Ingredientes para se Curar um Coração escrita por LizAAguiar


Capítulo 14
Ingrediente 10: Se Tudo der errado, ao Menos Diga a Verdade


Notas iniciais do capítulo

Olar pessoinhas o/

Estão prontos para o final dessa fic cheia de ingredientes que não querem dizer nada?

E ainda teremos a participação especial de uma personagem u.u

Sem mais delongas, tenham uma boa leitura ^^



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Idiota.

Significado: pessoa que carece de inteligência, de discernimento; tola, ignorante, estúpida.

Era exatamente assim que Reyna estava se sentindo.

Ignorante, tola e estúpida.

Essas palavras circulavam por sua mente o tempo todo, fosse no silêncio da principia, quando lutou com Percy novamente, — perdeu por pouco, mas a revanche já estava marcada, — ou com o barulho irritante do secador de cabelo, como naquele momento.

´´Uma cena...Você armou uma cena. ``

Nem com 12 anos se permitiria agir daquela forma, era até difícil de acreditar que não foi um pesadelo.

´´Ela não está aparecendo no refeitório. ``

Reyna estava preocupada.

´´Eu saberia se ela tivesse ido embora. ``

E isso não a deixava menos aflita.

No dia anterior, quando Frank perguntou se tinha visto Piper recentemente a romana teve vontade de mandar seus galgos a procurarem, apenas para se certificar de que estava tudo bem.

Felizmente a parte racional de seu cérebro, — um tanto morta atualmente, — a fez notar o quanto aquilo era bizarro, que dentro do acampamento estaria segura e, mesmo se isso fosse uma inverdade, Piper havia protegido suas costas durante uma guerra, sabia se cuidar muito bem.

´´Ela só está me evitando. ``

Não poderia culpa-la, Reyna também se evitaria se fosse possível.

Havia jogado suas frustrações em cima dela sem pensar duas vezes, Piper não tinha culpa se estava apaixonada por ela. Ouvi-la dizer que a considerava parte do acampamento doeu como um soco na boca do estômago, mas não era diferente do que a maior parte das pessoas pensavam, a grega não era obrigada a vê-la de outra forma apenas porque essa era a vontade de Reyna.

Tinha que se desculpar com ela antes de ir embora.

Desligou o secador, aliviada com o fim daquele barulho, mesmo que sua cabeça ainda estivesse em um ritmo acelerado, vestiu sua camiseta branca com a frase I ♥ Barrachina e um short de tecido leve, já que agora não conseguia mais olhar para seu kimono preferido.

Quando sentou-se no carpete da sala, a frente da mesinha de cento, seus olhos foram puxados até o pergaminho dourado de comunicação, mordeu o lábio inferior, incerta se aquilo era loucura, desespero ou consequência de alguma batida na cabeça que não se lembra, Reyna suspirou.

 ´´Não é como se não falar com ela fosse mudar alguma coisa. ``

Desenrolou o pergaminho, não foram necessários mais que alguns segundos para ser atendida, sempre eficiente em tudo que se propunha a fazer. Encarou o holograma que surgiu a sua frente, sentada em sua mesa polida e vestida como uma verdadeira amazona viciada em trabalho.

E, mesmo sabendo que eram parecidas, Reyna nunca se sentiu tão semelhante a ela quanto naquele momento.

— Reyna? — Hylla indagou, como se a ligação fosse um tipo de ilusão bem programada.

— Sim, é a sua irmã. — Seus olhos não deixaram a incredulidade de lado, mesmo que concordasse com a cabeça.

— Muito bem. — Cruzou as pernas e recostou na cadeira negra muito bem estofada. — Qual deus é o problema da vez?

— Nenhum. — O que por si só já era muito estranho. — Eu... — Seu orgulho ainda lutava. — Preciso de um conselho. — Disse a contragosto, sentindo a garganta arranhar. Os olhos de Hylla circularam pela sala discretamente, como se esperassem ver algum ninja do Walmart camuflado na parede.

— Você? Pedindo um conselho meu? — Riu levemente da cena esquisita, em um momento normal, Reyna teria rolado os olhos ou ido direto ao assunto, entretanto esse estava longe de ser o caso.

— É o que as irmãs fazem, não é? — Questionou em uma voz sem humor. — As irmãs normais. — Em outro momento teria se irritado consigo mesma por soar tão melancólica e carente na frente de Hylla.

