Contrato de Amor escrita por KogaRin


Capítulo 1
Visita inesperada




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/786725/chapter/1

Atenas, ano de 1885...

"... E é por acreditar em você, minha querida sobrinha, que eu deixo em seu nome a Casa de Apus em Rodório. Faça bom uso dela.

Seu tio,

Shion."

Luísa leu e releu aquele trecho da carta por diversas vezes, tentando compreender o que seu tio esperava que ela fizesse com aquela casa enorme na pequena Rodório, ao dizer que acreditava nela.

Dobrou a carta sobre o colo e encarou novamente o homem de traços orientais que trajava um terno marrom e segurava seu chapéu preto, o advogado de sua família, que aguardava pacientemente a sua assinatura no documento sobre a escrivaninha.

— Será uma bela mudança de vida, mudar-me para o interior sem saber o que fazer daquela casa… – Luísa colocou a carta sobre a escrivaninha começou a assinar a papelada.

— Se me permite a intromissão, senhorita Garcês, soube pelo seu tio que a senhorita tem um dom extraordinário para transmitir conhecimento. Então, por que não fazer uso deste dom e compartilhar seus conhecimentos com as jovens senhoritas de Rodório ao transformar aquela belíssima propriedade em uma escola para moças? – sugeriu Dohko.

— Escola para moças…

— Eu achei uma ótima ideia, senhorita! – Úrsula, sua dama de companhia e amiga, não conteve a empolgação.

Luísa assinou todos os documentos e se levantou da cadeira com um olhar determinado.

— Está feito! Mudaremos para Rodório!

Rodório, ano de 1887...

O súbito alarido dos passantes da rua principal de Rodório aos poucos ia tirando a atenção de suas alunas mais curiosas que, vez ou outra, achando que a professora não estava atenta, puxavam levemente a cortina para espiar pela janela o que acontecia do lado de fora.

— Adoraríamos que compartilhassem conosco o que há de tão interessante lá fora, senhoritas Rebeca e Eloá. – perguntou Luísa Garcês com uma sobrancelha arqueada sem tirar os olhos do livro que tinha sobre a saia vermelha de seu vestido, o que fez as duas jovens se aprumarem em seus lugares.

— Nos perdoe, senhorita Garcês. Mas acontece que uma pequena comitiva acaba de chegar e as carruagens são realmente muito chiques. – Rebeca responde, mal contendo sua empolgação ao enrolar os fios dourados nos dedos.

— E os cavalos têm as crinas mais brilhantes que os cabelos da Ester. – provocou Eloá e todas riram, menos a ruiva Ester, que fez um bico irritado.

— Já chega, meninas. Vamos voltar à nossa aula e, só por ter provocado à Ester, Eloá, leia para nós o trecho do qual falávamos agora à pouco. – Luísa ignorou a careta de desagrado da aluna e caminhou até a janela para fechar os vidros e assim diminuir os ruídos que vinham de fora.

No entanto, assim como suas alunas, ela também foi acometida pela curiosidade quando o elegante cocheiro abriu a porta da segunda carruagem e um belíssimo cavalheiro colocou a cabeça loura para fora para espiar. Belíssimo era de fato a definição perfeita para aquele homem, dono de curiosos olhos azuis, que percorreram a fachada da construção parando na janela de onde Luísa o observava. Sentiu seus dedos delicados apertarem com força desnecessária as cortinas de renda branca quando seus olhares se cruzaram e um sorriso lento e extremamente sedutor curvou os lábios pecaminosos do homem.

Um rubor instantâneo cobriu a face da professora quando esta se deu conta de que pecaminosos eram os pensamentos que preencheram a sua mente tão logo o cavalheiro de longos e cheios cabelos louros lhe sorriu mais abertamente ao descer da carruagem, revelando-se um homem de estatura alta e ombros fortes e largos.

