Entre Extremos escrita por Bella P


Capítulo 6
Capítulo 5




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— A Grifinória ganhou! Como a Grifinória pode ter ganhado? — Draco esperneou dentro da cabine em que estava e Dallas perguntou-se pela enésima vez por que estava retornando para Londres na companhia dele. Patrick havia sido levado pelos irmãos direto da estação de Hogsmeade e a maioria das cabines estavam cheias e quando Dallas encontrou uma vazia para ficar somente ela e os seus pensamentos e seus livros, Draco apareceu minutos depois para discursar sobre a injustiça da Sonserina ter perdido a Taça das Casas ao invés de importar-se com a principal questão aqui: por que a Sonserina perdeu a Taça das Casas?

Muitas coisas estranhas aconteceram em Hogwarts no ano em que passou e isto era um marco, visto que era o primeiro ano de Dallas na escola e para ela ter notado algo de anormal em um ambiente que desconhecia, era porque este anormal estava óbvio demais, mas o que tenha acontecido de estranho foi muito mal explicado e entre um boato e outro a verdade que foi-se descoberta era a de que a escola estava guardando um objeto raro que aparentemente o professor Quirrell tentou roubar, mas fracassou. E então, Granger, Potter, Weasley e Longbottom foram pontuados pelo próprio diretor, com a justificativa de que eles ganharam os pontos por alguns feitos extraordinários, mas sem nenhum contexto. Que feitos extraordinários? Esses feitos tinham testemunhas para validar os pontos? Capacidade de dedução? Extrema coragem? Quando foi que eles exerceram tais qualidades, e em que cenário, para ganharem cinquenta pontos cada?

Pois é. Essas perguntas jamais teriam explicação. 

Draco continuava resmungando e reclamando, em um misto de petulância e pura ofensa, enquanto gesticulava largamente com as mãos e Dallas contou até três sob a respiração antes da frase usual do garoto soar pela cabine:

— Meu pai vai ficar sabendo disto!

— Argh! — a menina rolou os olhos e fez a melhor simulação de cachorro entediado que conseguiu colocar em seu rosto, com direito a língua para fora e globo ocular rolando nas órbitas dos olhos. Dallas sentiu a ponta do sapato de Crabbe cutucá-la no tornozelo e Goyle deslizar sobre o banco, ao seu lado, afastando-se dela e daquela visão grotesca. Quando o seu rosto voltou a expressão usual, viu Draco com um bico enorme e braços cruzados sobre o peito, sentado no banco oposto a onde ela sentava. 

— Não teve graça. 

— Teve sim. — Dallas disse com divertimento. Usualmente costumava manter distância de crianças como Draco, ainda mais quando essas insistiam em lhe ofender somente para erguer a própria auto-estima. Mas o que antes isto era uma faceta que a irritava em seus colegas de sua antiga escola, hoje, em Draco, a divertia. 

— Por que eu ainda falo como uma sangue-ruim como você? — se a intenção de Draco era ofendê-la, ele errou o tiro por quilômetros de distância.

— Eu não sei. Por que fala? Não fui eu que entrei aqui e comecei a resmungar sobre a vitória da Grifinória. — como sempre, Draco não tinha uma resposta para a pergunta, e a única coisa que pôde fazer foi imitar um peixe fora d’água ao abrir e fechar a boca repetidamente, sem emitir som algum. Dallas riu e recolheu a sua bolsa do bagageiro acima da cabeça deles assim que sentiu o Expresso parar completamente. — Boas férias, Draco. — desejou antes de deixar a cabine. 

 

oOo

 

Dallas estava certa ao pensar que Amélia não ficou nada feliz com o fato dela não ter retornado para casa no Natal. A figura da mulher, altiva e sempre elegante, entre os meros mortais que transitavam por King’s Cross, era mais do que indicação de o quão contrariada ela ficou. Outra indicação foi que Dallas mal aproximou-se dela, empurrando o seu carrinho com malão e Osíris, que chamava a atenção de todos que passavam por ela, e Amélia segurou-lhe na mão, como se para impedi-la de fugir, e com a outra livre ajudou a empurrar o carrinho até onde Montgomery esperava com o carro.

