Entre Extremos escrita por Bella P


Capítulo 51
Capítulo 50




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— Lily. — Patrick sussurrou para a estátua que guardava a escadaria de acesso para a sala do diretor, e nada aconteceu. — Lily! — repetiu em um tom mais firme. 

— Acho que Deirdre nos passou a perna. — Dallas alfinetou enquanto dividia a sua atenção entre vigiar qualquer movimento estranho no corredor, e as tentativas frustradas de Patrick em abrir a passagem.

— Ela não faria isto! — Patrick resmungou em um tom defensivo. 

— Por quê? Porque vocês têm o mesmo tom de vermelho de tinta óleo correndo em suas veias?

— Você é desprezível. — foi a resposta completamente "madura" dele, seguida de uma careta para fechar o cenário com chave de ouro. Dallas abafou uma risada com as costas da mão. O momento não era propício para piadas, mas era isto ou desmoronar sob o peso da tensão que toda aquela situação gerava. — Deirdre não teria razões para mentir, simples assim. Ela é nascida trouxa e só por isto, apoia a nossa causa sem questionar. Não, ela nos deu a informação correta, mas talvez quem tenha mentido tenha sido Phineas Black, já pensou nisto? Em comparação a minha família, os Black não têm a melhor das reputações. — Patrick alfinetou de volta, com um olhar bem significativo para Dallas. 

In vino veritas. — Dallas rebateu. — Phineas não teria razão para mentir, não é mesmo?

— Não? Então por que cacete a senha não funciona? — Patrick sibilou, irritado. O tempo que perdiam ali tentando abrir aquela passagem era um tempo precioso, cada minuto gasto os colocava ainda mais em risco. Eles sabiam, pelo histórico passado de seus anos em Hogwarts, que o corpo docente sempre se reunia na sala dos professores antes do jantar de boas vindas e se Snape fosse seguir a rotina, o que eles acreditavam que aconteceria somente para manter as aparências, esta era janela de oportunidade perfeita para eles roubarem o livro de registros da escola. 

— Porque… — Dallas deu um tapa estalado na nuca de Patrick. — Snape é um mestre de Poções e lily ainda é uma planta. 

— Hã? — Patrick torceu o rosto em uma expressão confusa e Dallas rolou os olhos. 

— Pelo amor dos deuses, como é que você foi parar na Corvinal? Você desonra as cores da sua casa.

— E você honra de maneira perfeita as da Sonserina. — a resposta dele o fez ganhar outro tapa estalado na nuca. — Pare com isto! — Patrick advertiu com irritação e ganhou um segundo rolar de olhos da amiga. 

Liliaceae. — Dallas sussurrou e meio segundo depois a estátua de acesso a escadaria girou, cedendo passando para ambos. 

— Nerd. — Patrick acusou enquanto subiam os degraus com as varinhas em punho. Todo cuidado era pouco.

— Ou talvez a única pessoa desta escola que presta atenção nas aulas de Poções. — ela defendeu-se quando alcançaram a porta de entrada da sala e espalmou uma mão no peito de Patrick para pará-lo. — Você me espera aqui. — disse em um tom baixo. A porta era de madeira maciça e pesada, o suficiente para cortar qualquer som que viesse de fora para dentro da sala e vice-e-versa, mas Dallas não queria arriscar que as vozes deles ecoassem naquele estreito corredor espiral.

— Não. Não vou deixá-la entrar sozinha aí. 

— Vai sim. — ela declarou com firmeza, transfigurando-se para a sua fisionomia normal. — Se Snape quebrou a rotina e estiver aí dentro, eu terei que usar o Encanto Veela a potência total. Snape é oclumente, saberá se defender do efeito do Encanto, ou no mínimo resistir por mais tempo que o usual. Você não vai me servir de nada se estiver sob o efeito do Encanto também. 

— E se ele estiver aí dentro e o Encanto não funcionar? Independente do ranço que a maioria dos alunos de Hogwarts tem de Snape, ninguém pode negar que ele é um homem brilhante e um bruxo igualmente poderoso. Eu sei que você é foda, Dallas, mas experiência ainda vence conhecimento, e Snape tem mais de vinte anos de experiência sobre você. 

