Quando os Lobos Cantam escrita por Ladylake


Capítulo 19
Lágrimas e Sangue


Notas iniciais do capítulo

Mais um capitulo :3
Desculpem a demora, mas eu posto sempre primeiro no wattpad e depois acabo por me esquecer de postar aqui.
O Nyah está parado então, se gostas da história, deixa ai um aviso ♥



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O Inverno tinha terminado há pouco tempo. 5 meses passaram tão depressa, que eu nem dei por eles. Luckyan tinha-me ensinado inúmeras coisas, incluindo a lutar.

Desvio-me do punho de Aslam com bastante rapidez e faço-lhe uma rasteira, o que o faz cair no chão imediatamente. Os meus lábios abrem-se num sorriso, e viro-me de costas, a pensar que estou a sair com a vitória debaixo do braço. Mas eu estava enganada. É preciso muito mais para abater o grande lobo branco.

Aslam levanta-se e ataca-me por trás, fazendo cair no total quase 130 kg no solo florestal. Os dentes dele babam para cima de mim e sou obrigada a colocar um ramo entre os mesmos, para não ficar sem um pedaço da bochecha. Obviamente ele não está a brincar.

De braços cruzados, Luckyan observa-nos, a uns bons metros de distância. Eu tenho que mostrar que aprendi algo neste tempo todo, e rapidamente, pois Aslam está quase a desfazer o pedaço de madeira que lhe coloquei no meio da boca.

Algo no lobo branco chama-me à atenção: Sangue seco, na pata traseira esquerda.

— Desculpa, Aslam...

Com força, eu chuto-lhe a perna no exato sítio da ferida e ele afasta-se a ganir. Deitado no chão e agarrado à perna, Aslam resmunga todas as palavras amaldiçoadas para mim.

 Aslam? – pergunto, mas ele não se vira – Aslam estás bem?

Pergunta errada.

Num movimento rápido, ele lança um punhado de terra em direção aos meus olhos. A minha vista lacrimeja e não vejo nada de tal forma, que não me apercebo que ele está prestes a dar-me uma cabeçada.

Agarrada ao nariz ensanguentado e meio cega, apenas vejo uma sombra a caminhar na minha direção.

— Queres jogar sujo? Eu jogo mais ainda.

 

 

****

 


Com toda a calma e gentiliza do mundo, Bear limpa o sangue já seco do meu nariz, com um sorriso no rosto. Pergunto-me o que ele tanto está a achar piada.

Faço uma careta, expressando assim dor e desconforto, mas ele não se retrai de forma nenhuma.

— "Estás a exagerar. Eu tenho mãos de pianista. São gentis demais para magoar alguém." – ele gesticula com as mãos, depois de pousar um pedaço de algodão.

— Sabes tocar piano? – pergunto surpreendida. Bear limita-se a assentir, envergonhado – Adoraria ouvir.

Ele dá de ombros e prepara-se para arrumar o kit de primeiros socorros, mas o meu olhar subitamente paira em outra pessoa.

Luckyan estava a olhar para nós. Mais precisamente para mim, mas ele não tinha expressão. Eu não conseguia ter ideia alguma daquilo que ele estaria a pensar. Parecia sério.

Mas de repente, ele sorri. Um sorriso de orgulho. Eu desvio o olhar, mas ele nunca o faz. E ele olha para mim, como se houvesse algo em mim digno de ser olhado.

Há segredos que é melhor mantê-los enterrados. Há histórias que não valem a pena serem contadas, pois não trazem felicidade àqueles que as escutam, muito menos àqueles que as contam. Cada pessoa tem um capítulo que não lê em voz alta.

Assim era ela. Há quanto tempo é que não sorris Nour? Não aqueles pequenos sorrisos que faz qualquer um parecer bem, mas sim um sorriso de verdade. Uma gargalhada que faria doer as bochechas.

Mas ela já se tinha perdido. "Outros tempos." – pensava ela. Sentada à beira da enorme pedra, à frente da gruta, Nour martirizava-se sobre o quão miserável ela se sentia.

— Porque é que eu não morri naquele dia...? – sussurra, encarando o chão – porque é que eu não morri naquele dia?!

Pingas de sangue cobrem o chão, pintando-o de outra cor. As mãos dela ficam num caos, depois de desferir vários socos em pedra maciça. Lágrimas e sangue escorrem e formam-se num só.

Uma brisa fria de primavera passa por ela, na tentativa de levar alguma mágoa, mas o máximo que faz, é arrepiá-la dos pés à cabeça.