A viagem de Londres para Hampstead foi feita em absoluto silêncio e palavras só foram trocadas quando o carro atravessou o gigantesco jardim dianteiro da propriedade e estacionou perto da entrada e empregados vieram ajudar a descarregar as malas. Clarisse sorriu largamente para Dallas e em um gesto afetuoso lhe deu um rápido abraço, Amélia ignorou a neta em favor de retornar para dentro da mansão com o clique-clique de seus saltos ecoando às suas costas. 

— Em uma escala de um à dez, o quão irritada grand-mère está comigo? — Dallas perguntou à Clarisse enquanto tirava a gaiola de Osíris de dentro do carro e abria a portinhola. Corujas mágicas eram diferentes das comuns, independentes e leais, portanto não tinha medo que Osíris voasse para longe e nunca mais voltasse, não quando ela sabia exatamente o caminho de casa. 

Osíris piou e saiu da gaiola com um pulo, em outro pousou na cabeça de Dallas, deu uma bicada afetuosa na franja da menina e então levantou vôo para esticar as asas e procurar a sua caça do dia.

— A senhora Winford tinha planos para o Natal. — Clarisse comentou e comprimiu os lábios de tal forma que a sua expressão de desagrado diante de uma lembrança inconveniente ficou clara. 

— Que planos? — Dallas perguntou quando ambas puseram os pés dentro da mansão. 

— Allen Halliwell. — foi a voz suave e endurecida de Amélia que respondeu. Diferente do que Dallas esperava, a sua avó não tinha desaparecido casa adentro, mas sim a esperava no hall de entrada. 

— Allen Halliwell… — Dallas repetiu o nome como se fosse amaldiçoado.

Allen Halliwell era um ano mais velho que os gêmeos e ela e a sua família fazia parte do grupo da alta sociedade londrina, o que significava que eles se conheciam desde sempre. Allen lembrava um pouco Draco, loiro, feição pontiaguda, arrogante e mimado, e como conviveu com ele por anos, criou imunidade o suficiente contra este tipo de pessoa para não deixar-se abalar pelas infantilidades que saíam da boca de Draco Malfoy e a ida a Hogwarts a fez esquecer um outro pormenor referente a existência de Allen Halliwell:

Amélia planejava unir as duas famílias em matrimônio e planejava fazer isto usando Dallas. 

Muitos diriam que era moralmente errado informar a uma menina de oito anos que ela iria se casar com um garoto de nove quando chegassem a idade apropriada, em uma tradição arcaica e que era mal vista em sociedades de países de primeiro mundo, mas Dallas conhecia bem o seu lugar dentro daquele pequeno e privilegiado nicho dos ricos e famosos. Ela havia sido reconhecida legalmente como uma Winford quando recebeu o nome da família, biologicamente também foi atestado que ela era uma Winford, mas tradicionalmente ela ainda era uma bastarda, concebida fora dos laços sagrados do matrimônio em um caso extraconjugal, portanto não era dotada de todos os direitos que Samantha e Nicholas tinham. Samantha e Nicholas que todos fofocavam e suspeitavam que fossem filhos de Francis, mas cuja concepção ocorreu quando Meredith e Albert já estavam casados, e o pai era o patriarca da família, impreterivelmente, diferente da desconhecida sem nome e sem passado que largou Dallas nos braços dos Winford e foi embora. Portanto os gêmeos herdariam o nome e as empresas Winford, à Dallas restava apenas a posição de garantir uma boa aliança social via casamento. 

— Você sabe as regras, Dallas. — Amélia disse sem nenhuma gota de comiseração em sua voz e Dallas suspirou longamente. Sim, ela sabia as regras, essas foram explicadas de forma sucinta por Amélia desde que se conhecia como gente, repetidas de maneira cruel por Meredith e ecoadas pelos gêmeos desde sempre. 