Provavelmente se sentiria assim ao desligar a ligação. Sua irmã a sondou por um momento.

— Ok. — Entrelaçou as mãos no colo, como se fosse negociar o preço com um fornecedor. —Qual o problema? — Pensou por um momento em como narrar a questão sem dizer mais que o necessário, o anel de sua mãe passou a ser girado em seu dedo.

— Eu...

— É sobre as caçadoras, não é? — O tom de deboche a fez pensar seriamente em jogar o pergaminho pela janela, porém havia outra questão a ser explorada.

— Quem? — Sequer tentou conter o tom de ameaça em sua voz.

— O que? — O sorriso da irmã saiu satisfeito, mesmo fingindo não saber do que falava.

— Quem me espiona pra você? — Seu tom exigia uma resposta, qualquer outra pessoa teria ficado ao menos receosa, Hylla apenas deu de ombros.

— Por favor, maninha. Eu sou a rainha das amazonas. — E era a única resposta que estava disposta a lhe dar. — Diz logo qual o problema. — Pescou o leve tom impaciente.

´´Como conseguiu ficar desesperada a esse ponto, Reyna? ``

— Eu não sei se...

— Então não vai. — Sentenciou, cruzando os braços quando a encarrou aborrecida.

— Você não vai me deixar falar? — Mediram forças por alguns segundos a mais, até Hylla suspirar.

— Nunca tivemos tempo de conversar sobre isso, Circe, deuses dando trabalho, você sabe. — O arrepio em sua espinha confirmou o que sua intuição apontava desde que tive aquela ideia maluca. Hylla inclinou-se para mais perto, exigindo com o olhar que fosse sincera. — Você é assexual?

— O que? — Foi a única coisa que pode dizer, surpresa com o rumo daquela conversa. Sua irmã suspirou com impaciência.

— Assexual, uma pessoa que não sente atração sexual. — Foi sua vez que de suspirar. — Você é? Ou acha que é?

— Não. — Resmungou, olhando para a TV desligada a sua frente, sem acreditar que aquilo estava acontecendo.

— Odeia homens? — Alguém veio trazer uma pilha de papeis e um copo de café para viagem a sua mesa, e nem assim ela deixou de inquirir a resposta. — Estou falando de ódio de verdade, quer que eles morram?

— Claro que não. — Infelizmente sabia onde sua irmã queria chegar.

— Então por que quer se meter com as Caçadoras de Ártemis? — A voz dela saiu indignada, Reyna encarou o carpete, sentindo-se como uma criança. — Se quiser um trabalho pra caçar monstros, sempre precisamos de itens raros para feitiços, que você conseguira com o pé nas costas, pagamos muito bem e pode se divertir com o cara que quiser. — Voltou a encarar o rosto da irmã, levemente desnorteada.

— O que? — Hylla rolou os olhos para sua lerdeza pouco habitual.

— Só me escute: por que você quer ir? — E tomou um gole longo do café, lhe dando um tempo para pensar.

— As caçadoras perderam muito na batalha contra Órion... — Começou incerta, sabendo que se a conversa fosse presencial Hylla lhe daria um soco, e poderia dizer isso apenas pela forma como ela havia a fitado antes de devolver o copo a mesa. — Eu só achei que poderia ser útil e...

— Reyna: a verdade. — Estranhou a falta de irritação em sua voz, mas não deu atenção a ela.

Poderia enfeitar sua resposta, achar milhares de justificativas, mas a verdade era apenas uma:

— Não me sinto mais necessária aqui. — Havia feito tudo o que poderia pelo Acampamento Júpiter, não conseguia pensar em mais motivos para continuar ali. Os movimentos do holograma cessaram, ou a comunicação estava instável ou havia pego a irmã de surpresa.

— Necessária? — Indagou devagar, como se saboreasse a palavra.

Fazia tempo que Reyna não sentia medo de deixar Hylla irritada.

— Não estamos mais em guerra, temos paz entre gregos e romanos... — Parou suas justificativas ao ver compreensão nos olhos da irmã, finalmente alguém a entendia.

— Caralho, é por causa do papai. — Sua voz espantada e baixa fez seu corpo enrijecer.

Não tinha ligado para falarem sobre aquele assunto.

