Há quatro meses atrás, o planeta Terra fora tomado por uma pandemia, sendo que no começo não passava de um simples vírus inocivo que supostamente não merecia atenção aos olhos dos governos. Era muito mais fácil seguir em frente pensando somente na economia e riqueza que obteria a cada dia como se não houvesse nada que pudesse mudar drasticamente a vida dos seres humanos. Mas havia, afinal.

No mundo atual, ninguém se importa com etnias; sexualidades ou gêneros, somente com sobreviver. Quando começaram a entender que era uma situação de risco em diversos países, muitas pessoas prontamente largaram suas máscaras de compaixão e compravam tudo o que podiam, deixando mercados sem estoque. "Antes eles, do que eu", típica frase do egoísmo que corre em nossas veias. Agora já não há mercado, não há hospitais, não há nada que não seja sofrimento. São todos lutando por suas próprias vidas enquanto tiram as de outras pessoas. Roubar dos outros os poucos alimentos que restam já se tornou mais comum do que alguém jamais poderia imaginar. Suja, destruída, é assim que está a cidade de Hosu, onde Izuku e Shouto têm sobrevivido nos últimos dias em um prédio em ruínas enquanto sentiam os sintomas da doença se tornarem mais torturosos à cada segundo. Suas roupas já haviam se tornado meros trapos; seus corpos magros com um mal cheiro por conta da falta de banho, só conseguiam tomar quando chovia, toda água que encontravam — limpa ou não — eram para beber; os estômagos doendo de fome e os olhos sempre marejados.

O único motivo pelo qual preferiram viver e enfrentar tudo isso não era o medo da morte, mas a enorme vontade de permanecer um ao lado do outro enquanto for possível, namoravam à anos, só não se lembram de quantos exatamente, não tinham mais noção de tempo.

O céu estava escuro e carregado de nuvens mesmo sendo tão cedo da manhã, ambos estavam dormindo, ou pelo menos um estava. Todoroki acordou ao ouvir soluços e sentir sua blusa rasgada molhando aos poucos, era Midoriya chorando enquanto afundava seu rosto no peitoral do maior. — Ei, o que foi? Está bem? — Perguntou baixo sentindo sua garganta arranhar pela sede enquanto acariciava o cabelo esverdeado de seu pequeno.

— D-desculpe por te acordar... eu tive um pesadelo... em que você não estava mais ao meu lado — disse com a voz embargada, fazendo pausas por conta dos soluços que seu choro causava. Abraçou Shouto pela cintura com toda a pouca força que ainda tinha, para ter certeza que ele realmente estava lá.

Ergueu a cabeça de Izuku pelo queixo, tendo a vista de sua pele que vem empalidecendo nos últimos tempos como a sua, de seu rosto magro e os olhos esmeraldas tomados por lágrimas. Apesar de tudo, ainda o achava extremamente lindo, igual antes de tudo isso acontecer. — Você sabe que isso é impossível, anjo — fazia carinho em seu rosto com a costa da mão de maneira delicada, temia que Deku pudesse quebrar com um mero toque. Lhe deu um selinho, não importava que os lábios dos dois estavam ressecados e machucados, sentiam que o amor amenizava todas as dores em seus membros e a febre alta que deixavam-os ainda mais fracos. Ambos sorriram, e todo o choro fora dissipado.

Um súbito barulho chamou a atenção deles: era da chuva. Se levantaram com certa dificuldade do chão em que dormiam e deram as mão. Antes de saírem das ruínas que um dia já se foi um Shopping, observou as ruas, aflitos de haver mais alguém. Ao não notarem mais nenhuma alma viva, correram — ou andaram o mais rápido que conseguiam — em direção à chuva. Abriram a boca em direção ao céu, sentindo água adentrarem e molharem suas gargantas. Cada gota parecia levar embora os resquícios de tristeza e medo, era um momento deles, talvez até o último, sentiam isso em seus corações. Porém estava tudo bem, sabiam que iriam se esvair juntos, e suas almas continuariam se amando, independente de onde fosse. Céu; inferno; purgatório; vazio; suportariam tudo se ficarem juntos, e vão. Prometeram isso.

Midoriya puxou Shouto pela nuca e lhe deu um beijo de verdade, com os lábios já molhados. Suas bocas aquecidas como seus corações. Suas línguas dançando como eles em meio à tempestade. Nunca seria um adeus, no máximo, um até logo.