Nour transforma-se quando a lua cheia e brilhante deixa de ter vergonha de se esconder por detrás das nuvens. Ela fecha os olhos e abre-os segundos depois, já com o vermelho sangue a cobri-los. Mas algo não está bem.

Nour sente aquela sensação má outra vez. Ela começa a respirar mais depressa e ofegantemente. Ela está a perder o controlo. Outra vez. As pupilas dela crescem e diminuem à medida que ela luta para não se "embebedar" no seu outro lado. "Não! Não vais ganhar desta vez!"

A "loba preta" abana-se de um lado para o outro e rosna para si mesma. Os dentes dela, mergulhados em baba e descontrolo, são perigosíssimos neste momento. Ela mostra-os para a floresta, para que a mesma possa ver o que lhe espera.

 

 

****

 


O sol já nasceu, quando Bear se levanta. O "lobo tom de caramelo e branco" estica os braços e pernas e boceja, antes de se espevitar de susto.

Apesar de não ter nada no estômago, algo lhe vem à boca quando olha para a entrada. Nour está sentada no meio de uma carnificina. Corpos de animais mutilados e meio comidos estão espalhados à volta dela. Um banho de sangue e entranhas decoram a entrada da gruta. Uma passadeira vermelha, literalmente.

Bear está aterrado de medo. Com uma expressão pávida no rosto, ele pensa duas vezes antes de aproximar-se de Nour, que insiste em manter uma posição estática e com as pontas dos dedos viradas para cima.

Bear corre para dentro em pânico e bate violentamente na porta do quarto de Luckyan.

— O que se passa Bear? – pergunta o Alfa com uma voz ensonada.

Ele não responde e simplesmente arrasta-o por um braço até á entrada. Luckyan arregala os olhos mal vê a cena tirada de um filme de terror.

— Mas que raio...?

Luckyan aproxima-se. Bear tenta impedi-lo, mas o Alfa estende o braço para trás, para ele não se aproximar ou fazer movimentos bruscos.

Veados, texugos, animais de pequeno porte e até mesmo um lobo normal estão na pilha. A cabeça de um deles está separada do corpo. Os corvos e os abutres já tinham dado conta do festim que Nour tinha criado sem intenção, assim como as moscas, que não demoraram a rondar a carne fresca e gratuita. Luckyan nunca tinha visto nada assim.

— Nour...? – ele chama-a. Luckyan dá um salto espevitado quando os olhos dela se mexem e encaram-no.

— Luckyan...? – sussurram os lábios sangrentos dela. Uma lágrima cai instantaneamente – Luckyan...ajuda-me.

 

 

****

 


Em Seatle, o mercado local atrai toda a gente, especialmente quando faz sol. Saaya agarra-se a Aslam, assim que uma família de humanos passa muito perto deles.

— Eles não mordem, – sussurra Aslam enquanto ri – já tu, tenho sérias dúvidas.

— Os humanos repugnam-me. – responde Saaya – Vamos despachar a lista das compras rapidamente e ir embora.

Ambos apressam o passo, mas no meio da multidão, algo acontece. As Auras deles desembarcam dos seus corpos, quando passam por um rapaz e uma rapariga.

Aslam e Saaya olham imediatamente para trás e encaram os dois jovens, que também os encaram a eles, que nunca param de andar. O rapaz, com características albinas, anda de marcha atrás enquanto sorri para os dois "lobos" parados no meio do mercado.

A jovem puxa o Albino e despede-se com um sorriso mais tímido. Ela é loira, cabelo médio e rapado de um dos lados.

Saaya dá um encontrão em Aslam, que não desvia os olhos bicolor da jovem mulher que ainda vai olhando para trás, embora de relance.

— Cuidado, não babes demais. Olha que ficas desidratado. – resmunga Saaya. Aslam fuzila-a com o olhar.

— Não estavas com pressa para as compras?

De mau humor, o "lobo branco" pega no cesto com brutalidade e começa a caminhar de novo. Saaya abana a cabeça, rindo.

 

 

****

 


Na Vila, já tinham dado pela falta de Nour. Dois soldados arrombam a porta e investigam cada centímetro do quarto. Nada. A cama está feita e não há sinal dela em lado nenhum.

Os soldados dirigem-se ao escritório de Raphael e interrompem uma reunião entre pai e filho. Raphel carrega na expressão.