Ela era uma Winford, mas ao mesmo tempo não era, portanto as suas escolhas e o seu futuro não lhe pertenciam. Por agora Amélia lhe permitia liberdades, regalias, em troca de Dallas cumprir o que a matriarca tivesse planejado para ela em um futuro não mundo distante. Se foi permitida frequentar Hogwarts, é porque a sua avó esperava que Dallas casasse com Allen Halliwell sem protestos. 

Amélia aproximou-se da neta e parou perto o suficiente dela para abaixar o tom de voz e permitir que somente a menina ouvisse as suas próximas palavras:

— É o que eu quero para você? Não, não é. Mas eu sei que não estarei aqui para sempre, a minha existência é o que impede Meredith de descarregar toda a sua amargura sobre você, então eu tenho que garantir que o seu futuro esteja seguro. — ela disse tudo isto em uma voz descaracterizada de grande emoções, mas somente o fato de Amélia ter dito isto mostrava que ela se importava, um pouco que fosse, com Dallas. 

— Mas tinha que ser com Allen Halliwell? — avó e neta sabiam a razão do protesto de Dallas. Allen Halliwell era um menino pedante e sem grandes atrativos, com desvios de caráter que tinham grandes chances de permanecerem na vida adulta se os pais não colocassem um freio nele ou a maturidade lhe trouxesse alguma sabedoria. E Dallas? Dallas era uma menina brilhante. Ela era inteligente, poderia ser o que quisesse ser, mas o nome Winford sempre pesaria em suas costas, sempre a amarraria àquele mundo, e não era fácil livrar-se daquele mundo. 

— Os Halliwell foram os únicos que aceitaram o acordo. — os Halliwell viam números em suas vidas, eram homens e mulheres de negócio, eles não viam pessoas e sentimentos. Dallas, para eles, era um meio para um fim, e o seu status de bastarda era o de menos, ela era uma conexão sólida com os Winford e queriam assegurar-se de tê-la antes que outro arrebatasse a oportunidade. 

— Não se preocupe, grand-mère, o acordo será honrado, eu só não estava com humor de engolir os gêmeos por duas semanas depois de meses sem a presença intoxicante deles na minha vida. — Amélia assentiu para Dallas. Samantha e Nicholas eram um caso perdido e o tempo de moldá-las e discipliná-los ao seu gosto veio e passou. Meredith os mantinha sob as suas asas, perto o suficiente para as suas opiniões e despeito refletirem e enraizarem nas duas crianças. Dallas? Esta Amélia pôde moldar como uma verdadeira Winford deveria ser. Albert não queria criá-la, como não criou os gêmeos, esta função era sempre das esposas, a dos homens era trazer o provento para casa, e para Amélia sobrou este fardo, porque ou seria ela ou a criadagem e a ideia de ter Clarisse ou Montgomery influenciando Dallas além do que ela permitia eles influenciar a garota, era aterradora.

Amélia não gostava de imaginar do que resultaria esta educação. Clarisse e Montgomery eram bons criados, de boa postura e profissionais íntegros e leais, mas eram coração mole, não compreendiam por inteiro o que era viver naquele mundo. Aquilo era mais que dinheiro e posição social. Eram intrigas e difamações, era politicagem, um mar de tubarões querendo devorar uns aos outros ao menor deslize. Tubarões que sorriam em sua cara e fingiam carinho e amizade enquanto pelas suas costas planejavam a sua derrocada. Uma Dallas que fosse educada pela criadagem seria uma menina frouxa, de sentimentos frágeis, que poderia ser magoada facilmente e choraria por qualquer coisa, uma desonra para o nome Winford. 

— Meredith, Albert e os gêmeos não têm ciência do que verdadeiramente aconteceu. Para eles, você foi para a França, como programado, e que a curiosa carta que recebemos foi uma das idiossincrasias da escola, querendo mostrar-se um lugar de ideias clássicas e refinadas, portanto mandaram a lista de seu material escolar atualizada via uma coruja treinada. — Amélia explicou ao afastar-se de Dallas um passo e tomar o rumo para dentro da mansão. Dallas seguiu a avó de perto enquanto continuava a prestar atenção nas palavras dela. — Eu contratei um tutor para aperfeiçoar o seu Francês neste verão.