— Meus deuses…

— Hummm, está parecendo que a senhorita Garcês também gostou dos cavalos… – sussurrou Eloá, arrancando risinho das demais alunas e trazendo de volta a atenção da professora.

— Oh… bem… – Luísa pigarreou e puxou as cortinas, presenteando Eloá com a leitura de um capítulo completo do livro de história, e recebeu em troca muitos resmungos da jovem que retomou a leitura. Luísa mal havia se sentado em sua poltrona quando viu Úrsula gesticulando da soleira da porta a chamando. – Continue a leitura, Eloá, e lembre-se das vírgulas. Eu já volto.

— Desculpe interromper a aula, senhorita. – Úrsula entregou um cartão de visitas dourado com uma gravura em alto relevo.

— Milo Papandrea Kallas… – Luísa leu o cartão em voz baixa e franziu o cenho. – Você já ouviu falar desse senhor, Úrsula?

— Não, senhorita. Na verdade, ele e os dois cavalheiros que o acompanham acabaram de chegar à cidade em uma comitiva bastante chamativa. Ele diz que tem algo muito importante para a senhorita. Os levei para a sala de estar, onde a aguardam um tanto ansiosos.

O fato de estarem ansiosos para ter com ela a deixou ainda mais apreensiva. Teria que dar por encerrada a aula de hoje, pois tudo aquilo estava deixando Luísa com a sensação de que não gostaria tanto assim daquela visita inesperada. 

— Por favor, Úrsula, leve um chá para a sala e alguns biscoitos também. Vou dispensar as meninas e já irei para lá em seguida. – dizendo isso, Úrsula fez uma leve mesura e se retirou enquanto Luísa voltou para a biblioteca.

v.V.v

Milo Kallas caminhava pela sala de estar de decoração feminina demais para o seu gosto, mas de certo modo aquilo o encorajava ainda mais, afinal aquela decoração só poderia significar a ausência de uma presença masculina na vida daquela mulher, e a ausência de um homem significava que ele teria vantagens na proposta que estava ali para fazer.

— Parece que teremos mais sorte por aqui. Perché non para um pouco e senta num destes divani? Está me deixando tonto com esse seu zigue e zague. – falou em tom irônico um dos homens que o acompanhava, sentado no sofá com almofadas em vários tons de rosa e branco. Ele possuía curtos cabelos cinzentos e um forte sotaque italiano.

— Digamos que eu esteja fazendo um reconhecimento territorial, Dante. Preciso saber bem onde piso antes de atacar a minha presa. – respondeu Milo, ao que o outro homem, com longos cabelos vermelhos presos em um rabo de cavalo baixo e vestido impecavelmente em um terno preto com lenço perolado perfeitamente posto no pescoço, apenas revirou os olhos. – Ora, Camus, não me olhe com esse jeito esnobe. No fundo você sabe que estou certo.

— Espero que não esteja se referindo a mim como sendo a sua presa, senhor Kallas. – a entrada da bela mulher de cabelos castanhos ondulados e soltos até a curva da coluna atraiu a atenção de todos.

— Pois era exatamente o que eu fazia, senhora Garcês. – Milo resolveu atacar prontamente com o propósito de intimidar a moça. – Quero comprar esta propriedade e a sua escola terá de sair daqui.

Milo estendeu-lhe algumas folhas de papel onde Luísa leu as palavras "Contrato de Venda" e voltou a encarar os homens à sua frente. No entanto, o riso cristalino da professora causou-lhe exatamente o que ele pretendia causar a ela. Milo, assim como os amigos, paralisaram diante da reação incomum às mulheres daquela época.

— Oh… me desculpe, senhores. Mas nunca ouvi algo tão absurdo… – Luísa falava entre risos, o que o estava começando a incomodar, e ela sabia disso, então continuou rindo. – Senhor… oh céus! Um… um momento, sim?