— Não é. — Cerrou os punhos com força, não iria falar sobre isso.

— É claro que é. — E Hylla não se importava nem um pouco com sua vontade. — Ou vai dizer que você não foi pro Acampamento Júpiter por causa dele? Não me evita porque isso te faz lembrar dele? — Reyna encarou os próprios pés, sem conseguir sustentar o olhar da irmã, e nem isso pareceu agrada-la. — Reyna!

— O que?!

— Foda-se ele. — Disse simplesmente, voltando a sua calma habitual.

— Hylla! — Sua irmã rolou os olhos.

— Ele está morto e não vai mais voltar. O que aconteceu não importa. — Completou quando abriu a boca para contrapor. — Você está viva e tem a vida toda pela frente, não interessa o que ele queria que a gente fizesse, ou se a nossa família é importante ou não para Roma. — E bateu a mão na mesa, claramente querendo lhe dar um soco. — O que você quer fazer? Onde quer estar? Foda-se quem precisa ou não de você. — E massageou a têmpora, como se estivesse com dor de cabeça.

— Não precisa ficar brava desse jeito... — Novamente se sentiu uma criança, não era uma sensação nada boa.

— Você gosta de ser pretora? — Respirou fundo para perguntar.

— É que... — Parou de falar quando sentiu o olhar assassino preso em seu rosto.

— Reyna... — Hylla praticamente rosnou seu nome.

— Sim, eu gosto de ser pretora. — Como poderia não gostar?

Claro que na maior parte das vezes era difícil, corrido e pedia para que fizesse coisas impossíveis, mas sentir que havia feito diferença para que uma dinastia toda continuasse a existir compensava seus sacrifícios, era o que dava sentido a sua vida...

´´Oh...``

— Com quem você quer estar? — Sua voz soou mais branda, notando a expressão de compreensão em seu rosto. — Quem é importante pra você?

Gostava das noites de filme com Nico, de tomar um chocolate quente com Annabeth uma vez ou outra, de suas recentes lutas com Percy e a amizade retomada com Jason, de relaxar em sua padaria preferida olhando o movimento em seu dia de folga, do olhar feliz de Frank quando o chamava de pretor ou colega, da festa de dia das bruxas que ambos os acampamentos haviam escolhido para ser um evento diplomático e celebrar a paz.

E gostaria de ter mais momentos com Piper, se isso ainda fosse possível.

— Ok, acho que entendi. — Coçou o pescoço, sentindo-se idiota outra vez, Hylla deu de ombros, ainda não parecia satisfeita.

— Então? — Encarou a irmã, sem saber o que ela queria.

— Obrigada. — Arqueou a sobrancelha, dando evidência a cicatriz em sua testa.

— De nada. — Silêncio.

— O que? — Não sabia mais o que dizer.

— Quem? — Foi sua vez de rolar os olhos.

— Quem o que, Hylla? — Por algum motivo a rainha das amazonas sorriu.

— Quem virou sua cabeça? — Seu tom saiu sugestivo, e Reyna não enrolou o pergaminho para acabar com a palhaçada porque essa atitude teria consequências.

— Ninguém virou minha cabeça. — Sua voz saiu neutra e polida. Sua irmã apenas analisou seu rosto por alguns segundo mais do que a pretora estava disposta a tolerar.

— Tá bom. — Disse por fim. — Só não esquece de me apresentar minha cunhada quando ela virar ainda mais sua cabeça e a convencer de tirar umas férias aqui em Seattle. — Sua irmã encarou um ponto além do pergaminho enquanto Reyna tentava fechar a boca.

— O que? Como você...? — Até sua irmã?

Até sua irmã?!

— Tenho uma reunião agora, me mande notícias, ok? — E piscou para ela. — Como irmãs normais fazem.

— Hylla... — Não sabia mais o que dizer.

— Tchau. — O holograma sumiu.

Reyna não soube dizer quanto tempo ficou encarando o papiro dourado ou quanto sua mente vagou, tentando assimilar e refletir sobre toda a informação que sua irmã havia despejado em sua cabeça.

Apenas deixou que seu corpo escorresse até se deitar no carpete macio.

´´O que é que eu vou dizer para a Hazel amanhã? ``

Frank ficaria triste, considerando a quanto tempo estava esperando para dar a notícia.