— É, eu sei. — Dallas concordou, querendo evitar que o tom de preocupação saísse em sua voz, mas falhando miseravelmente. Ela compreendia completamente os riscos, mas precisavam daquela lista, precisavam estar, finalmente, um passo à frente de Você-Sabe-Quem. Precisavam retirar os nascidos-trouxas do Reino Unido antes que os Comensais da Morte chegassem à eles e destruíssem ainda mais a comunidade mágica. — Se você ouvir sons suspeitos, como os sons de um duelo…

— Eu venho resgatar você. 

— Não, você foge.

— Dallas…

— Eu estou falando sério, Patrick. Não temos o luxo de perder combatentes ainda tão cedo, uma casualidade é melhor do que duas.

— Dallas! — Patrick sibilou e a segurou pelo braço, a parando antes que ela abrisse a porta. — A sua baixa não é aceitável, entendeu? — declarou com firmeza até ela assentir para ele em concordância, compreendendo naquelas palavras que Patrick não iria simplesmente dar as costas e fugir com o rabo entre as pernas, que isto jamais seria do feitio dele.

Patrick a soltou e Dallas vagarosamente abriu a porta, criando uma brecha espaçosa o suficiente que a permitisse ver parte do interior da sala e, ao mesmo tempo, fazia com que a madeira pesada e escura servisse de escudo. Quando viu que a mesma estava vazia, entrou. 

Dallas nunca esteve na sala do diretor antes, apesar de todos os seus feitos e desfeitos em Hogwarts, o suficiente para lhe garantir grandes ganhos e grandes perdas de pontos para a Sonserina, mas nada grave o bastante para lhe garantir uma visita a diretoria. Ok, sejamos sinceros, quebrar Draco no soco foi algo grave o bastante para ser digno de visitar Dumbledore, mas as regras na Sonserina sempre foram claras, tudo o que acontecia dentro da casa, ficava dentro da casa, a ponto de que Dallas suspeitava que metade das coisas que ocorreram na sala comunal deles não foi de conhecimento de Dumbledore. Snape com certeza usou de toda a sua lábia e conhecimento para enganar o velho diretor. 

Dallas nunca esteve na sala do diretor antes, mas a decoração cheia de penduricalhos e objetos para estudos de Astronomia mostrava que, aparentemente, Snape ainda não havia tomado posse por completo do lugar. Cuidadosamente ela adentrou o aposento vazio, onde armaŕios e livros e quinquilharias estavam espalhados e arrumados da forma caótica que eram as decorações mágicas. No alto, ao longo das paredes, havia vários quadros de diretores passados da escola, alguns dormiam em suas molduras, outros a olhavam com curiosidade, mas nenhum dizia nada, todos esperando de forma mórbida os próximos passos dela. Dallas os ignorou e pôs-se ao trabalho, abrindo gavetas e armários e rodando os olhos pela sala, tentando imaginar onde um livro de registros importante como aquele estaria guardado.

— Se você nos disser o que procura, talvez nós possamos ajudar. — Dallas pulou de susto enquanto jogava sem nenhum cuidado no chão uma pilha de livros que formavam uma torre quase da sua altura, atrás da grande cadeira do diretor. Quando virou-se na direção dos quadros, viu que era a pintura do pŕoprio Dumbledore, que antes estava adormecido em seu assento, que havia dirigido-se à ela. 

— Professor Dumbledore, o senhor… — parece bem para alguém morto? Era indelicado dizer isto, não? Dallas pigarreou e empertigou-se. — Eu procuro o livro de registro de alunos. — Dumbledore arqueou uma sobrancelha branca e a mirou por cima dos aros do óculos meia-lua. 

— Por qual razão?

— Professor, acho que a morte não o deixou estúpido. O senhor sabe exatamente porque eu preciso deste livro. 

Dumbledore soltou uma risadinha.

— Uma das coisas que me arrependo é de não ter tomado mais tempo em vida para conhecê-la. Tenho a certeza que teríamos conversas fascinantes, srta. Winford. 