Camus olhou para o amigo e soube de pronto que ele e não estava gostando nada da reação da mulher. Muito diferente de si, é claro, pois se divertia sobremaneira com a atitude audaciosa da senhora da casa e a cara de poucos amigos que se formava no rosto de Milo.

— Posso saber o motivo desse riso descontrolado, senhora? – Milo perguntou em tom azedo.

— Em primeiro lugar, senhor Kallas, é senhorita Luísa Garcês. E em segundo: – Luísa colocou os documentos entre as mãos de Milo, ficando repentinamente séria ao encará-lo firmemente com seus olhos azuis. – Este lugar não está à venda! Agora, se me permitem, gostaria que deixassem a minha casa.

v.V.v

— Milo, amico mio, io tenho certeza de que vivi até hoje apenas para ver essa sua cara… Hahahaha… – Dante mal se continha ao entrar de volta na carruagem e se sentar diante do consternado e muito irritado, Milo Papandrea Kallas.

— Dante, você não está ajudando muito aqui. – Camus foi o último a entrar e se sentou ao lado do italiano, encarando também o loiro à sua frente. – E sei que também non vou ajudar com o que vou dizer agora, mas espero que tenha lhe servido de lição, mon ami. Non é porque une femme vive sozinha que ela non saiba como se defender. Non estamos mais em Atenas, e me parece que você se esqueceu de como as mulheres daqui são muito mais fortes e independentes do que as de lá.

Milo olhou outra vez para a casa branca de três andares, ou melhor, diretamente para a janela onde a viu pela primeira vez e teve a errônea ideia de que Luísa fosse uma dama convencional. Suspirou desanimado e passou as mãos nos cabelos, jogando-os para trás e recostou a cabeça no banco com os olhos fechados.

Não se daria por vencido e com certeza encontraria um jeito de convencê-la a sair dali, afinal, precisava daquelas terras. Foi então que um plano começou a se formar em sua cabeça, e um sorriso em seu rosto bonito.

— Ah, cazzo! Conhecemos esse seu sorriso. Acha mesmo que esse seu plano vai dar certo com ela?

— Já deixo minha aposta na mademoiselle. – Camus estendeu a mão para o amigo italiano, ignorando a carranca que Milo fazia.

— Com amigos como vocês, quem precisa de inimigos? Mas tudo bem. Eu vencerei no final e ainda terei o prazer de rir das caras de vocês dois. – dito isso, Milo olhou mais uma vez pela janela, vendo que Luísa observava a partida das carruagens com um leve sorriso. – Aquela megera vai se render… – piscou um olho para ela antes de se perder de vista.

v.V.v

— Cretino! – Luísa fechou a cortina com força sentindo o rosto esquentar.

Esperava não mais ter que lidar com aquele homem, mas a sua intuição gritava para que ela se preparasse pelo que estava por vir. Aquele sorrisinho irritante que viu permear o belo rosto antes que as carruagens deixassem a frente de sua casa dizia que ele não aceitaria um não como resposta.

— Ahhh… – sentou-se pesadamente no sofá e tomou um gole do chá que Úrsula havia servido antes da saída daqueles homens. – Tudo estava bem demais.

— Parece que a senhorita encontrou um oponente à altura. – Úrsula entrou na sala e começou a juntar as louças na bandeja. – E devo dizer que muito bonito também. O que pretende fazer?

— Ah, Úrsula, então você também sentiu que isso ainda não acabou?

A criada e amiga colocou a bandeja sobre a mesinha de centro e sentando-se ao lado de Luísa, segurou em suas mãos, olhando-a firmemente:

— Se o que eu vi nele se confirmar, teremos uma grande batalha pela frente. – deu dois tapinhas nas mãos da amiga e então se levantou, recolhendo a bandeja e deixando-a só com mais esses pensamentos.

— E mais essa agora… 

O resto daquele dia transcorreu como de costume, porém, ao cair da noite um mensageiro deixou um envelope aos cuidados de Luísa, que àquela hora já havia se recolhido.