´´Nico vai me matar. ``

Claro que ele ficaria aliviado e feliz por sua desistência, entretanto isso não o deixaria menos irritado do que estava, talvez devesse falar com Will primeiro.

´´Pelo menos o Guido vai ficar feliz, sem vontade de me dar um coice na cabeça. ``

E não poderia esquecer de Piper McLean.

Lhe devia um pedido de desculpas por ter explodido na frente dela, comunicar que não pretendia mais ir embora e, contar a verdade sobre seus sentimentos de uma vez por todas, o que faria com essas informações cabia apenas a ela mesma, o que estava ao seu alcance era ser sincera.

Levantou-se, sentindo a necessidade de uma boa barra de chocolate meio amargo.

´´Comunico o Frank pela manhã, adianto a reunião com Hazel...``

E arranjaria um tempo em sua agenda para achar a filha de Afrodite, que com toda a certeza não apareceria no refeitório por alguns dias, esperava que ao menos ela quisesse ouvir o que tinha a dizer.

Achou apenas uma barra de chocolate ao leite, — o que definitivamente não era um impedimento para que aproveitasse o doce, — jogou um quadradinho na boca, deixando que derretesse lentamente.

O som estridente da campainha a impediu de continuar saboreando sua cota de açúcar do dia.

— Deuses, não permitam que o Valdez tenha colocado fogo em alguma coisa. — Murmurou para si mesma, debatendo com sua consciência se deveria ao menos colocar um chinelo para receber sua visita.

Olhou o relógio de parede da sala quando passou pelo corredor de entrada, eram 21:15.

Suspirou, tentando imaginar o pior cenário possível.

´´Mais uma guerra entre unicórnios e pegasus? Um rato assustou o Aníbal outra vez? As Portas da Morte abriram de novo? ``

Nenhum desses cenários teria quase a feito engasgar com o resto de chocolate em sua boca tanto quanto o real.

A única reação que teve ao abrir a porta foi não ter reação alguma. A sua frente estava a filha de Afrodite que não saia de sua cabeça há semanas, com sua habitual camiseta do Acampamento Meio-Sangue, calça jeans, tênis, as contas em seu pescoço e uma pena vermelha de harpia no cabelo. Nada diferente do sempre, mas a deixou sem palavras do mesmo jeito.

Talvez estivesse apenas com saudades.

— Oi... — A voz dela mal saiu, segurando o braço e mudando o peso do corpo de um pé para o outro, completamente desconfortável, o que deu o estalo para que Reyna voltasse a realidade.

— Olá. — Sua voz saiu firme, porém seu olhar focou-se nos pés dela. — Entre, por favor. — Deu espaço para que ela o fizesse, tentando sufocar a vontade de sair correndo.

´´Eu falaria com você amanhã! ``

Um tempo para pensar e montar um discurso, apenas isso que queria.

´´Agora você tem 30 segundos para se resolver.``

Valendo!

— Quer algo para beber? — A educação lhe daria uns momentos enquanto não conseguia coragem para olha-la nos olhos. — Tem refrigerante, suco e chá, se você preferir algo quente.

— Não quero nada, está tudo bem. — Deu meia-volta da cozinha até a sala, onde Piper estava, seus olhos se prendiam a tudo que não fosse ela, como os polos magnéticos de imãs invertidos. — Eu...

— Então sente-se aqui. — Indicou o sofá, tentando andar devagar até a poltrona, sabia que sentar longe dela era um recado nada agradável, mas estava com medo de se aproximar.

Não era hora de jogar seus sentimentos sobre Piper e, Reyna se conhecia o bastante para saber que o faria se tivesse a chance.

Cruzou as pernas, jogou o cabelo sobre o ombro direito, alongando o tempo em que poderia ficar quieta, cada segundo era precioso.

Tinha 3 coisas para dizer: por onde começar?

— O que você está fazendo? — O tom de Piper saiu receoso, o que fez com que Reyna finalmente a encarasse.

— Nada. — Não entendeu sua pergunta, o que não era importante naquele momento. — Quer falar sobre o que aconteceu no Jardim de Baco, estou certa? — Sua prioridade no momento.

— Bem... — A grega pareceu se assustar com a chegada ao ponto, sem qualquer rodeio ou introdução, entrelaçou os dedos em seu colo, tentando dar confiança a si mesma.

