Paradoxo Temporal 2: O Projeto K1 escrita por Vanessa Sakata


Capítulo 29
Intenções ocultas e indecências expostas




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― Comandante Imai Nobume – uma voz masculina disse. – Relatório de hoje.

A mulher de altura mediana, corpo esguio, com longos cabelos lisos azuis-escuros e olhos num tom carmesim escuro se levantou da cadeira na qual se sentava e caminhou sem pressa para a tela onde seria feita uma projeção. Sua farda branca com detalhes em dourado sempre se mantinha impecável, tal como sua postura como Comandante do Mimawarigumi.

Sempre se consideravam elite da elite, logo deveria se comportar como tal... Sobretudo diante dos três integrantes da Junta. Apesar da pressão de estar frente a frente com os governantes, ela mantinha seu olhar inexpressivo.

Olhou para o trio que compunha a tal da Junta Governamental – ou simplesmente, “A Junta”. Não gostava da cara daquele trio, nem daqueles amantos da raça darkeniana. Pouco se sabia a respeito deles, mas comentava-se que controlavam poderes relacionados à escuridão e que aqueles três eram os mais poderosos que existiam. Não era possível confirmar ou desmentir tais comentários, visto que nunca foram vistos de fato em ação. Mas outros atributos eram fáceis de identificar. Eram bastante inteligentes e difíceis de serem enganados.

Falar com eles era o mesmo que pisar em ovos, sobretudo quando desconfiaram de infiltração no período em que Yamazaki Sagaru, espião experiente do Shinsengumi, estava disfarçado como um dos burocratas do atual governo. Quando ele encerrou sua missão, as suspeitas recaíram ainda mais sobre Miyojin Taichirou, então Capitão da Quinta Divisão. Foi preciso tomar parte em sua morte forjada, de tal modo que ele pôde retornar disfarçado graças ao Jouishishi. Seu disfarce de funcionário de lavanderia era bastante convincente, mas não conseguira se aproximar dele para dar-lhe as informações que sabia.

Fariam um cerco ao Distrito Kabuki o quanto antes e, com o tumulto que houve três dias atrás, certamente isso seria ainda mais antecipado. Daí a ordem para que ela trouxesse à Junta o tal relatório, no qual estariam as falhas apontadas no episódio em que Gintoki e Shinpachi vindos do passado conseguiram entrar para resgatar Hijikata e driblar toda a segurança da base, composta em sua maioria pelo Mimawarigumi. Não só as falhas deveriam ser apontadas, como também as possíveis soluções.

Ao fim do relatório, os olhares penetrantes daqueles três pareciam buscar nela algum indício de que poderia estar tentando mentir ou omitir fatos. Mesmo assim, buscou manter sua expressão impassível. Não seriam aquelas expressões de dúvida que a abalariam.

Não era a primeira vez que duvidavam de sua capacidade.

Huey, Dewey e Louie – esses eram seus nomes – sinalizaram com as mãos que ela estava dispensada e que poderia se retirar. Aqueles três seres de pele verde-clara eram realmente pedantes e chatos. Sentia certa saudade do antigo Bakufu, mesmo sendo fantoche do Tendoushuu, e da rivalidade que o Mimawarigumi possuía com o Shinsengumi.

Não era por serem rivais que ela gostaria que a força policial da farda preta fosse extinta. Eles e o pessoal da farda branca, comandado por ela, se completavam para a segurança de Edo. E não apenas o Shinsengumi a preocupava, o Distrito Kabuki, onde Gintoki vivia, também.

Embora estivesse servindo àqueles três, mal podia esperar pelo momento em que se viraria contra eles tal como Isaburou fizera contra Kasler.

Bastava uma boa oportunidade.

Caminhando com certa calma pelo corredor que a levaria até onde estava atualmente o QG do Mimawarigumi – no mesmo terreno do complexo que compunha a base do atual governo após a demolição do palácio do último shogun, Nobume sentiu algo vibrar em seu bolso. Era seu smartphone, no modo silencioso, o qual apenas desbloqueou quando chegou a uma área considerada como “ponto cego”, não alcançado por câmeras ou sensores, mas onde estavam homens de sua inteira confiança.

Abriu o aplicativo de e-mail e, na caixa de entrada, viu a primeira mensagem e reconheceu o remetente. Fora enviada por um usuário chamado “samuraideeliteaposentado” que, na verdade, era Isaburou. Em linhas gerais, ele dizia que havia recebido informações de que Taichirou estava em Kabuki com Gintoki, Shinpachi e Hijikata vindos do passado... E que ela e seus comandados poderiam fazer sua parte no cerco, pois já havia um plano sendo desenvolvido.