Na manhã do dia seguinte, um belo e ensolarado sábado, Luísa saiu com Úrsula para o encontro semanal com suas amigas em um charmoso café com mesinhas na calçada. Seus cabelos castanhos estavam presos em uma longa trança caída nas costas e um adorável e delicado chapéu com pequenas flores azuis adornava sua cabeça, realçando a cor de seus olhos e combinando perfeitamente com seu longo e rodado vestido branco com pequenos detalhes florais em azul.

— Luuuu, minha querida! – uma moça de porte miúdo e delicado se levantou sorridente assim que viu a aproximação da amiga. Ela usava vestido verde com rendas brancas e os cabelos castanhos presos em um coque baixo com uma linda presilha de pedrarias. – Que bom que veio. Eu estava muito ansiosa para o encontro de hoje!

— Ah, todas nós notamos a sua empolgação para este encontro, Calisto. – comentou a outra amiga, com cabelos mais curtos em um corte Chanel e vestido de cetim de cor creme, ajeitando os óculos de grau no rosto, levantando-se também para abraçar a recém chegada.

— Bom dia, meninas. – Luísa cumprimentou a todas e se sentou, pendurando a sombrinha rendada no encosto da cadeira. Ela bem sabia o motivo da empolgação de Calisto, mas fingiu ignorar o assunto. – Pode me contar o que aconteceu de tão interessante para essa comoção, Erika?

— Ora, Luísa Garcês! Quer mesmo manter esse teatrinho? Se a Erika quiser acreditar nesse fingimento tudo bem, mas à mim você não engana. – a negra de olhos e vestido violetas "afofou" os cachos escuros e retirou as luvas brancas para colocá-las sobre o colo.

— Falou muito bem, Tereza! Estou com você. – falou Calisto. – Estão dizendo na cidade que três carruagens enormes e nunca vistas por aqui, pararam diante de sua casa e vários homens entraram em sua casa.

— O quê?! – Luísa engasgou com o chá e começou a tossir. – Que história é essa?! Não… não foram "vários" homens.  Que absurdo!

— Oh, parece que ela recobrou a memória, não é mesmo, meninas? – Erika deu uma risadinha com a mão sobre a boca.

E com isso todas riram. Se haviam pessoas capazes de decifrar a Luísa, essas eram suas amigas. Não tinha como manter segredo delas por muito tempo. Então, resignada, Luísa contou exatamente o que aconteceu na tarde anterior em sua casa e as reações das amigas foram das mais variadas.

v.V.v

— Eu não acredito que ela simplesmente ignorou o meu convite para um café da manhã, sem nem mesmo me enviar uma mensagem com uma desculpa qualquer! – Milo arrancou a fita que prendia seus vastos cabelos num gesto nervoso e a jogou para o lado, no sofá da saleta que antecedia seu quarto no sítio que seu amigo Aldebaran possuía um pouco afastado do centro de Rodório.

— Já parou para pensar que ela pode non ter visto o seu convite? – Camus olhava a paisagem pela janela.

— Bem, Milo, devo dizer que a senhorita Luísa tem todo o direito de ignorá-lo se assim o desejar. – falou o grande anfitrião, recostado no batente da porta. – Mas a conhecendo bem, Camus deve estar certo. O horário que escolheu para enviar o convite, ela certamente já havia se recolhido.

— Em resumo, caro mio, você fez tudo errado! – Dante ria descaradamente.

Sim, seus amigos tinham razão. Teria que pensar numa maneira de se aproximar daquela mulher e mostrar para ela como ele sabia ser bastante persuasivo.

— Já sei! – Milo levantou-se num rompante e se voltou para Aldebaran. – Um baile!

— Um baile? Aqui? Para quê? – a cada pergunta Aldebaran dava um passo para dentro da saleta. 

