Unfolding escrita por Ysmiyr


Capítulo 6
Vermelho Carmin


Notas iniciais do capítulo

Então, o fim



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Ainda não é bem de manhã, o céu sustentando aquele tipo apagado de azul-cinza-violeta, escuro mas não de forma opressiva, de um jeito que faz seu cérebro tropeçar em si mesmo tentando entender se seus olhos estão cansados ou se estão em um sonho.

Jaskier está sentado, de pernas cruzadas sobre os lençóis amassados, olhando sobre um Geralt adormecido.

Há hematomas correndo para cima e para baixo do tronco, nas pernas, nos braços e Jaskier sabe que há marcas semelhantes nele também; e que os de Geralt desapareceriam ao meio-dia.

Ele se sente dorido e não importa como ele se movimenta, ele pode sentir algum grupo de músculos gemendo em proteto. Ele aprecia a dor, o lembrete. O amanhecer vem devagar, e ainda mais devagar a floresta volta à vida por perto. Jaskier senta, e ele espera.

Geralt acorda de forma incaracteristicamente lenta. Seus olhos mantêm-se concentrados nas copas das árvores, piscando como se fosse para se situar. Seus dedos se movem um a um, e seus dedos dos pés também se mexem um pouco. Quando seus olhos caem sobre os de Jaskier, ele sorri mas sua testa se sulca em preocupação. Ele não parece querer se levantar.

"Dormiu bem?" O bardo diz com a voz rouca, olhos inabaláveis.

"Melhor que você." Ele responde, voz suave e baixa. Jaskier suspira, esfregando a quietude do seu rosto.

"Ainda temos de falar. Não me interprete mal, o meu prazer de ontem à noite foi muito entusiástico, tenho a certeza, mas..."

"Sim." Geralt parecia desnorteado pelo carinho mesmo depois de ouvir isso mais vezes ontem à noite do que teve em respirações. Ele também se sentou, de frente para o bardo e a expressão tão aberta quanto ele sabia como fazê-lo. Jaskier pegou suas mãos com um pequeno sorriso.

"Havia outra razão para eu não querer ir para o norte." O bruxo fez um barulho baixo, apertando-lhe a mão. "Isso não quer dizer que não estivesse preocupado com as tuas tendências de auto-sacrifício, mas! Há mais."

"...sim?" Geralt encorajou, coração agitado.

"Sabe que meu nome é Julian." Um aceno com uma expressão muito confusa "Eu venho de uma propriedade entre Varlburg e Crinfrid. Eu fugi quando tinha nove anos, com um circo que passava a caminho de Mettina." Geralt piscou e não disse nada, rosto congelado olhando para o chão. "Agradeço muito, muito se não pudermos passar por ali."

"Você fugiu?" O bruxo sussurrou, olhando para os olhos azuis muito claros. Jaskier deu-lhe um riso auto depreciativo,

"Sim. Eu,... não quero entrar muito nisso, não agora, se não houver problema. Apenas... Todos nós temos fantasmas nos nossos passados, Geralt. Não gosto de me lembrar do meu mais do que você, mas escolhi deixar isso no passado e não deixar que isso me arraste para baixo. E você também não devia, apesar da culpa mal guiada que ainda carrega."

"Não é um erro de orientação. Eu te contei o que aconteceu." Ele disse com dificuldade, com os olhos fixos. Jaskier deu-lhe um chacoalhada pelas mãos entrelaçadas.

"Eu sei o que aconteceu, por ti, e por qualquer outra pessoa que foi estúpida o suficiente para falar daquele dia perto de mim. Eu ainda acredito no homem que conheço, mais do que no carniceiro criado por medo de alguém capaz de tanto." Jaskier sorriu, caloroso e carinhoso. Sua voz ainda estava firme quando ele a deixou cair num sussurro, "Eu prefiro muito aquele que estou vendo neste momento. No que passou ontem à noite comigo, e que passou os últimos vinte anos a me proteger contra mim mesmo, até". Geralt queria derramar um protesto, queria arrancar as mãos morenas das suas e sufocar o bardo por dizer coisas tão inverídicas, mas... Mas.

Os olhos dele estavam tão azuis, notou Geralt. Tão azuis que pareciam as runas gravadas na sua lâmina prateada, tão azuis que pareciam safira moída. Suas bochechas ainda estavam vermelhas, do frio da quase manhã, e eram tão bonitas.

