumprimentei vendo que ninguém estava feliz na sala, mas eu estava super animada, e como ninguém respondeu, eu entrei no recinto. Olhei para Christophe intrigada, até ele estava desanimado.

— Que tristeza é essa? Perguntei, como não houve resposta, eu tentei puxar assunto novamente, seu estado estava pior que o dos outros.

— O evento acabou e não conseguimos nada! Ele suspirou cansado. – Mas, a senhorita parece bem animada, conseguiu algo?

— Sim! Respondo calmamente. – Eu fiquei sozinha, e tive que arranjar companhia! Acabei achando alguém para conversar. Quando terminei minha explicação, lhe mostrei minha matéria sorrindo.

— Eu não acredito! Ele resmungou. – Como conseguiu? Sua pergunta se perdeu no ar e ele acabou sorrindo enquanto fazia uma negativa com a cabeça.

— Tenho que admitir... você é boa! Eu realmente me enganei sobre você! Ele estendeu a mão e sorriu verdadeiramente aceitei-a e sorrimos. 


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Notas finais do capítulo

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