— Ora essa, Aldebaran, meu grande amigo... – Milo começou a rodeá-lo enquanto dava voz ao seu plano.

Dante colocou o seu relógio dourado de bolso sobre o aparador ao lado de Camus.

— O que é isso? Está apostando suas heranças neste plano furado? – Camus perguntou e já retirava do bolso do paletó o seu relógio prateado.

— Como assim? Eu aposto tudo na moça, é claro. Ela vai massacrar o Milo e eu as suas economias. – Dante exibia um grande sorriso, que foi aos poucos morrendo em seu rosto quando Camus pegou de volta o relógio de cima do aparador. – Ma che?! Está dando para trás?

— Non, idiot! Non existe vitória quando os dois estão apostando no mesmo lado. – Camus guardou o relógio novamente no paletó e deixou o quarto e um Dante bastante decepcionado.

v.V.v

— Um baile na mansão do lorde Aldebaran neste final de semana, em boas vindas aos amigos que vieram de Atenas lhe fazer uma visita. – Luísa lia e comentava o convite que tinha em mãos.

— Não gosto de pensar que esse baile não se trata apenas de uma comemoração de boas vindas aos amigos do lorde. E menos ainda que Lorde Aldebaran faça parte disso. – comentou Úrsula, incomodada, ao que Luísa logo tratou de reconforta-la:

— Conhecendo o senhor Aldebaran, eu penso que este baile não tenha sido totalmente ideia sua. Talvez ele nem soubesse do real motivo da vinda de seus amigos para Rodório.

E com essa ideia permeando seus pensamentos, a semana passou entre ajustes de vestidos, a empolgação de suas alunas, a empolgação de suas amigas, e a empolgação de todos na cidade.

A noite já estava caindo quando Luísa desceu da carruagem seguida por Úrsula diante da belíssima propriedade de Aldebaran. As árvores formavam um túnel florido até a entrada da mansão, e tochas iluminavam todo o caminho e as laterais da grande mansão emprestando um ar muito romântico ao ambiente.

— Estão belíssimas, minhas caras! – Aldebaran às recebeu na porta, e não fez esforço algum para conter o brilho de admiração ao percorrer o vestido champanhe que cobria o corpo esguio de Úrsula e se demorar em sua face levemente ruborizada. – Fico muito feliz que tenha aceitado o meu convite, senhorita Úrsula.

— Não deixaria que a senhorita Luísa viesse desacompanhada. – respondeu sem encará-lo, e Aldebaran riu de sua atitude, oferecendo um braço para cada uma.

— Venham, deixem-me ostentar tão belas companhias, e assim aproveito para lhes confidenciar algo sobre este baile.

v.V.v

Milo caminhava pelo salão, cumprimentando aos convidados e conversando com amigos que não via a tempos, como o veterinário mais carismático e importante da cidade de Rodório.

— É uma honra finalmente conhecer a única pessoa capaz de fazer este homem parar de pensar em cavalos. Serei eternamente grato por colocar na cabeça do Aiolos que ele NÃO sabe relinchar, nem latir, e muito menos miar. – gracejou arrancando risos do casal à sua frente.

— Devo confessar-lhe, senhor Kallas, que às vezes ainda o pego falando "cachorrês" com os filhotinhos da nossa Misty. – brincou Erika.

— Meu amor, eu te pedi para não revelar os meus dons para ninguém.

— Tarde demais, meu amigo. – Milo abraçou Aiolos. – Vejo que encontrou um belo tesouro, Hilbert, e nem preciso perguntar como tem passado. Vocês estão realmente radiantes.

— Obrigado, Milo! Vi que trouxe o Camus e o Mask com você. 

— Mask? – Erika perguntou.

— É o apelido do Dante Canalli. Se lembra quando contei sobre a minha infância aqui em Rodório?

— Oh, sim. – Erika riu ao lembrar da história por trás do apelido do amigo de seu marido.