´´Não desvie o olhar e, não ouse gaguejar. ``

— Quero pedir desculpas pela forma como agi. — Estava irritada consigo mesma e não fez questão de esconder esse sentimento. — Acabei descontando minhas frustrações em você. — Foi a vez de Piper se ajeitar no meio do sofá, desconfortável. — Você não tem culpa de nada, isso não foi certo. — Pontou por fim, satisfeita com seu discurso improvisado.

´´Agora eu conto que não vou mais embora. ``

— Sabe... — A filha de Afrodite hesitou, o sorriso triste a deixou confusa e seu coração mais frio. — Odeio quando você fala assim comigo. — Reyna piscou por 3 vezes, sem saber se o problema eram seus ouvidos ou o cérebro. — Não sei se fui clara e você não se importa, ou se eu deveria dizer de uma vez, mas... — Piper soltou um riso curto e baixo, achando graça de sua reação. — Eu gosto quando você se abre comigo, na verdade eu adoro. — Completou, esticando as pernas e voltando o olhar para a mesinha de centro. — E me irrita quando você age assim, como se estivéssemos resolvendo negócios na principia. — Resmungou por fim.

Reyna queria ficar brava, queria muito ficar brava.

´´Eram só 3 coisas, eu te diria amanhã e tudo estaria resolvido, por que você tem que ser tão imprevisível, McLean?! ``

Mas como poderia ficar brava com sua voz baixa, suave e honesta?

— Desculpe. — Murmurou encarando as próprias mãos, sem ideia do que dizer, o riso suave de Piper se fez presente outra vez.

— Você não sabe agir de outra forma, não é? — Engoliu em seco e lutou contra a vontade de cruzar os braços, sentindo-se terrivelmente exposta. — Reyna, você pode sentar aqui comigo? — Fitou suas pernas, pensado em como a voz dela poderia soar persuasiva sem um pingo de charme.

A verdade era que preferia ser obrigada cumprir sua vontade, ao menos assim não teria que forçar suas pernas a se mexerem. Concordou com a cabeça, com medo de gaguejar, levou as mãos aos braços da poltrona para se levantar, tentando parecer relaxada quando tudo o que sentia era receio e medo.

Notar que estava fugindo do olhar da grega novamente a irritou, mas não o bastante para que fizesse algo contra. Sentou-se ao seu lado, com uma distância que considerou normal, tanto dela quando do braço do sofá.

— Posso te dizer uma coisa que não contei pra mais ninguém? — Sua voz espantou o silêncio.

— Claro. — Murmurou, sem saber o que esperar. Sentiu a movimentação de Piper no sofá, tão desconfortável quanto ela.

— Primeiro a parte que todo mundo sabe, como Jason e eu começamos a namorar. A névoa nos deu lembranças falsas de que éramos um casal, até hoje não sei se Hera nos manipulou para isso, ela gosta do Jason de um jeito bem bizarro.

Enquanto Piper falava seus olhos foram atraídos até ela, primeiro para os pés, batendo o calcanhar no carpete, as mãos unidas no colo, enquanto ela olhava para o nada a sua frente, perdida em memórias.

— O Jason não se lembrava de mim, mas eu me lembrava dele. — Crispou os lábios, revivendo as incertezas daquele momento. — Fomos nos conhecendo de novo, ele gostando de mim e eu dele. — O sorriso nostálgico se dissipou com um suspiro. — Mas eu sempre me lembrava da chuva de meteoros que vimos juntos, mas que nunca aconteceu.

Reyna teve vontade de aproveitar a pausa para perguntar onde ela queria chegar, porém conteve-se ao notar as mãos unidas serem apertadas com mais força, junto à vontade que tinha de segura-las.

— Depois veio o Argos II, a ameaça da guerra, problemas atrás de problemas, e a gente se apoiava em tudo, dava força um ao outro nos piores momentos. — Piper cruzou os braços, como se sentisse frio.

E Reyna fez o mesmo, se proibindo de se aproximar dela.

— Mas tudo deu certo no final, conseguimos evitar a guerra no último segundo, o despertar de Gaia e demos uma surra em tantos gigantes que eu mal consegui contar. — Suspirou aliviada, como se até hoje temesse pelo fracasso da missão. — E aí veio a paz, Annabeth e Percy entraram na faculdade em Nova Roma, Frank virou pretor e a Hazel capitã da Quinta Coorte, até o Leo achou uma namorada e fez todo mundo de palhaço fingindo que morreu.