— Eu duvido. — o velho diretor gostava de ser enigmático e conversar usando charadas, e Dallas detestava charadas, ela preferia pessoas diretas ao ponto. 

— Sob a mesa, no ponto central do tampo, pressione a parte para cima. — Dumbledore orientou e Dallas fez conforme o pedido. Algo ecoou na sala como um baixo estalo e um compartimento abriu-se sob o tampo da mesa, revelando o livro que ela tanto procurava. 

— Ele é mais fino e menor do que eu pensei que seria. 

— Hogwarts só tem pouco mais de mil anos de existência e, ainda sim, levou algumas centenas de anos para tornar-se a escola da magnitude que é hoje, fora que muitas famílias mágicas ainda optam pela educação domiciliar à Hogwarts. 

— Espera! Quer dizer que aqui só tem o nome dos bruxos que frequentaram Hogwarts? — isto era bom ou ruim?

Dumbledore deu outra risadinha.

— Nascidos-trouxas não têm famílias mágicas para educá-los em casa. Logo, a única opção deles é…

— Hogwarts. — Dallas rolou os olhos diante da própria estupidez e enfiou o livro no bolso interno que criou no forro da jaqueta que usava. 

— Dallas! — Dumbledore chamou quando ela tomou o rumo da saída da sala. Dallas parou a poucos passos do batente da porta, bem sob a pintura do diretor. — Tome cuidado. Todos vocês. 

Ela não o respondeu, não iria dar falsas esperanças para ele, mas também não deixaria de seguir as orientações dele porque ninguém verdadeiramente queria morrer jovem e de forma heróica. Ao menos não ela.

— Até que foi rápido. — Patrick falou com alívio quando ela o encontrou na escadaria e ambos desceram os degraus apressadamente, de dois em dois, até chegaram ao patamar e darem de cara justamente com Snape. Patrick reagiu rápido e ergueu um feitiço de proteção sobre os dois antes que o feitiço disparado pelo novo diretor os atingisse. Dallas rebateu com um outro feitiço que passou raspando pela orelha direita de Snape e atingiu a parede de pedra.

— Você errou. — Patrick murmurou enquanto protegia-se dos ataques de Snape.

— Errei? — Dallas respondeu com um tom de sorriso na voz um segundo antes da parede explodir as costas do professor, o acertando com pedaços de pedra e poeira. A distração foi o suficiente para Dallas puxar Patrick pela gola da jaqueta dele e ambos dispararem em uma corrida. 

Ao alcançarem o fosso das escadas moventes, o alarme soou por toda a escola. Alto e estridente o suficiente para fazer os ouvidos de Dallas doerem. Os alunos vinham de suas salas comunais quando foram pegos de surpresa pelo som, parando nos degraus das escadarias, confusos e olhando uns ao outros, procurando por respostas para o que acontecia, e bloqueando o caminho de maneira irritante. 

Alguém gritou as costas de Dallas e, ao olhar por cima do ombro, ela viu que foi uma aluna que tinha acabado de ser acertada pelo feitiço de um Comensal da Morte em perseguição. Dallas rebateu o ataque com outro e o cenário evidente de um duelo acontecendo naquele momento tirou os alunos de seu breve estado de animação suspensa e a confusão e gritaria começou. 

— Pule! — Patrick gritou. O feitiço de camuflagem já havia desfeito-se nele e Dallas apenas seguiu os instintos e a confiança inerente que tinha no amigo e pulou como o ordenado, passando por cima de um aluno caído de forma molenga nos degraus, com a pele pálida e o olhar vazio. Dallas engoliu rapidamente o bolo de culpa que subiu pela sua garganta, continuando a sua correria enquanto trocava feitiços com os seus perseguidores.

Finalmente, após o que pareceu ser uma eternidade, eles chegaram a entrada principal, que estava bloqueada por três Comensais bem mal encarados. 