— Eu estou no meio de uma reunião. – afirma Raphael.

— Desculpe, Senhor, – começa um dos soldados – mas a "loba preta" já não é vista há horas. Há indícios de que não tenha passado a noite na Vila.

Raphael tira os óculos e mexe e remexe na barba branca, pensando. Depois de um longo suspiro, ele pergunta:

— E o Nanuk?

— Sem sinal. Há dois dias que não é visto.

— Será que partiram, pai? – pergunta Gabriel.

— Não... – ele resmunga – aquele cão não deixaria a Ignis para trás. Soldado?

— Sim, senhor?

— Quem é que esteve de vigia nos portões, ontem à noite?

Os soldados olham entre si.

— Acreditamos que tenha sido o Ívar, entre outros. – acabam por responder.

— Tragam-mo.

 

 

****

 


Eu sentia-me tão...vazia. Era como se o céu me tivesse caído em cima e eu ainda não tive forças para o levantar novamente. A minha mente e o meu corpo não estavam em sintonia. Luckyan diz que a minha Aura esta a tentar controlar-me. Como isso pode ser possível? Era como se...o meu outro eu pegasse na minha raiva, na minha culpa e na minha dor e quisesse fazer justiça por ela própria. A justiça que eu não consigo fazer..., de certa forma, faz sentido.

Com o maior cuidado do mundo, Luckyan limpa o resto de sangue seco que ainda marca as minhas mãos e braços. Demorou mais de uma hora para me retirarem da carnificina que deixei à entrada da gruta. Eu não me conseguia mexer. Os meus músculos não respondiam, como se ainda tivessem em transe.

— Eu acho que se continuares a limpar-me a mão, eu ainda fico sem ela. – sussurro. Luckyan para e olha para as minhas feridas e arranhões.

— Desculpa, – ele sorri sem jeito – vou ver se arranjo roupa lavada para ti.

Ele levanta-se e tenta largar a minha mão, mas eu não deixo. Luckyan olha para mim, surpreendido pelo meu gesto.

Os meus olhos verdes encaixam nos azuis acinzentados à minha frente, à procura de algo. Alguma coisa. Um sentimento, uma faísca, uma vontade ou desejo. O meu coração precisa de uma razão para palpitar dentro do meu peito.

— O que foi? – pergunta ele. A voz rouca, mas suave de adulto, arrepia-me o espírito.

— Nada. – recomponho-me. Os meus dedos roçam delicadamente nas pontas dos dele quando o solto.

Luckyan vira-se de costas e sai, em busca de roupa. Inspiro de forma pesada, de forma a colocar o máximo de ar nos meus pulmões, pois estou nervosa.

Começo a tirar a minha roupa e em segundos estou completamente nua e crua. Ponho o meu cabelo preto para trás e apoio o corpo com os braços na cama, de modo a ficar confortável e com uma postura confiante.

 Estas roupas são da Saaya mas acho que te v-

Luckyan não termina a frase, assim que entra outra vez no quarto e põe a vista em mim. Os olhos deles movimentam-se, de cima para baixo, obviamente admirando o meu corpo nu, mas ferido.

Ele inspira fundo e parece recompor-se. Luckyan aproxima-se e atira a roupa lavada para cima de mim.

— É melhor vestires-te, – aconselha – ainda apanhas uma pneumonia.

Nour dá um sorriso sínico, de quem acabou de ser rejeitada. O Alfa dá a volta à cama e senta-se do lado oposto, ficando de costas para ela. Nour amassa as roupas nas mãos e cerra os dentes.

— Porque me rejeitas, se o teu corpo grita por mim sempre que vês?

Luckyan escolhe ficar em silêncio. Palavras que Nour não precisar ouvir para entender.

— Porque sei o que estás a tentar fazer. – ele acaba por responder, num tom quase inaudível e pegando num livro.

A "Loba Preta" olha por cima do ombro. As costas musculadas e sarapintadas do Alfa são a única coisa que ela vê.

— Como assim? – pergunta. Luckyan suspira.

— Não precisas de te despir para sentires alguma coisa.

— O que sabes tu sobre o que eu sinto? – Nour volta a perguntar, mas desta vez de forma mais ríspida.

— Aparentemente, mais do que tu. Ouve... - ele começa – eu nunca irei substituir o Soren mas...

— Podes parar já aí, – ela corta-o – a última pessoa que mencionou o nome dele, quase acabou morta.

