Minha mãe tentou me acalmar uma vez quando me viu de coração partido, chorando por um relacionamento a muito tempo destruído que eu havia insistido em levar para frente até o momento em que passou a me destruir. Ela disse que não devemos forçar as coisas, que a vida segue um fluxo e que se não for para acontecer insistir é um erro, mas que o que tiver que acontecer virá sem esforço. Pessoalmente achei bobagem. Achei que era um discurso muito bem ensaiado que ela deveria ter lido em algum livro de autoajuda, mas que nunca se aplicaria na vida real. Como supostamente você conseguiria as coisas sem nunca se esforçar por elas?

Eu ainda não tinha a resposta para isso, mas sabia que devia desculpas a minha mãe. De alguma forma veio... o que eu sempre esperei sem nem mesmo saber que o fazia. Quando parei de procurar o amor nos outros e concentrei-me em mim, o mesmo veio, ou melhor, só decidiu mostrar que estava ali o tempo todo e só eu que não vi. Pitty e minha mãe estavam certas e eu não passava de um completo ignorante.

Sob um holofote ridiculamente posicionado e os milhares de flashs das duzentas pessoas que se encontravam ali tentando guardar cada momento dentro de uma fotografia, eu te vi. Eu te via todo dia, mas ali, naquele momento, foi como se eu tivesse visto pela primeira vez. O rio do amor tinha um fluxo estranho, conturbado, as vezes raso e as vezes, como nesse momento, transbordando – me afogando. Você sorriu quando me viu e eu quis imediatamente chorar. Aquele rio tinha uma água muito pura, e eu o havia contaminado, mesmo assim você continuava sorrindo, como se aquele veneno não tivesse se alastrado por completo e feito-lhe sofrer.

Durante anos tínhamos compartilhado uma vida, tínhamos dividido desvios e bifurcações e agora eu percebia – quase tarde demais – que tudo acabava no mesmo lugar... todo rio tem seu fim e você era o meu. Você sempre soubera que eu era o seu certo?

As lágrimas pesaram e eu fui incapaz de segurá-las, transbordando. Naquele momento acho que ninguém estava entendendo nada, nem meus pais, nem os seus, nem os nossos colegas e seus familiares, mas quem ligava? Um rio nunca para, nem para a plateia. Lembro-me que tremia enquanto caminhava em sua direção... eu podia jurar que meu joelho me deixaria na mão se o caminho até você fosse um pouco mais longo do que aquilo.

I'm so in love
So in love
So in love
So in love

A voz do Ed Sheeran foi a trilha sonora do nosso primeiro beijo lembra?

— É claro que eu lembro seu animal. Por que raios você escreveu tudo isso em? O que você tá planejando Taehyung? Eu não to nem na metade dessa bíblia que você chama de carta e to chorando que nem um palerma, então é melhor você aparecer agora e me contar o motivo disso tudo. – Gritei para a nossa sala vazia.

Eu sabia que ele estava em algum lugar ali, escondido, pronto para dar um bote. Era sempre assim, ele preparava aquelas surpresas surreais, me fazia chorar, gravava e fotografava tudo e então depois postava em seu blog com um trilhão de seguidores me fazendo parecer um péssimo marido, porque eu nunca – em nenhum universo existente – conseguiria ser tão romântico e perfeito como ele era.

Eu queria mata-lo, só não havia decidido ainda se seria em um mar de beijos ou um oceano de prazer.

Diferente das outras vezes ele atendeu ao meu pedido, descendo as escadas do segundo andar, caminhando em minha direção com flores e quase mais lágrimas do que eu. Automaticamente entrei em alerta. Taehyung nunca atendia a um pedido meu de primeira se fosse para estragar suas surpresas – o que só me deu certeza sobre qual surpresa era. 

Minha garganta fechou e me sentei no chão, não aguentando meu próprio peso. Eu entendi o motivo da carta, porque assim que associei o que estava acontecendo ali toda a nossa história começou a passar pela minha cabeça; todos os entraves, os desvios, as correntezas e os reencontros – desde o momento em que nos tornamos amigos, passando pela minha confissão atrapalhada e afobada depois de anos de uma amizade sólida, indo para o dia da nossa formatura onde ele finalmente me correspondera, circundando pelos momentos passados juntos jogados no sofá, os beijos, os “eu te amo”, o pedido de casamento, o casamento... tudo, todo o imenso percurso daquele rio cíclico que sempre nos levava de volta para momentos ainda mais felizes que os anteriores.

Eu não conseguia enxergar seu rosto quando se sentou na minha frente, o óculos tinha embaçado com a quantidade de lágrimas que mais uma vez transbordavam.

— Nós conseguimos? – Perguntei, trêmulo.

Taehyung me abraçou. Eu não sabia onde as flores tinham ido parar, mas suas lágrimas molhavam meu ombro e seu cheiro marcava minha alma.

— Conseguimos. Eles ligaram hoje cedo, nossa vez na fila de espera finalmente chegou. – Ele se afastou, limpou o meu rosto, tirou os meus óculos e abriu o seu sorriso quadrado perfeito. – Nós vamos ter um bebê. Yoongi, nós vamos ser papais.