Reducto! — Patrick gritou, mas o seu feitiço não foi apontado para os Comensais bloqueando a passagem, mas sim para as enormes ampulhetas das casas. O som de vidro estourando foi mais ensurdecedor do que o alarme e rubis, esmeraldas e as outras pedras que preenchiam as ampulhetas voaram com a velocidade de um projétil sendo disparado por uma arma e cravaram-se de maneira enjoativa na carne e ossos dos Comensais. 

Dallas e Patrick pularam os corpos, feridos e mortos, e atravessaram as portas escancaradas, sem desacelerarem em nenhum momento o ritmo da corrida. O destino deles era claro, o Salgueiro Lutador, a passagem subterrânea que levava para a Casa dos Gritos e que eles esperavam que ainda estivesse lá, que não tivesse sido bloqueada por Snape. 

Mais obstáculos surgiram no caminho deles, mais Comensais, um grupo consideravelmente grande e que estava tornando aquela batalha cada vez mais desigual. Dallas sentiu um enjôo brotar na boca de seu estômago e não precisou olhar para o alto para saber que, ao ver a movimentação unusual nos terrenos, os Dementadores estavam aproximando-se mais que o necessário da escola. 

Um grunhido a sua esquerda lhe chamou a atenção ela viu de rabo de olho Patrick tropeçar, virar sobre os pés de forma cambaleante e disparar um contra-ataque. Dallas desacelerou ao perceber que o amigo apertava de forma desajeitada o torso, no lado direito, e viu que havia algo brotando do corpo dele, um pedaço de madeira que atravessou a jaqueta e a carne dele como uma estaca. A sua reação foi rápida, movida pela adrenalina e pelos anos em Hogwarts devorando todo o conhecimento do mundo mágico que lhe era possível. Dallas parou, virou, apontou a varinha para o chão e ergueu uma barreira de raiz, capim e terra entre os Comensais e eles, em seguida improvisou uma atadura ao redor do ferimento, para manter a estaca no lugar e não agravar mais a situação. No segundo em que a atadura terminou de ser conjurada por sua varinha e enrolar-se ao redor do corpo de Patrick, esta já estava manchada de sangue. Às costas deles, a barreira de terra tremia e desfazia-se pouco a pouco com as investidas dos bruxos no encalço deles. Dallas sentiu uma minúscula pedra rasgar-lhe a pele da bochecha, mas ignorou a ardência do machucado em favor de concentrar os seus esforços em aplicar um feitiço anti-gravitacional nas roupas de Patrick, segurar-lhe pela mão e voltar a correr enquanto trazia o amigo flutuando às suas costas. 

Eles chegaram no Salgueiro Lutador no instante em que a barreira de terra explodiu e os feitiços voltaram a voar na direção deles. Dallas desfez o feitiço sobre Patrick, pois dali por diante ele teria que seguir com os próprios pés, e enquanto tentava manter os Comensais longe e sentia que estava fracassando, Patrick imobilizou os galhos do Salgueiro e a puxou na direção da árvore, por onde escorregaram de forma desajeitada pela entrada íngreme e Patrick gritou de dor porque o movimento não foi favorável para o seu corpo, encravando ainda mais a estaca em seu peito e dificultando-lhe a respiração. 

Merde! — Dallas praguejou ao ver o sangue borbulhar por entre os lábios do amigo. — Perfurou o pulmão. — declarou com pavor. Patrick corria o risco de sofrer uma parada respiratória a qualquer momento, então eles precisavam sair dali, naquele instante. 

Dallas não quis arriscar colocar outro feitiço sobre Patrick e portanto optou em passar o braço dele sobre os seus ombros e apoiar o lado não ferido do corpo dele contra o seu. O som de terra se movimento e xingamentos mostrou que os Comensais ainda estavam na cola deles.

— Eles não desistem? — Patrick resmungou com um grunhido de dor. 

— São como baratas. Em uma guerra nuclear, serão os únicos a sobreviver. — Dallas correu os olhos pelo túnel com cheiro de mofo, terra e madeira, a varinha de Patrick, segura em sua mão ensanguentada, era o que iluminava o caminho. A passagem era apertada e ameaçava desmoronar a qualquer pequeno espirro. 

Estava aí uma boa ideia, que poderia salvá-los ou matá-los. 