— Mas tu não podes ficar presa a uma pessoa para o resto da tua vida! – Luckyan levanta-se e vira-se para ela. Nour dá-lhe as costas – Nour, ele morreu..., e eu sei que queres sentir algo para além de dor, mágoa e tristeza, mas eu não sou nenhuma marioneta que quando queres, puxas os cordelinhos, e depois encostas-me a um canto.

Nour começa a vestir-se e vira-se para Luckyan, assim que termina de ajeitar a camisola. Ela morde o lábio e inspira fundo antes de dizer:

— Desculpa, – ela sorri falsamente – foi má ideia. Por momentos, pensei que fosse algo que ambos queríamos, mas estava errada.

Nour dirige-se para a porta, determinada a ir-se embora e terminar com a conversa.

— Onde vais? – pergunta o Alfa. Nour olha para trás.

— Matar algo, – ela ri – pelo menos a raiva e o descontrolo é melhor do que o egoísmo e a miséria.

Ela arrasta a porta de betão e sai disparada. Luckyan segue-a, enquanto chama por ela e implora para que a mesma espere, mas Nour não o faz.

O Alfa fica a vê-la a ir em direção à floresta e sacode os braços, frustrado. Bear, dá uma pequena gargalhada ao ver a cena.

— "Não tens mesmo jeito nenhum com as mulheres, pois não?" – gesticula ele com as mãos. Luckyan resmunga.

 

 

****

 


O sol estava a partir. Por detrás das montanhas, uma imensa onda cor de laranja pintava o vale e o que mais lá houvesse. Os mimos-gaios, no céu, recolhiam para os seus ninhos para passarem a noite.

Quem dera á Ignis puder voar agora. Quebrar as correntes e ganhar asas, assim como por magia. Ela olha lá para fora, e o castanho dos seus olhos transforma-se num tom âmbar, assim que absorvem a luz do sol.

Algo a chama à atenção. Pedras estão a cair para a varanda. A jovem ruiva levanta-se e abre a janela que dá acesso à mesma e quase que é atingida por uma nova pedra, antes de se debruçar para ver quem ou o quê que está a fazer aquilo.

— Psst.

Nanuk, em carne e osso, está no telhado de uma casa e sorri, assim que a vê. Ignis cobre o rosto com as mãos, rindo, ao ver o pequeno monte de telhas partidas, que estavam a servir de munição.

Nanuk faz sinal para que ela se afaste, pois ele vai tentar chegar até ela e Ignis assim faz. O "Husky" começa a trepar uma casa e utiliza os limites das janelas para apoio de mãos e pés. Ignis fica aflita, quando ele quase escorrega, mas o "lobo branco e preto" depressa fica em segurança. Com um pouco de parkour e uma pirueta, Nanuk aterra na varanda e abraça Ignis com bastante força.

— Conseguiste. – ela sussurra, derretida em felicidade.

Ela consegue sentir os músculos quentes assim que os braços dele a envolvem com firmeza. Nanuk está tão assustado, que treme, e esconde o rosto no pescoço suave e perfumado dela.

— Eu estava desesperado por te ver – responde. Ignis sorri.

— Provavelmente não temos muito tempo, Nanuk. Gabriel pode aparecer a qualquer momento – ela avisa, preocupada.

— Eu sei... – ele mergulha nos olhos dela – mas eu precisava de te ver, de te sentir...

Nanuk puxa-a para um beijo. Ignis pede passagem com a língua e ele cede, sem hesitar. As mãos dele percorrem o corpo dela, e param nas nádegas, apertando-as com força. Ignis solta um pequeno arfo. Tudo o que ela mais queria era poder entregar-se, agora, ali...

Os dois afastam-se por falta de ar. Nanuk esconde uma mecha de cabelo ruivo atrás da orelha dela e coloca uma expressão séria.

— Quem me dera que nos tivéssemos conhecidos noutras circunstâncias...

— Ainda podemos ficar juntos...certo? – pergunta Ignis, na esperança que ele diga que sim.

— Claro, – ele sorri – a minha irmã saiu da Vila, à procura de ajuda, mas eu não consigo esperar. Eu preciso de sair daqui, mas eu não vou a lado nenhum sem ti. Junta o que puderes para uma viagem. Eu venho-te buscar daqui a uns dias.

Em lágrimas, Ignis chora de felicidade.

— Eu sabia que não me deixarias para trás...


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado! SE AINDA HÁ ALGUÉM AI POR FAVOR QUE ME DIGA ALGO AAAAA



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