Mesmo fora do Mimawarigumi, Sasaki Isaburou seguia bastante ativo. Tinha informantes para lhe passar algumas coisas que ocorriam fora da base, principalmente dentro do Distrito Kabuki e inclusive dentro do Shinsengumi. Era isso que a deixava um pouco mais tranquila no atual momento, o que permitia que sua cabeça trabalhasse numa forma de evitar que aquele trio fizesse o que bem entendesse no governo.

Dois governos caindo em menos de um ano não era um fato que ocorria todo dia.

 

*

 

O Distrito Kabuki aos poucos voltava à sua rotina, na medida do possível. Devido à atual conjuntura, o local não era tão movimentado como antigamente, mas mostrava estar bem longe de ser considerado um distrito morto. A noite trazia um movimento bastante tímido de transeuntes em busca de alguma diversão, caso houvesse alguma naquela área. Contrastando com o pouco movimento das ruas de chão batido, havia uma grande algazarra na parte de baixo do prédio vermelho de dois pavimentos.

A movimentação se dava no bar de Catherine, onde um karaokê tocava animadamente num ambiente bem cheio. Estavam o quarteto vindo do passado, formado por Gintoki, Shinpachi, Kagura e Hijikata, além do Trio Yorozuya do futuro formado por Gintoki, Ginmaru e o outro Shinpachi, agora ex-comandante do Shinsengumi. Também estavam Katsura, Elizabeth, Hasegawa, Kondo, Tae, Ichiko, Yamazaki, o agora Vice-Comandante Okita e o novo Comandante do Shinsengumi, Hijikata. Era uma pequena confraternização para comemorar várias coisas, como o fato de Kabuki continuar em pé, Taichirou ainda estar vivo e o Hijikata do passado ter sido resgatado com sucesso.

Enquanto Ginmaru e Taichirou ajudavam Catherine e Tama, os demais se divertiam comendo e bebendo. Nem todos estavam tomando bebida alcoólica, por precaução ou por conta da idade, como era o caso de Kagura e Shinpachi vindos do passado e Ichiko. A porta corrediça se abriu e por ela entrou uma pessoa.

― E aí, pessoal? – uma voz masculina cumprimentou de forma jovial, entre risos. – Há quanto tempo, não é?

O recém-chegado era um homem alto, que envergava seu inconfundível casaco vermelho sobre blusa cinza e calças pretas. Também não deixara de calçar getas – tradicionais sandálias de madeira – e usar seus característicos óculos escuros mesmo à noite. Seus cabelos castanhos ainda formavam a permanente natural que pouco ou nada mudara com o passar dos anos e seu rosto tinha pouquíssimas linhas de expressão, que sequer eram percebidas por conta de seu largo sorriso típico de um otimista incorrigível.

― Tô sabendo que você e o Takasugi se acertaram, Kintoki... – ele disse ao Gintoki mais velho enquanto lhe dava tapinhas nas costas. – Isso é ótimo!

― É “Gintoki”, Tatsuma. – o albino rebateu após terminar a primeira caneca de cerveja, mas dizia com um leve sorriso no rosto. – Digamos que percebemos que somos dois cabeças-duras.

― Ué, mas se vocês se acertaram, por que ele não veio?

― Ele está em Yoshiwara junto com os demais do Kiheitai.

― Ah, sim! Provavelmente Mutsu e a metade do pessoal do Kaientai vai encontrá-los, eles foram pra lá conforme combinamos. A outra metade tá comigo.

Katsura se juntou aos dois amigos para prosseguir a conversa, enquanto a cantoria rolava solta no karaokê. O microfone estava nas mãos do Shinpachi mais jovem que cantava o grande sucesso de sua cantora favorita, Terakado Tsuu, “Seu pai é um XX”. Cantava com toda a sua alma de capitão da Guarda Imperial, o fã-clube que liderava, mas nem o fato de cantar com tamanha paixão amenizava o quanto o jovem era absurdamente desafinado. Entretanto, na próxima música, a “Seu irmão é um hikikomori”, começaram a cantar juntos Ichiko e seu tio. Kagura enfiou os dedos nos ouvidos numa vã tentativa de abafar o som duplamente horroroso das vozes que se esgoelavam durante a música.