— Patrick? — chamou em um sussurro e os olhos castanhos dele caíram sobre o rosto dela. Sob a fraca luz do feitiço lumos, eles pareciam quase negros. — Você confia em mim? — ele não hesitou ao responder:

— Sim. 

A força veela era algo que Dallas ainda não tinha domínio completo mas que, segundo a sua avó, era algo que era ativado pelas emoções, pelo instinto primordial de sobrevivência que todo animal tinha, pelo estresse e pela raiva e, no momento, Dallas era uma mistura de todos esses sentimentos que ela deixou a dominar e sentiu a diferença em poucos segundos, quando deixou Patrick de ser um peso sobre os seus ombros, quase a derrubando no chão. 

Com a mão direita firmemente plantada na cintura dele para mantê-lo de pé, Dallas soltou a mão esquerda do pulso de Patrick, o qual segurava para manter o braço dele sobre o seu ombro, e a usou para apontar a varinha para o túnel às suas costas. Um feitiço explosivo atingiu o teto da passagem, o túnel ao redor deles começou a tremer, farelos de terra caíam sobre as suas cabeças e Dallas trocou um último olhar com os Comensais que, ao perceberem o que acontecia, que eles estavam prestes a serem enterrados vivos, aceleraram o passo para alcançá-los. Eles realmente não desistiam, que inferno!

Dallas ergueu Patrick pela cintura e voltou a correr. Pelos gritos e xingamentos que ouvia ecoando pelo túnel, supôs que os bruxos atrás deles estavam ocupados demais em tirar do caminho os blocos de terra que caíam para lançarem feitiços contra a dupla. O alçapão de acesso a Casa dos Gritos surgiu ao fim do túnel como um fiapo de luz de esperança. Dallas o abriu com um feitiço, a porta bateu no chão da casa com um estrondo e ela ajudou Patrick a escalar as escadas até o outro lado. Às suas costas, um feitiço passou raspando pelo seu ombro, lhe arrancando um pedaço da jaqueta e blusa e queimando a pele exposta. A escada de acesso, que já estava velha e podre, quebrou sob os seus pés, indo ela e pedaços de madeira contra o chão. 

— Dallas! — Patrick gritou, debruçado na boca do alçapão, ao ver a queda dela. Dallas sacudiu a cabeça, para espantar a tontura e a poeira, e continuou atirando a esmo feitiços para além do túnel, tudo para atrasar os Comensais que pareciam bem decididos em capturá-los ao risco das próprias vidas. O que esses homens e mulheres achavam que iriam ganhar com isto? Por que eles seguiam de forma tão voraz um homem que era a receita para o desastre? Não podia ser simplesmente o fato de compartilharem os mesmos ideais, deveria ter algo mais neste contrato de lealdade. Ideais muitas pessoas compartilham ao redor do mundo, mas isto não as faz seguirem umas às outras como fanáticas. Deveria ter algo mais nesta história além de simples lavagem cerebral. 

A visão de Dallas finalmente voltou ao normal, ou ao máximo que conseguiu voltar naquele túnel desabando e ficando a cada segundo ainda mais escurecido. 

— Dallas! — o chamado desesperado e carregado de dor de Patrick a despertou por completo de seu torpor e ela soltou outro feitiço explosivo contra as paredes do túnel para acelerar o processo de desmoronamento, mas não ficou para ver o estrago. Primeiro ela arremessou a varinha além da entrada do alçapão, a ouviu quicar contra o chão de madeira, e então ela mesma pulou e jogou-se contra a beirada do alçapão. O impacto tirou-lhe o fôlego, mas ainda sim ela continuou içando-se até alcançar o chão empoeirado da Casa dos Gritos.

Accio varinha! — a varinha voou até a sua mão e ela girou sobre o chão e a apontou para a entrada do alçapão. — Aguamenti Maxima! — um jato d’água, como a pressão equivalente a mangueira dos bombeiros, voou na direção do túnel, o alagando de forma rápida e alarmante. Dallas fechou a porta do alçapão, a lacrou com os mais poderosos feitiços, mas essa não conseguiu abafar os gritos de ódio e então desespero dos Comensais. E então, depois de uns quatro minutos, veio o silêncio. 