— Contou à ela sobre quando éramos crianças, e ela ainda assim aceitou se casar com você? Ela realmente te ama, meu amigo.

Antes que Aiolos pudesse retrucar a brincadeira, uma pequena comoção chamou a atenção de todos para a entrada do salão, onde Aldebaran se exibia com duas belíssimas damas. Milo engoliu em seco ao reconhecer uma delas e mal pôde esconder o encantamento que sentiu ao ver Luísa desfilando num vestido azul marinho sem mangas e com detalhes de pedrarias na gola, dispensando o uso de colares, e na cintura bem marcada. Sem que ele mesmo notasse, já estava diante deles e oferecia seu braço para Luísa.

— Está linda, senhorita Garcês! – ouviu-se falando, e não resistiu a continuar dizendo o que lhe vinha à mente. – Me daria a honra de sua companhia esta noite?

Luísa estancou ao lado de Aldebaran e não soube como interpretar tal convite. O seu lado lógico sabia que que ele se referia à acompanhá-lo durante o baile, mas quem disse que seu lado lógico comandava a sua mente diante daquele homem? Como se soubesse de antemão a cor do vestido com o qual ela viria ao baile, Milo trajava um elegante terno de veludo no mesmo tom azul marinho de seu vestido, e como se não bastasse, aquela cor emprestava um brilho extremamente irresistível aos olhos dele, o que a fez pensar em como seria o olhar dele num momento de prazer. Tais pensamentos causaram-lhe um súbito calor e o rubor cobriu a face alva quase que instantaneamente, forçando-a a desviar os olhos para o chão.

E percebendo o duplo sentido em sua frase, Milo tratou de logo explicar-se:

— Oh, bem… me perdoe. Não foi isso que quis dizer. – se atrapalhou com as palavras, então pigarreou e continuou: – Gostaria de me acompanhar durante o baile?

Olhando para Úrsula e depois para Aldebaran, Luísa soltou o braço do amigo e aceitou o braço de Milo.

— Luísa? – perguntou em tom preocupado o anfitrião, ao que Luísa lhe sorriu confiante. 

Não seria justo que ela atrapalhasse o claro romance de seus amigos apenas para fugir de um problema loiro, alto, forte e de olhos azuis. E percebendo a intenção de sua amiga, Aldebaran meneou a cabeça em agradecimento.

— Espero que cuide bem dela, Kallas, pois essa senhorita me é muito querida, e eu ficarei atento! – dito isso, Aldebaran voltou-se para Luísa e concluiu com seu sorriso caloroso: – Divirta-se, minha amiga, e não hesite em me chamar se houver algo errado.

Luísa sorriu para seus amigos e retribuiu o cuidado ao dizer:

— Digo o mesmo à vocês dois. Aproveitem o baile. – Luísa viu um amplo sorriso se espalhar pelo rosto de Aldebaran, ao passo em que a face clara de Úrsula ganhou um tom rosado, e cochichou para a amiga. – Eu torço por você.

Com um meneio de cabeça, Milo a guiou para a pista de dança que foi montada nos jardins da mansão, onde uma pequena orquestra tocava para os convidados embalados pelo perfume das flores. Durante todo o caminho até a pista, o casal foi parado diversas vezes para serem cumprimentados e Luísa percebia o quanto o homem ao seu lado era conhecido entre os moradores da pequena cidade, e isso a fez lembrar de quando entrou no salão e o viu junto à Erika e seu marido Aiolos.

Mas isso ficou de lado quando finalmente chegaram na pista de dança e Milo posicionou a mão esquerda em suas costas aproximando mais que o convencional o corpo delicado do seu, enquanto segurava a mão de Luísa com a outra, iniciando a valsa.

— Confesso que fiquei surpreso quando aceitou o meu convite. – falou Milo.

— Eu também me surpreendi com isso. 

— Quer dizer que não esperava que eu me aproximasse da senhorita?