A pretora engoliu em seco com o tom mordaz.

— E nós decidimos terminar a escola, foi aí que as coisas mudaram, ao menos para mim. — Piper descruzou os braços, tocando o colar de contas em seu pescoço. — Acho que nunca esqueci o que a névoa fez comigo, meus sentimentos por ele estava ligados a ela, e quando a gente pode finalmente ter um pouco de normalidade essa paixão mentirosa se transformou em afeto e carinho por uma pessoa muito importante para mim, só entendi isso quando Jason disse que me amava. — Piper encarou a TV desligada, chegando à parte que era mais delicada e difícil, vê-la buscar força para continuar e não fazer nada contrariava seus princípios.

Tocou suas mãos unidas no colo apenas com as pontas dos dedos, testando suas reações, a filha de Afrodite levou os olhos a seus movimentos, deixando que seus dedos se entrelaçassem pouco a pouco, notar o sorriso leve em seu semblante deixou o coração da pretora mais leve.

— Nós já tínhamos dito um para o outro depois da guerra, quando os romanos ainda estavam no Acampamento Meio-Sangue. — Com a mão livre Piper passou a desenhar círculos nas costas de sua mão com o polegar. — Mas foi a emoção do momento, naquela época eu nem sabia o que era gostar de alguém de verdade. — Rolou os olhos para si mesma. — Quando tudo estava tranquilo ele repetiu que me amava e eu também disse isso, mas me senti estranha, como se estivéssemos falando de amores diferentes.

A expressão no rosto da grega mudou, como se houvesse acabado de experimentar uma comida e não gostado nem um pouco.

— Isso me incomodou muito, não foi difícil entender que não gostava mais dele como namorado, era melhor que a gente terminasse. — Piper soltou sua mão, apoiando os punhos cerrados no sofá. — Ele fingiu que entendia e que estava tudo bem, mas estava tão magoado. — A filha de Afrodite voltou a encarar o chão, ainda incomodada com o que aconteceu meses atrás. — Jason me olhava exatamente como o meu pai, quando eu perguntava sobre a minha mãe. — Tentou disfarçar o soluço com uma risada sarcástica.

E aquilo foi mais do que o suficiente para que Reyna deixasse seu autocontrole de lado.

Passou seu braço pelos ombros dela, afim de traze-la para perto, ato que Piper aceitou de bom grado, abraçando-a pela cintura enquanto descansava a cabeça em seu peito.

— Fiquei com tanto medo de começar a agir como Afrodite. — Disse em um fio de voz, Reyna acariciou suas costas, tentando de alguma forma passar conforto a ela. — De me apaixonar de novo e ser cruel e mesquinha.

Segurou-a pelos ombros para afasta-la, a grega não se opôs, embora tenha agarrado seu pijama, para que não se afastasse mais.

— Olhe pra mim. — Pediu baixo quando o olhar de Piper fixou no braço do sofá, levou a mão ao seu queixo, erguendo o rosto até que seus olhares se chocassem. — Você jamais seria igual a sua mãe, McLean. — Limpou as lágrimas de seu rosto com o polegar suavemente. — Vênus quer ser inesquecível na vida dos mortais. — Colocou uma mecha de seu cabelo atrás da orelha. — Você quer uma vida tranquila, sem holofotes, ser apenas você mesma. — Tirou o cabelo de sua testa, plantando um beijo suave na região, Piper soltou um suspiro inebriado, como se houvessem usado o charme contra ela.

— Deuses... — As mãos dela deixaram sua cintura, subindo até o rosto. — Você é tão doce... — Reyna teve a intensão de perguntar o que ela queria dizer, mas os lábios de Piper cobriram os seus antes que pudesse fazer qualquer coisa.

Suaves, quentes e macios, receptivos e contraditoriamente ansiosos, Reyna se lembrava de pensar o quanto estava chocada por...Bom....

A garota pelo qual era apaixonada estar lhe beijando.