Dallas suspirou aliviada.

Ela sempre soube que quando o momento chegasse, quando ela estivesse em uma situação que tinha que escolher entre matar ou morrer para proteger-se ou proteger aqueles que lhe eram queridos, ela não pensaria duas vezes ao escolher em matar. Mas a teoria e a prática eram coisas completamente diferentes e mesmo assim, mesmo convicta de que fez o certo, ainda sim a decisão deixou um gosto amargo em sua boca. 

Patrick gemeu e a atenção de Dallas voltou-se para ele. O sangue agora escorria além da atadura, manchando o chão, os lábios dele estavam vermelhos carmim e o sangue manchava-lhe os dentes. 

— Patrick. — Dallas ofegou o nome do amigo e arrastou-de até onde ele estava caído, comprimindo como podia o ferimento ao mesmo tempo em que apertava a varinha como se esta fosse a sua única âncora com a consciência. O que talvez fosse. — Precisamos sair daqui, não vai levar muito tempo para eles descobrirem que o túnel leva a Casa dos Gritos. — Dallas murmurou. As passagens secretas de Hogwarts foram um segredo compartilhado por Dumbledore com a Ordem e o túnel sob o Salgueiro Lutador foi informado de sua existência por Remus Lupin. O plano sempre foi usar o túnel que, de acordo com Remus, era de conhecimento de apenas pouquíssimas pessoas. Infelizmente entre este grupo seleto estava Snape. 

— Acho melhor você me deixar aqui. — Patrick disse com um grunhido e uma breve risada de desespero. Ele sabia que a sua situação não era boa, sentia a sua força e consciência esvaindo a cada segundo e não tinha certeza se quando desmaiasse, iria acordar novamente. 

— Muito engraçado, senhor “a sua baixa não é aceitável”. Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço, é isto? 

— Dallas…

— Cala a boca! Não ouse sugerir o que você está pensando em sugerir. — porque Dallas conhecia Patrick, conhecia aquele olhar determinado, aquele olhar que exigia obediência às vontades dele. Mas Patrick também conhecia Dallas o suficiente para saber que ela nunca foi de obedecer ordens de ninguém — Patrick, você confia em mim? — porque uma ideia louca estava surgindo na mente dela. Patrick a olhou, com o rosto contorcido em dor, e ainda conseguiu esboçar uma risada antes de responder:

— Sim. 

— Ok. Petrificus Totalus. — todos os membros dele ficaram paralisados sob o feitiço e somente os olhos moviam-se, acompanhando os movimentos de Dallas. — Espero que isto seja o suficiente para a viagem. — viagem? Que viagem? Patrick quis perguntar, mas a sua boca estava congelada e a sua resposta veio quando Dallas segurou em seu ombro e então eles desaparataram da Casa dos Gritos. 

Em Hogwarts, à janela da torre da diretoria, que dava vista privilegiada para os terrenos da escola, Severus viu o exato momento em que os Comensais perderam a briga para Dallas, quando a entrada no tronco do Salgueiro Lutador cuspiu água e lama sobre as grossas raízes da árvore. Severus tinha que admitir que sentiu uma ponta de orgulho, assim como tinha que admitir que facilitou a fuga deles. Dallas e Patrick eram bruxos poderosos e com um vasto conhecimento em magia, mas ainda sim eram crianças inexperientes e Severus tinha anos a frente deles e uma gama de feitiços de autoria própria que eram desconhecidos de muita gente. 

Felizmente, Dallas também era uma bruxa com uma fama que a precedia, especialmente no que dizia respeito ao Lorde das Trevas que invariavelmente iria descobrir sobre este incidente, fosse vindo da boca de Severus ou de outra pessoa, e como Dallas deixou uma grande impressão em Você-Sabe-Quem, a facilitação de Severus para a fuga dos dois adolescentes era algo que nunca seria descoberto.