— Não, senhor. Quero dizer que eu mesma não esperava que EU aceitasse a sua aproximação.

O riso de Milo foi instantâneo. Aquela mulher não media palavras e ao invés de se sentir acuado como a maioria dos homens, ela o atraía mais com esse jeito autêntico.

— Lorde Aldebaran demonstrou muito apreço ao realizar este baile. E me parece que todos gostam muito do senhor e de seus amigos. Quase não conseguimos chegar ao jardim sem que alguém o parasse para cumprimentá-lo. – comentou Luísa, mais para afastar os pensamentos de como o riso dele reverberava em todo o seu corpo.

— Por um acaso, o fato de ter a minha atenção dividida com outras pessoas incomoda a senhorita? – provocou-a com um sorriso de canto, fazendo Luísa errar o passo com a audácia do cavalheiro.

— É um homem muito bonito, senhor Kallas, não posso negar. – declarou a moça, o que fez com que ele errasse o passo da dança desta vez, e então continuou, satisfeita por devolver-lhe o desconcerto: – No entanto, seria necessário algo muito além da beleza para me conquistar. A inteligência, por exemplo.

— Por Athena! – Milo afastou-se um pouco para encará-la mas sem soltá-la. – A senhorita acabou de me chamar de ignorante? Por acaso sabe o que eu sou, senhorita Garcês?

A esta altura o casal já não mais seguia os passos da valsa que embalava os outros casais no tablado. Os dois apenas se encaravam sem se dar conta de que aos poucos se tornavam o centro das atenções. O olhar de Milo percorreu o rosto de feminino até parar sobre os lábios rosados, ao mesmo tempo em que Luísa os entreabria para puxar o ar.

Luísa sentia seu coração disparar enquanto os olhos azuis do homem ganhavam uma tonalidade mais intensa, revelando o desejo que sentia de tocar os lábios dela com os seus. Os rostos foram aos poucos se aproximando ao ponto de sentirem o hálito quente um do outro na própria pele. Esqueceram-se por completo de onde estavam e sobre o que discutiam, só importava que ela estivesse em seus braços e que ela sentiria os lábios firmes dele contra os seus.

— Parece que finalmente os dois se entenderam.

Como que despertando de um sonho, Luísa e Milo piscaram várias vezes antes de encararem o dono da voz que estava acompanhado de uma jovem dama, cujo os olhos brilhavam tanto quanto o belo vestido amarelo ombro a ombro.

— Dante!

— Calisto!

Disseram ao mesmo tempo.

— Lu, poderia me acompanhar até o toalete? Sabe como sou atrapalhada e posso acabar me perdendo nessa mansão.

— Oh, sim… vamos. – voltando-se para Milo ao seu lado, Luísa fez uma leve mesura e as duas se retiraram.

Vendo-as se perderem em meio aos convidados, Milo suspirou passando a mão pela franja.

— Ela te pegou de jeito, não é? – Dante colocou o braço sobre os ombros do amigo.

— Dante… – Milo apertou a ponte do nariz e bufou, então começou a caminhar para deixar a pista de dança, saindo do abraço do outro. – O que você pretende, me atrapalhando desse jeito?

— Pegue, beba. – o italiano pegou duas taças de champanhe da bandeja de um dos muitos criados que serviam pela festa, e ofereceu uma para Milo. – Eu fui forçado, mio caro.

— Forçado? Só pode ter sido coisa do Aldebaran. Ela está no meu pé…

— Não, Milo, não foi o Aldebaran. – então, assumindo um tom de voz sussurrante e a fisionomia de pavor, esclareceu: – Viu a dama que me acompanhava? – Milo afirmou com a cabeça franzindo o cenho. – Ela enganchou o braço no meu e ameaçou fazer um escândalo se eu não interrompesse o que estava para acontecer.

