Cactos & Girassóis escrita por Sali


Capítulo 25
Vinte e quatro (Parte I)


Notas iniciais do capítulo

Ei, galera! Turubom?
Começamos aqui a primeira parte do último capítulo! ♥
E, além disso, é finalmente o dia do torneio... como será que a Lena vai se sair?
Espero que gostem ♥



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Domingo | 11 de Dezembro

Helena sentia tanto frio na barriga que era como se ela tivesse engolido várias pedrinhas de gelo ─ apesar de que aquele momento, em específico, era voltado para o descanso.

Ela olhou mais uma vez para o relógio, no celular: meio-dia e vinte. O horário da pesagem das competidoras havia sido até meio-dia, com todos aqueles detalhes técnicos: definição das categorias, avaliação das vestimentas e das bandagens e uma breve reunião com Felipe, seu treinador, só para acertar os últimos detalhes.

Agora, ela estava sentada numa das arquibancadas ainda vazias, bem perto de uma das entradas laterais do ginásio ─ que, para o torneio, estava fechada por grades. Alguns grupos de garotas das mesmas academias conversavam, e, inclusive, ela conseguia ver Felipe perto do ringue, junto a um pequeno grupo de adolescentes que treinavam com ela e competiriam nas categorias sub-13 e sub-15.

─ Ei! Lena!

A voz de Gabriela ─ que, afinal, não pertencia mais ao torneio jovem ─ surgiu como uma surpresa para Helena, a ponto de ela demorar alguns instantes para localizar de onde vinha. Logo, porém, não conseguiu deixar de rir baixo ao ver o rosto da amiga entre as grades da entrada lateral.

─ Ei, Gabi. Algum problema?

─ Só vim te desejar boa sorte! E trazer um presente também.

A primeira parte era familiar para Helena; no ano anterior, quando apenas Gabi participara da competição, Lena também enfiara a cara na grade, apenas para desejar um boa sorte para a amiga. No entanto, a parte do presente era inédita, e a deixou imediatamente curiosa.

─ Você sabe que eu não posso pegar nada agora, né.

Gabriela, no entanto, soltou outra risada e encolheu os ombros.

─ Eu não falei que era um objeto…

E, no instante seguinte, o rosto enfiado na grade era de Marina ─ que, no lugar dos cachos volumosos ou do habitual coque abacaxi, tinha box braids negras e longas, com as pontas azuis, presas num rabo-de-cavalo pelo lenço que Lena já conhecia.

─ Mari! Caralho, você tá linda

Marina deu uma risada doce e tímida e se aproximou um pouco mais.

─ Vim te desejar boa sorte também, gatinha.

Lena corou quase automaticamente; não fossem as grades e a presença de Gabi, que a embaraçava um pouco, com toda certeza daria um beijo na garota naquele instante.

─ Time! Aquecimento! ─ a voz alta de Felipe soou por todo o ginásio, antes mesmo que Helena pudesse responder Marina.

Ela, porém, sorriu mais uma vez para a garota.

─ Te encontro mais tarde, ok? Obrigada. E obrigada, Gabi.

Gabriela meneou a cabeça, murmurando um “disponha, baby”. E, antes de saírem, Mari acenou uma última vez.

No instante seguinte, Lena já descia os degraus altos da arquibancada, juntando-se ao grupo da academia dela pra iniciar uma série breve de aquecimentos.

O frio na barriga ainda imperava, mas, pelo menos, o exercício a ajudava a manter seu foco em outro lugar.

─ ─ ─

Pouco depois de uma da tarde, quando a entrada do público foi liberada, as arquibancadas já estavam cheias. Apenas em uma das fileiras se reuniam Marina, Jordan, Daniel, Gabriela, Matheus, Clara e sua namorada, Júlia. Todos, naquele momento, com diferentes níveis de expectativa para a entrada de Helena no ringue ─ principalmente quando, no telão, o nome dela surgiu junto a vários outros, com a distribuição de lutas da primeira fase.

Marina sentiu um certo nervosismo ao ver que, estando na Chave 1, Helena aparecia em três lutas ─ e que, se ela conseguisse uma boa quantidade de pontos nas três, ainda faria a final de sua categoria com a campeã da Chave 2.

Ok, era um esporte. Ok, Lena a tranquilizara, falando várias vezes que não era nada tão violento. No entanto, ainda era uma luta… e, olhando para o telão, Mari só conseguia pensar nas cenas sangrentas do UFC que já vira na TV uma vez ou outra.

Logo ao seu lado, porém, servindo quase como alívio cômico, estava Jordan, curiosamente animado.

─ Adorei esse conceito, cara… minha irmã pegando uma mina que é lutadora! Tipo, rolê de casal: torneio de muay thai!

A empolgação do rapaz, no fim das contas, acabou conseguindo arrancar uma risada de Marina. E, quando as lutas das categorias sub-13 e sub-15 começaram ─ e nenhum sangue foi derramado em lugar nenhum do ringue ─, ela, enfim, começou a relaxar.