 

oOo

 

Dallas os aparatou no solário da Mansão Winford. Era a intenção dela trazê-los para ali? Não. Mas no desespero e na pressa, quando pensou em um lugar seguro, pensou em sua casa e não importa quantos maus momentos tenha passado na mansão por causa de Meredith e dos gêmeos, ela também tinha muitas boas lembranças do lugar, ainda considerava a velha construção vitoriana o seu lar. 

— Patrick? — Dallas chamou pelo nome do amigo cujos olhos estavam assustadoramente fechados. — Patrick? — repetiu e a sua voz saiu rouca, quase desaparecida, por causa do soluço que bloqueava a passagem de som pela sua garganta. As lágrimas ela já as sentia escorrer pelas suas bochechas e com as mãos trêmulas ela desfez o feitiço imobilizador e hesitou um segundo antes de procurar por pulsação na jugular de Patrick. Encontrou algo, uma batida fraca e tímida. Não satisfeita, aproximou o seu rosto do dele e sentiu Patrick exalar ar quente contra o seu queixo. A respiração dele também estava fraca, como as batidas de seu coração.

Dallas precisava de ajuda, porque de todas as matérias que demonstrou menos interesse na vida, Biologia foi uma delas. Dallas gostava de exatidão, respostas concretas, da certeza que o imutável oferecia, portanto as Ciências Exatas sempre foram a sua preferência, para as quais dedicou todo o seu tempo e inteligência. Biologia era constituída de suposições e estudos contínuos para obter a resposta para algo que amanhã sofreria uma mutação e mudaria e obrigaria a todos a começarem as suas pesquisas novamente do zero. Então Biologia foi algo que ela nunca deu grande valor, e agora pagava um preço amargo pelo seu desprezo, não?

Porque ela precisava desesperadamente de ajuda, sabia como pedir ajuda, mas as suas mãos ainda tremiam, o seu corpo inteiro tremia, a vontade que tinha de chorar era imensa e sentia-se idiota por isso porque aquele não era o momento para cair em prantos, Patrick não estava morto ainda, e ela precisava de uma lembrança feliz, uma mísera lembrança feliz. Dallas tinha a certeza de que deveria ser uma figura patética naquele momento e podia jurar que ouviu Amélia a repreendendo, parada naquela pose dela de dona do mundo, na entrada do solário. 

"É a isso que você foi reduzida? A uma menininha chorona esperando por ajuda? Esperando que alguém venha lhe segurar a mão e dizer 'deixa comigo, vai ficar tudo bem'? Patético!"

— Eu sei, eu sei! — Dallas rebateu entre lágrimas de desespero e raiva enquanto tirava a jaqueta e usava a peça para pressionar o ferimento ao redor da estaca. Ao menos uma coisa ela aprendeu com o seu tutor trouxa; a de em caso de emergência e primeiros socorros, nunca retirar o objeto encravado no corpo da vítima, deixasse isto para os profissionais, ou então somente agravaria a situação. 

"Sabe tanto que não consegue nem conjurar um maldito patrono!" Amélia agachou-se ao lado dela, uma ilusão tão real que Dallas temeu estar perdendo a sanidade. "Conjure um patrono, Dallas! Chame por ajuda profissional! Patrick vai morrer!"

— Eu sei! — ela berrou, o seu grito ecoou pelo solário e inconscientemente apertou mais a ferida, fazendo com que Patrick soltasse um gemido dolorido, mesmo estando desacordado. 

"Lembra do conto da Cinderela? O que eu te ensinei sobre este conto?" Dallas hesitou em responder. "O que eu te ensinei, Dallas?!" a ilusão de Amélia repetiu com ferocidade. 

— Não seja a Cinderela em sua própria história, seja o príncipe Encantado. Não seja a dama em perigo, seja o herói. 

"Conjure este maldito patrono!" Amélia ordenou antes de desaparecer. 