— Espere um pouco? – Milo parou de frente para Dante. – Está me dizendo que você, o temível Máscara da Morte, tremeu nas bases por conta da ameaça de uma mulher daquele tamanho?!

— Shhhhiiio – Dante tapou a boca do amigo com a mão enquanto olhava para os lados. – Non parlare alto dessas coisas! E também você não faz ideia de como aquela ragazza pode ser assustadora.

v.V.v

— Onde você estava com a cabeça ao se deixar levar pelo inimigo?! – Calisto fechava a porta do que ela julgou ser o escritório de Aldebaran e se voltou com as mãos na cintura. – Por acaso tem ideia de que se eu não chegasse a tempo vocês teriam se beijado diante de todos?!

Sim, Luísa tinha ideia do que estava por fazer e, além disso, sabia muito bem onde isso a levaria. Era professora de futuras debutantes. Em breve aquelas garotas seriam apresentadas para a sociedade e se Calisto não tivesse chegado naquele exato momento, não somente a sua reputação estaria arruinada quanto a de suas alunas se tornaria questionável diante da sociedade.

— Eu sei, Cali, e sinto muito por isso mas… – levou as mãos ao rosto, sentando-se no sofá envergonhada. – Eu não sei o que acontece comigo quando olho para aquele homem. Ele… ah, ele...

— Ele é um sedutor, isso o que é! Querida, – Calisto se abaixou diante da cadeira onde Luísa estava sentada. – É para isso que servem as amigas, não é? Me desculpe por te dar uma bronca, eu me apavorei. Mas, me conte, o que você fazia com aquele homem? Além de quase beijá-lo, é claro.

Levantando-se e ajudando a amiga a fazer o mesmo, Luísa caminhou até a janela antes de responder:

— Ele me convidou para acompanhá-lo durante o baile, e como você sabe, não queria atrapalhar a noite de Úrsula.

— Ah – suspirou Calisto, encantada. – Úrsula e o senhor Aldebaran formam um casual tão bonito… Acho que teria feito o mesmo que você, e me atirado aos leões.

— Por falar nisso, senhorita Calisto, de onde conhece aquele homem? 

— Aquele… homem? Bem… fala do cavalheiro que me acompanhava?

— Sim, Calisto. Do cavalheiro que a acompanhava, que por sinal, é o mesmo cavalheiro que acompanhava o senhor Kallas em minha casa, por tanto, um… "inimigo" também. – Luísa fez questão de lembrá-la das palavras que Calisto usou com ela.

— Bem… eu nem mesmo o conheço. – confessou. – Eu a procurava pelo salão quando a vi indo para o jardim com o senhor Kallas e então, agarrei o primeiro braço vago que vi pela frente e o… eu o coagi a me acompanhar e interromper aquela bela catástrofe.

— Você o quê?! – Luísa arregalou os olhos e não conteve a gargalhada quando Calisto levou a mão ao peito para enfatizar o seu drama. – Pelos deuses!.... Não consigo parar de rir… ao imaginar… ao imaginar aquele homem com medo… de você…

— Por uma amiga eu sou capaz de tudo. Agora, fique aqui enquanto vou buscar algo para você beber e se acalmar. – dizendo isso, Calisto deixou o escritório da mansão.

Enquanto esperava, Luísa começou a caminhar pela sala com cuidado, pois a única iluminação ali dentro vinha das janelas. Passava os dedos pelos livros nas estantes até se deparar com alguns desenhos na escrivaninha.

Franzindo o cenho, curiosa, começou a folhear o que descobriu serem plantas do terreno onde agora ficava a sua casa e a de seus vizinhos. Eram projetos de uma construção com inúmeros quartos e áreas extensas de recreação e convívio comum, e pelas descrições ao lado de cada desenho, se tratava de algo grandioso.

— Aquele cretino… mas se ele pensa que vai conseguir me tirar de lá só para construir este hotel de luxo, está muito enganado!


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Contrato de Amor" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.