─ ─ ─

─ E aí, quem vai ser dessa vez? Azul ou vermelha?

Mari riu da empolgação do irmão ─ que era competitivo por natureza ─ e se pôs a pensar. Após algumas lutas, os dois já estavam fazendo pequenas apostas, tentando adivinhar quem venceria cada combate. Os nomes eram sempre citados, mas, para os dois, as lutadoras eram identificadas apenas porque as luvas eram sempre azuis e vermelhas.

─ Acho que nessa vai a azul, hein ─ ela comentou, enquanto observava as garotas frente a frente e a árbitra do torneio passando as últimas instruções para ambas.

─ Azul? Essa menina baixinha? ─ Jordan franziu a testa. ─ Para, né. Ela nem parece ser peso-leve.

Marina voltou a rir. Nem de longe muay thai era uma das áreas de expertise do rapaz, mas, àquela altura do torneio, ele estava tão investido nas lutas que falava como se estudasse a modalidade há anos, e não como se tivesse aprendido os termos minutos antes, com os anúncios do locutor.

─ Eu boto fé nas baixinhas, ué ─ ela encolheu os ombros e, logo em seguida, o início do primeiro round foi anunciado. ─ Vamos ver o que pega lá.

Jordan balançou a cabeça, ainda rindo um pouco, mas logo voltou sua atenção para o ringue.

─ Eu vou na vermelha. Que vença a melhor… 

Os dois irmãos riram mais uma vez.

Nas categorias jovens do muay thai, o que era o caso do torneio inteiro, todas as lutas consistiam em três rounds de dois minutos cada. Assim, não demorou muito para que a árbitra anunciasse o resultado ─ e, também, a primeira vitória por knock-out do dia. Numa das arquibancadas, a torcida da garota de luvas azuis vibrou mais alto que o resto, e Marina comemorou também, tão animadamente como se fosse parte deles.

─ E aí, quanto foi a aposta mesmo, Michael Jordan? Dez reais?

O rapaz revirou os olhos, mas ainda tinha um sorriso leve no canto do lábio.

─ Foi sorte isso aí.

Marina voltou a rir.

Os embates estavam acontecendo dos menores pesos para os maiores e alternando as categorias de idade. Assim, passadas as lutas dos pesos menores do sub-13 e do sub-15 da primeira fase, nada demorou para que o locutor anunciasse a frase que, com poucas palavras, conseguiu trazer toda a tensão de volta para o corpo da garota:

─ Na categoria peso-médio do sub-17 feminino, pela Chave 1, Anna Carvalho e Helena Martins.

Mari ficou mais séria quando viu Helena, de luvas vermelhas, conversando com um homem alto e largo, com dreads bem-feitos e um braço fechado de tatuagens tribais ─ o treinador. E seu estômago começou a dar saltos no exato instante em que Lena enfim subiu de um lado do ringue, enquanto a outra garota ─ que era tanto mais alta quanto mais larga que ela, parecendo, na opinião de Marina, grande demais para estar de fato na categoria de peso-médio ─ subia do outro lado, ajeitando as luvas azuis.

─ E aí? Azul ou vermelho? ─ Jordan brincou, então, e Marina apenas revirou os olhos.

─ Pode ter certeza que se dessa vez você torcer pro azul, quem vai levar nocaute é você ─ ela respondeu, rapidamente, sem tirar a atenção por um segundo do ringue.

─ Ouch. Okay. Mas até parece que eu não ia torcer pra Lena.

Mari riu pelo nariz.

─ É bom mesmo.

E então, Helena estava ouvindo as últimas instruções da árbitra. E nos momentos seguintes, Marina só conseguia pensar que, ao mesmo tempo que ficava um pouco preocupada, estar vendo Lena demonstrar sua habilidade com todos aqueles golpes extremamente rápidos fazia seu coração bater um pouco mais forte.

─ ─ ─

Helena se sentou no banco de madeira, ofegante, e ajeitou os fios soltos no rabo-de-cavalo firme. Já não pingava suor como minutos antes, e, apesar de alguns pontos meio doloridos no corpo, se sentia bastante satisfeita.

─ Boa, Lena, foi uma boa luta. É isso mesmo, não pode perder o foco e tem que manter a calma. Agora pode descansar que daqui a pouco tem a segunda.

Helena sorriu levemente e apenas acenou com a cabeça, sobretudo quanto o cumprimento habitual de Felipe ─ um tapinha nada gentil no ombro ─ lhe pegou desprevenida, apesar de ela estar mais do que habituada com sua mão pesada.

Logo que ele saiu, então, Anna se sentou ao seu lado, igualmente ofegante e com uma garrafinha de água na mão.

─ Você melhorou.

Lena ergueu as sobrancelhas e deu uma risada pelo nariz, voltando o olhar para a garota alta, de cabelos castanhos cacheados e olhos alegres.

─ Quê?

─ É sério, Lena, você melhorou demais. Tá bem mais rápida que antes. E lutando com mais calma também.

Helena deu um sorriso leve.

