A claridade fúnebre do galpão abandonado vinha unicamente dos ousados feixes cintilantes provindos da luminescente lua cheia, se entranhando fugazes pelas frestas do telhado carcomido pelo tempo. No centro, com sua visão obstruída, o herói anulador aguarda pelo que o destino o reserva, completamente desamparado.

Sua garganta, completamente seca, ansiando por algo para matar sua sede, tenta balbuciar. Não sabia se estava sozinho. A única resposta que suas lamúrias recebem é o zumbir de algum inseto que o sobrevoa, faminto, nem ao menos aguarda sua morte antes de atacar sua pele.

Tenta se soltar pela centésima vez sem sucesso, apenas machuca ainda mais seus pulsos, já cortados pelo metal, presos às costas.

Estava na posição mais desconfortável e humilhante possível, seu rosto imprensado no chão frio e úmido, suas mãos presas de modo que impedia parte do fluxo de sangue, deixando-as dormentes; seus cabelos soltos caindo sobre a face, dificultam sua respiração. Usa o que restou de sua energia para se virar, a dor cruciante que começa a sentir em sua perna o leva a crer que está torcida.

Um som novo. Passos.

Em seguida um baque alto; um grunhido junto ao quebrar de madeiras velhas. Os passos se tornam alarmados, se espalhando por todo o ambiente ao seu redor.

Mãos confortáveis e quentes o envolvem em um abraço apertado cheio de preocupação, inconscientemente, se aninha nos braços largos, buscando ainda mais daquela quentura convidativa. Pelo menos não estava mais sozinho. Sabendo que sobreviveria, finalmente lamenta por sua individualidade roubada, mas não tinha forças e nem coragem para contar isso aos outros.

“Não tem mais ninguém”

Afirma a voz que identificou ser de Tsukauchi.

As algemas que prendiam seus braços são quebradas em um instante, certamente aquele que fora diretamente acalentá-lo era All Might. Mesmo que ainda estivesse sentado no chão pútrido daquele galpão, o simples fato de ter suas mãos livres e saber que enfim havia mais alguém consigo, o faz suspirar em alívio.

Estranha o fato do herói não ter dito uma palavra sequer, na verdade, o único som que ouviu e sabia ter vindo do loiro, foi um suspiro surpreso, suas mãos grandes permaneciam em seus ombros, mas ele, diferente de sempre, não o cumprimentou com um glorioso: “Está tudo bem, eu estou aqui!” No entanto, sabia que, assim que tirasse aquela venda o velho sorriso deslumbrante o receberia de braços abertos.

Levanta as mãos a caminho do rosto, elas parecem extremamente pesadas graças à sua falta de energia, até mesmo tremem em esforço, mas queria ver logo aqueles belos olhos azuis que o estariam observando preocupados; seus ombros doem ao finalmente mudar de posição. Quando chega aos olhos, seus dedos param, seus lábios tremem, sua respiração acelera enquanto seu peito se aperta, como se todo o ar fosse repentinamente expulso para longe de seu pulmão.

Não havia nada. As lágrimas começam a escorrer pelo seu rosto, seus olhos se arregalam descrentes e seus dedos traçam caminhos ininterruptos por toda a face, procurando pelo pano que deveria estar sobre seus olhos.

“P-por que está tão escuro?...”

A única resposta que recebe é um abraço reconfortante, cheio de cordialidade e lágrimas que começam a molhar seu pescoço. Não podia ser verdade, mas não havia erro, daquele dia em diante, assim como não poderia mais deixar outrem acuado diante seu olhar rubro, não teria o direito de olhar uma última vez o brilho do luar, que nem ao menos sabia que o atingiu esse tempo todo, lhe fazendo companhia enquanto cria estar sozinho; ou aqueles chocados olhos marejados com a cor dos céus.