— Meu Francês já é perfeito. — a família Winford só retornou para a Inglaterra quatro anos após o nascimento de Dallas que, há esta altura, já tinha o Francês como língua mãe e o inglês como língua secundária. 

— Notei alguns deslizes em seu sotaque, ultimamente, não está totalmente parisiense. 

Grand-mère, mon français est parfait. Vous le savez. — Dallas respondeu com petulância. Era uma menina brilhante, com memória fotográfica, grande capacidade de absorção e raciocínio lógico, e interpretação. Não foi testada, mas pelas conversas que espiou entre o psicólogo da sua escola anterior e Amélia, a doutora suspeitava que Dallas tivesse o QI de um gênio.

“Ela apresenta todo o tipo comportamental de crianças geniais. Entedia-se fácil, é de temperamento curto e antissocial. Ela precisa de estímulos, senhora Winford, ou continuará a socar colegas de classe a cada pequena provocação.”

A mulher havia dito e isto tinha sido há dois anos. Desde então, Amélia contratou tutores e intensificou os treinos de montaria e esgrima. Para Meredith e os gêmeos, Dallas estava tendo aulas particulares porque era burra demais para acompanhar as matérias na escola, e este pensamento foi algo que Amélia e ela não desencorajaram em sua madastra e meio-irmãos. 

— Contratei tutores para Física, Matemática, Química e Inglês. Devo supor que a sua nova escola não ofereça nenhuma dessas classes. — não, não oferecia e por mais que gostasse de ler e aprender novas coisas, Dallas não sabia se estava disposta a gastar todas as suas férias estudando mais e mais. — Você vai se casar com Allen Halliwell, mas eu me recuso a mandar para aquela casa uma garota estúpida e manipulável. Os Halliwell são fortuna nova, começaram o seu império com o avô de Allen, então os seus desvios em relação às nossas tradições são perdoáveis, o que possibilita uma chance para você ser algo além de uma esposa e uma boa conexão de negócio. 

— A senhora está me casando com os Halliwell para que eu entre nos negócios deles e seja a conexão entre eles e os Winford, ao invés do Allen?

— Allen é um estúpido que provavelmente será mais uma dor de cabeça do que um sucesso, e Thomas sabe disto. Ele preferiu desposar uma mulher pela sua beleza ao invés do cérebro e acabou ganhando como herdeiro Allen. Portanto, ele não está disposto a cometer o mesmo erro de novo e vê em você a chance dos negócios da família não irem para o buraco depois da morte dele. 

— Me senti especial agora, grand-mère. — Dallas respondeu com sarcasmo.

— Sinta-se, porque ao menos você não terá o mesmo futuro que Samantha, que Meredith… que eu. — Amélia disse enfática ao virar-se para olhar dentro dos olhos da neta.

Dallas sabia de que futuro a avó falava. O futuro que era casar-se com um homem de família de bom nome para servir apenas de esposa troféu. Amélia era sagaz, era inteligente, perspicaz, e à ela foi reservado como único caminho na vida uma casamento e filhos. Uma vez, por curiosidade, Dallas pesquisou sobre o passado de Amélia Brontë, nome de solteira de sua avó, e encontrou protestos sobre igualdade de gênero em seu currículo, um mestrado, dois doutorados, cinco línguas estrangeiras faladas com fluência, mas tudo isto esmagado sob o nome Winford.

— Desculpe-me grand-mère. — pediu, realmente sentida. 

— Vamos. — Amélia virou nos saltos e continuou a seguir casa adentro — O jantar será servido em meia hora e amanhã você terá um longo dia pela frente. — Dallas a seguiu de forma obediente e o assunto sobre Allen Halliwell morreu ali. 




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