Anna, uns três anos antes, havia treinado na mesma academia que ela ─ e, por um breve período de tempo, as duas foram, inclusive, amigas próximas. Mesmo no momento atual, com o afastamento normal causado pela falta de contato, elas ainda tinham uma relação bastante amigável. E, apesar de seu tamanho ser um pouco assustador, ela era uma das pessoas mais gentis e delicadas que Helena conhecia.

─ Obrigada. Foi uma boa luta.

A outra garota fez que sim com a cabeça e sorriu antes de se levantar, dessa vez na direção do vestiário.

─ ─ ─

Parecia ter se passado apenas dez segundos e, ao mesmo tempo, uma hora inteira quando Lena entrou no ringue pela segunda vez. De qualquer forma, quando seus pés descalços finalmente tocaram a lona, ela se sentia completamente descansada, e já cheia de energia para a próxima luta ─ isso, sobretudo, quando encarava a expressão desafiadora de sua oponente, Fernanda Wang.

Diferente de Anna, a garota não era familiar, mas Helena não precisava conhecê-la para entender o que significavam sua inquietude no ringue, enquanto a árbitra repassava as regras, e seu olhar impaciente, fixado em Lena.

Até que, enfim, a juíza se afastou alguns passos e deu a ordem; e em segundos Fernanda desferiu o primeiro golpe, tão rápido que foi questão de impulso a defesa que Helena conseguiu fazer.

Enquanto Anna privilegiava sua força para lutar, em golpes não necessariamente ágeis, mas bastante potentes, Fernanda era absolutamente agitada e impaciente; parecia nem precisar pensar exatamente no que fazer depois, emendando ofensivas seguidas. E isso, ao longo do primeiro round, realmente fez Lena temer por sua pontuação.

Até que, enfim, o sinal para o fim do round se fez ouvir, e logo Helena estava sentada num banquinho dobrável em seu corner do ringue, enquanto Alex, um dos assistentes, lhe entregava uma garrafa de água e analisava o encaixe de suas luvas.

─ Lena, ela é rápida, mas se você acompanhar esse ritmo, vai ficar cansada ─ Felipe aconselhou, com palavras rápidas e objetivas. ─ Tenta desacelerar ela, vai no seu ritmo, ataca quando der e não deixa ela te atingir. 

Helena apenas balançou a cabeça afirmativamente algumas vezes, e em questão de um segundo já havia devolvido a garrafa de água e colocado de novo o protetor bucal: era hora do segundo round.

─ ─ ─

Marina mordia as unhas, descascando o esmalte preto, tão nervosa que nem conseguia mais conversar tanto. Apesar de não entender muito de muay thai, a quantidade de golpes e ataques seguidos daquela Fernanda Wang era o suficiente para lhe deixar realmente  preocupada. E, a bem da verdade, a situação era tão tensa que nem mesmo Jordan havia encontrado espaço para fazer novas gracinhas.

Mari, enfim, só conseguiu relaxar quando, depois dos três rounds ─ que pareceram durar uma eternidade ─, a árbitra, enfim, ergueu a mão de Helena. E, lá embaixo, no ringue, ela também pareceu suspirar de alívio.

Lena estava, agora, a apenas uma luta do fim da primeira fase.

Depois de tanta adrenalina, as outras lutas nem pareciam tão interessantes assim para Marina, já totalmente ansiosa para a próxima de Helena. No entanto, ela não deixou de prestar atenção em algumas delas ─ sobretudo numa outra lutadora da categoria peso-médio, que tinha cabelos rosa-pastel curtíssimos, lutava pela Chave 2 e não parecia ter muita dificuldade para vencer suas oponentes.

Até que, enfim, o locutor anunciou a última luta de Lena pela primeira fase. E, com uma mistura de orgulho e nervosismo, Marina viu Helena subir ao ringue com uma garota de cabelos cacheados com pontas pintadas de azul ─ cujo nome, de tão nervosa, Mari nem conseguiu lembrar.

Esse, pelo menos, foi um combate menos aflitivo ─ para o alívio das unhas já maltratadas de Marina. Ela conseguiu perceber que a garota tinha golpes calculados, parecia realmente traçar uma estratégia; em seu olhar pouco treinado, aquela foi uma luta justa, equilibrada: as duas trocavam golpes de igual para igual, e a juíza precisou agir poucas vezes para separar excessos.

E então, passados os três rounds, Marina prendeu a respiração. E acabou soltando um grito quando viu a luva vermelha de Helena sendo erguida pela terceira vez naquela tarde ─ e, no telão, seu nome classificado para a final.

Jordan, Gabi, Daniel e os outros amigos de Lena também comemoraram, junto com uma parte da arquibancada, que também torcia por ela ─ ou que, simplesmente, a havia achado uma boa lutadora.

No entanto, Mari logo percebeu, o nome ao lado do dela era o de Júlia Silva. Mais precisamente, a garota de cabelos rosa pastel e ar atrevido e meio pretensioso.


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Notas finais do capítulo

Até amanhã! ♥
E aceito feedback, hein?



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