Ela aranhou seu couro cabeludo levemente, fazendo sua pele arrepiar, suas próprias mãos desceram até a cintura da filha de Afrodite, sentindo os contornos de seu corpo e a apertando mais contra si mesma, necessitando de um contato mais intenso, porém nenhuma sensação comparou-se a da língua de Piper tocando seus lábios, ávida para aprofundar o beijo. Reyna suspirou sobre sua boca ao sentir o contato, a mente sendo tragada pelas sensações, a calidez e a necessidade daquele toque, que começou lento e que a cada segundo ganhava mais urgência.

Pois não era apenas seu corpo afetado, seu coração ansiava por ele.

Seu coração machucado, cansado de esperar por algo que a própria deusa do amor lhe negou, e que negou a si mesma, usando seu cargo para afastar outras pessoas de seu passado e suas fraquezas, cada vez mais se escondendo dentro de sua armadura dourada, onde as palavras de Vênus não poderiam magoa-la, os olhares de pena e até receio não poderiam afetá-la.

Escondida onde ninguém veria suas falhas, vendo-a apenas pelo que se deixava mostrar, como a líder que o Acampamento Júpiter teria orgulho de possuir, a que Julian teria sonhado em ver.

E agora, ofegante, sobre uma Piper de olhos fechados deitada em seu sofá, — sem qualquer noção de como e quando haviam mudado de posição, — Reyna se perguntava se poderia finalmente deixar aquele peso para trás.

Ver o sorriso suave e feliz da filha de Afrodite quando tocou seu lábio inferior com o polegar foi a única resposta que precisava.

Ela apertou sua mão com a própria, abrindo os olhos devagar, como se o coração de Reyna já não estivesse agitado o bastante.

— Oi... — A pretora não teria condições de responder mesmo se tentasse. — Não acredito que Drew estava certa sobre você.

— O que? — A surpresa a ajudou a voltar a si.

— Esquece, não é nada. — O riso baixinho a fez sorrir, sentir os movimentos das pernas de Piper a fez notar o quão a posição em que estavam era...

Íntima, sugestiva e complicada.

Sentou-se na ponta do sofá, tentando parecer menos envergonhada do que se sentia, infelizmente o sorriso lascivo de Piper mostrou que sua tentativa foi em vão. Esperou que ela se sentasse também para pigarrear e dizer...

´´O que eu tinha que dizer mesmo? ``

Eram 3 coisas.

— Você fica uma gracinha sem graça desse jeito. — Murmurou perto de seu ouvido, afastando-se rapidamente para ser o resultado de suas palavras.

— Piper. — Suspirou seu nome, pedindo para que parasse, a grega apenas riu, pegando sua mão e entrelaçando seus dedos sem cerimônia alguma.

— Foi por isso que eu menti. — Disse em tom baixo, a graça deixando sua voz. — Não queria tentar uma relação sendo como a minha mãe, quando você me perguntou porque eu queria que ficasse, não pude dizer que era porque estou apaixonada por você. — Piper suspirou, sua boca continuou a se mover, embora a pretora não conseguisse mais distinguir o que falava.

Ok, não era idiota o bastante para não entender que Piper gostava dela depois de ser beijada daquele jeito, mas ouvir era diferente, muito diferente.

Porque agora o eco da voz de Vênus em sua mente não passaria apenas a isso, um eco.

— Reyna. — Chamou quando suas mãos foram até o rosto dela. — Você está me escutando?

— Não... — Disse, com o riso em sua voz.

— O Leo tentou me dizer e a Annabeth não... — Deixou a frase morrer quando notou sua aproximação. — Ok, isso também não é importante. — Capturou o lábio inferior de Piper com os dentes, como a última prova que precisava de que não estava tendo um sonho bom demais para ser verdade.

Leo e Annabeth não eram importantes, sua reunião com Hazel no dia seguinte ou o fato de que a grega estar ali depois da nove da noite era uma infração que teria que fazer vista grossa, o que importava era que Piper havia conseguido seu lar e se livrar da sombra de sua mãe.

E no caminho havia lhe ajudado a curar seu coração.


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Notas finais do capítulo

Eu queria ter trabalhado mais a Reyna nessa fic, mas as coisas foram acontecendo no ponto de vista da Piper e eu não teria mais tempo pra mexer por causa da faculdade, achei melhor terminar ela e deixar pra colocar um update quando fosse possível.

Enfim, chegamos ao fim.

Enquanto estanco meus sangramento nasal vocês podem dizer o que acharam da fic XD



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