— Okay. — Dallas inspirou profundamente, pressionando com uma mão a compressa no peito de Patrick e com a outra ergueu a varinha na direção da janela do solário. — Okay. — lembranças felizes, era o que ela precisava e, surpreendentemente ela tinha várias, muitas adquiridas quando chegou à Hogwarts. Lembranças felizes. Ela trouxe à tona o seu primeiro encontro com Patrick, a primeira vez que viu o amigo, trouxe à tona o primeiro beijo com Harry, dias de aula, as hilárias peças que pregou contra Umbridge, várias lembranças. — Expecto Patronum! — como no treino da Armada Dumbledore, a lince brotou da ponta de sua varinha e com a elegância de todo felino, pousou no chão, lambeu uma pata prateada e sentou com suavidade, esperando pacientemente pela ordem. Dallas olhou dentro dos olhos brilhantes do animal antes de começar a recitar:

— Para Davon Yale. Davon, preciso de você urgentemente. Patrick está ferido. Me encontre no solário da Mansão Winford, Estrada Spaniards, 35, Hampstead, Londres. — a lince brilhou, como se estivesse finalizando o processo de gravação, e então virou e em um pulo desapareceu através da janela do solário. 

Esperar por Davon enquanto tentava impedir que Patrick sangrasse até a morte no chão branco do solário foi um martírio. A noite, vazia desde que os Winford mudaram-se para o Brasil, a mansão emitia sons tenebrosos que não estavam ajudando a acalmar os nervos de Dallas. Algum tempo depois da partida do patrono, um estalo soou alto em algum ponto da casa e alguém chamou o seu nome. Dallas pôs-se de pé em um pulo, com a varinha em punho, e a apontou para o peito de Davon quando ele apareceu na porta do solário. 

— Qual foi a primeira reação de Lorraine depois que a resgatamos do Ministério? — perguntou, porque só porque tinha pedido a ajuda dele, não significava que era realmente Davon que estava ali. Muita coisa poderia acontecer em poucos minutos, um Comensal poderia ter interceptado o seu patrono, poderia ter usado a poção polissuco para passar-se por Davon, com o auxílio da magia, tudo era possível em poucos minutos. 

— Ela me bateu e disse que eu não deveria ter ido salvá-la, e sim fugido para o continente com meu pai e irmãos. 

Dallas abaixou a varinha, mas não relaxou por completo. Memórias também podiam ser violadas, mas este processo era mais trabalhoso e levava mais tempo. Mas, novamente, com magia, tudo era possível.

Patrick escolheu aquele momento para gemer de dor e chamar a atenção de Davon para ele. 

— O que aconteceu? — Davon perguntou, ajoelhando-se no chão ao lado de Patrick e correndo pelo corpo dele todos os feitiços diagnósticos que conhecia. 

— A nossa entrada em Hogwarts foi discreta. A nossa saída? Nem tanto. — Dallas explicou. 

— Ao menos vocês conseguiram pegar os registros?

— Óbvio. — e ela não gostou nada da expressão que Davon fez quando terminou de avaliar Patrick. — O que foi? O que há de errado? — perguntou ao ajoelhar-se de frente para ele, do outro lado do corpo de Patrick.

— Ele precisa de ajuda profissional.

— Eu sei! Por isso eu te chamei. 

— Agradeço o voto de confiança, mas eu ainda sou um curandeiro em treinamento, e com treinamento defasado visto que os meus professores estão mais ocupados em manter os agentes da Ordem vivos. O caso de Patrick é de intervenção cirúrgica e eu não tenho prática o suficiente para realizar tal procedimento.

— Mas tem prática.

— Sim, mas sob supervisão de um curandeiro registrado.

— Davon, Patrick não tem tempo para esperar por mais ajuda. Ele está sangrando, nós aparatamos de Hogsmeade para cá, o pulmão dele está perfurado, e eu não confio em mais ninguém além de você aqui. Então, você vai ter que fazer isto. Ele já está morrendo, não tem como você piorar a situação!

Ok. — Davon declarou, com um tom convicto na voz. — Você vai me ajudar. 

— Eu não tenho vocação, nem talento, para ser enfermeira. 

— Como você disse: ele já está morrendo, não tem como você piorar a situação. 

— Ok. — Dallas concordou e então eles começaram o longo e estressante processo que era salvar a vida de Patrick Gordon. 

 


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