Não sabia se ficava com pena ou com raiva por descobrir que o Quatro-Olhos continuaria ferindo os ouvidos alheios por cantar tão mal. Entretanto, correu até Ichiko ao ver que o patriarca dos Kondo começava a se desfazer das roupas devido ao fato de o álcool ingerido ter despertado seus instintos “gorilescos” que o faziam ter vontade de se expor completamente. Sendo assim, interrompeu a cantoria da menina enquanto tapava os olhos dela e sentiu que alguém também lhe fazia o mesmo. Ouviu um “mas quem é que tá tapando meus olhos?” vindo de Shinpachi, pergunta essa respondida quando ouviu:

― MAS QUE DROGA, ISAO! – era a voz do outro Shinpachi mais velho, que tapava os olhos de sua contraparte mais jovem, que fazia o mesmo com Kagura, que o fizera antes com Ichiko. – TEM MENOR DE IDADE AQUI!

― Meu pai tá ficando peladão de novo? – Ichiko perguntou.

― Você não tem trauma de ter um gorila desses como pai? – Kagura questionou.

― Nada. – a menina respondeu tranquilamente. – Já estou acostumada com isso.

― Peraí! – o Shinpachi adolescente atalhou. – Você já viu seu pai pelado?

― O máximo que vi foi ele de fundoshi. Sempre taparam meus olhos antes de ver sem. Até hoje tô curiosa pra saber se ele tem mesmo bunda peluda como dizem.

Os dois jovens da Yorozuya Gin-chan disseram ao mesmo tempo:

― NEM QUEIRA SABER!

― De toda forma – a garota suspirou conformada. – minha mãe já vai resolver isso em cinco... quatro... três... dois... um...

Um barulho bem forte de alguém sendo golpeado, seguido por um baque de um corpo indo ao chão, foi ouvido por eles, acompanhado por um grito:

― EU JÁ FALEI PRA VOCÊ PARAR DE FICAR PELADO DO NADA, ISAO!

Era Tae quem havia desferido uma voadora no marido, que desmaiara com a violência do golpe. E, com seu típico sorriso impossível de decifrar se é de achar algo engraçado ou de puro sadismo, ela arrastou Kondo Isao puxando-o por uma perna.

― Shin-chan, daqui a uns quinze minutos leve a Ichiko-chan pra casa. Depois você volta.

― Pode deixar, mana... – ele respondeu enquanto destapava os olhos de sua versão mais jovem. – Fique tranquila quanto a isso.

 

*

 

Já era alta madrugada quando a confraternização terminou. Kagura abria a porta corrediça da casa de Gintoki, que chegava sendo arrastado por Ginmaru, da mesma forma que sua contraparte mais jovem era levada por Shinpachi. Ambos estavam bêbados demais e antes de subirem as escadas haviam quase vomitado as tripas, como consequência do porre que tomaram.

Assim que todos entraram, os dois albinos tiraram forças de onde não tinham e correram para o banheiro, de onde se ouvia o incômodo e nojento som de alguém vomitando muito. Um som bastante corriqueiro para quem convivia com o antigo Shiroyasha e com seu conhecido lado pinguço.

No dia seguinte estariam insuportáveis como sempre por conta da ressaca.

Após alguns minutos, o Gintoki do passado e o do futuro saíram do banheiro com passadas vacilantes, que só pararam quando alguém caiu em cima dos dois. Não foi difícil para Shinpachi identificar a pessoa que despencara do teto:

― Sacchan-san?!

A kunoichi de cabelos de cor lilás havia caído do teto e conseguiu derrubar os dois homens, que tentaram se levantar enquanto se livravam dela. Por seu turno, Sarutobi Ayame se agarrava aos dois ferrenhamente, se divertindo com a forma desajeitada com a qual tentavam se libertar daquela situação. Nessa confusão, os óculos de grau dela caíram e, com a visão embaçada, se agarrou a um terceiro indivíduo de cabelos prateados que, com o susto caiu no chão.

― Ô SUA MALUCA MÍOPE – Ginmaru tentava se livrar de Sacchan. – ME LARGA, VAI AGARRAR MEU PAI!

Kagura pegou os óculos e entregou a ela, que se levantou e os pôs enquanto se empertigava e se desculpava com Ginmaru.

― Sacchan-san – Shinpachi indagou. – Você veio aqui só por causa do Gin-san, ou tem alguma novidade?

― Sim – a kunoichi assumiu um tom sério enquanto ajeitava os óculos de grau. – Eles já estão se movimentando para o cerco. Vão começar com o cerco bem aos poucos, para ninguém desconfiar.


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