Geralt sabia que estaria corando -Corando! - se isso fosse uma coisa que seus capilares queimados ainda pudessem fazer.

"Essa não é a única vez que coisas como essa aconteceram. Eu vivi uma longa vida." Ele murmurou, mas até ele podia ouvir como não havia nenhum calor ou protesto nas palavras. Jaskier deu-lhe um grande sorriso, com grandes dentes brancos e uma covinha no lado direito e Geralt odiava como ele se sentia em casa olhando para aquele rosto.

"Então fala-me deles, e eu também posso os consertar." Ele encolheu os ombros nus e suas sardas expostas parecem se mover na meia luz. Geralt engoliu, lembrando que sabia o gosto delas. Ele não sabia o que dizer a isso, então ele apenas respirou, frustrado. O bardo inclinou-se para a frente para lhe dar um beijo na bochecha.

"Eu te conheço, Geralt. Se você fez algo que considera monstruoso, há mais do que uma boa razão por detrás disso." Ele apertou as mãos pálidas, levantando-se e alongando-se. As articulações do joelho dele estalaram e ele riu, despreocupado. "Pode inventar mil casos em que foste um vilão, e eu griterei o um milhão onde tu foi o herói."

"Isso é porque você embeleza tudo." O Geralt murmurou, entrincheirado depois de um tempo. Seu coração enrrugado assumiu um ritmo trêmulo.

"Um pouco. Mas contigo, eu só digo a verdade em palavras bonitas." Ele piscou e foi apagar o fogo que já estava a morrer.

Geralt ficou sentado nu no rolo de cama, atordoado e mais do que um pouco afetado. Ele nunca se acostumaria ao carinho fácil, ao companheirismo não pago. À lealdade, ao amor de um homem que poderia ter qualquer coisa, qualquer um e, no entanto, sempre o escolheu. O escolheu quando foi afastado e mal se conheçiam; O escolheu quando as dificuldades da estrada foram muitas e as recompensas poucas. O escolheu quando ele não devia, quando o perdão não podia ser dado tão facilmente.

O escolheu quando Geralt não o faria, quando ele próprio não suportava olhar para a sua armadura manchada, para a sua pele anormalmente pálida e rosto marcado.

Havia uma poesia na situação, o bruxo podia admitir; algum tipo de ironia em alguém como Jaskier escolhendo-o. O bardo não era puro, não era inocente; ele era humano, melhor que a maioria. E ainda assim...

Ainda assim, ele estava ali mesmo, dando tapinhas no nariz de Roach e falando besteiras em uma voz suave com ela como se não fosse nada; como se ela não desgostasse do toque geral tanto quanto Geralt.

O sol nasceu preguiçosamente para além das árvores, parando nas borboletas e nos insetos a acordar. Jaskier andava na sua roupa de baixo pelo acampamento no meio da floresta, rodeado por um cavalo, seu bruxo, uma armadura manchada de sangue e um alaúde que podia fazer com um pouco mais de polimento.

Ele não acreditava, mas desconsiderar o desdobramento dos acontecimentos que os colocaram onde estavam agora era ser obtuso em um nível que nem mesmo Geralt poderia alcançar. Ele não acreditava nas coisas que o bardo lhe dizia, não conseguia puxá-las ao seu coração. Mas Jaskier podia. E ele podia acreditar por dois por um tempo ainda.

"Vai ajudar a recolher as coisas ou vai ficar aí me encarando?" Jaskier disse, divertido e impossivelmente carinhoso. Geralt sorriu.

"Eu gosto bastante da vista daqui." O bardo virou, a sobrancelha levantada. "Além disso... Não é como se tivéssemos outro lugar para estar, pois não? Demora alguns dias a refazer a nossa rota."

"Suponho que isso seja verdade. Para onde vamos agora?" Jaskier perguntou, aproximando-se novamente. Geralt inclinou-se para trás, oferecendo-se com sua garganta desprotegida. Os olhos do bado moviam-se entre a garganta apresentada e os olhos derretidos de Geralt, mãos se movendo como se contendo.

"Onde quer que você queira. Desde que não nos separemos." O sorriso de Jaskier estava perfeitamente espelhado nos lábios finos de Geralt.

"Qualquer lugar, então."


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